Acórdão nº 739/15.6T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução14 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO M (…), residente na Rua (...) , intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra “R (…) S.A.

”, com sede na Avenida (...) , dizendo que a ação deve ser julgada procedente e, consequentemente: - “Deve a Ré ser condenada a pagar à Autora, a título de indemnização pelos danos patrimoniais supra elencados, o montante total de 5.733,15€ (cinco mil, setecentos e trinta e três euros e quinze cêntimos), acrescido de juros até efectivo e integral pagamento; - Mais, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora o valor indemnizatório cujo exacto cômputo não foi (nem é ainda), pelos motivos supra aduzidos, possível efectuar de modo definitivo e que, por esse motivo, se relega para execução de sentença; - De igual sorte, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora, a título de indemnização pelos supra descritos danos não patrimoniais, valor nunca inferior a 1.500,00€ (mil e quinhentos euros), acrescido de juros até efectivo e integral pagamento; - Finalmente, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora, a título de multa in casu legalmente devida, o valor de 1.020,00€ (mil e vinte euros)”.

Alega, em síntese, que no dia 8 de Outubro de 2010, a Ré instaurou contra a Autora a execução nº 5217/10.7TBLRA, que melhor identifica, tendo apresentado como título executivo um requerimento de injunção (nº.213680/10.7YIPRT) ao qual foi conferida força executiva. No âmbito daquele requerimento injuntivo, a Ré declarou ter celebrado com a Autora uma convenção de domicílio para efeitos de citação, o que não é verdade, pelo que a notificação da Autora foi expedida por “via postal simples”.

Assim, na execução, não houve lugar a citação prévia da Autora, tendo no dia 5 de Março de 2012, sido penhorado o seu veículo marca “BMW”, matrícula “ (...) EC”, que foi apreendido a 23 de Julho de 2013. Só neste dia, já após a efetivação de tal penhora, foi a Autora regular e validamente citada e só nessa ocasião teve pela primeira vez conhecimento da existência de um processo judicial contra si instaurado pela Ré mais de 3 (três) anos antes. Face a tal a Autora, apresentou oposição à execução, com o nº.5217/10.TBLRA-A, que no dia 9 de Junho de 2014 foi julgada integralmente procedente.

Do referido circunstancialismo fáctico resulta não ter a Ré agido com a prudência a que estava legalmente adstrita, pelo que responde pelos danos culposamente causados à Autora.

A efetivação do referido ato executivo teve um impacto absolutamente devastador na Autora. Em primeiro lugar, na medida em que a referida viatura era um instrumento indispensável ao exercício da sua atividade profissional de promotora de vendas, a privação do respetivo uso desde 23 de julho de 2013 impossibilitou o exercício de tal atividade, redundando na cessação da sua relação laboral com a sociedade comercial L (…), Lda., em 31 de julho de 2013. Por esse motivo a Autora deixou de auferir, pelo menos, o valor de total de 3.132,00€ correspondente a 522,00€ de retribuição base x 6 (seis) meses, única fonte de rendimentos da Autora. A privação de uso do veículo impossibilitou, também que a Autora executasse as mais elementares tarefas da sua vida pessoal, sendo que vive em área deslocada da cidade.

Viu-se a Autora forçada a alugar uma viatura, aluguer que se manteve até ao dia 16 de Outubro de 2013 e cujo cômputo total ascendeu a 2.346,15€. No dia 17 de Outubro de 2013 porque não tinha condições para continuar a suportar o encargo com aluguer de viatura, pediu ao seu irmão uma viatura emprestada, que utilizou até ao dia 18 de Março de 2014, tendo suportado, as despesas com o pagamento da reparação a que a mesma teve de ser sujeita e ainda atinente ao seguro, que ascenderam a 255,00€.

No âmbito do incidente de prestação de caução apresentado pela Autora com o fito de obter o levantamento da penhora sobre a sua viatura teve a Autora de efetuar um depósito bancário no valor global de 1.749,98€, que até à data da propositura da ação não lhe foi restituído, pelo que tem direito a receber o valor respeitante aos juros que deixou de auferir, à taxa civil desde 10 de Dezembro de 2013 e cujo exato cômputo, pelo facto de não lhe ter sido ainda restituído, relega para a fase de execução de sentença.

Fruto da circunstância da apreensão ter sido efetuada pelo agente de execução com auxílio da força pública - e, portanto, com o “aparato” inerente - na casa de habitação da Autora e na presença do cliente e vizinhos que ali se encontravam, sentiu-se esta profundamente vexada e humilhada, situação infeliz e rapidamente propalada e que teve a particularidade de causar profunda humilhação na Autora, tida por todos que com ela lidam como pessoa e profissional de fino trato, de ética e moral irrepreensíveis e que, se para tanto tivesse tido oportunidade tudo faria para se defender em sede própria e evitar tal situação. A Autora no dia 23 de julho de 2013 e nos dias subsequentes andou acabrunhada, nervosa e hipersensível, comportamento totalmente contrário à sua maneira de ser - já que quem, na realidade, a conhece sabe que é uma pessoa calma, serena e bem-disposta -, tendo a realidade descrita sido igualmente foco de inúmeras desavenças conjugais com o seu marido. Teve a Autora dificuldade em adormecer, resultado da recordação, sempre presente, da humilhação e do vexame sofridos. Assim, resulta estarmos perante danos patrimoniais e não patrimoniais claramente merecedores de tutela jurídica, que foram consequência direta e necessária da conduta culposa da Ré. Assim, dúvidas não restam de que esta incorre na obrigação de indemnizar a Autora, a título de indemnização pelos danos patrimoniais referidos e a título de indemnização pelos danos não patrimoniais, valor nunca inferior a 1.500,00€ (mil e quinhentos euros), acrescido de juros até efetivo e integral pagamento. Por fim, deve a Ré ser condenada a pagar à Autora, a título de multa o valor de 1.020,00€ (mil e vinte euros). Cita jurisprudência e doutrina.

Juntou documentos, requereu as suas declarações de parte e arrolou testemunha.

* A Ré, regularmente citada, contestou, pugnando pela improcedência da ação, e deduziu reconvenção, que não foi admitida – cfr. despacho de fls. 133-139.

Alega, em síntese, em sede de contestação, que se dedica à prestação de serviços de viagens e turismo, resultante da fusão entre as sociedades S (…9 e G (…).

No âmbito da sua atividade comercial (nessa data ainda denominada S(…)), reservou a favor da Autora, seu marido (…) e um grupo de amigos um pacote turístico de fim de ano em Roma, com o operador "T (...) ", com saída a 31/12/2008 e regresso a 04/01/2009, em regime de alojamento e pequeno almoço, sendo o custo total da viagem dos referidos oito membros do grupo, 4.517,00€, importando a parte da viagem da A. e do marido em 1.104,00€, que com o desconto de 8€ por pessoa feito pela Ré, ascendeu ao valor de 1.088,00€.

A Autora sinalizou a viagem no dia 14/12/2008, através do cheque n.º (...) , emitido pelo valor de 300€, tendo a Ré emitido o recibo n.º (...) .

Imediatamente a seguir ao Natal desse ano a Autora contactou a loja da Ré em (...) e solicitou informação sobre os gastos de cancelamento da viagem. Foi informada pelos funcionários da Ré de que atendendo a que as passagens aéreas já haviam sido emitidas e se tratava de um pacote de fim de ano, os gastos de cancelamento corresponderiam ao valor integral do pacote. Não obstante, a Autora cancelou a viagem no dia 30/12/2008, invocando problemas de saúde e internamento hospitalar do seu marido. Na data em que a A. cancelou a viagem já a R. tinha pago a quantia total de 4.103,56€ (correspondente à soma das quantias parciais de 1.025,89€ e 3.077,67€, ao operador T (...) . O prejuízo sofrido pela Ré com o cancelamento da viagem da Autora e marido, ascendeu à quantia de 839,55€ (1.018,63€- 179,08€).

À data dos factos estava em vigor o Decreto-Lei n.º 209/97, de 13.08, cujo artigo 29.º referente ao direito do Cliente à rescisão de viagem turística ou organizada), previa que “O cliente pode sempre rescindir o contrato a todo o tempo, devendo a agência reembolsá-lo do montante antecipadamente pago, deduzindo os encargos a que, justificadamente, o início do cumprimento do contrato e a rescisão tenham dado lugar e uma percentagem do preço do serviço não superior a 15%.

” Assim, a Ré tem direito a receber da Autora a quantia de 539,55€ acrescida de uma indemnização correspondente a 15% do valor do serviço, ou seja 163,20€ (1.088,00€ x 15%), totalizando 702,75€.

Tanto a fatura emitida pela Ré como as cartas de interpelação acima referidas foram enviadas pela Ré para a morada da Autora sita na Rua (...) , fazendo expressa menção aos “gastos de cancelamento” da viagem sub judice, conforme docs. 12, 13 e 14. Esta morada é a mesma morada em que a Autora atualmente reside, o que resulta claramente quer do formulário da p.i., quer do seu cabeçalho. A carta enviada em 14/01/2009 foi recebida pela própria Autora que, no dia 19/01/2009, assinou o respetivo aviso de receção – cfr. aviso de receção que junta como Doc. Resulta, assim, evidente, que é falso que a Autora “não tivesse a mínima ideia” de que era devedora à Ré do valor dos gastos de cancelamento da viagem reservada para si e para o seu marido.

Porque a Autora não efetuou o pagamento do valor devido à Ré, no dia 21/06/2010, esta apresentou o requerimento de injunção n.º 213680/10.7YIPRT contra a Autora, pedindo o pagamento do valor de capital de 608,92€ (valor indicado por lapso pois que o em divida era 702,75€), acrescido do valor dos juros de mora até essa data vencidos – cfr. doc. 16 Foi por mero lapso que no requerimento de injunção foi indicada a existência de convenção de domicílio. Não obstante ter sido indicada a existência de convenção de domicílio, o requerimento de injunção sub judice foi notificado à A. por via postal simples no dia 02/07/2010 – cfr. Aviso dos CTT com o n.º (...) que junta como doc. 17 – na morada da A. já...

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