Acórdão nº 222/14.7T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelV
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – Relatório “Banco (…) S. A.

”, com os sinais dos autos, intentou ([1]) ação declarativa condenatória, com processo comum, contra 1.ºs – CA (…) e CM (…), 2.º - CF (…) 3.ª – E (…) e 4.º - CP (…), todos também com os sinais dos autos, pedindo que seja decretada a ineficácia em relação a si da alienação dos prédios que identifica, condenando-se os RR. a reconhecerem ao A. o direito de executar tais imóveis no património daqueles (aludiu aos 1.ºs e 2.º), para pagamento do seu crédito (quantias peticionadas em duas ações executivas).

Para tanto, alegou, em síntese, que: - celebrou com a sociedade “F (…), Lda.” um denominado “contrato de empréstimo”, no montante de € 100.000,00, dois “contratos de abertura de crédito em conta corrente”, até ao limite de € 100.000,00, cada um, e um “contrato de remessa de exportação”, este até ao montante de € 150.000,00; - e celebrou com a sociedade “I (…)Lda.” um “contrato de abertura de crédito em conta corrente”, até ao limite máximo de € 100.000,00; - para garantia do cumprimento das responsabilidades emergentes desses contratos, as referidas sociedades entregaram ao A. livranças em branco, avalizadas pelos 1.º e 2.º RR., as quais tal A. preencheu em consequência do incumprimento e resolução dos referidos contratos, instaurando ações executivas para obter o pagamento coercivo da importância global de € 205.339,25; - nestas execuções não foram encontrados bens (da titularidade das ditas sociedades ou dos referidos RR.) suficientes para pagamento do crédito; - porém, após o incumprimento contratual, os 1.ºs e 2.º RR. doaram à 3.ª R. e ao 4.º R. diversos imóveis, reservando para si o respetivo direito de usufruto, doações que o A. impugna, por envolverem perda da garantia patrimonial do seu crédito (art.º 610.º do CCiv.), visando a ineficácia dessas transmissões em relação a si, para execução dos respetivos bens no património daqueles RR. até satisfação do seu crédito.

Contestou a 1.ª R., CM (…), excecionando a sua ilegitimidade e impugnando diversa factualidade alegada pelo A. – afirmou encontrar-se separada judicialmente de pessoas e bens, nunca ter mantido qualquer relacionamento com o A., manter a livre disponibilidade sobre o seu património e desconhecer, sem dever de conhecer, a relação controvertida entre A. e demais RR. –, de molde a concluir pela sua absolvição da instância e pela improcedência da ação.

Também os demais RR. contestaram (estes conjuntamente), alegando: - não invocar o A. a impossibilidade de ressarcimento do seu crédito; - ter o 1.º R. marido doado os imóveis aos seus descendentes, por sofrer de doença grave e pretender aproveitar regime fiscal favorável, motivando-se o 2.º R. no facto de trabalhar em país (Bósnia) fustigado pelas minas terrestres e temer pela sua vida; - residirem os 3.ª e 4.º RR. na Suécia, desconhecendo a situação financeira dos demais RR.; - inexistir dolo na transmissão dos imóveis, antes litigando o A. de má-fé, devendo ser condenado, por isso, em multa e indemnização, enquanto a ação deve improceder.

Observado o princípio do contraditório – quanto à matéria de exceção invocada e quanto à discussão de facto e de direito na perspetiva do imediato conhecimento de meritis –, vieram as partes manter as posições veiculadas em sede de articulados, concluindo os 1.º, 2.º, 3.ª e 4.º RR. por deverem os autos prosseguir para produção de provas.

Porém, dispensada a audiência prévia e saneado o processo – foi julgada improcedente a deduzida exceção de ilegitimidade passiva –, conheceu-se imediatamente de facto e de direito, proferindo-se saneador-sentença, com o seguinte dispositivo: «(…) julgo procedente, por provada, a presente ação e, em consequência: a) declaro ineficaz, em relação ao autor, (…) o contrato de doação celebrado em 13 de junho de 2012 entre os 1.ºs réus, CA (…) e CM (…), na qualidade de doadores, e a 3.ª ré, E (…), e o 4.º réu, CP (…), na qualidade de donatários; b) declaro ineficaz, em relação ao autor, (…) o contrato de doação celebrado em 13 de junho de 2012 entre o 2.º réu, CF (…), e a 3.ª ré, E (…) c) declaro ineficaz, em relação ao autor, (…) o contrato de doação celebrado em 13 de junho de 2012 entre o 2.º réu, CA (…) e o 4.ª réu, CP (…) d) condeno os réus, (…), a reconhecer ao autor, (…) o direito de executar os imóveis objeto desses contratos de doação no património da 3.ª ré, E (…) e do 4.º réu, CP (…) até ao limite do seu crédito, de 205.339,25€ (…) e juros legais.» (sic, fls. 815, com negrito retirado).

Inconformada, recorre apenas a 1.ª R., apresentando alegação e as seguintes Conclusões (…) O A. contra-alegou, pugnando, por sua vez, pela improcedência do recurso e confirmação do julgado.

*** O recurso foi admitido como de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo neste Tribunal ad quem sido mantidos o regime e o efeito fixados.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

*** II – Âmbito do Recurso Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil atualmente em vigor (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 ([2]) –, cabe saber ([3]):

  1. Se a 1.ª R./Apelante é parte ilegítima; b) Se a decisão proferida padece de inconstitucionalidade e ilegalidade, ao atingir o direito de propriedade da Recorrente; c) Se o estado do processo não permitia decisão de meritis; d) Não estando demonstrado o requisitório da impugnação pauliana.

    *** III – Fundamentação

    1. Da factualidade julgada provada Na 1.ª instância foram considerados provados os seguintes factos: «1.º Em 19 de julho de 2011, o autor celebrou com a sociedade “F (…) Lda.” o “contrato de empréstimo” com o n.º 44-00052-64, nos termos do qual aquele concedeu a esta um empréstimo no montante de 100.000,00€ – cfr. documento de fls. 29 a 34, cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido.

      1. Para garantia do pagamento do capital, juros, comissões e demais encargos resultantes desse contrato, a sociedade “F (…), Lda.” entregou ao autor uma livrança avalizada pelo 1.º e 2.º réus – cfr. “cláusula adicional” do mesmo documento.

      2. Por documento denominado de “contrato de abertura de crédito em conta corrente” com o n.º 050-00074-96, datado de 29 de julho de 2011, o autor declarou abrir a favor da sociedade “F (…) Lda.” um crédito até ao limite máximo de 100.000,00€ – cfr. documento de fls. 35 a 40, cujo teor aqui dou por integralmente reproduzido.

      3. Para garantia do pagamento do capital, juros, comissões e demais encargos resultantes desse contrato, a sociedade “F (…) Lda.” entregou ao autor uma livrança avalizada pelo 1.º e 2.º réus – cfr. “cláusula...

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