Acórdão nº 89/12.0EACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução21 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do PCS n.º 89/12.0EACBR da Comarca de Viseu, Viseu – Inst. Local – Secção Criminal – J1, mediante acusação pública, foram os arguidos A... e B... , melhor identificados nos autos, submetidos a julgamento, sendo, então, imputada, a cada um a prática em autoria de um crime de exploração de jogo de fortuna ou azar, p. e p. pelos artigos conjugados dos artigos 1º, 3º, 4º, 108º do D.L. n.º 422/89, de 2.12.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença de 11.01.2016, o tribunal decidiu [transcrição do dispositivo]: Por todo o exposto, decido julgar parcialmente procedente, por provada, a acusação pública e, em consequência: a) Absolvo a arguida B... da prática de um crime de exploração ilícita de jogo, do artigo 108.º, n.º 1, conjugado com os artigos 1.º, 3.º e 4.º, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, por que vinha acusada; b) Condeno o arguido A... pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo do artigo 108.º, n.º 1, conjugado com os artigos 1.º, 3.º e 4.º, n.º 1, alínea g), todos do Decreto-Lei n.º 422/89, de 2 de dezembro, nas penas de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), e na pena de 6 (seis) meses de prisão, que substituo por 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), do que resulta a pena total de 280 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), perfazendo a quantia global de € 1.960,00 (mil novecentos e sessenta euros); c) Condeno ainda o arguido no pagamento dos encargos e das custas do processo, que fixo em 3 UC; d) Declaro perdidos a favor do Estado as máquinas apreendidas nos autos, melhor descritas no auto de apreensão de fls. 5 e 6 dos autos, e a quantia de € 10,00 (dez euros) encontrada no seu interior.

  2. Inconformado recorreu o arguido A... …, formulando então as seguintes conclusões [aperfeiçoadas na sequência do convite que, para o efeito, lhe foi dirigido por este tribunal – cf. fls. 643/644]: I. NULIDADE DA ACUSAÇÃO E IMPOSSIBILIDADE DA SUA SANAÇÃO ATRAVÉS DA ALTERAÇÃO NÃO SUBSTANCIAL DOS FACTOS OPERADA NA AUDIÊNCIA DE DISCUSSÃO E JULGAMENTO A. Da douta Acusação Pública dirigida contra o Arguido, resulta, cristalinamente, que a mesma omite as características das máquinas/computador e os respetivos jogos, que alegadamente as mesmas desenvolvem, bem como, a respetiva ilicitude de cariz criminal, resultando do texto Acusatório apenas, e em suma, que as máquinas apreendidas à ordem dos presentes autos desenvolvem jogos de fortuna e azar, que atribuem pontuações e prémios pecuniários.

    1. De facto, o eventual modo de execução do crime, o que integra tipicidade objetiva do ilícito não está especificadamente enunciada, descrito ou descriminado na douta Acusação Pública, realizando uma ilegal remissão para um qualquer “Relatório Pericial” realizado à ordem dos presentes autos (violando desde logo os princípios do acusatório, do contraditório, e todos os subprincípios daí emergentes, tal qual resulta preceituado no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa e conforme melhor se explanou na Motivação de Recurso apresentado).

    2. Ora, a consideração de tais factos nunca e em momento algum poderá consubstanciar uma alteração não substancial dos factos, nos termos previstos no artigo 358.º, n.º 1 do C.P.P., conforme se defende em sede de douta Sentença e não pode operar uma tal comunicação após realização de audiência de discussão e julgamento, conforme realizado pelo Dig.º Tribunal “a quo”, na tentativa de sanar a insuficiente acusação dirigida contra o Arguido, que é elabora por remissão para determinados documentos.

    3. Deste modo, a nulidade de que padece todo o texto acusatório, nos termos do disposto no artigo 283.º, n.º 3 do C.P.P., não poderá miraculosamente ser suprida por uma qualquer e ilegítima alteração não substancial dos factos, nos termos do disposto no artigo 358.º, n.º 1 do CPP, por tal pretensão ser absoluta e totalmente contrária aos mais elementares princípios que envolvem o nosso processo penal e supra descritos, o que deverá em sede do presente recurso ser reconhecido, para todos os devidos e legais efeitos e com todas as consequências daí advenientes e quanto a tais questões já se pronunciou também nosso Insigne Tribunal da Relação do Porto, em douto Acórdão datado de 08-10-2014, proferido no âmbito do Proc. n.º 196/13.1TABGC.P1 (disponível em www.dgsi.pt).

    4. Isto posto, as alterações introduzidas ilegítima e ilegalmente no texto acusatório, através de uma alteração não substancial dos factos, não poderão por qualquer forma operar, devendo, necessariamente, de resultar a absolvição do aqui Recorrente.

      II. DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO F. Analisado atentamente a douta sentença recorrida, mais concretamente na parte respeitante à factualidade dada como provada no que se refere ao ora Recorrente, concretamente no que concerne à sua exploração de um qualquer jogo de fortuna ou azar por referência às máquinas apreendidas nos autos, do tipo “Internet Kiosk”, “Berlindes” e “Colorama” é para nós liquido que na mesma se conclui para além da prova produzida, ou, para além do que essa mesma prova permitiria, com toda a segurança necessária, concluir.

    5. Entendendo o Recorrente que, toda a prova produzida no âmbito dos presentes autos e valorada em sede de Sentença recorrida, não se vislumbraram factos probatórios suficientes e concretos que permitissem dar como provada a factualidade apurada que fundamentou a Sentença ora recorrida no que concerne ao crime de exploração ilícita de jogo que lhe é imputado por referência às máquinas apreendidas nos autos, considerando o aqui Recorrente que foram incorretamente julgados os pontos de facto vertidos na douta sentença recorrida, sob os pontos 1., 2., 3., 4., 13., 14. e 15. da factualidade provada.

    6. Isto porque, sempre resulta que, ao contrário do vertido na douta sentença recorrida, nunca se poderia concluir, por um lado, que aquando da sua apreensão as máquinas em causa fossem aptas e destinadas a desenvolver um qualquer jogo de fortuna ou azar, e que para tal eram destinadas pelo ora Recorrente, ou seja, de toda a prova produzida nunca se poderia haver concluído, como o fez o Digníssimo Tribunal “a quo” que, efetivamente, as máquinas em causa desenvolveram, em algum momento, sob a égide do aqui Recorrente, um qualquer jogo de fortuna ou azar e que, aliás, o aqui Recorrente era conhecedor de uma tal possibilidade e para isso destinava a mesma.

      Deste modo, I. Conforme melhor resulta dos Relatórios Periciais de fls. … dos autos, e no que ao Kiosk de Internet diz respeito, não foi possível executar qualquer alegado jogo nesse computador, tendo a descrição do funcionamento dos jogos de fortuna ou azar sido realizada com recurso apenas à experiência da inspetora que realizou a perícia, e não através da efetiva execução dos mesmos, o mesmo sucedendo, “mutatis mutandis” com a máquina com os dizeres “Colorama” e com a designação “Berlindes”.

    7. Ora, e quanto ao “valor” dos “Relatórios Periciais” realizado nos termos em que o foram e supra referido, relativamente ao facto de, claramente, os mesmos se fundarem em experiências anteriores da respetiva subscritora e não em factos concretos pela mesma verificados, haverá aqui que referir e considerar-se como integralmente reproduzido o douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, de 26.03.2014 (proferido no âmbito do Proc. n.º 22/12.9GBPRD.P1, da 1.ª Secção).

    8. Além disso, as próprias testemunhas, limitam-se a afirmar que as máquinas foram apreendidas por suspeitas de conterem jogos ilícitos, sem que, no entanto, tenham posto qualquer jogo em funcionamento e, no caso concreto, prova alguma, fosse documental ou testemunhal, existe ou foi produzida que permitisse concluir pela efetiva disponibilização de jogos de fortuna ou azar pelas máquinas ora em causa nos autos e, bem assim, pelo efetivo conhecimento do ora Recorrente quanto a um eventual funcionamento do Kioske Internet na sua imputada e alegada vertente ilícita, logo, quanto a uma qualquer atuação alegadamente dolosa por parte do Recorrente. Senão porque, L. Assim, e em obediência ao disposto na alínea b) do n.º 3 do art. 412.º do C.P.Penal, desde já se indica o aludido Relatórios Periciais, de fls… dos autos, o seu teor e todos os argumentos vertidos em sede de motivação, o depoimento das testemunhas C... , D... , E... e F... – cujos concretos trechos se encontram já devidamente identificados em sede de Motivação -, como consubstanciando uma prova concreta que impõe decisão diversa da recorrida.

      Posto isto, M. E, pese embora se reconheça a admissibilidade da convicção do Tribunal escudada tão-somente no princípio da livre apreciação da prova, a verdade é que, tal princípio não pode confundir-se com arbitrariedade, dado que, a matéria fáctica, porque sindicável, deve ter suporte probatório e, nessa medida, num último considerando, sempre haverá que concluir ainda pela verificação de uma inconstitucionalidade normativa na douta Sentença proferida, mormente, da interpretação do 127.º do C.P.Penal, bem como a violação do princípio constitucional de presunção de inocência, tal qual preceituado no artigo 32.º da nossa Constituição da República Portuguesa.

      SEM PRESCINDIR, III. DO ENQUADRAMENTO JURÍDICO DOS FACTOS TIDO COMO PROVADOS N. O Arguido entende, que as máquinas apreendidas nos autos e denominadas por “Berlindes” e “Colorama”, não desenvolvem qualquer jogo de fortuna e azar, porquanto, e para além de tudo o quanto foi vertido em sede de motivação e aqui se considera como integralmente reproduzido, as mesmas não pagavam diretamente um qualquer prémio, seja em fichas ou moedas, além do que, não desenvolvem tais máquinas um qualquer jogo do tipo roleta, sendo notórios e gritantes as diferenças existentes entre um e outro jogo, tão pouco permitem dobrar apostas ou...

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