Acórdão nº 444/14.0JACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2017
Magistrado Responsável | IN |
Data da Resolução | 25 de Outubro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório No processo supra identificado foram julgados os arguidos: A..
, solteiro, cortador de madeira, nascido no dia 8 de Abril de 1972, filho de (...) e de (...) , natural da freguesia e concelho das (...) e residente em Rua (...) e; B...
, solteira, reformada, nascida no dia 24 de Abril de 1950, filha de (...) e de (...) , natural da freguesia e concelho de (...) , residente na Rua (...) .
- Ao arguido A...
são imputados, a prática de: - um crime de homicídio, na forma tentada, p. e p. pelos art. 131.º e 22.º, n.ºs 1 e 2 al. a), b) e c) do CP; - um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1 al. c) e d) da Lei 5/2006 de 23/2, alterada pela Lei 17/2009 de 6/5, conjugado com art. 2.º, n.º 1, al. v), do mesmo diploma legal.
- À arguida B...
, é imputado a prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1 al. c) e d) da Lei 5/2006 de 23/2, alterada pela Lei 17/2009 de 6/5, conjugado com art. 2.º, n.º 1, al. v), do mesmo diploma legal.
* O Tribunal Colectivo, julgando parcialmente procedentes a acusação, deliberou:
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Absolver a arguida B...
do crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1 al. c) do RJAM.
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Condenar o arguido A...
: - Por um crime de homicídio tentado p. e p. pelos art. 131.º, e 22.º, nºs 1 e 2 al. a), b) e c) do CP, na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão; - Por um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1 al. c) do RJAM na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
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Em cúmulo jurídico, na pena única de 4 (quatro) anos de prisão efectiva.
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Declarar perdidos a favor do Estado os bens apreendidos a fls. 69; 138 e 139 e a navalha apreendida a fls. 140.
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Devolver ao arguido o telemóvel apreendido a fls. 140.
* Inconformados com o acórdão recorreram o Ministério Público e o arguido.
* O Ministério Público formula as seguintes conclusões: «1ª – Vem o presente recurso interposto pelo Ministério Público do douto Acórdão de fls. ..., na parte em que condenou o arguido A... pela prática de 1 (um) crime de homicídio, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, nºs, 1 e 2, als. a), b) e c) e 131º, ambos do Código Penal, na pena parcelar de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva (a 1.ª conclusão fazia referência a outra condenação de outro arguido, noutro processo, cujo lapso rectificou a fls. 653, em conformidade com delimitação do objecto do recurso na motivação, a fls. 573).
2ª.1 -- O objecto do processo penal, de natureza acusatória, é delimitado ou definido, consoante os casos, ou pela acusação, ou pelo despacho de pronúncia.
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2 -- Delimitado o objecto do processo penal, sabendo-se que o Legislador acolheu o conceito de naturalístico de facto, este (s) só poderão ser alterados nos termos legalmente definidos pelos artigos 358º e 359º, ambos do Código de Processo Penal.
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3 -- Existe uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia e, por conseguinte, a imputação ao arguido de um crime diverso quando: a) -- Da referida adição ou modificação dos factos resulte que o bem jurídico agora protegido é distinto do primitivo; b) -- Da referida adição ou modificação dos factos resulte um facto naturalístico diferente, objecto de um diferente e distinto juízo de valoração social; c) -- Da referida adição ou modificação dos factos resulte a perda da “imagem social” do facto primitivo, ou seja, resulte a perda da sua identidade.
2.4ª -- Uma “alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia” constitui uma divergência ou diferença de identidade que não transforme o quadro da acusação em outro diverso no que se refere a elementos essenciais, mas apenas, de modo parcelar e mais ou menos pontual, e sem descaracterizar o quadro factual da acusação, em virtude de o seu substracto fundamental já se encontrar descrito na acusação ou na pronúncia”.
2.5ª -- Nos termos do disposto no artigo 358º, nºs. 1 e 3, do Código de Processo Penal, em consonância, até, com a jurisprudência constante do Assento do S.T.J. nº 2/93, in D.R., Iª Série, de 10/03/93 (“Para os fins dos arts. 1°, al. f), 120°, 284º, n° 1, 303°, n° 3, 309°, n° 2, 359°, n° 1 e 2, e 379°, al. b), do C.P.P., não constitui alteração substancial dos factos descritas na acusação ou na pronúncia a simples alteração da respectiva qualificação jurídica (ou convolação), ainda que se traduza na submissão de tais factos a uma figura criminal mais grave”) e do Assento do S.T.J. nº 3/2000, in D.R. Iª, de 11/02/2000 (“na vigência dos Códigos de Processo Penal de 1987 e de 1995, o tribunal, ao enquadrar juridicamente os factos da acusação ou da pronúncia, quando esta existisse, podia proceder a uma alteração do correspondente enquadramento, ainda que em figura criminal mais grave, desde que previamente desse conhecimento e, se requerido, prazo ao arguido da possibilidade de tal ocorrência, para que o mesmo pudesse organizar a respectiva defesa”).
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6 -- “Se a alteração não substancial dos factos não resulta de iniciativa do tribunal de recurso, mas da posição de outros sujeitos processuais no recurso, designadamente do Ministério Público, já a necessidade dessa notificação não tem lugar”, sendo que “o dever de comunicação no tribunal de recurso, previsto no nº 3, do art. 424.º do CPP, não se verifica quando a alteração resulta da posição do Ministério Público expressa nas conclusões do recurso por si interposto, pois sendo o recurso notificado ao arguido para lhe responder, a alteração é já dele conhecida.” 3ª.1 -- A factualidade que resultou provada subsume-se à prática pelo arguido A... de 1 (um) crime de homicídio simples, na forma tentada, agravado pelo uso da arma, p. e p. pelos artigos 22º, als. a), b) e c), 23º, 72º, 73º e 131º, todos do Código Penal e 86º, nºs. 3 e 4, da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção dada pelas Leis nºs. 17/2009, de 6 de Maio, 12/2011, de 27 de Abril e 50/2013, de 24 de Julho.
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2 -- Razão pela qual deverá esse Venerando Tribunal da Relação de Coimbra substituir o douto Acórdão a quo por outro douto a proferir no qual condene o arguido A... pela prática do referido ilícito criminal.
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3 -- Ao assim não ter decidido, violou-se no douto Acórdão a quo o disposto no artigo 86º, nºs. 3 e 4, da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção dada pelas Leis nºs. 17/2009, de 6 de Maio, 12/2011, de 27 de Abril e 50/2013, de 24 de Julho.
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1 -- O crime de homicídio simples, na forma tentada, agravado pelo uso da arma, p. e p. pelos artigos 22º, als. a), b) e c), 23º, 72º, 73º e 131º, todos do Código Penal e 86º, nºs. 3 e 4, da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção dada pelas Leis nºs. 17/2009, de 6 de Maio, 12/2011, de 27 de Abril e 50/2013, de 24 de Julho é, em abstracto, punível com pena de 2 anos, 1 mês e 18 dias a 14 anos, 2 meses e 20 dias de prisão.
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2 -- As exigências de prevenção geral constituem o limite mínimo da pena e a culpa do agente o seu limite máximo, pelo que a medida concreta da pena deve ter em consideração a finalidade de prevenção especial, de ressocialização do arguido ou de suficiente advertência, no sentido de retirar este agente do caminho criminoso.
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3 -- A determinação da medida concreta da pena faz-se, nos termos do artigo 71º, do Código Penal, em função da culpa do agente, atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime (porque estas já foram tomadas em consideração ao estabelecer-se a moldura penal do facto), deponham a favor do agente ou contra ele.
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4 -- A pena a aplicar será, assim, fixada em função da culpa, da ilicitude, das circunstâncias agravantes e atenuantes que ocorram, não se perdendo de vista o objectivo de reinserção social do agente.
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5 -- Tendo por base a moldura penal abstracta ao crime imputado ao arguido, na determinação da medida da pena relativa ao mesmo, deveria o Tribunal a quo ter tido em consideração, as seguintes concretas circunstâncias: O grau de ilicitude presente na conduta do arguido não pode deixar de ser considerado elevado, atendendo ao bem jurídico cuja tutela a pena visa assegurar --- o bem jurídico supremo vida ---, o que tem necessárias sequelas ao nível da culpa, fazendo, por um lado, estabilizar tais exigências e, por outro, aumentá-las; O dolo presente na conduta do arguido, na sua modalidade mais intensa: -- o dolo directo, o que faz aumentar as exigências de culpa; O grau de violação dos deveres impostos ao arguido/agente: -- “O arguido agiu de forma premeditada, tendo esperado que o ofendido abandonasse a localidade de A(...) para atentar contra a vida dele, aguardando que o mesmo ficasse sozinho, para o surpreender”; As circunstâncias em que os factos ocorreram, potencialmente muito graves; O modo de execução do crime: -- “o arguido aproveitou-se do facto de o ofendido circular sozinho numa estrada em terra batida, sem iluminação e com pouco movimento”; Os motivos determinantes das condutas, pautados “pela reacção desajustada, desproporcionada e desatempada a uma provocação anterior”; O carácter não primário da delinquência do arguido, pelo que a necessidade de restauração da confiança da sociedade na norma violada não se compadece com penas próximas do limite mínimo ou de qualquer atenuação especial; O comportamento processual do arguido, que nenhum juízo de auto-censura e sentido crítico manifestou acerca dos factos; e As necessidades de reprovação e de prevenção destes tipos de crime que são particularmente elevadas.
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6 -- Tendo em conta a moldura penal abstractamente aplicável, ao valorar todas estas concretas circunstâncias, deveria o Tribunal a quo na escolha e determinação concreta da medida da pena tê-la fixado em 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses prisão.
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7 -- Ao ter decidido de forma diversa da ora sustentada violou o douto Acórdão a quo o disposto nos artigos 40º, 70º e 71º, todos do Código Penal.
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1 -- Estando-se perante concurso...
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