Acórdão nº 727/14.0TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | JORGE MANUEL LOUREIRO |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório Os autores propuseram contra o réu a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo que se declare a resolução do contrato de arrendamento celebrado com o réu, com fundamento em falta do pagamento de rendas devidas na sequência de um procedimento de actualização das mesmas e de transição para o NRAU, que seja decretado o despejo imediato do local arrendado, por forma a que o mesmo lhes seja entregue completamente livre e devoluto de pessoas e coisas, e que seja o réu condenado a pagar-lhe as rendas vencidas e parcialmente não pagas até à propositura da acção e as vincendas até à efectiva entrega do locado.
Citado, o réu deduziu contestação, pugnando pela improcedência da acção, e reconvenção, peticionando a condenação dos autores a reconhecerem que o réu realizou no locado obras e benfeitorias no valor de 25% do valor actualizado do mesmo, condenando-se os autores no seu pagamento aos réus, sem o que o réu não deve ser obrigado a desocupar o locado.
Alegou, em resumo, que a renda exigida pelos autores excede o valor máximo da renda que os mesmos poderiam exigir do réu e que este lhes ofereceu no procedimento de actualização de renda, tendo em conta que o valor patrimonial tributário do imóvel locado foi determinado em termos de exceder aquele que realmente lhe asiste de acordo com os critérios legais aplicáveis; realizou no local obras e benfeitorias que representam pelo menos 25% do valor actual do imóvel locado, devendo os autores ser condenados a pagar ao réu o valor de tais benfeitorias, sem o que o réu se propõe exercer o direito de retenção sobre tal imóvel até ao momento da satisfação desse seu crédito.
Replicaram os autores para, em resumo, impugnarem os fundamentos da reconvenção e concluírem como já tinham feito na petição.
O processo seguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença de cujo dispositivo consta o seguinte: “Nestes termos, decide-se : 1.
Julgar a ação procedente, por provada e, em consequência:
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Declaro resolvido o contrato de arrendamento que se encontra em vigor entre os Autores e o Réu, relativo ao prédio mencionado no artigo primeiro da petição inicial e, em consequência, condeno o Réu a entregar aos Autores aquele prédio, devoluto de pessoas e bens.
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Condeno o Réu a pagar aos Autores a quantia de €8.079,57 relativa às rendas já vencidas e parcialmente não pagas (desde Julho de 2013 até Março de 2014 inclusive), bem como aquelas que, na pendência da ação se vencerem à razão mensal de €1.014,83 até à efetiva entrega do locado.
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Julgo improcedente, por não provado, o pedido reconvencional de que absolvo os Autores.
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Condeno o Réu nas custas da ação e nas custas do pedido reconvencional (art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
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Fixo o valor da causa na importância de €38.524,47 (trinta e oito mil quinhentos e vinte e quatro euros e quarenta e sete cêntimos).
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Registe e notifique.
”.
Não se conformando com o assim decidido, apelou o réu, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: ...
Contra-alegaram os autores, pugnando pela improcedência da apelação.
II - Principais questões a decidir I.
I.
II.1 Nas alegações de recurso, o réu suscita a questão de saber se o procedimento de transição para o NRAU e de actualização da renda não foi levado a efeito por todos aqueles que nele deveriam ter participado, tendo em conta que nele não participaram pessoas a quem assiste a qualidade de senhorio.
No decurso do processo até às alegações, em especial na contestação onde o deveria ter feito, tendo em conta o princípio da concentração consagrado no art. 573º do NCPC, o réu jamais suscitou a questão acabada de ser referenciada.
A única questão que neste âmbito suscitou (art. 1º a 3º da contestação) foi a de não estar comprovada nos autos a qualidade de proprietários do imóvel locado, qualidade essa que veio a ser dada como provada no ponto 1º) dos factos dados como provados.
Não se trata de matéria que seja do conhecimento oficioso.
Acresce que o recurso ordinário assume a natureza de recurso de reapreciação visando a modificação das decisões, a significar que tais recursos não se destinam a conhecer de questões novas não apreciadas pelo tribunal recorrido, mas, sim, a apurar da adequação e legalidade das decisões sob recurso, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso[1].
Assim, o objecto do recurso deve circunscrever-se à matéria sobre a qual a decisão recorrida se tenha pronunciado em termos que mereçam a discordância do recorrente, com a consequente impossibilidade do tribunal superior decidir pela primeira vez sobre matéria não apreciada pelo tribunal a quo, ressalvas, como dito, situações em que estejam em causa matérias de conhecimento oficioso, entre as quais se não integra a da legitimidade para desencadear o procedimento de transição para o NRAU e de actualização da renda.
De tudo flui que este tribunal não deve conhecer da questão atinente à supra indicada temática.
II.2 Em face do exposto, sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 - NCPC), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são apenas as seguintes as questões a decidir: 1ª) se a matéria de facto se encontra incorrectamente julgada, devendo ser alterada; 2ª) se no domínio dos contratos de arrendamento anteriores ao RAU e a respeito da respectiva transição para o NRAU, com actualização da renda, cabe ao senhorio, em sede de acção de resolução do contrato de arrendamento fundada em não pagamento da renda actualizada, o ónus de alegação e prova da autenticidade de todos os factos com base nos quais os serviços tributários avaliaram o imóvel locado e determinaram o correspondente valor patrimonial tributário para efeitos de IMI, com base no qual passou a exigir-se a nova renda cujo não pagamento fundamenta o pedido de resolução; 3ª) se foi indevidamente fixado em 182.670 euros o valor patrimonial tributário do imóvel locado calculado na avaliação a que esse imóvel foi sujeito em Novembro de 2008 e se, por isso, a renda exigida ao réu de 1.014,83 euros era superior à permitida legalmente; 4ª) se o réu realizou no locado benfeitorias com fundamento nas quais deva ser-lhe reconhecido qualquer direito de retenção do locado até à compensação do valor daquelas.
III – Fundamentação
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De facto Os factos provados O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos: “1.Os AA. adquiriram, por via sucessória, a qualidade de proprietários do prédio urbano sito na ..., a descrição constante da caderneta predial urbana que se junta a fls. 13 a 14 - sucedendo como senhorios do Réu, na relação locatícia (não habitacional), que dura há mais de 3 dezenas de anos, não possuindo nem os Autores nem o R. cópia do contrato escrito então celebrado.
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Em Março de 2013, a renda mensal era de 117,10€ pagando o Réu, normalmente, por depósito em conta bancária dos AA.
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Em virtude da publicação da Lei 31/2012, de 14 de Agosto, em 19 de Março de 2013, os Autores, por carta registada, promoveram a transição deste contrato para o NRAU, propondo que a duração do contrato passasse para 5 anos, renovável por períodos de 2 anos, e com a nova renda mensal de €1.014,83.
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O Réu recebeu essa carta em 20/03/2013, respondendo por carta datada de 17 de Abril de 2013 contrapropondo uma renda de €351,00 mensais.
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A esta comunicação do Réu, responderam os Autores, através de carta...
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