Acórdão nº 5408/16.7T8CBR-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | JORGE MANUEL LOUREIRO |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório A autora propôs a presente acção especial de insolvência, pedindo a declaração de insolvência da ré, alegando como fundamento da sua pretensão, em resumo, o seguinte: no âmbito de um contrato de mútuo garantido com hipoteca em que outorgou com a ré, mutuou-lhe a quantia de 60.000.000€, ficando a ré obrigada a amortizar tal quantia em 8 anos, a contar de 28/10/2012, vencendo aquela quantia juros a liquidar semestral e postecipadamente; foi igualmente constituído, para garantia desse crédito, um penhor sobre acções da S..., S.A., e da E..., SGPS, S.A.; em Dezembro de 2012 as partes acordaram na prorrogação do prazo de pagamento de juros relativos ao período de 28/10/2012 até 28/10/2015, tendo sido amortizado o capital mutuado em 21.150.517,17€; em 28/10/2015 a ré não pagou os juros até então devidos; violando os deveres de informação convencionados, a ré não informou a autora da alteração que foi produzida em 12/9/2014 no seu quadro societário; em 15/6/2016 a autora comunicou à ré o vencimento antecipado do contrato de mútuo, com efeitos imediatos, ficando a ré constituída num débito de 54.057.800,18€, o qual não satisfez até à data da propositura da acção; a ré não consegue gerar receitas que lhe permitam pagar tal dívida, nem dispõe de património que garanta tal pagamento, tendo apresentado, no ano de 2014, um resultado líquido negativo de 1.413.185,38€, facto que permite concluir no sentido de que a mesma se encontra impossibilitada de satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações; segundo as contas do exercício do ano de 2014, o activo da ré ascendia a 50.317.266,03€, o que permite concluir no sentido de que o seu passivo é superior ao activo; a ré alienou as acções que detinha na sociedade S..., S.A. (correspondente a 48,58% do capital social desta), sem informar de tal facto a autora, que tinha sobre as mesmas um penhor constituído a seu favor, e sem que o produto dessa venda tivesse sido afecto ao pagamento do crédito detido pela autora sobre ela; entre 2012 e 2014 a ré transmitiu participações sociais de que era detentora no capital social das sociedades S..., Ld.ª, L..., Ld.ª, e S..., Ld.ª, num claro intuito de liquidação apressada ou ruinosa de bens integrantes do seu património.
Citada, a ré deduziu oposição, pugnando pela improcedência da pretensão da autora.
Alegou, como fundamento da oposição e em resumo, o seguinte: a autora não invoca, de modo suficiente, qualquer facto integrador dos factores indiciadores enunciados no artigo 20º do CIRE, usando de forma anómala o processo de insolvência, convertendo-o num sucedâneo do processo executivo; apesar de se encontrar numa situação de mora em relação à obrigação do pagamento dos juros vencidos em 28/10/2015, não se encontra numa situação de impossibilidade de satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações; nunca violou os deveres de informação a que se alude na petição; a autora não alega factos concretizadores da liquidação apressada e ruinosa de bens a que se alude na petição; a autora é credora única da ré e o processo de insolvência pressupõe uma pluralidade de credores, razão pela qual a autora faz um uso indevido deste processo; a diferença entre o activo e o passivo da ré não é manifesta.
A ré também se opôs à nomeação do senhor administrador de insolvência proposto pela autora, caso a sua insolvência seja declarada, e peticionou a condenação da autora por litigância de má-fé, em indemnização e multa, por ter deduzido pedido infundado, causando prejuízos à ré.
O processo prosseguiu os seus regulares termos, acabando por ser proferida sentença que, designadamente, decretou a insolvência da ré.
Não se conformando com o assim decidido, apelou a ré, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas: ...
Contra-alegou a autora, pugnando pela improcedência da apelação.
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II - Principais questões a decidir Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 - NCPC), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) se um credor único pode instaurar contra o devedor um processo de insolvência ou se, pelo contrário, está limitado a instaurar contra o devedor uma acção executiva; 2ª) se os factos dados como provados permitem ter por verificado o factor indiciador da insolvência enunciado no art. 20º/1/b do CIRE; 3ª) se deve ser mantido ou substituído o administrador de insolvência nomeado pelo tribunal recorrido a requerimento da apelada.
III – Fundamentação
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De facto Os factos provados O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos: ...
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De direito Primeira questão: se um credor único pode instaurar contra o devedor um processo de insolvência ou se, pelo contrário, está limitado a instaurar contra o devedor uma acção executiva.
A resposta à primeira parte desta...
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