Acórdão nº 182/13.1JACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução09 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório No processo supra identificado o Ministério Público deduziu acusação contra A...

, divorciado, reformado, nascido a 3 de Fevereiro de 1946 em (...) , Lisboa, filho de (...) e de (...) e residente na Avenida (...) , Lisboa, imputando-lhe a prática em concurso efectivo dos seguintes crimes: - três crimes de actos sexuais com adolescentes p. e p. pelo art. 173.º n.º 2 agravado pelo art. 177.º n.º 3 ambos do CP em concurso aparente com três crimes de recurso a prostituição de menores, p. e p. pelo art. 174.º n.º 2 agravado pelo art. 177.º n.º 3 do CP; - dezassete crimes de actos sexuais com adolescentes p. e p. pelo art. 173.º n.º 1 agravado pelo art. 177.º n.º 3 ambos do CP em concurso aparente com três crimes de recurso a prostituição de menores, p. e p. pelo art. 174.º n.º 1 agravado pelo art. 177.º n.º 3 do CP.

* B... , em representação do menor C...

, deduziu pedido de indemnização a título de danos não patrimoniais da quantia de 10.000,00 €.

* O tribunal colectivo deliberou:

  1. Absolver o arguido da prática de: - três crimes de actos sexuais com adolescentes p. e p. pelo art. 173.º n.º 2 agravado pelo art. 177.º n.º 3 ambos do CP; - dezassete crimes de actos sexuais com adolescentes p. e p. pelo art. 173.º n.º 1 agravado pelo art. 177.º n.º 3 ambos do CP.

  2. Condenar o arguido pela prática de: - um crime de recurso à prostituição de menores, p. e p. pelo art. 174.º n.º 1 agravado pelo art. 177.º n.º 3 do CP, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo prazo de duração da mesma, com regime de prova assente num plano de reinserção social que permita a reinserção social do arguido, com vista à reorganização pessoal, social e profissional e identificação de factores de risco de repetição das condutas, devendo ainda aceitar o acompanhamento/tratamento em consulta da especialidade de psiquiatria e/ou psicologia, se possível em sub-especialidade preferencialmente direccionada para o seguimento de perturbações como a apresentada.

    Mais impôs que arguido ficasse impedido durante o prazo da suspensão de exercer qualquer profissão ou actividade que tenha menores como destinatários.

  3. Julgando procedente o pedido de indemnização civil, condenou o arguido no pagamento da quantia 10.000,00 €, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros contados desde a data da decisão.

    * Inconformado recorreu o arguido, o qual pugna pela sua absolvição, formulando as seguintes conclusões: «1. O arguido não se conforma com a sua condenação pela prática de um crime de recurso à prostituição de menores, previsto e punido pelo artigo 174 n.º 1, agravado pelo 177 n.º 3 do Código Penal na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, pena essa suspensa na sua execução, mediante regime de prova, e na indemnização de 10.000,00€, a que acrescem juros contados desde a data da decisão.

    2. Com tal decisão e com a sua fundamentação não se pode manifestamente o arguido conformar, no seu e no seu como, porquanto a mesma não resultou da prova produzida em julgamento, nem tem expressão do que resultou da investigação realizada.

    3. Padece o acórdão de uma insuficiência de matéria de facto dada como provada e, num erro notório na apreciação da prova por parte do Tribunal ad quo, nos termos do artigo 410 n.º 2 alínea a) b) c) do CPP, conforme doravante se exporá.

    4. Desde logo o Tribunal julgou incorrectamente os factos 6), 7), 8), 9), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16) a 24).

    5. Dado que o recorrente não concorda que o tribunal tenha dado como provado: a. Que o recorrente tenha convidado o C... para lhe tocar no corpo e vice-versa; b. No fim de cada acto dava ou prometia dar um presente ao C... .

    6. Segundo a fundamentação apresentada pelo Tribunal para formação da sua convicção o tribunal atendeu às declarações do arguido, do ofendido, ao depoimento da testemunha B... e D... e ao relatório social 7. Analisando os meios de prova elencados na “Fundamentação dos factos” não se retira a mesma conclusão e o tribunal não demonstra como formou a sua convicção e como desenvolveu o seu raciocínio que culminou com tal decisão, senão vejamos: a. Declarações do arguido: o tribunal considerou como provados os seguintes factos: “ (…) comprou livros, cadernos, a cartilha do João de Deus que deu ao menor; igualmente lhe deu uma máquina fotográfica, imagens de santos, livros de orações, um crucifixo; comprou-lhe e deu-lhe um telemóvel, uma vez deu-lhe dinheiro (5€) (...) ”, o que é contraditado pela audição da transcrição n.º 20160314100530 (…).wma de 00:7:28 a 00:8:30, de 00:11:54 a 00:12:46, de 00:13:00 a 00:14:36, de 00:11:05 a 00:11:44, e 00:16:05 a 00:16:16; considerou o tribunal que o arguido falava com o ofendido pelo skyp e “uma vez o menor masturbou-se em frente ao skyp”, o que é contraditado pela audição da transcrição n.º 20160314100530 (…).wma de 00:26:55 a 00:29:00.

  4. Atendendo às declarações prestadas, entende a defesa o Tribunal deveria ter dado como provados os seguintes factos: 1. O arguido e a família do ofendido conheciam-se e conviviam (transcrição n.º 20160314100530 (…).wma de 00:11:05 a 00:13:00) 2. O arguido esteve a morar em x... até 2013, ou seja durante 7 anos arguido e família de ofendido conviveram (transcrição n.º 20160314100530 (…).wma de 00:26:55 a 00:29:00).

    3. O arguido era visita da família e convidado para ocasiões festivas; arguido e família do ofendido faziam passeios para fora de x... (Fátima, Coruche, Tomar). (transcrição n.º 20160314100530 (…).wma de 00:11:05 a 00:13:00) b. Pelo depoimento de B... (audição da transcrição n.º 20160314111602_ (..).wma), avó do menor, deviam ser dados como provados os seguintes factos: i. confirma a amizade ii. e a ajuda do arguido para com o menor, nada mais acrescentando, iii. afirma nunca ter desconfiado de qualquer acto do arguido para com o ofendido seu neto, iv. afirma não ter visto ou desconfiado de nada, v. confirma as ofertas ao neto, sem localizar no tempo O depoimento desta testemunha não põe em causa as declarações do arguido, nomeadamente quanto a localização temporal das ofertas e a sua justificação dada pelo arguido.

    c. Depoimento do menor (audição da transcrição 20150602115324_ (…).wma), Com base nas declarações do ofendido o tribunal deu como provado que: (…) por várias vezes o arguido tocou no pénis do menor e pedia-lhe para o menor tocar no seu (do arguido), isto aconteceu na Quinta para onde o menor ia todos os dias, rente à noite; terão sido aí umas 20 vezes, que estes factos aconteceram; por 3 vezes pensa que o arguido introduziu o seu pénis no seu ânus, ejaculou para fora, para cima de um cobertor; sempre que o menor ia à quinta o arguido dava-lhe um presente; (...) ”.Ou seja, deu como provado que: i. O arguido várias vezes tocou no seu pénis e vice versa ii. Os actos aconteceram na Quinta y..., iii. Durante 20 dias, todos os dias, rente à noite iv. O ofendido ia ter com o arguido à quinta v. Ao contrário do mencionado pelo tribunal, o ofendido declarou que “por 3 vezes o arguido introduziu o pénis no seu ânus” (transcrição da gravação nº 20150602115324_3603438_2870946.wma 00:08:40 a 00:09:53, 00:13:32 a 00:13:41, 00:16:19 a 00:16:50 e 00:17:50 a 00:18:18); vi. Sempre que o ofendido ia à quinta o arguido dava-lhe prendas (transcrição. Gravação nº 20150602115324_3603438_2870946.wma 00:09:23 a 00:10:20, 00:16:59 a 00:17:59).

    Acontece que o Tribunal considerou o ofendido é “limitado de um modo grave nas funções de percepção” pelo que “pode o menor ter percepcionado e relatado um facto como ocorrido (…) e de facto o mesmo não ter ocorrido”, ou seja considerou o Tribunal que o ofendido podia ficcionar um facto como ocorrido, quando o mesmo não aconteceu.

    Foi por esse motivo que o Tribunal considerou que havia dúvidas quanto à penetração/coito anal, dúvidas essas adensadas por ter sido junto documentação a atestar a disfunção eréctil do arguido.

    Igualmente por esse motivo – pelo facto do ofendido padecer de uma limitada percepção da realidade que conduz à ficção factual - considera a defesa que não pode tão-só o tribunal afirmar que “o depoimento do menor merece-nos crédito” para dar como provados todos os factos alegados, não basta, terá de haver um plus, uma prova suplementar e complementar.

    Poderia bastar a menção por parte do Tribunal sobre a credibilidade das declarações do ofendido, atento o princípio do art. 127 do CPP, no entanto tendo o tribunal considerado que o ofendido padece de uma limitação nas funções da percepção, podendo ficcionar a realidade, situação que fez com que o tribunal ficasse com dúvidas sobre um facto minuciosamente relatado pelo ofendido, não pode o tribunal, relativamente aos demais factos considerar sem mais as declarações do ofendido, terá de haver prova suplementar que corrobora tal versão por forma a que o tribunal possa considerar provados tais factos.

    Ora tal não aconteceu, atenta a prova indicada pelo Tribunal em sede de fundamentação de facto, e analisada a referida prova, a mesma não corrobora a versão do ofendido; pelo contrário houve mais prova produzida em sede de audiência de julgamento, e que o Tribunal não tomou em consideração, que corrobora a versão trazida aos autos pelo arguido.

    Afirmar que “ o depoimento do menor merece-nos crédito” , justificando o “crédito” com base no relatório social e na “envolvência que o arguido procurou ter com este menor” é pouco para tão grave acusação! Para os factos 6) a 24) serem dados como provados terá de haver algo mais que as declarações do ofendido, o testemunho de B... e as declarações do arguido, que como vimos, em nada densificam os factos para serem dados como provados.

    d. O depoimento de D... (transcrição 20160314113931_ (…).wma): Ao contrário do facto dado como provado pelo tribunal, esta testemunha não afirma contactos frequentes entre arguido e ofendido via mensagem.

    O tribunal não tomou em consideração outra prova produzida...

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