Acórdão nº 425/12.9TBBBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2017
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 07 de Março de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: * A... intentou a presente acção declarativa contra B... e esposa C... pedindo que se declare que o prédio rústico que identifica é sua propriedade e que os réus sejam condenados a restituir-lho e a absterem-se da prática de qualquer acto que impeça ou diminua a utilização por parte do A. desse prédio.
Em síntese, alega: que é dono do prédio que se encontra descrito na CRP; que a qualidade de proprietário lhe adveio por sucessão, por morte de sua mãe; que os RR. há cerca de 7 anos e à sua revelia ocuparam parte do prédio instalando um painel publicitário e que em 28.02.2008 ali puseram, também à sua revelia, um monoposte publicitário; e que, apesar de interpelados diversas vezes, os réus se recusam a deixar o prédio.
Contestaram os RR., por excepção e por impugnação, alegando, em resumo: que ocupam o prédio desde 1.10.1992, o que têm feito publica e pacificamente, agindo como donos; que em 1991 ficou verbalmente acordado com o autor que o prédio seria vendido ao réu marido pelo preço de 2000 contos; que o réu pagou 500 contos e que ficou acordado que os restantes 1500 contos seriam pagos no acto da escritura; todavia, a pedido do autor, entregaram na Páscoa de 1992, mais 500 contos; e apesar de não celebrada a escritura, o réu, a solicitação do autor, entregou mais 1000 contos, em Setembro de 1992, tendo, nessa altura, o réu exigido a declaração que o autor passou em 1.10.1992; que, a partir dessa data e com consentimento do autor, ocuparam o prédio para o limpar e desmatar, aproveitaram a linha, arrancaram um pomar de ameixieiras, cederam em 1993 a um funcionário uma parte do terreno para batatal até 2007 e em 1992 outra parte para horta a outros dois funcionários; que em 1993 e não há 7 anos mandaram colocar um painel publicitário da fábrica de fogos contígua e mais tarde em Fevereiro de 2008 autorizaram a colocação de um monoposte; que delimitaram o terreno com vedação em 2006. Invocam, assim a usucapião, com fundamento na posse desde 1.10.1992.
Com fundamento na mesma usucapião deduziram reconvenção, pedindo o seu reconhecimento como proprietários do prédio.
Subsidiariamente, e com fundamento nas regras do esquecimento sem causa, pediram a condenação dos autores a devolver a quantia de € 9 975,96 (equivalente a 2.000 contos) e juros de mora.
Pediram, ainda, a condenação do autor como litigante de má-fé em multa e indemnização.
Em resposta, o A. veio impugnar a matéria fáctica atinente à usucapião, concluindo pela sua improcedência, bem como do pedido de restituição e de condenação como litigantes de má-fé.
Foi efectuada a selecção da matéria de facto sujeita a reclamação deferida.
Após julgamento foi proferida sentença que concluiu assim: “ Declara-se que o prédio id. em 6.1. é do A., e em consequência, condena-se os RR. a restituírem o referido prédio rústico, abstendo-se da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a utilização por parte do A desse prédio.
Declara-se o pedido reconvencional de reivindicação improcedente, condenando-se o A. a entregar a quantia de nove mil novecentos e setenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde 26.09.2012 até integral pagamento.
Condena-se o A. como litigante de má-fé na multa de cinco unidades de conta bem como na indemnização à parte da quantia de mil e quintos euros.
Custas da acção pelos RR. na totalidade; e da reconvenção pelo A. em dois terços e pelos RR em um terço.
Notifique e registe. “ Desta sentença recorreu o autor que rematou a sua alegação de recurso com as seguintes conclusões: “1) O Recorrente não se conforma com os seguintes segmentos decisórios da douta sentença proferida nestes autos em 30.05.2016 (Ref. 81512303): – “Declara-se o pedido reconvencional de reivindicação improcedente, condenando-se o A. a entregar a quantia de nove mil novecentos e setenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde 26.09.2012 até integral pagamento.”; – “Condena-se o A. como litigante de má-fé na multa de cinco unidades de conta bem como na indemnização à parte da quantia de mil e quintos euros.”.
2) Entende que o presente recurso deverá ser provido, revogando-se naquela parte a douta sentença proferida. 3) O âmago da questão agora colocada reside na circunstância de que o Mmo. Juiz a quo entendeu que ficou provado o seguinte facto: “6.13. Em altura anterior a 1.10.1992, A. e R. marido acordaram verbalmente que este adquiriria o prédio aludido em 6.1. por 2 000 000$00, quantia que este último entregou em prestações, sendo duas delas de 500 000$00, e nessa sequência em 1.10.1992 o A. escreveu e assinou “Declaro que já recebi os dois milhões de escudos, correspondentes ao pagamento total da propriedade denominada “ x(...) ”. Fico a aguardar documentos para efectuar a escritura 1.10.1992 (ass. ilegível) (…).”.
4) Ressalvado o devido respeito, que é muito, a prova produzida nestes presentes não permite tal conclusão, antes impondo que se considere que tal facto – fruto da alegação dos Recorridos – não ficou provado.
5) Está singelamente em causa o escrito de fls. 55, junto pelos Recorridos com a contestação que apresentaram, a propósito do qual o Recorrente tomou expressamente, na Réplica, a seguinte posição: “(…) o autor impugna o documento junto à contestação como Doc 7, por se tratar de documento não emitido nem assinado por este.” 6) Foi realizada perícia à letra e assinatura desse documento, tendo o respectivo relatório pericial sido junto aos presentes autos em 28.11.2014 (Ref. 280580).
7) Ora, muito embora os peritos que o subscreveram tenham concluído “como muito provável que as escritas suspeitas do texto e da assinatura da declaração” fossem “da autoria” do Recorrente, não se pode desconsiderar que o mesmo relatório pericial integra a presente “Nota: A perícia foi algo limitada pelo traçado desenhado, retocado e irregular dos autógrafos de A... , indiciando eventual tentativa de disfarce, e por os mesmos não conterem os dizeres do texto constante da declaração (…) traçados em maiúsculas. A análise pericial ao texto da declaração incidiu essencialmente nos dizeres manuscritos em maiúsculas constantes das fotocópias de imposto de mais-valias.” (o sublinhado é nosso).
8) Deste modo, não poderá deixar de se considerar que a perícia realizada ao escrito aqui em questão foi inconclusiva, na medida em que o texto e a assinatura do mesmo foram comparados com fotocópias e não com documentos originais, sendo sabido que a avaliação pretendida haverá que incidir, nomeadamente e com relevância tantas vezes capital, na “fluência/pressão” da escrita (cfr. pág. 2/6 desse mesmo relatório pericial). Dito de outra forma, nos termos em que foi feita a perícia, é notório que a apontada característica da escrita não foi avaliada – não podia ser avaliada, já que “a análise pericial ao texto da declaração incidiu essencialmente nos dizeres manuscritos em maiúsculas constantes das fotocópias de imposto de mais-valias” que os Recorridos prestimosamente juntaram aos autos em 23.01.2014 (Ref. 263082).
9) Ora, com o devido respeito que nos merece o Mmo. Juiz a quo, não se pode dar relevo algum – ao contrário do que sucede na douta sentença recorrida – ao facto de “que o escrito foi dado ao nível da prova pericial como “muito provável” ser do punho do A.”, ora Recorrente.
10) É o que se espera nesta sede.
11) Dito isto, o que nos resta então a favor da acima mencionada alegação dos Recorridos? Citando a douta sentença recorrida, o “depoimento da testemunha I... , o qual (…) prestou depoimento que é corroborado com o escrito de fls. 55.” 12) Ora, como já se denunciou, o escrito em questão, constante a fls. 55, não depõe em desfavor do Recorrente, pelo que não se podia dar o facto aqui em questão por provado apenas com base no depoimento da referida testemunha.
13) Na verdade, a testemunha I... , filho dos Recorridos, apresentou, por esta circunstância, um depoimento comprometido e parcial.
14) Esta testemunha procurou provar na íntegra os termos do negócio alegadamente celebrado entre o Recorrido varão e o Recorrente, muito embora tenha admitido que, das 3 conversas supostamente havidas entre ambos, apenas assistiu à última… curiosamente aquela em que o seu pai teria pedido ao Recorrente a emissão do documento aqui em causa, solicitação esta que teria sido atendida. Todas as restantes lhe teriam sido, nas suas palavras, relatadas pelo seu pai, aqui Recorrido.
15) Vejam-se os excertos acima transcritos das suas declarações, que aqui se consideram reproduzidos, constantes do ficheiro 20160419160315_3092339_2870939: 1) minutos 10:0810:22; 2) minutos 11:16-11:21; 3) minutos 12:32-13:03; e 4) minutos 13:38-20:10.
16) Esta testemunha não demonstrou conhecimento directo dos factos em causa, o que, além do que já se disse, resulta da circunstância de não ter sido capaz de concretizar espacial (nada dizendo a tal propósito, embora expressamente questionado pelo Mandatário dos Recorridos) e temporalmente (mencionando apenas que o documento em causa indica a data da sua produção) a elaboração do escrito em causa.
17) Por outro lado, o Recorrente, explicitamente inquirido a tal propósito em sede de audiência de discussão e julgamento, negou que a letra e assinatura constantes do escrito de fls. 55 fossem suas.
18) Fê-lo como consta dos excertos acima transcritos das suas declarações, que aqui se consideram reproduzidos, constantes do Ficheiro 20160421142625_3092339_2870939: a) minuto 16:0716:13; e b) minutos 16:31-17:22.
19) Tudo visto, a prova produzida impõe que se considere não provado o facto acima transcrito.
20) Em consequência, deverá o pedido reconvencional subsidiário ser julgado totalmente improcedente, por não provado (à semelhança do que já sucedeu com o pedido reconvencional principal). 21) De igual modo, porque umbilicalmente ligado àquele, deverá o Recorrido ser absolvido do...
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