Acórdão nº 255/10.2TMCBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA CATARINA GON
Data da Resolução28 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

A...

, residente na Rua (...) , Cernache, veio propor a presente acção de prestação de contas contra B...

, residente na Rua (...) , Aveiro, alegando, em suma: que foi casada com o Réu no regime de comunhão de adquiridos, sendo que o casamento – celebrado em 01/08/2003 –veio a ser dissolvido por divórcio, encontrando-se pendente o inventário para partilha dos bens comuns do casal onde a Autora desempenha as funções de cabeça de casal; tendo relacionado no aludido inventário verbas de passivo correspondentes a créditos que detém sobre a comunhão conjugal referentes a pagamentos de prémios de seguros, prestações do empréstimo e IMI relativos à casa comum, veio a ser proferido despacho que excluiu essas verbas da relação de bens que, por se reportarem a período posterior à data relevante para efeitos patrimoniais de divórcio, deveriam ser objecto de prestação de contas; por essa razão, vem agora prestar essas contas, alegando ter pago, entre Dezembro de 2008 e Novembro de 2014, o valor total de 44.358,01€ correspondente a débitos que eram da responsabilidade do casal (prestações mensais do empréstimo, seguros e IMI) ou da responsabilidade do Réu (dívida à Segurança Social contraída enquanto solteiro).

Com estes fundamentos, conclui pedindo que, aprovadas as despesas realizadas, seja o Réu condenado ao pagamento do saldo apurado de 44.358,01€, acrescidos das prestações do empréstimo bancário, seguros inerentes e impostos correspondentes que se vencerem posteriormente e que a Autora venha a pagar.

O Réu veio contestar, invocando a excepção de caso julgado relativamente ao valor da dívida à Segurança Social (1.814,00€),uma vez que, por decisão proferida no inventário, esse crédito do património comum do casal manteve-se ali relacionado. No mais, impugna os factos alegados, dizendo que a casa em questão deixou de ser a casa de morada de família a partir da separação – nela tendo passado a residir apenas a Autora e a filha do casal – e que foi acordado entre eles que seria a Autora a assumir sozinha o pagamento integral da prestação devida ao banco e o pagamento das demais despesas inerentes ao imóvel, sustentando que a presente acção constitui um abuso de direito por parte da Autora por ser contraditória com a posição anteriormente assumida. Mais alega que o valor da utilização exclusiva da casa por parte da Autora deve ser considerado como receita.

Conclui dizendo que nada deve à Autora e que, se alguma coisa devesse, nunca seria o total que é peticionado mas apenas metade desse valor, devendo a acção ser julgada improcedente.

Foi realizada a audiência prévia onde se determinou que o valor de 1.814,00€ não seria aqui considerado por estar relacionado no inventário e ter sido aí aprovado. Foi proferido despacho saneador, foi fixado o objecto do litígio e foram delimitados os temas da prova.

Mediante requerimento de 16/11/2015, a A. veio declarar que o pedido formulado quanto às prestações vincendas tem como limite o mês de Novembro de 2015, por lhe ter sido adjudicado o imóvel no inventário, assumindo todo o passivo ligado ao imóvel a partir daquele mês de Novembro, anexando a conta corrente final correspondente à prestação de contas integral (39.155,88€ correspondente a amortizações e juros, 2.722,39€ corresponde a seguros de vida, 1.200,50€ correspondente a seguros MRH, 5.095,94€ correspondente a IMI e 562,41€ correspondente a IMT).

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou o Réu a pagar à A. a quantia de 22.655,94€.

Inconformado com essa decisão, o Réu veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: 1. O recorrente considera incorrectamente julgados os pontos de facto 7. e 8. da decisão sobre a matéria de facto provada constante da sentença do Tribunal a quo.

  1. Tal como considera incorrectamente julgado o facto de ter sido dado por não provado “que as partes tenham acordado após a separação que a A. assumiria sozinha o pagamento integral da prestação mensal devida ao banco mutuante e as despesas domésticas e fiscais inerentes ao imóvel”.

  2. Porquanto a prova produzida nos autos impunha decisão diversa.

  3. No que se refere aos pontos de factos 7. e 8., a Acta da Conferência de Interessados do processo principal de Inventário a que os presentes autos estão apensos, datada de 10 de Março de 2015, com termo de transacção aí lavrado e decisão transitada em julgado no final de Abril do mesmo ano, que se dá por inteiramente reproduzida para todos os efeitos legais, que adjudica o prédio comum à recorrida.

  4. Não se percebendo nem estando fundamentada na sentença a razão que levou o Tribunal a quo a considerar que o pedido formulado pela recorrida tinha como limite o mês de Novembro de 2015, acrescendo que o prédio foi adjudicado àquela, não em Novembro de 2015, mas a 10 de Março de 2015, na Conferência de Interessados do Inventário a que os presentes autos estão apensos.

  5. O que era do conhecimento do tribunal a quo por virtude do exercício das suas funções, uma vez que foi a Meritíssima Juíza a quo que presidiu àquela Conferência, não carecendo, pois, tal facto de alegação – art. 412º, nº 2 do CPC -, acrescendo o facto do tribunal a quo se ter socorrido de documentos juntos aos autos principais de Inventário para dar por provados, na sentença de que se recorre, os pontos de facto 1., 2. e 3.

  6. Assim, deverá ser alterada a decisão proferida quanto a estes pontos de facto 7. e 8., passando a constar dos mesmos o mês de Maio de 2015 e não o mês de Novembro de 2015.

  7. Tornando-se necessário alterar os valores da amortização do empréstimo e juros e dos seguros inerentes àqueles, constantes do Ponto de Facto 8. e que vão, na sentença de que se recorre, erradamente contabilizados a Novembro de 2015.

  8. Sendo certo que, dos autos, constam já os valores dessa amortização do empréstimo e juros e de tais seguros contabilizados a Maio de 2015, constantes do documento nº 6 junto aos autos pela recorrida com o seu requerimento de 18.05.2015, com a referência 19646870.

  9. Assim, o Ponto de Facto 8. deve passar a ter a seguinte redacção: Até Maio de 2015, a A. pagou ao BPN 36 692,34 euros de amortização do empréstimo e juros, e 3 577,47 euros de seguros inerentes ao mesmo.

  10. Quanto ao facto de ter sido dado por não provado “que as partes tenham acordado após a separação que a A. assumiria sozinha o pagamento integral da prestação mensal devida ao banco mutuante e as despesas domésticas e fiscais inerentes ao imóvel”, a prova produzida nos autos concatenada com as regras da experiência e do normal acontecer impunham decisão diversa, ou seja, impunham que tal facto tivesse sido dado por provado, desde logo a prova documental junta aos autos, como sejam os documentos juntos com a Certidão da 1ª Secção de Família e Menores – J2, da Instância Central de Coimbra do Tribunal da Comarca de Coimbra, datada de 23.11.2015.

  11. A morada da recorrida que aí consta é a Rua (...) , nº 58, 3040-770 Cernache, ou seja, a do prédio urbano em causa nestes autos – cf. Pontos de facto 3, 5 e 6 da decisão sobre a matéria de facto constante da sentença de que se recorre, e que não vão impugnados, dando-se por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais -, sendo tal prédio reconhecido em tais documentos como residência da mãe, a casa da mãe 13. A recorrida utilizou, em proveito exclusivo e sem pagar qualquer importância ao recorrente, o prédio urbano referido desde Dezembro de 2008 – cf. Pontos de facto 6. e 11. da decisão sobre a matéria de facto constante da sentença de que se recorre, e que não vão impugnados, dando-se por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais.

  12. Após a separação das partes, a recorrida manteve-se a habitar o referido prédio com a filha do casal – cf. Ponto de facto 6. da decisão sobre a matéria de facto constante da sentença de que se recorre, e que não vai impugnado, dando-se por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.

  13. A recorrida mudou a fechadura do prédio em causa nos autos – cf. Ponto de facto 10. da decisão sobre a matéria de facto constante da sentença de que se recorre, e que não vai impugnado, dando-se por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.

  14. Deste facto, a recorrida não deu conhecimento nem pediu consentimento ao recorrente, nunca lhe tendo entregue cópia da nova chave – facto que resulta provado dos depoimentos gravados na audiência de julgamento, tendo, com o devido respeito, havido também aqui erro na apreciação das provas pelo Tribunal a quo, que exigiam decisão diversa, ou seja, dar tal facto por provado, o que se requer a V. Exas.

  15. Assim, ouça-se o depoimento da testemunha C... , mãe do recorrente, com conhecimento directo dos factos (… ….) 18. Ao mudar a fechadura do prédio, a recorrida impediu efectivamente o recorrente de a ele aceder sem o seu consentimento e, por isso, de o usar e fruir como seu legítimo proprietário, dele dispondo a recorrida como bem entendeu, exclusivamente, comportando-se, assim, como se fosse dona e única proprietária do prédio, de que tinha a posse e o uso exclusivo desde a separação do ex-casal.

  16. Aliás, a recorrida considerava e referia-se ao prédio, nas comunicações com o recorrente, como “a minha casa”...

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