Acórdão nº 209/13.7TBMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução14 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório A...

, viúva, residente na Rua (...) , Marinha Grande, intentou a presente ação declarativa, hoje sob a forma de processo comum, contra B...., S.A.

, com sede na Avenida (...) , em Lisboa, pedindo: “Que seja declarado válido e eficaz o contrato de seguro do ramo vida titulado pela apólice n.º 000 (...) /certificado n.º 9 (...) ; Que seja a ré condenada a reconhecer o que vem pedido no número anterior e a pagar à autora o capital seguro contratado, necessário para a amortização do empréstimo concedido à autora e marido, assim como juros de mora sobre o capital seguro, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento.” Alegou para tal, em síntese, que, em 14/10/2002, a A. e o seu marido, C... , compraram à D... , Lda., pelo preço de € 92.277,60, a fração autónoma designada pela letra "E" (do prédio inscrito na respetiva matriz sob o artigo número 16.339, descrito na Conservatória do Registo Predial da Marinha Grande sob o número 8428, afecto ao regime de propriedade horizontal), correspondente à Quinta Moradia; tendo também intervido na respectiva escritura (que foi de compra e venda e empréstimo com hipoteca), como terceiro outorgante, o G... , na qualidade de mutuante, tendo-se a aqui A. e o seu marido, na qualidade de mutuários, declarado devedores ao G... da importância de € 92.277,60, “que do mesmo Banco receberam a título de empréstimo e que vai ser aplicada na precedente aquisição", para além de, para garantir o pagamento da quantia mutuada (e bem assim dos respetivos juros e outros acréscimos), haverem constituído hipoteca a favor do G... , sobre a fração autónoma adquirida.

Para além disto, a A. e o marido (tendo-se obrigado, nos termos do contrato de mútuo com hipoteca concedido pelo G... , a contratar um Seguro de Vida) celebraram com a R. B... o contrato de seguro de vida, associado ao crédito habitação, com o certificado nº 9 (...) , titulado pela apólice nº 000 (...) , com início em 10/02/2006, sendo o capital seguro de € 110.600,00, as pessoas seguras a A. e o marido e o beneficiário, em caso de morte das pessoas seguras, o G... ; contrato de seguro em que os prémios teriam periodicidade mensal e cujo pagamento seria efetuado por débito na conta de depósitos à ordem de que a A. e o marido eram titulares com o nº (...) .

Entretanto, no dia 09/05/2010, faleceu o marido da A. (deixando como herdeiros legais a A. e dois filhos, que [os filhos] repudiaram a herança), motivo pelo qual, em meados de Maio de 2010, a A. se deslocou à sucursal do "G... " da Marinha Grande para comunicar o falecimento do marido e acionar o seguro de vida; tendo, “perante as dificuldades apresentadas”, pedido o exemplar das condições gerais e especiais aplicáveis à apólice de seguro de vida, o qual lhe foi remetido, por carta datada de 01/06/2010, pela R. B... , que a informou que “nos termos da legislação em vigor e das condições contratuais aplicáveis, o certificado individual n.º 9 (...) se encontra anulado por falta de pagamento dos prémios com data efeito a 01/09/2008”.

Ora, segundo a A., até aquela data, nunca a R. havia comunicado quer ao marido da A. quer à própria A. que o contrato de seguro se encontrava “anulado” ou “resolvido”, razão pela qual “a morte do marido da A., em 09/05/2010, se apresentava coberta”; acrescentando ainda: que a falta de pagamento de prémios não determina a resolução automática do contrato, que carece de ser comunicada; que “não bastaria a declaração de resolução dirigida ao falecido marido da autora”, sendo “imprescindível que tal declaração tivesse também sido dirigida à A. e que tivesse chegado à sua esfera de ação (caso em que se presumia o conhecimento) ou que se provasse o conhecimento, por ela, do teor da declaração diretamente dirigida a ela (dispensando-se nesse caso a prova da recepção da declaração)”; e que “era por conseguinte indispensável que a R. tivesse feito duas comunicações de resolução do contrato de seguro, uma à A. e outra ao marido”.

Contestou a R., reconhecendo a adesão da A. e do marido ao Seguro de Grupo que a R. havia celebrado como o G... ; seguro que, nos termos das suas condições gerais, cessa para cada pessoa segura na data da resolução do contrato, o que, também nos termos das mesmas condições gerais (art. 13.º), pode acontecer por falta de pagamento dos prémios, nos 30 dias posteriores à data do seu vencimento.

Após o que alegou que foi exactamente isto que aconteceu, ou seja, não conseguindo, a partir de setembro de 2008, cobrar o prémio, procedeu, por falta de pagamento dos prémios, à resolução do contrato; enviando, para tal, cartas (a pedir a regularização do premio e a declarar a resolução) ao marido da A. ( C... ), cartas que foram remetidas para a morada que consta do Certificado Individual de Seguro (assumido pelo seu sistema informático, em virtude de a A. e seu falecido marido já constarem, com tal morada, dos registo da R.), que foram recebidas e o seu conteúdo conhecido quer pela A. quer pelo seu marido; acrescentando, ainda, que “sendo a A. apenas segurada e constando do Certificado Individual como entidade pagadora o seu marido, não tinha a A. que ser interpelada para pagar, nem tinha a ré de lhe comunicar a resolução do contrato”.

Referiu também que ignora qual o valor em dívida ao banco mutuante e, bem assim, se existe mora ou se as prestações estão a ser garantidas, sendo que a A. tal não alegou.

E concluiu pela improcedência da acção, em face da resolução do contrato.

Replicou a A., mantendo alegado na PI.

Foi proferido despacho saneador – que declarou a instância totalmente regular, estado em que se mantém – e foram seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória; instruído o processo, foi designado dia para audiência, realizada já à luz do NPCP, após o que a Exma. Juíza proferiu sentença, em que julgou a acção totalmente improcedente e em que, consequentemente, absolveu a R. dos pedidos.

Inconformada com tal decisão, interpôs a A. recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por decisão que revogue/inverta o decidido, julgando procedente a acção.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1.ª O presente recurso vem interposto da douta Sentença proferida nos Autos, que julgou totalmente improcedente a pretensão da Recorrente. Decisão, com a qual a Recorrente não pode conformar-se.

  1. Impunha-se ao Tribunal a quo que se debruçasse sobre toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como os documentos juntos aos autos, pois, certamente, ter-se-ia uma decisão bem diferente.

    1. Modificabilidade da decisão de facto: 3.ª A prova produzida em sede de Audiência, em conjugação com a prova documental junta aos Autos, impõe uma decisão diversa da recorrida quanto à matéria de facto considerada assente pelo Tribunal a quo.

  2. Os poderes de cognição do Tribunal ad quem possibilitam a modificabilidade da decisão recorrida e ora impugnada, uma vez que do processo constam todos os elementos de prova que lhe serviram de base.

    4 .1ª Factos provados que não deveriam ter sido: Alínea c) (…) em virtude de a autora e seu falecido marido já constarem dos registos da ré, com aquela morada, por força de anterior celebração de contrato de seguro associado a crédito à habitação, com a apólice nº000 (...) e certificado individual nº88 (...) 4, com inicio em 14.10.2002 (Facto 20).

    Alínea d) A autora e o seu então marido tiveram conhecimento do teor da correspondência referida em 24. a 26., que não foi devolvida à ré (Facto 27).

    4.2ª Factos não provados que deveriam ter sido: Até aquela data, a ré não haja comunicado, para a morada convencionada, ao marido, nem à autora, que o contrato de seguro, identificado supra se encontrava “anulado” ou sem efeito (alínea c).

    4.3ª Factos extraídos da prova produzida, que deveriam ser considerados provados.

    - O aviso de anulação da apólice foi enviado, por correio simples, para C... , para a morada Rua (...) , Marinha Grande.

    - A comunicação da anulação da apólice foi enviada, por correio simples, para C... , para a morada Rua (...) , Marinha Grande.

    - Porquanto, a morte do marido da Autora, em 09 de Maio de 2010, apresentava-se coberta por aquele contrato.

    1. Modificabilidade/impugnação de direito: 5ª Tendo em conta a matéria de facto provada e que cuja alteração supra se pugna, atentas as razões expostas no antecedente Capítulo II destas Alegações, forçosamente a aplicação do direito aos factos deveria ter sido necessariamente diferente.

  3. No que concerne à subsunção do direito aos factos, o nosso dissídio dirige-se, exclusivamente, ao entendimento de que a declaração de resolução do contrato de seguro chegaram ao conhecimento do destinatário e, ainda, da Autora e, como tal tornou-se eficaz. Importa analisar se a Ré B... provou os elementos constitutivos da resolução do contrato de seguro do ramo vida constante dos Autos? Salvo o devido respeito, que é muito, entendemos que não.

  4. No caso em apreço e de acordo com os factos provados, estamos perante um contrato de seguro de grupo contributivo, na modalidade de seguro de vida de crédito à habitação, que garantia o pagamento do capital devido ao Banco G... – tomador de seguro e beneficiário – por via de concessão de crédito à habitação à Autora e seu marido (mútuo) – aderentes/pessoas seguras - estando garantidos pela Ré Seguradora os riscos de morte ou de invalidez dos mutuários, a liquidação à mutuante do montante em dívida, do capital e dos juros vencidos.

  5. O interesse da Autora e seu marido (pessoas seguras/aderentes) na celebração do contrato foi o de assegurar o pagamento do montante da dívida em caso de morte ou invalidez de algum deles ou, de ambos.

  6. Daqui se extrai que não obstante o Banco G... ser o principal beneficiário do seguro, a Autora e seu marido enquanto aderentes e pessoas seguradas também se incluem nesta categoria (beneficiários) uma vez que, em caso de morte (risco seguro), podem exigir à...

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