Acórdão nº 73/12.3GAMGL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Maio de 2017

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução10 de Maio de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório No processo supra identificado, o Ministério Público requereu o julgamento de A....

, divorciado, empregado fabril, filho de (...) e de (...) , natural de (...), nascido em 20/03/1967, titular do BI (...) , residente em (...) , (...), imputando-lhe, em autoria material, concurso efectivo real e sob a forma consumada: a) sete crimes de abuso sexual de crianças na forma agravada, p. e p. pelo n.º 1 do artigo 171.º, com referência à alínea b) do n.º 1 do artigo 177.º, ambos do Código Penal (CP).

  1. dois crimes de abuso sexual de crianças na forma agravada, p. e p. pelo n.º 2 do artigo 171.º, com referência à alínea b) do n.º 1 do artigo 177.º, ambos do CP.

  2. cinco crimes de actos sexuais com adolescentes, na forma agravada, p. e p. pelo n.º 2 do artigo 173.º, com referência à alínea b) do n.º 1 do artigo 177.º, ambos do CP.

    *O tribunal colectivo julgando a acusação parcialmente procedente e com pertinência para apreciação no âmbito do recurso, deliberou: I) Condenar o arguido pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de dois crimes de abuso sexual de menor dependente, p. e p. pelo art.172.°, n.°1, do CP:

  3. Na pena de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão para o crime cometido no quarto do arguido; b) Na pena de 3 (três) anos de prisão para o crime cometido no quarto da menor.

    Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

    II) Absolver o arguido de todos os restantes crimes que lhe vêm imputados.

    III) Condenar o arguido a pagar à menor B... , a título de indemnização arbitrada oficiosamente, a quantia de €6.000,00 (seis mil euros).

    *Inconformado com o acórdão, recorreu o arguido, o qual pugnando pela sua absolvição, formula as seguintes conclusões: «I - Para a condenação, no âmbito dos presentes autos, do arguido acima identificados e ora Apelante, e no que releva no presente Recurso, o Tribunal a quo motivou a sua decisão, maxime os factos dados como provados, assim como nas declarações para memória futura da menor, apenas e só.

    II - Analisada a prova gravada, em declarações que se apresentam contraditórias entre si, não se mostrando as mesmas merecedoras daquela valoração “de uma forma positiva por congruentes, verosímeis e credibilizadores” (sic), sendo declarações totalmente não coincidentes relativamente a aspetos que são de maior importância para a descoberta da verdade.

    III - Não resulta provado que o arguido tenha enviado uma mensagem à menor com o seguinte teor: "lava-te e vai para a minha cama que não perdes nada", sendo que a tia apenas afirma que a menor lhe mandou a mensagem e nunca que a terá visto no telemóvel da menor.

    IV - Dos depoimentos prestados pela mãe e pelo irmão da menor resulta que estes nunca se aperceberam de tal situação e se tivessem acontecido seriam os primeiros a denunciar o arguido. Mais afirmaram que o arguido sempre os tratou como se fosse seus filhos.

    V - Com efeito, o douto acórdão proferido pelo tribunal a quo, não teve em linha de conta tais meios de prova, verificando-se assim uma contradição entre a prova realizada e a decisão proferida.

    VI - De acordo com a prova produzida em audiência de julgamento, a mesma, não permite ao tribunal a quo concluir que o arguido tenha praticado qualquer crime.

    VII - O douto acórdão recorrido vai mais longe: em cúmulo jurídico condenou o arguido na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão efetiva.

    VIII - O Tribunal a quo não fez quaisquer considerandos nem fundamentou minimamente a aplicação da pena na medida em que atentou o, suposto número de crimes, isto é, dois, mostra-se desadequado e exagerada a fixação de cinco anos e seis meses de prisão efetiva.

    IX - Ora, a aplicação da pena mais gravosa, pena limitativa da liberdade do arguido, não se mostra adequada e ajusta ao suposto número de crimes cometidos, diga-se, dois.

    X - Uma vez mais o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 71º do Código Penal, doseando descriteriosamente a medida da pena concretamente aplicável, abstendo-se de tecer quaisquer considerações que fundamentem minimamente a sua decisão.

    XI - O arguido está inserido social e familiarmente, usufruindo de modesta condição social e cultural.

    XII- Pelo exposto, mostra-se exagerada a pena aplicada, e em caso de não merecer provimento a reapreciação da prova, absolvendo-se o arguido, deve a mesma ser reduzida ou eventualmente ser-lhe aplicada a suspensão mediante a execução de injunções.

    XIII - Assim, de toda a prova resulta que não ficou claro que o arguido tenha efetuado os factos dados como provados na sentença.

    XIV- Mesmo, e por mero caso académico, se se considerar o crime provado, afigura-se-nos que a pena é demasiado elevada, se tivermos em consideração o facto de o registo criminal do arguido apenas conter crimes de condução sob efeito do álcool e não haver agravantes que se nos afigurem de relevo.

    XV - Por último, a condenação do arguido ao pagamento de 6.000,00 euros à pretensa vítima parece-nos, antes de mais, que não está devidamente fundamentada. Pois em sítio nenhum a ofendida fez prova dos danos que teve.

    XVI - Não são referidas na douta sentença quais as particulares exigências de proteção da vítima que dão base a esta reparação.

    XVII - Mesmo que se admitisse a condenação, seria sempre um valor exagerado considerando as condições sócio-económicas do arguido, já que o mesmo foi declarado insolvente, e não tem meios de proceder a tal pagamento.

    XVIII - Em consequência destas violações, o Apelante foi erradamente condenado, por factos que não cometera.

    XIX - Pelo que antecede, foram violados no douto Acórdão recorrido, entre outros, os seguintes preceitos: artigos 48.º, 70.º, 71.º, 72º e 73º do Código Penal e 410º-2. b) do CPP, pelo que o mesmo deve ser revogado na parte em que condena o recorrente em prisão efectiva».

    *Cumprida que foi a notificação do art. 413.º, n.º 1, do CPP, o Ministério Público, em síntese, sustenta que deve ser negado provimento ao recurso, uma vez que o acórdão não sofre dos vícios apontados, a prova foi devidamente apreciada e valorada e as penas mostram-se justas e adequadas, bem com a indemnização oficiosamente atribuída à vítima.

    *Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, o qual emitiu douto parecer no sentido de que o arguido não deu cumprimento ao disposto no art. 412.º, n.º 3 e 4, do CPP, ao pretender impugnar a matéria de facto e o acórdão não padece de qualquer dos vícios previstos no art. 410.º, n.º 2.

    Relativamente às penas aplicadas não há fundamento para as alterar, as quais foram determinadas em função do elevado grau de culpa com que actuou e da gravidade da sua conduta.

    *Notificado o arguido, nos termos do art. 417.º, n.º 2, do CPP, não respondeu.

    *Foi cumprido o art. 418.º, do CPP, e uma vez colhidos os vistos legais, indo os autos à conferência, cumpre decidir.

    Vejamos pois a factualidade apurada pelo tribunal e respectiva motivação:

    1. Factos provados: 1. B... nasceu no dia 24 de Junho de 1997 e é filha de C... e D... .

      1. Os pais da menor separaram-se e em 29 de Setembro de 2005, por sentença que homologou o acordo do exercício das responsabilidades parentais, a menor ficou confiada à mãe e com ela a residir.

      2. No ano de 2008, na sequência do início de um relacionamento amoroso com o arguido A... , a mãe de B... , juntamente com esta e o irmão, foram residir para a habitação do arguido, sita na (...), em (...), o que fizeram até apresentação da denúncia em 28.02.2012.

      3. Como a mãe da menor B... trabalhava desde as 14 horas até às 00.00h era o arguido que, à noite, ficava frequentemente com a mesma em casa.

      4. Nesse período era o arguido quem, com o acordo da mãe da menor, cuidava desta nesse período, como se de sua filha se tratasse, zelando pelo jantar da mesma, que fazia, e pelo cumprimento das horas de chegar a casa no final das aulas e de sair com os amigos à noite.

      5. Nessas condições, encontrando-se a mãe da menor a trabalhar fora de casa, em data não concretamente apurada, mas situada durante aquela vivência com o arguido até 28.02.2012, à noite, o arguido, no quarto da menor, numa ocasião, deitou-se em cima da mesma, ambos desnudados, apalpou-lhe os seios e a vagina com as suas mãos, exibiu-lhe o pénis ereto desnudado e pediu à menor que o acariciasse com as mãos.

      6. Nessas condições, encontrando-se a mãe da menor a trabalhar fora de casa, em data não concretamente apurada, mas situada durante aquela vivência com o arguido até 28.02.2012, à noite, o arguido, noutra ocasião, no quarto dele, deitou-se em cima da mesma, ambos desnudados, apalpou-lhe com as mãos os seios e a vagina, introduziu-lhe os dedos na vagina, exibiu-lhe o pénis ereto desnudado e pediu à menor que o acariciasse com as mãos, introduzindo-o depois na vagina e fazendo movimentos oscilatórios até estar prestes a ejacular, altura em que o retirou e ejaculou para uma toalha.

      7. Em data e hora exatas não apuradas, mas situada em meados de Fevereiro de 2012, o arguido enviou para o telemóvel da B... , que se encontrava em casa, uma mensagem com o seguinte teor: “lava-te e vai para a minha cama que não perdes nada”, bem sabendo e querendo desse modo propor à menor que mantivesse consigo um relacionamento sexual.

      8. O arguido agiu sempre deliberada, voluntária e conscientemente, bem sabendo e querendo praticar com a menor B... , cuja idade conhecia, os sobreditos atos sexuais, valendo-se da falta de maturidade e inexperiência sexual da mesma para o conseguir e assim satisfazer os seus instintos libidinosos.

      9. Nas referidas circunstâncias a menor ficava de facto, naquelas ocasiões, à guarda e confiança do arguido na residência que era o lar de toda a família, o que era do conhecimento daquele, mas ao que foi indiferente.

      10. Sabia outrossim que ao atuar do modo atras descrito não só afetava o livre desenvolvimento da...

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