Acórdão nº 2206/07.2TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução19 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

H (…), Lda., (hoje insolvente e representada pela respetiva administradora da insolvência), instaurou contra E (…), casada com A (…) no regime da separação de bens, A (…), (falecido tendo sido julgados habilitados E (…) e F (…)) e em que foram intervenientes B (…) e J (…) (ambos hoje falecidos tendo sido julgados habilitados os seus herdeiros incertos), M (…) (hoje falecida tendo sido julgadas habilitados M (…) e M (…), ação declarativa, de condenação, com processo ordinário.

Pediu: Que os RR. sejam condenados a pagar-lhe, de forma solidária, a quantia global de 59.203,81 euros (cinquenta e nove mil duzentos e três euros e oitenta e um cêntimos), a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos, acrescido dos juros de mora sobre aquele valor, calculados à taxa legal, desde a data da citação da presente ação até efetivo e integral pagamento.

E, ainda, condenados, solidariamente, a pagar-lhe o valor correspondente às rendas, relativas ao 2.º andar, que se vencerem na pendência da presente ação até ser possível à A. utilizar aquele espaço com o fim a que o arrendamento se destina.

Para tanto alegou, em síntese: - É arrendatária do rés-do-chão e 2º andar do edifício sito na Rua X (...) em (...) .

- No dia 1 de Dezembro de 2006, cerca das 17 horas, na Rua Y (...), em (...) , ocorreu a derrocada do edifício propriedade da 1.ª R., que identifica.

- Na sequência daquela derrocada, foi arrastado um segundo edifício (edifício 2) sito na Rua Y (...), n.º 1, 3, 5 e Travessa Y (...) n.º 8.

- Na sequência da derrocada, o rés-do-chão e o 2º andar do edifício do qual a A. é arrendatária, acima identificado, foram afetados pelos escombros do prédio que ruiu que foram projetados em direção ao edifício no qual a A. possui o seu estabelecimento comercial.

- Com a derrocada do edifício 1 sofreu danos patrimoniais na quantia global de 59.203,81 euros (cinquenta e nove mil duzentos e três euros e oitenta e um cêntimos) e o correspondente ao pagamento das rendas devidas pela A. relativamente ao 2.º andar que se vencerem na pendência da presente ação até ser possível à A. utilizar aquele espaço com o fim a que o arrendamento se destina.

Os RR. E (…9 e A (…) contestaram.

Imputando as causas da derrocada ao estado de degradação do edifício 2 e alegando ainda que a derrocada ocorreu devido à chuva e por falta de cuidado e erros com que, do ponto de vista técnico, foi abordada a situação pelos serviços competentes da Câmara.

A autora replicou.

Manteve a sua versão mas, considerando que face à posição dos RR. tal pode implicar responsabilidade partilhada com os proprietários do edifício 2, requereu a intervenção principal provocada de B (…), J (…) e M (…) Conclui que caso não seja dada procedência ao pedido formulado a título principal, deverá ser reconhecida a responsabilidade dos 1ºs RR. e dos ora Chamados pelo ressarcimento dos danos causados à A., em virtude da derrocada do edifício identificado no art.º 4.º da p.i.

  1. Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «Pelo exposto, julgo a ação totalmente procedente por provada e em conformidade, condeno os RR. E (…9 e F (…) a pagar à autora a quantia de € 61.132,86 (sessenta e um mil cento e trinta e dois euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor, desde a citação até efetivo e integral pagamento, absolvendo os restantes intervenientes do pedido.» 3.

    Inconformada recorreu a ré E (…).

    Rematando as suas alegações com as seguintes, massivas, conclusões: (…) As intervenientes/recorridas M (…) e a MASSA INSOLVENTE DE H (…), LDA., contra alegaram, pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes argumentos finais: Contra alegações das intervenientes: (…) Contra alegações da Massa Insolvente: (…) 4.

    Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª – Nulidade da sentença por não se ter pronunciado sobre questões que devesse apreciar e por haver condenação ultra petitum.

    1. – Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    2. – Improcedência da ação.

  2. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    5.1.1.

    Estatui, no que para o caso interessa, o artº 615º do CPC: 1 - É nula a sentença quando: d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

    Da omissão de pronúncia.

    Este segmento normativo ínsito na al. d) do artº 615º do CPC conexiona-se com o estatuído nos arts. 154º e 608º do mesmo diploma, ou seja, com o dever do juiz administrar a justiça proferindo despachos ou sentenças sobre as matérias pendentes – artº 152º - e com a necessidade de o juiz dever conhecer das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica e de resolver todas as questões – e só estas questões, que não outras, salvo se de conhecimento oficioso - que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras –artº608º.

    Há decisão “ultra petitum” sempre que o julgador não confina o julgamento da questão controvertida ao pedido formulado pelo autor ou ao pedido reconvencional deduzido pelo réu e conhece, fora dos casos em que tal lhe é permitido “ex officio”, questão não submetida à sua apreciação.

    Para que não se verifique tal vício terá de existir uma correspondência entre a pronúncia e a pretensão, isto é, a sentença não pode decidir para além do que está ínsito no pedido, nos termos formulados pelo demandante. Este princípio é válido quer para o conhecimento excessivo em termos quantitativos, quer por condenação em diverso objeto - excesso qualitativo – cfr. Ac. do STJ de 28.09.2006, dgsi.pt, p.06A2464. Por outro lado e como é consabido e constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, não se devem confundir «questões» a decidir, com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes.

    A estes não tem o tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas às pretensões formuladas e aos elementos inerentes ao pedido e à causa de pedir –cfr. Rodrigues Bastos, in Notas ao CPC, 2005, p.228; Antunes Varela in RLJ, 122º,112 e, entre outros, Acs. do STJ de 24.02.99, BMJ, 484º,371 e de 19.02.04, dgsi.pt.

    Da decisão ultra petitum.

    Dispõe o artº 609º nº1 que «a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir».

    E dispõe o artº 615º nº 1 al. e) que «é nula a sentença quanto o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir».

    Há decisão “ultra petitum” sempre que o julgador não confina o julgamento da questão controvertida ao pedido formulado pelo autor ou ao pedido reconvencional deduzido pelo réu e conhece, fora dos casos em que tal lhe é permitido “ex officio”, questão não submetida à sua apreciação.

    Condenando em quantidade superior ou em objeto diverso o juiz excede o limite imposto por lei ao seu poder de condenar e infringe o princípio do dispositivo que assegura à parte a faculdade de circunscrever o thema decidendum.

    Para que não se verifique tal vício terá de existir uma correspondência entre a pronúncia e a pretensão, isto é, a sentença não pode decidir para além do que está ínsito no pedido, nos termos formulados pelo demandante.

    Este princípio é válido quer para o conhecimento excessivo em termos quantitativos, quer por condenação em diverso objeto - excesso qualitativo – cfr. Ac. do STJ de 28.09.2006, p.06A2464 in dgsi.pt. Sendo ainda de notar que, no caso de pedidos plúrimos ou parcelares, tal vício inexiste se o juiz, mesmo condenando a mais num dos pedidos, o montante condenatório final ainda quede ínsito no pedido global final.

    5.1.2.

    No caso vertente a recorrente taxa a sentença de nula por omissão de pronuncia no entendimento de que: «o Meritíssimo Juíz a quo não podia proferir a decisão final tal como a decretou, pois não valorou, nem classificou todo um conjunto de factos considerados fundamentais para a boa decisão da causa, que lhe permitiam assim, formular uma decisão sólida, coesa.».

    A recorrente mistura conceitos e realidades jurídicas distintas: a não consideração/valoração de certos factos que ela taxa de relevantes para a decisão da causa e a pronúncia/decisão, na sentença, tout, court, sobre as questões colocadas pelas partes no processo.

    Aquela realidade coloca-se, a montante, em sede de seleção da fatualidade alegada pelas partes e que é pertinente para a boa decisão da causa: no domínio do código antigo, reportava-se à seleção da matéria de facto – artº 511º do CPC; no âmbito do novo código refere-se, desde logo e numa fase anterior, à identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova – artº 596º do CPC.

    Ora se naquela fase – temas de prova – a questão, meridianamente, não se prende com a nulidade da sentença, seja com que fundamento for, vg. por omissão de pronuncia, mesmo na fase da sentença e nesta própria outrossim não.

    Efetivamente, e ainda que presentemente a decisão sobre a matéria de facto passe, formalmente, a constar na sentença – lato sensu considerada - tal decisão não se confunde nem é totalmente absorvida pela sentença – stricto sensu – a qual se consubstancia na subsunção dos factos apurados às normas legais pertinentes e na respetiva decisão – artº 607º nº3 do CPC.

    Assim, na decisão sobre a matéria de facto, importa apurar se a convicção que acarreta a prova de certos factos e a não prova de outros, está consonante com os meios probatórios produzido ou se o julgador se pronunciou e relevou todos os factos com interesse para a decisão.

    Já na sentença final urge apenas verificar se a decisão final está alicerçada, ou não, em factualismo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT