Acórdão nº 186/14.7GCLSA.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução19 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Lousã – Instância Local – Secção de Competência Genérica – J1, por sentença de 11 de Março de 2016, depositada a 14 do mesmo mês [fls. 739] e corrigida por despacho de 16 de Junho de 2016 [fls. 880] foi o arguido A...

, com os demais sinais nos autos, condenado pela prática de dois crimes de homicídio por negligência, p. e p. pelos arts. 137º, nº 1 e 69º, nº 1, a) do C. Penal, na pena de vinte e oito meses de prisão por cada um e, em cúmulo, na pena única de quatro anos de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período e ainda na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de vinte e quatro meses, e pela prática da imputada contra-ordenação muito grave na coima de € 100.

Inconformado com o teor de um despacho proferido em 1 de Fevereiro de 2016 e com o decidido na sentença, de ambos recorreu o arguido para esta Relação que, por acórdão de 9 de Janeiro de 2017, assim determinou, na parte em que agora releva: “ (…).

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação em:

  1. Negar provimento ao recurso intercalar do arguido.

    * B) Conceder parcial provimento ao recurso do arguido interposto da sentença e, em consequência, decidem: 1. Declarar a nulidade da sentença recorrida, por omissão de pronúncia, relativamente à determinação e fixação da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, determinando, nesta parte, a sua substituição por outra, que supra a apontada nulidade, nos termos sobreditos.

    1. Revogar a sentença recorrida na parte em que condenou o arguido A... nas penas parcelares de vinte e oito meses de prisão e de vinte e oito meses de prisão e, em cúmulo, na pena única de quatro anos de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período, e condenar o arguido nas penas parcelares de um ano e seis meses de prisão e de um ano e seis meses de prisão e em cúmulo, na pena única de pena única de dois anos e quatro meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período, a contar do trânsito do presente acórdão. * C) Negar provimento ao recurso da demandada Companhia de Seguros B..., SA.

      (…)”.

      * Baixados os autos à 1ª instância, com data de 7 de Abril de 2017, a Mma. Juíza a quo proferiu o que designou por «segmento decisório», que considerou «complemento» da sentença de 11 de Março de 2016, suprindo a nulidade de omissão de pronúncia apontada no acórdão da Relação 9 de Janeiro de 2017, aí decidindo condenar o recorrente – pela prática de dois crimes de homicídio por negligência – em duas penas acessórias de proibição de conduzir veículos com motor de doze meses cada uma e, em cúmulo material, na pena acessória única de vinte e quatro meses de proibição de conduzir veículos com motor.

      A decisão foi notificada ao Ministério Público em 10 de Maio de 2017 e ao recorrente e demais sujeitos processuais, por via postal registada, datada de 10 de Maio de 2017. * Inconformado com a decisão, dela recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto do segmento da sentença na parte em que decidiu condenar “o arguido no cumprimento do período total de 24 (vinte e quatro) meses de proibição de conduzir veículos motorizados, correspondendo à acumulação material das duas penas acessórias de 12 meses de proibição de conduzir veículos a motor, aplicadas para cada um dos crimes de homicídio negligente em que se condenou o arguido, nos termos das normas conjugadas artigos 137º e 69º, nº 1, al. a), ambos do Código Penal”.

    2. Na determinação da medida das penas acessórias o Tribunal a quo não respeitou o já decidido, no âmbito dos presentes autos, por este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão já transitado em julgado.

    3. As penas acessórias só podem ser decretadas conjuntamente com um pena principal ou com uma pena de substituição, e tendo as mesma natureza criminal e não prevendo o C. Penal regras específicas para a determinação da medida da pena, são-lhe aplicáveis os critérios gerais de determinação da medida da penas previsto no C. Penal.

    4. Para a determinação da concreta medida das penas acessórias aplicáveis ao arguido, teria o Tribunal a quo – salvo o devido respeito – de se socorrer do decidido no Acórdão do Tribunal da Relação proferido no âmbito dos presentes autos e já transitado em julgado, no que se refere ao grau da ilicitude, à intensidade da negligência, e às exigências de prevenção especial.

    5. Porém, a Mma. Juíza a quo fez “tábua rasa” do decidido pelo Tribunal da Relação de Coimbra… 6. Consta do segmento da sentença ora em crise, (cfr. 4º parágrafo da pág. 6) que o grau de ilicitude da conduta do arguido é significativamente elevado, quando resulta do Acórdão proferido nos presentes autos por este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra que o grau da ilicitude do facto é elevado.

    6. Por outro lado, considerou a Mma. Juíza a quo que a conduta do arguido revela um grau de negligência particularmente intenso, quando resulta do Acórdão proferido no âmbito dos presentes autos por este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, já transitado em julgado, que a intensidade da negligência é elevada.

    7. Sendo certo que, não se compreende em que factos se apoiou o Tribunal a quo para concluir que o Arguido sabia que dormiu pouco, esteve em convívio, numa noite de veraneio, na Figueira da Foz ou tenha tido preocupação com a ingestão bebidas alcoólicas durante a mesma.

    8. Na verdade, dos factos dados como provados não resulta o motivo que levou ao fatídico adormecimento do arguido, não resulta que o Arguido tenha ingerido qualquer bebida alcoólica, que tenha tido preocupação com a ingestão de qualquer bebida alcoólica ou que se tenha recusado a efetuar qualquer teste de alcoolémia designadamente no local do sinistro.

    9. Por outro lado ainda, refere a Mma Juíza a quo que da factualidade dada como provada não resulta que o arguido reúna as características essenciais para se poder afirmar que o período de repetição de condutas criminosas é inexistente ou diminuto, referindo que não se poderá dizer que o perigo de reiteração criminosa do arguido seja inexistente ou sequer diminuto! 11. Porém, do Acórdão proferido no âmbito dos presentes autos por este Venerando Tribunal, resulta que, ainda que o Arguido não tenha assumido uma qualquer conduta reveladora de ter interiorizado a sua culpa, o recorrente mostra-se afetado e penalizado com o sucedido, não se indiciando a existência de uma personalidade com traços problemáticos, que não se está perante o início de uma carreira criminosa e que não se fazem sentir exigências prevenção especial.

    10. Face ao exposto, como supra se referiu, na determinação da medida de cada uma das penas acessória de proibição de conduzir, prevista no art. 69º do C. Penal, a Mma. Juíza a quo não teve em consideração o decidido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito dos presentes autos, por acórdão já transitado em julgado.

    11. Ora, o princípio da imodificabilidade da decisão ou da sua irrevogabilidade, consagrado nos nºs 1 e 3 do art.º 613.º, do CPC, implica o esgotamento do poder jurisdicional sobre as questões apreciadas, obstando a que, fora das condições expressamente previstas na lei (n.º 2 do artº 613.º), a Mma. Juíza a quo a altere.

    12. Sendo certo que, havendo caso julgado formal o seu cumprimento é obrigatório no processo onde foi proferido, nos termos do disposto no nº 1 do art. 620º do CPC, obstando a que a Mma. Juíza a quo possa no mesmo processo alterar a decisão proferida acerca do grau da ilicitude, da intensidade da negligência, e das exigências de prevenção especial.

    13. Assim, a Mma. Juíza a quo, ao decidir em sentido diferente daquele decidido por este Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, no acórdão proferido no âmbito dos presentes autos, já transitado em julgado, infringiu a autoridade do caso julgado, tendo desrespeitado os seus efeitos processuais, ocorrendo a situação de julgados contraditórios, com a consequência de, nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do art. 625º do C.P.C., valer a decisão que primeiramente tenha transitado em julgado, ou seja, a decisão deste Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, o que se requer seja declarado.

    14. Acresce que, face ao que supra se deixou exposto, à factualidade dada como provada em juízo e ao direito aplicável, as penas acessórias de proibição de conduzir veículos motorizados ao arguido revelam-se, salvo o devido respetivo, pouco criteriosas e desequilibradamente doseadas.

    15. Na verdade, como supra já se deixou dito, a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, prevista no art. 69º do Código Penal, configura uma verdadeira pena, com moldura penal própria, dentro da qual terá o julgador que determinar a medida da pena a aplicar ao arguido, com obediência ao disposto no artigo 71º do Código Penal.

    16. Assim sendo, a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, deve ser graduada dentro dos limites legais, ou seja, entre 3 meses e 3 anos, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, tendo por base “todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”.

    17. Tendo em consideração o supra exposto, o grau de ilicitude do facto foi elevado, a intensidade da negligência inconsciente foi elevada e não se fazem sentir exigências de prevenção especial.

    18. Por outro lado, de acordo com a matéria de facto dada como provada nos presentes autos, presentemente o arguido dá apoio dois dias por semana à empresa “ K... ” e trabalha com stands seus conhecidos, ajudando no transporte de carros e/ou vendas e ganha comissões do que vende (cfr. ponto 119 do factos provados).

    19. Pelo que, necessita de se deslocar de automóvel, diariamente. Sendo, obviamente, impensável, pela sua onerosidade e tendo em conta os rendimentos do Arguido, a contratação de um...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT