Acórdão nº 7825/16.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelCATARINA GON
Data da Resolução19 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

A...

, com sede em (...) , Londres, instaurou processo de execução contra B...

e C...

, residentes na (...) , Coimbra, pedindo o pagamento da quantia de 5.897,61€ e juros no valor de 549,73€.

Invoca, para tanto, um contrato de crédito celebrado em 3 de Agosto de 1999 entre os Executados e o D...., S.A. através do qual este concedeu àquele um empréstimo de 2.000.000$00. Alega: que os Executados deixaram de pagar as prestações acordadas pelo que foi preenchida a livrança que havia sido dada como caução; que, por cessão de créditos de 24/06/2014, o aludido Banco cedeu à ora Exequente os créditos em questão e que, por força de pagamento parcial entretanto efectuado, encontra-se em dívida o capital de 5.897,61€.

Junta aos autos o contrato de cessão de créditos, o contrato celebrado entre o D... e os Executados e uma livrança subscrita pelos Executados, no valor de 1.832.313$00, com vencimento em 29/11/2001.

Por decisão proferida em 03/01/2017, o requerimento executivo foi liminarmente indeferido por falta de legitimidade da Exequente para demandar os Executados.

A Exequente veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: Primeira) Nos termos do artigo 30, nºs 1 e 3 do Código de Processo Civil, considera-se parte legítima a que possuir interesse directo em demandar ou contradizer, reconhecendo-se semelhante interesse aos titulares da relação material controvertida tal como configurada pelo Autor; Segunda) A legitimidade processual não se afere com recurso à legitimidade substantiva, aferindo-se sim pela relação controvertida delineada na petição inicial, através do pedido e da causa de pedir e, é, em face de tal relação que se haverá de aferir se são ou não as partes legítimas; Terceira) Determinante para o reconhecimento do pressuposto processual em estudo é objecto do processo tal como desenhado pelo autor, sendo o objecto da acção fixado, em primeira linha, pelo mesmo, pelo que são partes legítimas os titulares da relação material controvertida, tal como ela é, por este, configurada. Razão pela qual, independentemente de tal relação coincidir com a que existe no plano substantivo, se em face do relatado na petição inicial/requerimento executivo, as partes surgirem como as titulares dos interesses em discussão, é reconhecida àquelas a necessária legitimidade processual; Quarta) Aplicando-se o supra mencionado, a ora Recorrente é parte legítima na relação material controvertida tal como configurada pela mesma, porquanto, adquiriu os créditos sub judice por contrato de cessão de créditos, celebrado em 24 de Junho de 2014, com o D... – D... , S.A., não relevando para a apreciação da validade formal da instância se a Recorrente notificou ou não os Recorridos da cessão de créditos, antes sendo esta matéria de mérito da sua pretensão, bastando a análise do requerimento executivo, para o efeito; Quinta) Por via da legitimação material conferida pelo contrato de cessão de créditos, a ora Recorrente, sendo a legítima portadora da Livrança, assente no contrato de mútuo, junto aos autos de execução, pode, com base neles, executar os seus subscritores por falta de pagamento, conforme menciona o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 22 de Novembro de 2016; Sexta) A notificação ao devedor, a que alude o artigo 583º, nº1 do Código Civil, de que o seu credor cedeu o crédito a outrem, pode ser feita através de citação para a execução, proposta pelo credor cessionário contra os Executados, conforme menciona o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 10 de Março de 2016; Sétima) Tendo a notificação do contrato de cessão como objectivo essencial alertar o devedor quanto à identidade do actual credor, prevenindo, deste modo, que aquele por desconhecer o dito negócio, pague ao primitivo credor/cedente e não ao cessionário, com a consequente extinção da obrigação, é evidente que a omissão de tal acto (que não ocorreu no caso sub judice, dado que, a Recorrente notificou os Recorridos, conforme notificação, junta aos autos do processo de execução, em data anterior à da notificação da Sentença recorrida), pode ser ultrapassada com a citação dos Devedores para a Acção. Sendo certo que, Oitava) Na cessão de créditos, o credor transmite a terceiro, independentemente do consentimento do devedor, a totalidade ou parte do seu crédito, nos termos do disposto no artigo 577º do Código Civil, ocorrendo essa cessão de créditos quando o credor, mediante negócio jurídico, transmite a terceiro o seu direito. Verifica-se então a substituição do credor originário por outra pessoa (modificação subjectiva da obrigação), mantendo-se inalterados os restantes elementos da relação obrigacional. Neste sentido veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 25 de Maio de 1999; Nona) A lei faz depender a eficácia da cessão em relação ao devedor do conhecimento que este tenha de que o crédito foi cedido, sendo que, tal conhecimento do devedor pode chegar ao mesmo através da citação para a acção/execução. Pelo que, se a eficácia da cessão está ligada ao conhecimento, não se pode dizer que com a citação para a acção/execução o devedor não passe a conhecer que o crédito foi cedido, conforme menciona o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 3 de Junho de 2004. Sendo que, se o conhecimento do devedor da cessão é o elemento constitutivo da eficácia da cessão relativamente a ele (devedor), é indiferente do ponto de vista jurídico, classificar a citação como notificação ou simples modo de conhecimento, não se vislumbrando como a citação não possa ser considerada um meio idóneo de transmissão ao devedor do pertinente e adequado conhecimento; Décima) Tendo em consideração que a cessão representa uma simples transferência da relação obrigacional pelo lado activo, dúvidas não restam que a legitimidade para a acção executiva satisfaz-se com a alegação e prova da existência do acordo de cessão de crédito, o que ocorreu no caso sub judice, independentemente da sua notificação ao devedor, conforme menciona o Acórdão da Relação de Coimbra, datado de 22 de Novembro de 2016; Décima Primeira) Com o requerimento executivo, o exequente deve demonstrar a habilitação-legitimidade, alegando e provando os factos constitutivos da cessão, sendo que, no caso em apreço, não há dúvida que existiu um contrato que abarcou a cessão do crédito exequendo para a Recorrente, como se refere no requerimento executivo. Sendo que, Décima Segunda) A legitimidade activa da Recorrente para a acção executiva satisfez-se com a alegação e prova da existência do acordo de cessão de crédito, independentemente da sua notificação ao devedor; Décima Terceira) Tendo a ora Recorrente demonstrado a existência da cessão, tal bastaria para assegurar o prosseguimento da execução, sendo manifesta a sua legitimidade activa, ao abrigo do disposto no artigo 54º, nº1 do Código de Processo Civil, pelo que, não sendo a notificação do devedor facto constitutivo do direito da Recorrente, mas mera condição de eficácia da cessão em relação aos Recorridos, não é admissível que se associe tal notificação da cessão de créditos à causa de pedir, extrapolando para a respectiva falta. Sendo a causa de pedir o facto jurídico de onde emerge a pretensão da Recorrente (artigo 581º, nº 4 do Código do Processo Civil) e confundindo-se tal pressuposto processual com o próprio título executivo, importa sublinhar, mais uma vez que, a notificação dos Recorridos é irrelevante para a modificação da relação creditícia no que concerne ao elemento subjectivo, produzindo-se esta a partir da outorga do acordo...

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