Acórdão nº 849/04.5TBCNT.C3 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL CAPELO
Data da Resolução26 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Relatório Nos autos de processo declarativo comum com forma de processo ordinário em que é autora “I..., Lda.”, e réus P... e mulher, M..., a demandante pediu a condenação dos demandados no pagamento da quantia global de €35.828,73, acrescida de juros de mora vencidos desde a data da tentativa de cobrança extrajudicial de tal montante, em 24 de Março de 2004 – juros aqueles que, em 3 de Junho de 2004, ascendiam ao valor de € 7.613,60 –, e dos vincendos até efectivo e integral cumprimento, calculados à taxa legal vigente para os créditos comerciais.

Sustenta para o efeito que se dedica à execução de trabalhos de construção civil com carácter lucrativo e haver celebrado com o Réu, em 20 de Janeiro de 2003, um contrato de empreitada para a realização do alvoramento e acabamentos de uma moradia unifamiliar, pelo valor de €40.901,00 a que acresceria o montante devido de I.V.A., sendo o prazo de execução do contrato de 12 meses, com início em 15 de Julho de 2003.

Os trabalhos não enunciados no caderno de encargos seriam considerados como “trabalhos extras”, não incluídos no preço inicial, com respectiva liquidação adicional.

O valor da empreitada seria liquidado em diversas prestações, consoante o andamento dos trabalhos e na execução do convencionado no contrato e à medida que a obra ia avançando, foram emitidas pela demandante e entregues ao Réu as facturas, sendo ainda realizados alguns trabalhos não considerados no contrato inicial, os quais foram também orçamentados e facturados pela A..

Totalizando o conjunto das facturas o montante de €75.828,73, agora já com I.V.A. incluído, acontece que até 3 de Junho de 2004 só procederam os Réus ao pagamento de €40.000 à A. por conta das mesmas facturas.

Face ao não pagamento, por parte dos demandados, das quantias devidas à A., suspendeu esta os trabalhos em 24 de Março de 2004.

Tentada a cobrança extrajudicial da dívida na referida data de 24 de Março de 2004, e perante a sua recusa de pagamento, incorreram os Réus em mora.

Na contestação os réus sustentam que a demandante não terminou os trabalhos acordados, abandonando a obra sem qualquer razão atendível e sem sequer proceder aos trabalhos de limpeza e à remoção do entulho (madeiras, ferro, papéis, areias, cimentos) acumulado no exterior da obra e dentro desta, deixando-a em um verdadeiro “caos”, trabalhos a que os Réus tiveram de proceder a expensas suas, após a atitude de evidente incumprimento contratual por parte da demandante.

Os trabalhos assumidos no caderno de encargos foram defeituosamente executados, e os caracterizados pela A. como “extras” foram, em alguns casos, também efectuados com defeitos e, em outros casos, realizados sem o consentimento dos Réus e à total revelia do caderno de encargos.

Assim, desde a cave até ao telhado, passando pelo primeiro andar da moradia, existe nos trabalhos efectuados pela demandante todo um conjunto de falhas e defeitos de execução (devidamente enunciados na douta contestação), que até hoje não foram reparados pela A..

Os Réus deduziram reconvenção pedindo o decretamento da resolução do contrato de empreitada em causa por incumprimento da A., a qual abandonou os trabalhos imediatamente após a suspensão do contrato; para além disso, pugnaram também os reconvintes pela condenação da reconvinda a reconhecer os vícios, os defeitos e os erros de execução devidamente descritos, assim sendo condenada a pagar-lhes o custo da respectiva reparação, avaliados em quantia não inferior a €10.000; peticionaram ainda os mesmos reconvintes a condenação da reconvinda a suportar o pagamento do montante correspondente aos prejuízos que já tiveram e irão ter com a conclusão dos trabalhos de empreitada, para já no valor de €28.835,42; mas mais se dirigiu a reconvenção à condenação da A. no pagamento do montante que vier a ser liquidado em sede de execução de sentença se se verificar um aumento dos vícios, dos defeitos e dos erros de construção de que padece a moradia em consequência da actuação de incumprimento por banda da A. e também se se verificar qualquer pagamento de quantias não alegadas pelos reconvintes porque não previstas; por último, deverá ser a reconvinda condenada a pagar uma indemnização, igualmente a liquidar em execução de sentença, pelos danos não patrimoniais aos reconvintes causados.

A A. apresentou novo articulado dizendo que a obra não foi abandonada mas apenas suspensa pela replicante, já que o Réu não procedeu ao pagamento das facturas relativas aos trabalhos efectivamente prestados, além de que todas as alterações que houve ao caderno de encargos foram motivadas pelo facto de o Réu muitas vezes entender, depois de os trabalhos estarem efectuados, ou que não gostava do resultado final ou dos materiais aplicados, situação que, aliás, levou a um acordo mediante o qual os trabalhos ou materiais aplicados de novo seriam tratados e considerados como “extras” (casos da cave ou das telhas, por exemplo); os vícios invocados pelos Réus no seu não o são na realidade porquanto se tratam de trabalhos inacabados, dada a suspensão das obras motivada pela falta de pagamento das facturas (casos da fiada de tijolo ou do assento da cumeeira), ou se tratam de situações relativamente às quais o Réu nada decidiu (casos da chaminé, das telhas e das ravessas), decidiu modificar mais tarde (casos da substituição do material de impermeabilização por roof-mate, das mudanças em sede de tubagem e canalizações e tubagens de antena), ou são ilegais (casos da caixa de estore, dos pontos de luz e das caixas de electricidade) por não existir projecto.

Depois, nunca apontaram os reconvintes defeitos à obra, apenas o tendo feito no momento do pagamento das facturas que ora estão em causa na acção; é certo, além do mais, que nunca poderão pedir em sede de reconvenção a eliminação de supostos defeitos que previamente não foram denunciados em conformidade com a lei civil, assim faltando um pressuposto do direito de resolução que os Réus pretendem agora exercer.

Pelo exposto, deverá ser a acção julgada provada e procedente e, consequentemente, merecer a reconvenção formulada pelos Réus a total improcedência, da mesma sendo absolvida a A..

Os Réus apresentaram articulado de tréplica, através do qual disseram que tendo havido uma mera suspensão dos trabalhos inacabados pela A. e não uma sua conclusão, não podia haver (ou deixar de haver) aceitação da obra e, logo, não se pode falar em denúncia dos defeitos. Ora, a notificação da A. para os termos do pedido reconvencional – através do qual pretendem tornar efectivos os seus direitos de resolução do contrato e de ressarcimento dos danos por eles invocados – equivale à denúncia dos defeitos em questão.

Elaborado despacho saneador e a base instrutória veio a realizar-se julgamento e a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente provada e procedente decretando que: “- Condenam-se os Réus P... e M... a pagar à demandante “I..., Lda.” a quantia de € 3.362,06 (três mil, trezentos e sessenta e dois euros e seis cêntimos) (acrescida do pertinente I.V.A.), e inerentes juros de mora, à taxa legal vigente para os créditos comerciais, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento; - Absolvem-se os Réus do demais contra si peticionado nos autos pela A..

Custas da acção por A. e Réus, na proporção, respectivamente, de 5/6 e 1/6 (e sem prejuízo do apoio judiciário existente nos autos).

No mais, julgando-se a reconvenção parcialmente provada e procedente: - Declara-se a resolução do contrato de empreitada acima referido nos pontos 2 e 3 dos factos provados constantes da presente sentença, celebrado que fora entre o reconvinte P... e a reconvinda “I..., Lda.”; - Condena-se a reconvinda a pagar aos reconvintes a quantia indemnizatória de € 12.500 (doze mil e quinhentos euros) (acrescida do pertinente I.V.A.); - Condena-se a reconvinda a pagar aos reconvintes o montante compensatório por danos não patrimoniais de € 5.000 (cinco mil euros); - Absolve-se a reconvinda do...

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