Acórdão nº 5/16.0T9MGL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução27 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo n.º 5/16.0T9MGL, do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, Viseu – Juízo Inst. Criminal – Juiz 1, finda a fase de inquérito, o Ministério Público proferiu despacho final determinando o arquivamento dos autos quer relativamente ao denunciado crime de falsificação de documentos, quer quanto aos crimes de falsidade de depoimento e falsidade de testemunho, em relação ao primeiro por entender que «os factos imputados aos arguidos não consubstanciam a prática de qualquer crime de falsificação de documentos …», no que concerne aos segundos por não ter sido possível recolher indícios suficientes que permitissem concluir pela prática por parte dos arguidos «dos crimes de falsidade de depoimento (no caso da arguida C... ) e de falsidade de testemunho (no caso dos demais arguidos)» - [cf. fls. 279 a 284].

  1. Requerida que foi, pelo assistente A..

    . , a abertura da instrução, realizados os atos instrutórios teve lugar o debate instrutório, na sequência do qual, por despacho de 18.01.2017, o tribunal decidiu [transcrição parcial do dispositivo]: 1) Não pronunciar a arguida C... pelos factos que constam do RAI e pela prática de um crime de alteração de marcos, p.p.p. artigo 216.º, um crime de falsificação de documento, p.p.p. artigo 256.º, al. a) e d) e um crime de falsidade de depoimento, p.p.p. artigo 359.º, todos do CP; 2) Não pronunciar os arguidos E... , F... , G... e H... pelos factos que constam do RAI e pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p.p.p. artigo 360.º do CP.

  2. Inconformado com a decisão recorreu o assistente, formulando as seguintes conclusões: 1. O Assistente apresentou queixa contra os arguidos C... , E... , F... , G... e H... , imputando-lhe a prática de crimes de alteração de marcos, falsificação de documentos, falsidade de depoimento (no caso da arguida C... ) e de falsidade de testemunho (no caso dos demais arguidos).

  3. Tais factos foram praticados no âmbito do processo n.º 79/2015 do Julgado de Paz de Carregal do Sal, em que são demandantes A... (assistente nos presentes autos) e mulher B... e demandados C... e marido D... .

  4. Do ponto de vista fáctico, em causa está, para além do depoimento de parte e dos testemunhos prestados na audiência de julgamento do referido processo (crimes de falsidade de depoimento e de testemunho), a alegada colocação de objetos, o seu registo fotográfico e a sua apresentação no processo como prova (crime de falsificação de documentos).

  5. Fixa a lei que se tiverem sido recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou medida de segurança, o juiz pronuncia o arguido pelos factos respetivos – o artigo 283º, n.º 2, define como suficientes os indícios “sempre que deles resultar uma possibilidade razoável de ao arguido vir a ser aplicada, por força deles, em julgamento, uma pena ou uma medida de segurança”.

    Posto isto, 5. Do crime de alteração de marcos p.p.p. artigo 216.º do CP; 6. Sobre esta matéria, importa atentar ao disposto no artigo 216.º do Código Penal.

  6. Não é verdade que o assistente não tenha alegado os elementos objetivos e subjetivos do tipo legal em causa, nomeadamente, a existência anterior dos marcos.

  7. Para tal, basta atentar na queixa-crime apresentada.

  8. Para se concluir que foram alegados os elementos do tipo em causa.

  9. De facto, como alegado e documentado, a arguida C... , com intenção de apropriação de coisa móvel alheia (prédio de que o assistente é proprietário), para si, arrancou e alterou os marcos.

  10. Isso mesmo, aliás, resulta do documento que ora se junta e cujo teor se dá por reproduzido.

  11. Trata-se de um auto de ocorrência, elaborado pela GNR.

  12. Como resulta dos mesmos, 7 de Janeiro de 2015, a aqui arguida, afirmou “agora estava a delimitar o caminho com dois pilares, mais pequenos que os penedos que ali estavam antigamente” e, “andavam por conta da Sra Lusitania”.

  13. Neste documento está concretizado e confessado a existência de uma anterior marco, colocado, alterado pela arguida.

  14. Alegados e provados os elementos do tipo em causa: a. A existência de marcos, b. A sua alteração, c. A intenção de apropriação de terreno, por parte da arguida.

  15. Provado que foi a arguida C... que colocou o ferro com arame e uma argola, bem como dois pilares sustentados numa cancela.

  16. Deve, como se requer, a arguida C... ser acusada, julgada e condenada pelo crime de alteração de marcos.

  17. E quanto aos crimes de falsificação de documentos, de falsidade de testemunho, de falsidade de depoimento p.p.p. artigo 359.º do CP, dir-se-á: 19. Assente que as fotografias elaboradas pela Arguida C... , são documentos nos termos e para os efeitos do artigo 255.º, alínea a), 20. Importa, também, dar por assente, pela prova carreada para os autos, que as mesmas fotografias são documentos falsos.

  18. E são documentos falsos porque, retratam uma “realidade fabricada”.

  19. Retratam um cenário que nunca existiu, e que foi composto para que as fotografias pudessem ser elaboradas.

  20. Para que as mesmas fotografias pudessem ser apresentadas em Tribunal como meio de prova.

  21. E a montagem desse cenário concretizou-se com a criação de Marcos, como resulta da alínea g) do artigo 202º do Código Penal.

  22. E patente a contradição entre o depoimento das testemunhas inquiridas em sede de inquérito e o depoimento dos arguidos, proferido na audiência de julgamento.

  23. Em sede de audiência de julgamento vieram os arguidos atestar a existência de dois pilares em pedra sustentando uma cancela impedindo o acesso à propriedade do seu legítimo dono e possuidor.

  24. Como vieram declarar ter existido na extrema da propriedade, um muro de pedra que recentemente teria sido retirado, e impedia o acesso à propriedade e à casa, e que o mesmo acesso seria feito no lado norte (extrema norte).

  25. Tudo declarações que foram contrariadas pelo depoimento das testemunhas inquiridas no presente processo, em sede de inquérito.

  26. Não se trata, como se conclui, em nosso modesto entender, de “duas versões distintas”, mas, antes, uma verdadeira e uma falsa.

  27. O que, além do mais, resulta do facto de a referida extrema norte ser uma encosta com um desnível superior a três metros de altura.

  28. Facto que por si só põe em evidência a falsidade dos depoimentos prestados neste ponto.

  29. Falsidade que resulta, ainda, das duas fotografias aéreas tiradas pelo Exército Português datadas, uma de 1965 e outra de 1974, e obtidas junto dos serviços competentes, evidenciando a inexistência do muro, cancela, ferro e arames que 33. os arguidos afirmaram existirem no local desde sempre.

  30. Também estes documentos, e por si só, põem em evidência a falsidade das declarações prestadas pelos arguidos na audiência de discussão e julgamento.

  31. Documentos que não foram sequer valorados no despacho de arquivamento.

  32. E, novamente, erradamente, em nosso modesto entender, também, agora, não foram valorados pelo Senhor Juiz de Instrução.

  33. Não se trata de duas versões distintas, sem mais.

  34. Trata-se de versão falsa, por parte da arguida, declarada e testemunhada por todos os arguidos, sustentada em depoimentos e documentos falsos com alteração de marcos.

  35. De outro modo, se apenas existem versões distintas, então, nunca existirá a prática dos crimes denunciados.

  36. Os arguidos cometeram os crimes denunciados.

  37. Sendo que, a prática desses crimes, está devidamente evidenciado nos autos, testemunhal e documentalmente.

  38. A Arguida C... por forma a adulterar a verdade dos factos em discussão, colocou um ferro com um arame e uma argola no local objeto dos autos por forma a enganar o Tribunal, pretendendo criar a convicção de que o dito arame serviria para prender uma alegada cancela, qua ali nunca existiu (cfr. documento nº 3, 4 e 5 juntos com a denúncia, cópias das fotografias juntas pela Arguida e por esta identificadas como Documentos 4, 5 e 6).

  39. A mesma Arguida, e ainda com o intuito de adulterar a verdade dos factos, colocou também dois pilares em pedra sustentando uma cancela – também por si colocada e fechada a cadeado – impedindo o acesso à propriedade do seu legítimo dono e possuidor. (cfr. Documento nº 6 e 7 juntos com a denúncia, cópias das fotografias juntas pela participada e por esta identificadas como Documentos 1 e 3, bem como, de novo, os documentos 3 e 4).

  40. Após as Arguidas C... e E... fotografaram o cenário que assim criaram, com o intuito concretizado de juntarem aquelas fotografias ao processo que então corria termos no Julgado de Paz de Carregal do sal.

  41. Os Arguidos (todos) declararam depois em audiência de discussão e julgamento que aqueles Marcos (o ferro com um arame e uma argola bem como dois pilares em pedra sustentando uma cancela) sempre existiram naquele local.

  42. Bem como, ao afirmarem nunca ali ter existido passagem para o Sr. I... .

  43. E mais ainda, afirmando ter existido na extrema desta propriedade, um muro de pedra que recentemente teria sido retirado, e impedia o acesso à propriedade e à casa, e que o mesmo acesso seria feito no lado norte (extrema norte).

  44. Isto quando na extrema norte a encosta junto ao caminho tem mais de 3 metros de altura.

  45. Todos os arguidos sabem que tudo quanto testemunharam em audiência de julgamento é falso.

  46. E com a mesma falsidade, afirmaram ainda que o Sr. I... era um homem solteiro, quando este na verdade era casado e pai de sete filhos.

  47. A Arguida C... , cometeu com esta relatada conduta um crime de alteração de marcos, previsto e punido pelo artigo 216º, em concurso com um crime de falsificação de documento previsto e punido pela artigo 256º, alíneas a) e d) e um crime de falsidade de depoimento, previsto e punido pelo artigo 359º, todos do Código Penal.

  48. Os Arguidos E... , F... , G... e H... , cometeram, com a relatada conduta um crime de falsidade de testemunho, previsto e punido pelo artigo 360º do Código Penal.

    Termos em que, por violação do legalmente disposto...

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