Acórdão nº 2933/12.2TBCLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução26 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I.

Relatório A..., casado, residente na Rua ..., M..., solteira, maior, residente na Rua ..., e J..., casado, residente na Rua ..., instauraram contra R... & C.ª Lda., com sede na Rua ..., acção declarativa, pedindo a final: - fosse reconhecia a cessação do contrato de arrendamento tendo por objecto o imóvel que identificaram, por denúncia dos senhorios efectuada nos termos da al. c) do art.º 1101.º do CC, aplicável ex vi do disposto no art.º 26.º do NRAU, na sua redacção original, e, consequentemente, - fosse a ré condenada a despejar e a entregar aos Autores de imediato, livre e devoluto, o mesmo imóvel, e ainda a indemnizá-los à razão de €500,00 por cada mês de ocupação indevida desde o dia 1 de Novembro de 2012 e até à entrega do imóvel, sendo devida a este título a quantia já liquidada de €1 000,00.

Em fundamento alegaram, em síntese, que são os donos do prédio urbano sito na Rua ..., o qual foi objecto de contrato de arrendamento para comércio celebrado verbalmente entre os antepassados dos autores e a ré cerca dos anos de 1964/1965.

Ocorre, porém, que a ré, por deliberação de 17 de Abril de 2007, veio a aumentar o seu capital social em €15.000,00, aumento integralmente subscrito por um novo sócio, no caso a sociedade “M..., Lda” que, em consequência de tal subscrição, passou a ser a sócia maioritária, tendo o seu gerente sido igualmente nomeado gerente da locatária. A descrita situação, apesar de não assumir a forma de uma transmissão de quotas, implicou contudo uma radical alteração da estrutura societária, dominada pela nova sócio, constituindo fundamento de denúncia do contrato de arrendamento à luz do disposto na al. b) do n.º 6 do art.º 26.º da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, direito potestativo que os AA. exerceram, observando os requisitos previstos na lei.

Não obstante a denúncia e subsequente confirmação efectuadas pelos AA., a Ré não procedeu à entrega do imóvel, ocupação ilícita que vem causando os prejuízos decorrentes da privação do locado, o qual produziria um rendimento não inferior a €500,00 mensais, por corresponder ao seu valor locativo.

Citada a ré, apresentou a contestação que consta de fls. 61 a 64 dos autos, peça na qual defendeu que a entrada de um novo sócio assentou na necessidade que se fazia sentir de se viabilizar financeiramente, tal como ficou a constar da acta da AG levada a cabo para o efeito, situação que não integra a previsão legal. E por assim entender, não aceitou a denúncia que lhe foi comunicada, tal como de imediato deu a conhecer aos AA mediante carta então enviada, de que é expressão o facto de ter continuado a pagar as rendas, o que ocorre até ao presente.

Reputando em todo o caso de excessivo o montante reclamado a título de indemnização, concluiu pela total improcedência da acção.

Os AA responderam, impugnando que após a data da cessação do contrato tenham recebido da ré qualquer quantia a título de pagamento de rendas, sendo certo que não a podem impedir de proceder ao envio de vales postais, conforme vem acontecendo.

Teve lugar a audiência prévia e nela, frustrada a tentativa de conciliação, foi determinado o prosseguimento dos autos com prolação de despacho saneador, fixação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova, peças não reclamadas.

Realizou-se a audiência de julgamento, no âmbito da qual teve lugar a diligência de inspecção ao local, tendo-se a Mm.ª juíza feito acompanhar de um Sr. Eng.º Técnico Civil, que elaborou o relatório que consta de fls. 133 a 142.

Vieram entretanto os AA, em articulado superveniente, alegar ter tomado conhecimento na audiência que as quotas antes detidas pelos primitivos sócios haviam sido cedidas ao gerente da ré, J..., cessão de quotas consumada em 6 de Setembro de 2007, embora apenas levadas a registo por meio de depósito efectuado no ano de 2012, daqui resultando que à data em que os AA denunciaram o contrato, por força da transmissão das quotas já então existente mas só agora conhecida, a totalidade do capital social da locatária havia sido transmitido, o que constitui fundamento da denúncia do contrato, ainda que se considere a interpretação mais restritiva do preceito defendida pela Ré.

Mais sublinhou que com a sua descrita conduta o gerente da ré, que era simultaneamente o cessionário das quotas, ao não proceder ao registo da transmissão, impediu que ela fosse conhecida de terceiros, incluindo os AA., durante mais de cinco anos, ao que acresce o facto da ré, aquando da sua demanda para a acção, ter continuado a ocultar o facto, defendendo-se como se a composição do capital social fosse aquela que os AA., em erro, haviam indicado na petição.

Tal conduta da ré, por violadora dos deveres de colaboração e verdade que lhe são legalmente impostos, configura, no entender dos demandantes, litigância de má-fé, impondo-se a condenação daquela em multa e indemnização que cubra todas as despesas e encargos em que estes incorreram, incluindo os honorários ao mandatário que os representa, em montante a apurar.

Respondeu a ré, negando que a transmissão das quotas tenha ocorrido em Setembro de 2007, data em que os antigos sócios entenderam por bem ficar de posse de um contrato de cessão, destinado apenas a prevenir que, dada a sua posição minoritária, em qualquer altura poderiam transmitir as quotas sem que para tal fosse necessária a autorização da nova sócia sociedade. Tal contrato, todavia, veio a produzir os seus efeitos apenas em Outubro de 2012, donde não assistir razão aos AA., sendo inverdadeiros os factos alegados em sede de articulado superveniente, não se justificando, consequentemente, qualquer condenação por litigância de má-fé.

Encerrada a audiência de discussão e julgamento, veio a ser proferida douta sentença que, na parcial procedência da acção: “a) julgou válida e eficaz a denúncia do contrato de arrendamento do prédio urbano sito na Rua ... com efeitos a partir do dia 1 de Novembro de 2012 inclusive; b) condenou a ré a despejar e a entregar aos Autores o arrendado livre de pessoas e bens; c) condenou a Ré a pagar aos Autores a quantia de 410€ mensais desde o dia 1 de Novembro de 2012 até à efectiva entrega do locado”.

Inconformada, recorreu a ré e, tendo desenvolvido em sede das alegações apresentadas as razões da sua discordância com o decidido, reproduziu-as a final de forma escusada nas conclusões, de que se destacam as seguintes: ...

Com tais fundamentos, pretende a revogação da sentença apelada e sua substituição por acórdão que julgue a acção inteiramente improcedente absolvendo a apelante dos pedidos formulados.

Contra alegaram de forma esclarecida os apelados e, sustentando a manutenção do julgado, concluíram como segue: ...

Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, temos como única questão sujeita à apreciação deste Tribunal determinar se os AA, tal como foi reconhecido, denunciaram validamente o contrato de arrendamento celerado com a ré.

  1. Fundamentação De facto Não tendo sido impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto, é a seguinte a factualidade a atender (aqui se tendo incluído outros factos tidos por pertinentes e que, por se encontrarem assentes nos autos, deverão ser considerados, como impõe o n.º 4 do art.º 607.º do CPC, “ex vi” do disposto no n.º 2 do art.º 663.º, sendo ambos os preceitos do CPC): 1. Os Autores são proprietários do prédio urbano sito na Rua...

  1. Em data que não foi possível apurar, mas cerca dos anos de 1963-1964, foi o prédio supra identificado objecto de arrendamento para comércio celebrado entre os antepassados dos Autores na qualidade de Senhorios e a Ré na qualidade de arrendatária.

  2. O contrato de arrendamento referido em 2. foi...

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