Acórdão nº 152/14.2GAMMV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução20 de Abril de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo comum com intervenção do tribunal singularda Comarca de COIMBRA- Instância Local de Montemor-o-Velho–Secção de Competência Genérica – Juiz 1.

*** Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra: I- Relatório No processo supra identificado foi deduzida acusação contra a arguida, A...

, solteira, sem profissão, nascida em 31/7/1985, natural da freguesia da (...) , Coimbra, filha de (...) e de (...) , residente na (...) , Montemor-o-Velho, imputando-lhe a prática de um crime de ofensa à integridade física simples e de um crime de introdução em lugar vedado ao público, p. e p. respectivamente, pelos artigos. 143.º n.º1 e 191.º, ambos do Código Penal (CP).

* A assistente B...

deduziu ainda acusação contra a arguida, imputando-lhe a prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181º, n.º, 1. do CP.

* A assistente deduziu pedido de indemnização civil contra a arguida, pedindo a condenação da mesma a pagar-lhe a quantia de € 2.999,77, acrescida de juros de mora á taxa legal, contados desde a data da notificação até efectivo e integral pagamento, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos em consequência da conduta da arguida.

* O CHUC, EPE, deduziu pedido de reembolso contra a arguida, pedindo a condenação da mesma a pagar-lhe a quantia de € 117,07, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.

* A arguida apresentou contestação escrita oferecendo o merecimento dos autos, e alegando que sofre de esquizofrenia, doença que lhe provoca descompensações súbitas e inesperadas, as quais estão na origem de alguns episódios mais violentos, e pediu a sua absolvição quanto aos pedidos de indemnização civil, alegando para tanto que não cometeu os crimes de que vem acusada.

* Ao abrigo do disposto nos arts. 159.º e 160.º do Código de Processo Penal (CPP), foi determinada a realização de perícia médico-legal psiquiátrica e sobre a personalidade da arguida, com vista à avaliação da sua personalidade, perigosidade, grau de socialização, inimputabilidade ou grau de imputabilidade.

* O tribunal decidiu: 1.

Ao abrigo do disposto no artigo 20.º, do CP, declarar a arguida inimputável, em razão de anomalia psíquica.

  1. Ao abrigo do disposto nos artigos 40.º, 91.º, n.º 1, e 98.º, nºs 1, 3 e 4 do Código Penal, impor à arguida a medida de internamento por um período mínimo de um ano, suspensa na sua execução, mediante as seguintes regras de conduta:

    1. Submeter-se a tratamento médico psiquiátrico, frequentar as consultas com a periodicidade que lhe for exigida, seguir as prescrições e tratamentos médicos ordenados.

    2. Aceitar a “vigilância tutelar” e o acompanhamento da DGRS da área da sua residência e comparecer perante a DGRS sempre que tal lhe for ordenado.

  2. Julgar improcedente o pedido de indemnização civil deduzido pela assistente contra a arguida e, consequentemente, absolveu a mesma do pedido.

  3. Julgar improcedente o pedido de reembolso deduzido pelo CHUC- EPE, contra a arguida e, consequentemente, absolveu a mesma do pedido.

    * Inconformada recorreu a assistente B... , o qual pugna pela modificação da sentença recorrida, devendo ser substituída por outra que determine o cumprimento da medida de internamento sentenciada, bem como julgar procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela recorrente, a qual formula, as seguintes conclusões: «1.º - O Tribunal de primeira instância proferiu sentença decidindo declarar a arguida inimputável, impondo-lhe a medida de internamento por um período mínimo de um ano, suspensa na sua- execução, absolvendo-a do pedido de indemnização civil deduzido pelaassistente.

    1. - Não pode contudo a assistente B... conformar-se com a douta decisão proferida, quer pela suspensão da execução da medida de internamento, quer pela absolvição do pedido de indemnização civil.

    2. - No que se refere ao internamento da arguida, a medida foi-lhe imposta por um período mínimo de um ano.

    3. - Porém, tal medida foi suspensa na sua execução.

    4. - Com o devido respeito, e salvo melhor opinião, tal suspensão não deveria ter ocorrido.

    5. - Conclui-se na fundamentação da douta sentença pela perigosidade da arguida, em virtude da mesma ser pessoa de quem se espera, se nada for feito e dadas as características da sua doença mental, o cometimento no futuro, de outros factos ilícito-típicos da mesma espécie ou natureza.

    6. - No mesmo sentido, na avaliação clínica e parecer psiquiátrico-forense constantes no relatório de perícia psiquiátrica médico-legal, é recomendado que se recorra se necessário numa primeira fase ao seu internamento, visando influenciar positivamente o prognóstico do caso e, igualmente, prevenir o seu eventual envolvimento em outros ilícitos típicos, isto porque a arguida padece de doença bipolar, e quer em fase maníaca quer em fase depressiva, isto é, em fase de descompensação, está incapacitada de perceber o alcance dos seus actos e de se determinar.

    7. - Ora, a existência de um conflito latente com a assistente B... , sendo esta sua vizinha e com quem inevitavelmente se irá cruzar amiúde, poderá levar a arguida, em fase de descompensação, a praticar acções violentas como as que se julgaram nos autos, a que de resto já esteve em vias de se concretizar, pese embora tal factualidade não conste dos autos.

    8. - A suspensão da execução da medida de internamento só pode ter lugar se for razoavelmente de esperar que através dela se alcança a finalidade da protecção de bens jurídicos através da reintegração do agente na sociedade e eliminação da sua perigosidade.

    9. - No caso vertente, salvo melhor opinião está em crer a assistente que a mera pendência do processo não é suficiente para levar a arguida a modificar a sua atitude, abstendo-se de praticar novos actos ilícitos e aceitar ser tratada, que a liberte da perigosidade eminente que oferece para a assistente, atento o referido na perícia médico-legal que recomenda o internamento numa fase inicial, motivo porque pugna pela execução da condenação, ao invés da sua suspensão.

    10. - Assim, salvo o devido respeito, não se verificam no caso dos autos quaisquer circunstâncias de que se possa concluir que através da suspensão da execução da medida de internamento possam alcançar-se as finalidades desta.

    11. - Pelo que, ao decretar tal suspensão, a douta decisão ora recorrida violou o disposto no artigo 98.º, n.º 1, do Código Penal.

    12. - Quanto ao pedido de indemnização civil deduzido pela assistente, foi o mesmo julgado improcedente, sendo a arguida absolvida do pedido.

    13. - Também aqui, e com o devido respeito, a decisão deveria ter sido de sentido inverso.

    14. - Com efeito, resultou provado que a arguida praticou os factos pelos quais vinha acusada, pois com o seu comportamento preencheu a tipicidade objectiva dos crimes de ofensas à integridade física simples, de introdução em lugar vedado ao público, e de injúria, previsto e punidos, respectivamente, pelos artigos 143.° n.º 1, 191.º, e 181.º, n.º l, todos do Código Penal.

    15. - Conforme exarado na sentença do Tribunal a quo, verifica-se a ocorrência dos pressupostos do dever de indemnizar: acto ilícito praticado pela arguida e nexo de casualidade adequada entre o facto ilícito e o dano.

    16. - Não existindo ninguém que estivesse obrigado à vigilância tutelar da arguida que pudesse ser responsabilizado pelo prejuízo causado à ora recorrente, verificou o Tribunal a quo se teria a assistente direito a indemnização com base no critério da equidade previsto no art.489.°, do Código Civil.

    17. - E entendeu que não, por concluir que resultou provado que a arguida não tem bens nem rendimentos, e que as condutas da mesma não são particularmente graves.

    18. - Ora, salvo o devido respeito, não pode a arguida partilhar deste entendimento.

    19. - Entre as razões de equidade avulta a necessidade do lesado e a possibilidade do inimputável, conforme assertivamente é afirmado na douta decisão ora recorrida, e que fundamenta o julgamento, pelas conclusões a que chega relativamente a essas duas questões.

    20. - Contudo, em nenhum dos pontos da matéria provada, se refere a não existência de bens titulados pela arguida, ou que a arbitragem de uma indemnização civil à ora requerente, privaria a pessoa não imputável dos alimentos necessários.

    21. - E não refere, o motivo do escrutínio de tais questões nunca haverem sido, conforme se infere da matéria provada, uma questão cujo mérito tivesse sido apreciado.

    22. - Aliás, pelo conhecimento dos autos, o que se pode concluir é por uma situação económica da ora requerente que merece apoios sociais, traduzida no apoio judiciário de que beneficiou, podendo igualmente beneficiar de outros, como o rendimento social de inserção.

    23. - Em termos doutrinários, cita o Tribunal a quo Antunes Varela (Das Obrigações em Geral, 7.ª ed., Vol. I, pág.557) quando nos ensina: porque o agente tenha bens por onde responder, porque o lesado tenha ficado em situação económica difícil situação económica, porque seja avultado o montante do prejuízo, porque seja particularmente grave a conduta do agente ou séria a violação cometida.

    24. - Em face de tal, entende a ora recorrente, que no caso sub judice, salvo melhor opinião, não se concluir dos autos quer a inexistência de bens por parte da arguida por onde responder, quer a situação económica em que ficou, a lesada.

    25. - Podemos sim concluir pela conduta particularmente grave da arguida, na medida em que os factos que praticou ofendem bens que estão sob tutela jurídica, constando do catálogo dos crimes.

    26. - E quanto ao montante do prejuízo, reputa-o a recorrente de avultado, na medida em que apenas a soma dos valores constante na matéria de facto, não considerando os danos não patrimoniais, ascende a valores que representam mais do que os seus rendimentos de um mês inteiro.

    27. - Ora, existindo contradição entre o que é dado como provado e o que é referido como fundamentação da douta decisão, salvo melhor e mais sabia opinião estamos perante uma...

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