Acórdão nº 1751/13.5TBACB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL CAPELO
Data da Resolução15 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório L... veio, por apenso à execução comum intentada por S... deduzir oposição à execução.

Para o efeito alegou, e em síntese, que: - O embargante é credor do embargado pelas quantias devidas a título de honorários e despesas por serviços prestados nos valores de €46.750,00, €8.500,00 e €400,00, respectivamente: - As referidas notas de despesas e honorários foram remetidos ao embargado por correio registado; - O embargante, para garantia do pagamento das despesas e honorários devidos pelos serviços prestados, goza do direito de retenção sobre os valores recebidos e a entregar ao cliente; - O embargante invocou junto do embargado a compensação dos seus créditos; - Em consequência, deve reconhecer-se o direito de retenção invocado e, em consequência, ser declarada, por compensação, a extinção do crédito do exequente até ao valor de €68.395,50.

Contestando, o exequente veio alegar que se encontram prescritas as quantias reclamadas a título de honorários e despesas, as quais, inclusive, foram pagas na sequência do acordo celebrado entre embargante e embargado.

- Mesmo que o crédito a título de honorários e despesas do embargante perante o embargado existisse, deve considerar-se que o valor dos mesmos excede os parâmetros gerais de fixação de honorários.

Realizada tentativa de conciliação, sem resultado, os autos prosseguiram tendo sido elaborado despacho saneador.

Após ter sido proferido despacho saneador, o embargado por requerimento de fls. 52 a 55 requereu a rectificação do seu art. 23 da contestação para que passasse a ter a seguinte redacção: “ 23 - Assim sendo: a) embora se reconheça a existência do dito mandato conferido pelo Embargado; b) considerando que o Embargado já havia efectuado o pagamento dos honorários do Embargante, pois, o Embargante informou o Embargado que: i) o valor da indemnização recebida no processo do acidente de trabalho (Processo n.º ...) era de, aproximadamente, €71.000,00 – e não no valor real de €171.630,13, que o Embargante recebeu em nome do Embargado; ii) que os honorários que eram devidos ao Embargante por todos os serviços prestados e que o Embargante conservaria para si do montante de €71.000,00 somente (alegadamente!) recebido correspondiam ao valor da diferença dos €71.000,00 para os €64.000,00 que foram transferidos pelo Embargante ao Embargado em 2008.03.07 (ou seja, os seus honorários seriam no valor de €7.000,00 e não de); c) o Embargante, sem qualquer motivo ou critério válido, conservou para si quantia muito superior à quantia que havia combinado com o Embargado, tendo o Embargado só sabido do que lhe havia sido ocultado – ou seja, que o valor da indemnização resultante do acidente de trabalho era de €171.630,13 e não de €71.000,00 - após o seu divórcio, a propósito do qual foi feito um levantamento do património e dos créditos do mesmo em Portugal por parte do Exmo. Senhor Dr. ... (nomeadamente, dos créditos emergentes do acidente de trabalho em causa).

d) O Embargante não fixou os seus honorários conforme os critérios do n.º 3 do artigo 100.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, pois os serviços solicitados e efectivamente prestados, a dificuldade e urgência do assunto, o grau de criatividade intelectual da prestação, o resultado obtido, o tempo efectivamente despendido, as responsabilidades assumidas e os usos profissionais não legitimam o valor ainda peticionado a título de honorários.” ...

Tendo-se o embargante oposto à rectificação do art. 23 da contestação e ao aditamento de nova testemunha, o tribunal por despacho de fls. 61 decidiu nos seguintes termos: “a) Defere-se o requerido quanto à notificação da testemunha L...; b) Admito o requerido aditamento ao rol de testemunhas, designadamente, da testemunha O..., ao abrigo do disposto no artigo 598.º, do CPC, a qual será a apresentar.” Realizado o julgamento proferiu o tribunal de primeira instância sentença em que julgou “os presentes embargos de executado totalmente improcedentes, com o consequente prosseguimento da execução.” Inconformado com esta decisão dela interpôs recurso o embargante concluindo que: ...

Não houve contra alegações Cumpre decidir.

Fundamentação O tribunal deu como provada a seguinte matéria de facto: … Além de delimitado pelo objecto da acção, pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (arts. 635 nº3 e 4 e 637 nº2 do CPC).

De acordo com o que deixamos dito, o objecto do presente recurso é o de decidir se se verifica ou não a prescrição presuntiva do crédito invocado pelo embargante e que o tribunal recorrido entendeu ocorrer, e com base na qual julgou improcedentes os embargos e, subsequentemente, conhecer o mérito do pedido do embargante.

Como advertência preliminar, observa-se que no recurso o apelante reclama, para interpretação da defesa do embargado/exequente, o teor do requerimento apresentado por este quando pretendia rectificar o art. 23 da contestação de embargos, protestando o recorrente que, segundo as próprias declarações do exequente vertidas nesse requerimento, o montante dos honorários por si em dívida ao executado seria apenas de 7.000,00 €. E acrescenta, justificando, que “embora sobre o pedido de rectificação apresentado (…) não tenha havido decisão da Mma. Juiz a quo, o comportamento por si evidenciado ao longo do processo é contraditório e incompatível com a presunção de cumprimento alegado.” Tomando aqui esta questão exposta, exclusivamente na sua densidade processual, isto é, no sentido de decidir se é admissível às partes, neste caso o embargante, socorrer de matéria de facto alegada em requerimento apresentado pela parte contrária, sem que o tribunal a quo se tenha pronunciado sobre a sua admissão, é um facto que sobre o aludido pedido de rectificação do art. 23 da contestação aos embargos o tribunal não se pronunciou e contra esta não pronúncia não houve arguição de nulidade.

Bastará confrontar o teor do art. 23 da contestação de embargos original e o teor do que se pretendia rectificado para se concluir que não se tratava de qualquer correcção de lapsos de escrita ou materiais mas sim de reescrever esse artigo com matéria de facto nova.

Nos termos do art. 195 nº1 do CPC, fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita ou a omissão de uma formalidade que a lei prescreva só produzem a nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame ou na decisão da causa. E tais nulidades têm de ser reclamadas para que delas o juiz possa conhecer (art. 196 nº1 CPC), reclamação que deverá ser feita no prazo de dez dias a contar do momento em que a parte, depois de ela ter sido cometida, interveio em qualquer acto no processo e quando deva presumir-se que então tomou dela conhecimento ou dela pudesse ter tomado conhecimento agindo com a devida diligência (art. 199 e 149 nº1 do CPC).

Nesta conformidade, se entendia o recorrente que o tribunal de primeira instância havia cometido uma nulidade, traduzida na omissão de pronúncia sobre a admissão do requerimento de rectificação do art. 23 da contestação de embargos, deveria ter arguido essa nulidade no prazo de 10 dias a contar da data em que foi notificado do despacho de 8 de maio de 2014, por ela não ser do conhecimento oficioso nem ter sido praticada na sua presença (art. 199 nº1 CPC). E não o tendo feito, ficou essa eventual nulidade sanada sendo de todo impertinente e legalmente inadmissível vir aludir agora, em recurso, ao que conste de requerimento que não foi admitido ou sobre o qual não tenha havido decisão de admissão, sem a consequente arguição de nulidade por omissão.

Nestes termos, a matéria que serve a presente decisão é apenas a que nos autos foi dada como provada e não provada e que não sofreu impugnação, sendo que a referência para o que possa ter sido alegado nos articulados das partes não comporta o teor do requerimento em que o embargado pretendeu alterar a redacção do art. 23 da sua contestação.

O embargante invoca como fundamento de oposição à execução a compensação nos termos dos arts. 847 e ss do CCivil.

Embora neste momento não se possa já questionar a admissibilidade legal de o embargante pretender exercer a compensação em execução[1] por rigor lógico e metodológico esta matéria merece pela sua importância e contexto uma breve referência.

De facto, já se entendeu, na vigência do anterior CPCivil, que por ser inadmissível a dedução de reconvenção em oposição à execução, a compensação não podia aqui ser invocada; ou, dito doutro modo, para a compensação poder ser invocada teria a existência do contra crédito e os requisitos substantivos da compensação que estar provados por documento com força executiva[2]. Não julgamos que assistisse razão a este entendimento uma vez que, quer o contracrédito invocado seja igual ou inferior, quer seja superior ao do exequente, é “permitido deduzir a excepção de compensação, seja como objecção (no caso de já extrajudicialmente ter declarado querer compensar), seja como excepção propriamente dita (no caso de essa declaração ser feita na petição de embargos).”[3] E hoje, no CPC saído da reforma de 2013 o art. 729.º/h admite expressamente a compensação como fundamento de oposição embora no art. 266.º/2/c), se estabeleça que a compensação passa a ter que ser sempre deduzida por reconvenção.

Assim, julgando que é inteiramente admissível a invocação de um contracrédito compensável na oposição à execução importa esclarecer que essa invocação não é livremente alegável e demonstrável, uma vez que a lei processual no citado art. 729, als. g) e h) dispõe que, sendo a execução fundada em sentença, os factos extintivos ou modificativos da obrigação têm que ser posteriores ao encerramento da discussão no processo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT