Acórdão nº 741/16.0T8LRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução06 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

D (…), apresentou-se a processo especial de revitalização.

Alegou para o efeito estar numa situação económica difícil, mas que ainda assim reunia as necessárias condições para a sua recuperação.

Foi proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, nos termos do art.27.º n.º 1 al. b) do CIRE, a que o requerente respondeu positivamente.

Foi nomeado administrador judicial provisório nos termos do disposto no art.17-C nº 3, al. a) do CIRE tendo junto oportunamente a lista provisória de créditos, a qual veio a ser convertida em definitiva por inexistência de impugnações.

O prazo de dois meses para conclusão das negociações foi prorrogado por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre administrador judicial provisório e o devedor – cfr. nº 5 do art. 17-D do CIRE.

Prosseguiu o processo com vicissitudes várias.

Designadamente por o devedor não ter salvaguardado aos credores institucionais um prazo mínimo de 10 dias para avaliação e votação do plano de revitalização e que mereceu a reação do Banco Portugal, S.A., por meio da apelação documentada a fls.145 e ss que, posteriormente, deixou cair.

Ademais tendo sido verificada a falta de documentação nos autos do auto de votação do plano e decorrido o prazo perentório para a sua votação e receção, foi proferido despacho a determinar o encerramento do processo sem homologação do plano e solicitado ao Sr. Administrador Judicial Provisório o envio do parecer a que alude o art.17-G n.º 4 do CIRE (fls.144).

Em resposta o Sr. AJP informou que o plano de revitalização não havia sido aprovado pela maioria dos votos expressos ( 50,45% contra e 45,95% a favor).

Mais informou que o devedor teria reunido com os credores comuns no dia 27.10.2015 à revelia dos demais credores e do próprio AJP, cuja presença havia sido dispensada no mesmo dia, por telefone, pelo devedor, com a informação que ali não marcaria presença nenhum credor embora haja recebido uma ata de reunião com três dos credores comuns. Salientando que o devedor apenas concedeu 6 dias para a votação do plano.

Nesse seguimento foram remetidos diversos requerimentos dos credores acusando, em suma, a falta de contabilização dos seus votos ((…) – e os primeiros três credores acusando a valoração de um voto emitido para lá do prazo das negociações e a sua não audição previa a propósito do estado de insolvência do devedor) e denunciando (o devedor) as irregularidades que teriam sido levadas a cabo pelo Sr.AJP e a requerer a contabilização dos votos oportunamente expressos e não contabilizados a favor do plano de recuperação.

Por fim o Sr.AJP veio prestar os seus esclarecimentos a respeito da forma como decorreu o processo das negociações, alegando que o mesmo foi pautado pelo seu premeditado afastamento da supervisão das negociações e dos credores hipotecários; plano de revitalização apenas remetido aos credores; pouca credibilidade do plano apresentado; o curto prazo concedido para a votação de apenas 6 dias, incluindo dois dias não úteis, e a situação de insolvência atual do devedor.

O devedor e os credores tomaram posição sobre aquela pronúncia.

2.

Finalmente foi proferida decisão final na qual se plasmou: « Repara-se o despacho datado de 04.12.2015 (fls.144) na parte em que tem subjacente a não aprovação do plano apresentado pelos credores do devedor, uma vez que existiu de facto um quórum constitutivo, de deliberação e de aprovação por credores detentores de 75,88% dos créditos reconhecidos.

Mas nos termos do 17-F nºs 5 e 6 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa não se homologa o plano de revitalização apresentado pelo devedor D (…)… por ter incorrido na violação não negligenciável por parte do plano de regras procedimentais – atinentes à superintendência por parte do Sr.AJP e à circunstância de se encontrar em situação de insolvência atual (erro na forma do processo) – e mais importante substantivas decorrentes da falta de verosimilhança dos termos do plano de revitalização para almejar o seu desiderato.» 3.

Inconformado recorreu o devedor.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. A sentença sub judice, pese embora reconhecer a aprovação do plano pelos credores e o não pedido de homologação por parte de qualquer credor, recusa a homologação do plano apresentado, com fundamento no facto de os Requerentes se encontrarem em situação de insolvência, aquando da sua apresentação ao PER, e invoca -sem fundamentar - a falta de transparência nas negociações.

2. Faz assim, servindo-se da charneira argumentativa de um acórdão do STJ, uma errada qualificação jurídica dos factos vertidos, errando na determinação da norma aplicável (artº 215) em manifesto abuso do poder judicial em detrimento do poder legislativo, ferindo de morte o escopo do Legislador aquando da criação do Processo Especial de Revitalização e esvaziando-o de sentido.

3. Na sentença recorrida o Tribunal decide contra a lei, com fundamento apenas numa sua convicção que refere, porém, objectiva, conclusão que de facto a Lei não lho permite, pois não define objectivamente os conceitos de “situação económica difícil» e «situação de insolvência meramente iminente», sendo, portanto, estes conceitos susceptíveis de ser interpretados subjectivamente.

4. Se de facto tais conceitos são rasgados de subjectividade, e se permitiram ao Tribunal entender pela insolvência dos devedores (não se fundamentando sequer porquê), terá de se admitir que os devedores estejam, também eles, autorizados a entender que se encontram apenas em situação económica difícil – e por maioria de razão, já que efectivamente conhecem melhor que o Tribunal a sua situação e possibilidades de recuperação.

5. Nulidade que expressamente se arguí, nos termos do artigo 615, nº1, alinea b) do CPC.

6. Não obstante, sempre se dirá que salvo douto melhor entendimento, jamais poderia o Tribunal, com base na sua interpretação subjectiva da situação económica dos devedores (diferente, refira-se, da interpretação dos devedores, dos credores interessados e da Sra. Administradora Judicial) ditar a morte dos devedores, porque o poder jurisdicional não se pode sobrepor ao poder Legislativo, em clara VIOLAÇÃO DO ART. 2º DA CRP.

7. Com efeito, o Per é um processo de natureza maioritariamente extrajudicial, cabendo que as decisões a que a ele digam respeito sejam democraticamente decididas pelos credores interessados.

8. O papel do juiz neste processo é muito restrito, porquanto o legislador faz radicar a defesa daquele interesse público, em que se traduz a saúde da economia, na primazia da vontade da maioria qualificada dos credores, confiando quase plenamente nestes e no administrador judicial (DOC 1) 9. Foi entendida como objectiva aquela situação de recuperação pelos devedores e por todos os credores reclamantes, que nunca aduziram a suposta situação de insolvência, antes aceitando e manifestando desejar participar nas negociações que vieram a decorrer e que no decurso das mesmas levaram a cabo o seu direito de voto sem objecção.

10. Na verdade, se fosse intenção do legislador que o Tribunal aferisse efectivamente dos factos que justificariam a situação económica difícil ou a situação de insolvência eminente, uma vez recebida pelo Tribunal a comunicação do devedor a informar que pretende dar início às negociações conducentes à sua recuperação, a Lei não mandaria que o juiz nomeasse de imediato o Administrador Judicial Provisório e permitiria sim que este, naquele momento, ou, no limite, imediatamente após a publicação da lista provisória de créditos, pudesse fiscalizar tais pressupostos, rejeitando liminarmente o pedido. O que não acontece! 11. Assim, se a Lei não o permite de ínicio, por maioria de razão não o permite no decurso do mesmo, quando o procedimento foi já iniciado, com taxas de justiça pagas, com os seus trâmites legais devidamente observados, e com as expectativas legítimas criadas (nos devedores e seus credores), culminando na apresentação de um plano, votado e aprovado pela maioria dos credores, nos termos do art. 17º F nº 3, e que não viola qualquer regra procedimental ou de conteúdo .

12. Ademais, sempre se dirá que no Processo Especial de Revitalização a situação de insolvência apenas poderia ser imputada aos devedores, nos termos do Art. 17º G nº 4 do CIRE: isto é, apenas no caso de resultarem infrutíferas as negociações com os credores, e sempre depois de o tribunal pedir o parecer ao Sr. Administrador Judicial Provisório! 13. O que significa que a Lei, antes de permitir ao juiz a fiscalização do plano aprovado nos termos do 215º do CIRE, dita inclusivamente, que mesmo no caso do plano não ser aprovado, não pode o Tribunal decidir-se imediatamente pela insolvência dos devedores, antes obrigando a que se solicite ao Sr. AJP o seu parecer acerca da situação económica dos devedores.

14. Por último, sempre se dirá que não podia o Douto Tribunal determinar que esta sua convicção se subsumisse em qualquer das violações nos termos do art 215º do Cire (violação de regras procedimentais ou de normas de conteúdo) 15. Acresce que, como a própria lei indica, as regras procedimentais e normas de conteúdo, que podem ser violadas, dizem respeito ao processo propriamente dito, e não ao que lhe está a jusante. São, pois, coisas distintas: o antes do processo e o processo de revitalização propriamente dito.

16. Conforme referido pela Relação de Coimbra, no processo 5697/12.6TBLRA.C1, de 29/10/2013, as normas procedimentais são todas aquelas que regem a actuação a desenvolver no processo, que incluem os passos que nele devem ser dados até que a assembleia de credores decida sobre as propostas que lhe foram presentes — incluindo, por isso, as relativas à sua própria convocatória e funcionamento — e, bem assim, as relativas ao modo como ele deve ser elaborado e apresentado.

17. As normas relativas ao conteúdo serão, por sua vez, todas as respeitantes à parte dispositiva do plano (propriamente dito, o que é...

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