Acórdão nº 2411/15.8T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução13 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A...

, residente na Av. (...) Leiria, veio deduzir o presente procedimento cautelar para suspensão de deliberação social, nos termos dos artigos 380º e seguintes do Código de Processo Civil, contra B... , S.A.

, pessoa colectiva número (...) com sede em (...) Bidoeira de Cima, pedindo que seja determinada a suspensão das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral Anual a 29 de Junho de 2015, tudo com as demais consequências legais.

Requer ainda que seja determinada a inversão do contencioso, declarando a anulação das deliberações sociais tomadas na mesma assembleia.

Partindo da caracterização da requerida e da sua legitimidade, decorrente de ser sócio da requerida, o requerente, alegou, em síntese, a ilegalidade de deliberações societárias por violação da lei, por violação do pacto social e os danos apreciáveis que decorrerão caso não sejam suspensas e anuladas a final da deliberação de aprovação de contas, da deliberação de nomeação de órgãos sociais e a final fundamentou as razões para se determinar a inversão do contencioso e declarar a anulação das deliberações sociais tomadas na mesma assembleia.

Juntou prova documental, requereu a junção da respectiva acta invocando recusa de entrega da mesma por parte da requerida e testemunhal.

Citada a Requerida veio a mesma deduzir oposição, nos termos que se mostram a fls. 139 e segs., resumidamente, por não se verificarem as ilegalidades assacadas às invocadas deliberações, que respeitaram a lei e os estatutos da requerida, pugnando pela improcedência da presente providência, não ser declarado a inversão do contencioso, peticionada pela requerente, e caso assim se não entenda, deve o Tribunal pronunciar-se sobre a validade das deliberações de 16/06/2015 e de 29/06/2015, bem como sobre o abuso de minoria em que se traduz o comportamento do Requerente, que é sócio de várias sociedades que têm o mesmo objecto social da requerida.

Juntou prova documental, apresentou a respectiva acta e rol de testemunhas.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, após o que foi proferida a sentença de fl.s 533 a 580, na qual se procedeu ao saneamento dos autos e neste âmbito se declarou a legitimidade do autor e fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final, se julgou improcedente, por não provada, a requerida providência, ficando as custas a cargo do requerente.

Inconformado com a sentença proferida, dela interpôs recurso o requerente, A... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo – (cf. despacho de fl.s 722), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. O art. 11º do pacto social prevê que as deliberações sociais são tomadas por maioria superior a setenta e cinco por cento de votos favoráveis correspondentes à totalidade do capital.

  1. No dia 16/06/2015 realizou-se uma assembleia geral extraordinária da sociedade Requerida cuja ordem de trabalhos era proceder à alteração a vários artigos dos estatutos da Requerida – nomeadamente o art. 11.

  2. A proposta de alteração aos estatutos mereceu os votos favoráveis dos acionistas C... , D... e E... e o voto desfavorável do acionista e Recorrente A... .

  3. Os votos a favor da aprovação da proposta de alteração aos estatutos correspondem apenas a 70% do capital social da Requerida, razão pela qual a referida proposta não foi aprovada por falta de quórum, ao abrigo do art. 11º do pacto social.

  4. A ata n.º 89, respeitante à assembleia geral extraordinária de 16 de junho de 2015, contém uma menção expressa à proclamação, pelo presidente da mesa, de deliberação negativa.

  5. Ao presidente da mesa da assembleia geral cabem múltiplas funções, entre elas, a de direção e condução da reunião de tal colégio. E neste específico desempenho, compete-lhe, notadamente, abrir e encerrar a assembleia, pôr em discussão cada ponto da ordem do dia, dar a palavra aos participantes que dela pretendam usar, aceitar e pôr à votação propostas de deliberação, efetuar a contagem dos votos e, ainda, proclamar o resultado da votação.

  6. Não existe qualquer dúvida de que é a deliberação proclamada pelo Presidente – e só essa – a que se formou.

  7. Tem legitimidade para proceder à impugnação da deliberação social os sócios que não tiverem votado no sentido que fez vencimento.

  8. Contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, o Recorrente não podia ter impugnado a deliberação proclamada na assembleia geral de 16/06/2015 — de rejeição da proposta — porque havia votado justamente no sentido da rejeição.

  9. Se é certo que o Presidente proclamou uma deliberação negativa – conforme consta da ata 89 – e que não ocorreu nenhuma retificação, pelo presidente, do sentido dessa proclamação, então é igualmente certo que se formou uma deliberação negativa de rejeição da proposta de alteração dos estatutos.

  10. O registo de alteração dos estatutos, efetuado com base na ata n.º 89, onde foi proclamada uma deliberação negativa, foi levado a registo, o que é simplesmente desconcertante: a ata contém uma menção expressa à proclamação, pelo presidente da mesa, de deliberação negativa (rejeição da proposta de alteração dos estatutos), pelo que se mostra incompreensível e obsceno o registo efetuado.

  11. O conservador não tem a liberdade de decidir registar uma deliberação ou o seu contrário – o conservador tem de registar a deliberação proclamada pelo Presidente.

  12. Mesmo que o presidente da mesa se tivesse enganado ou tivesse errado ao proclamar a deliberação negativa, o vício de procedimento determinaria a respetiva anulabilidade: por isso, a deliberação, até ser impugnada, produziria os seus efeitos e, não tendo sido impugnada tempestivamente – como de facto não foi – convalida-se.

  13. Ou seja, a deliberação de rejeição da proposta de alteração, mesmo que se considerasse inválida, já estaria convalidada.

  14. Razão pela qual não há quaisquer dúvidas de que os estatutos não foram alterados.

  15. O reforço do quórum deliberativo por via estatutária não é ilegal.

  16. A maioria qualificada de dois terços dos votos emitidos pode ser aumentada nos estatutos. Tal como é possível reforçar estatutariamente a maioria prevista no n.º 4 do art. 386º.

  17. A doutrina e a jurisprudência são praticamente consensuais quanto a esta questão.

  18. O art. 386º, n.º 4 é uma norma dispositiva e, como tal, deve entender-se que a fixação de um quórum nos estatutos constitui uma derrogação implícita da normal.

  19. Razão pela qual a doutrina reconhece a não aplicação do n.º 4 do art. 386º aos casos em que os estatutos fixem um quórum acrescido – como são os da Requerida.

  20. Se assim não se considerasse, a redução de quórum seria arbitrária, e, mais grave, constituiria um mecanismo fácil para contornar qualquer reforço estatutário de quórum, pois bastaria faltar na primeira data para, na segunda, lograrem aprovar a deliberação, que se bastaria com metade dos votos.

  21. Permitir que em segunda convocatória se aprove uma deliberação que aquela percentagem de capital nunca lograria aprovar em primeira convocação, constitui uma subversão do espírito do art. 386º, n.º 4.

  22. Ou seja, uma cláusula estatutária que ele acima da percentagem exigida por lei o capital necessário para a aprovação de deliberações, é incompatível com uma norma que reduz esse capital em segunda convocatória.

  23. O presidente da mesa goza de competências próprias, não podendo os sócios, independentemente do capital que detenham, sobrepor as suas decisões às do Presidente.

  24. Tendo o Presidente decidido encerrar os trabalhos da assembleia geral de 29/06/2015, a alegada reabertura dos trabalhos mais não é que uma reunião não convocada: o procedimento que se iniciaria com a convocatória conclui-se com o encerramento da assembleia, estando qualquer ato posteriormente praticado provado de legitimidade procedimental.

  25. Assim sendo, as alegadas “deliberações” aprovadas na assembleia geral anual de 26/06/2015, que constam das fls. 54ss do livro de atas, são nulas, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 56º, n.º 1, alínea a).

  26. Não pode, por isso, ser levada a cabo a tese do Tribunal a quo a respeito da aparente validade das deliberações tomadas após ter sido encerrada a assembleia de 26/06/2015.

  27. Conclui-se que as deliberações padecem de nulidade, por vício de procedimento (art. 56º, n.º 1, al. a) CSC) por terem sido tomadas em assembleia não convocada – aquela que foi convocada estava já encerrada por decisão do Presidente.

  28. Mas, procederiam sempre de anulabilidade, por vício de procedimento (art. 58º, n.º 1, al. a) CSC) em virtude de não terem sido aprovadas pelo quórum fixado na cláusula 11ª do pacto social, que pelas razões expostas, se mantém em vigor na sua redação originária.

  29. As “deliberações” tomadas na AG anual de 29/06/2015, consideradas válidas pelo Tribunal a quo, causam danos quer à Sociedade, quer ao próprio Requerente enquanto sócio.

  30. A Certificação Legal das Contas relativas ao ano de 2014 contém quatro reservas.

  31. Da deliberação de aprovação das contas resulta um claro dano, na justa medida em que as mesmas não espelham com realidade a verdadeira situação da sociedade Requerida, uma vez que há imparidades que não estão reconhecidas no balanço da Sociedade e o ativo e capital próprio da empresa está sobreavaliado – conforme resulta da certificação legal das contas apresentada pelo Fiscal Único e conforme ficou provado na douta sentença a que ora se recorre.

  32. As reservas chamam a atenção para aspetos que não estão de acordo com as normas contabilísticas.

  33. A reserva relativa aos diferimentos, caso tivesse sido corrigida, faria com que o resultado líquido do período passasse de positivo a negativo.

  34. Está evidenciado nas reservas que o capital próprio da empresa está sobrevalorizado em cerca de € 2.140,00 (passaria de 5.791,00 para € 3.651,00 – um decréscimo de...

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