Acórdão nº 3479/09.1TACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Junho de 2016

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução29 de Junho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência, na 4ª Secção (competência criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra.

I 1.

Nos autos de processo comum supra identificados, foi o arguido A... , melhor id. nos autos, por sentença de 22.11.2012, condenado pela autoria material e em concurso efectivo de um crime de ofensa à integridade física simples e de um crime de dano simples, p. e p. pelos artigos 143.º, 1, e 212.º, 1, ambos do Cód. Penal, respectivamente, na pena única de 200 dias de multa, à razão de € 7 dia, num total de € 1 400.

2.

Requereu e foi-lhe deferida por despacho datado de 28.05.2014, a substituição da pena de multa por prestação de trabalho fixada em 200 horas.

  1. Por despacho judicial de 22.09.2015 – fls. 290 -, foi-lhe revogada a pena de substituição e decidido que se a multa não for paga voluntariamente, o arguido cumprirá a pena de prisão subsidiária fixada na sentença (133 dias - art.º 49.º, 1, ex vi 4, do Cód. Penal).

  2. Desta decisão recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões: A.

    Com o presente recurso a incidir sobre matéria de direito, justeza, adequação formal e substancial da douta decisão proferida e vertida no despacho recorrido, não se pretende colocar em causa o exercício das mui nobres funções nas quais se mostram investidos os Ilustres julgadores, mas tão-somente exercer “manifestação de posição contrária” ou “discordância de opinião”, traduzido no direito de recorrer bem como consagrado na alínea i) do n.º 1 do art. 61º CPP e no nº.1 do art. 32º da CRP; B.

    Olhada a douta decisão denota-se, com o devido respeito se refere, que a mesma se mostra mais fruto de um acto intuitivo, da “arte” do mui Ilustre julgador, e puramente mecânico, em razão da aparente arbitrariedade e matematicidade decorrente da ausência de especial fundamentação e apego cego à douta promoção do Ministério Público, denotando-se ausência de especial fundamentação e singeleza decisória; C.

    Ao proferir o segundo segmento decisório o Tribunal a quo precludiu antecipada e ilicitamente o direito do arguido de expor, alegar e provar, ausência de culpa pelo não pagamento da multa, não podendo assim, nesta fase e sem que primeiramente transite em julgado a revogação da pena de substituição, o Tribunal a quo determinar a execução da pena de prisão subsidiária, como aparece no último parágrafo decisório e sem possibilitar ao arguido invocar ausência de culpa pelo não pagamento; D.

    Mostra-se disforme face à Lei fundamental, por violação dos princípio da legalidade, contraditório e presunção de inocência, a dimensão normativa resultante do entendimento e interpretação do art. 49º n.º 4 CP no sentido de “Em caso de revogação de pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, substitutiva de pena de multa, é lícito ao Tribunal de forma contemporânea a tal juízo de revogação determinar o cumprimento de prisão subsidiária em caso de não pagamento voluntário da multa sem necessidade de aguardar pelo trânsito em julgado da revogação e concessão de contraditório ao arguido para efeitos de, querendo, usar a faculdade de alegação e prova de ausência de culpa, nos tempos do n.º 3 do art. 49º CP”; E.

    Da leitura da douta decisão não parece decorrer que tenha tido lugar audiência e efectiva audição do arguido na presença do técnico, tal qual decorre do n.º 2 do art. 495º ex vi n.º 3 do art. 498º CPP e se mostra exigível nos termos da jurisprudência citada supra e a qual se dá por integralmente reproduzida por questões de economia processual, não tendo a mera notificação do arguido para efeitos de contraditório a virtualidade de suprir tal falta, podendo-se assim concluir que não teve lugar qualquer notificação do arguido para comparecer em Tribunal para ser ouvido, tudo se tendo passado à margem do processualismo que se julga legalmente imposto e a douta decisão recorrida se mostra ilegal e não conforme às mais elementares garantias de defesa bem como aos princípios da tutela jurisdicional efectiva, contraditório, imediação e oralidade, fugindo ao padrão de um direito processualmente conforme e mostrando-se vigente a nulidade insanável plasmada na alínea c) do art. 119º CPP! F.

    É inconstitucional, por violação dos princípios da tutela jurisdicional efectiva, de garantia de defesa e do contraditório, a dimensão normativa extraída do n.º 4 do art. 49º CPP quando interpretado no sentido de “Para efeitos de revogação de pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, substitutiva de pena de multa, não se mostra exigível a convocação do arguido para comparência em audiência, para ser ouvido na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento da execução da pena, ao arrepio do plasmado nos arts. 495º n.º 2 ex vi 498º n.º 3, ambos CPP”; G.

    Relativamente à revogação da prestação de trabalho o teor da lei não impõe sobre o arguido o ónus de provar a não imputabilidade uma vez que, tal qual decorre do n.º 4 do art. 49º CP inexiste remissão expressa para o n.º 3, contrariamente ao que se mostra feito para os n.

    os 1 e 2, não se podendo ter por válido o juízo de censura plasmado na douta decisão na parte em que, partindo de uma justificação de alegadas e invocadas razões de saúde, decide tal falta de prova contra o arguido e ao arrepio do princípio in dubio pro reo, dado que da parte final do n.º 4 decorre unicamente a previsão de inimputabilidade sem qualquer expressa imposição ao nível do ónus de alegação, diferentemente do que mostra expresso no n.º 3 para o não pagamento da multa, havendo manifesta diferença ao nível da previsão legal, não podendo o Tribunal impor ao arguido um ónus que a lei lhe não impõe expressamente! H.

    Tem-se por inconstitucional, por violação dos princípios da presunção de inocência e da legalidade em razão da ausência de remissão expressa para o teor do n.º 3 do art. 49º CP, a dimensão normativa extraída do n.º 4 do art. 49º CP quando interpretado no sentido de “Em sede de revogação de pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, substitutiva de pena de multa, recai sobre o condenado o ónus de prova de ausência de culpa de tal incumprimento por forma evitar a automática revogação.” I.

    A progressividade não é mais do que a densificação do conceito de justiça proveniente da igualdade material, princípio base de todo o Direito, pressupondo um conceito de democraticidade (a lei penal é igual para todos), sendo essa a essência do princípio da igualdade que não consiste em tratar tudo por igual sob pena de, por paradoxal que pareça, gerar manifesta e clara desigualdade, mas sim em tratar de forma igual o igual e de forma diferenciada o desigual, mostrando-se in casu violados os princípios da igualdade e proporcionalidade dado que se mostra exigível prova de culpa ou dolo, o que manifesta e cristalinamente in casu se não mostra comprovado nem, em observância das mais elementares garantias de defesa, poderá ser tido por presumido! J.

    Não ressaltando investigada a razão para a falta de comparência junto da DGRS ou o início do trabalho (afinal, o único dever que objectivamente poderá suportar o incumprimento!), em manifesta demissão ajuizativa e omissão de pronúncia geradora de nulidade, não pode o Tribunal a quo afirmar a culpa do arguido, dado a alegada falta (sem referência aos seus contornos ou circunstancialismo inerente) ser, só por si, manifestamente insuficiente para suportar um juízo derrogativo da pena de substituição, uma vez que não poderá nunca justificar-se, nesta área do Direito ou qualquer outra, uma entorse aos princípios garantísticos, atento o recorte constitucional e legal em matéria penal e processual penal, pelo que não se mostrando cristalinamente in casu comprovado qualquer dolo, em observância das mais elementares garantias de defesa, não poderá o mesmo ser presumido, existindo na lei medidas alternativas à revogação da pena de substituição, por razões de igualdade e proporcionalidade, atenta a natureza de ultima ratio do cumprimento de pena de prisão e seus efeitos nefastos; K.

    Um olhar despretensioso, sério e isento, não permitirá vislumbrar e atribuir conformidade legal ao doutamente decidido, em preterição das mais elementares garantias de defesa e contraditório uma vez que a presente situação poderá ser ela mesma diversa daquela que resultaria da deliberada e inequívoca ausência de cumprimento com total demissão de comparecimento e contacto com a DGRSP, devendo assim ter tratamento diferenciado sob pena de violação do princípio da igualdade e entorse constitucional, dado que tendo o arguido sido vítima de acidente de viação (o qual esteve na génese de um outro processo judicial, a saber 120/14.4PTCBR) teve necessidade de ser sujeito a internamento e a receber cuidados hospitalares, cujas sequelas impossibilitaram a pronta prestação de trabalho! L.

    Tendo a notificação do arguido tido lugar por via postal simples para a morada constante do TIR e não se mostrando este efectivado tendo por referência a última alteração processual, decorrente da lei 20/2013, temos que a medida de termo de identidade e residência havia cessado com o trânsito em julgado e veio a ser proferida decisão sem que efectivamente se tenha assegurado não só a presença do arguido em audiência como a sua válida notificação para efeitos de contraditório face à douta promoção do Ministério Público bem como demais diligências subsequentes, sempre se tendo o arguido por não notificado e estando assim o processo eivado de um vício processual insanável! M.

    Temos por violados os princípios da igualdade, adequação, proporcionalidade bem como carácter de ultima ratio do Direito prisional que assim se verá convocado a final, para efeitos de execução da pena de prisão subsidiária, quando a danosidade material e desvalor de resultado da conduta eventualmente...

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