Acórdão nº 379/13.4TACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução26 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em audiência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo comum singular (artigo 16.º, n.º 3 do CPP) n.º 379/13.4TACBR, da Comarca de Coimbra, Coimbra – Inst. Local – Secção Criminal – J2, mediante acusação pública, foram os arguidos A...

e B...

, melhor identificados nos autos, submetidos a julgamento, sendo-lhes, então, imputada a prática, em coautoria material e em concurso real, de um crime de peculato, p. e p. pelo artigo 375.º, n.º 1 do Código Penal, e de um crime de abuso de poder, p. e p. pelo artigo 382.º do C. Penal, com referência ao artigo 386.º, n.ºs 1, alínea d) e 2, do mesmo Código.

2. Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença de 27.11.2015, o tribunal decidiu [transcrição parcial do dispositivo]: Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a acusação e, consequentemente: 1.

Absolvo os arguidos A... (…) e B...

(…) da prática, em coautoria material, do crime de abuso de poder, previsto e punido pelo art.º 382.º do Código Penal, com referência aos art.ºs 386.º, n.ºs 1, al. d), e 2, e 28.º, n.º 1, do Código Penal.

2.

Condeno os arguidos A... (…) e B...

(…) pela prática, em coautoria material, de um crime de peculato, previsto e punido pelo art.º 375.º, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art.º 386.º, n.ºs 1, al. d), e 2, e 28.º, n.º 1, do Código Penal, respetivamente nas penas de:

  1. Arguido A... : 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; b) Arguido B... : 2 (dois) anos de prisão.

    3. Vistas as circunstâncias acima mencionadas e relativas aos arguidos, nos termos dos art.ºs 50.º, n.ºs 1, 2, 3, 4 e 5, e 51.º, n.ºs 1, al. c), e 2, do Código Penal, o Tribunal suspende a execução das penas de prisão aplicadas aos arguidos, pelos períodos, respetivamente, de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses e de 2 (dois) anos, subordinada ao cumprimento do dever de cada um dos arguidos entregar, no prazo de 1 (um) ano, aos Serviços Municipalizados (...) (SM ....), de contribuição monetária no valor individual de € 2.000,00 (dois mil euros).

    (…)» 3. Inconformados com a decisão recorreram os arguidos, formulando as seguintes conclusões: A... : 1.º Dando cumprimento ao estatuído no artigo 412.º, n.º 3, al. a), do CP Penal, consideram-se incorretamente julgados os factos constantes dos pontos 3., 41., 44., 46., 47. E 48 daqueles factos dados como provados e o facto 6 daqueles tidos por indemonstrados.

    1. No que tange ao “facto 3” o Mmo. Juiz a quo usa, para fundamentar a respetiva prova, a naturalidade do recorrente e de seu coarguido, a mesma militância política, e o facto de, em conversas telefónicas, se tutearem.

    2. Salvo o devido respeito, é manifestamente pouco para tão assertiva conclusão.

    3. Desde logo, no que tange à naturalidade, os mesmos só partilham o Concelho, dado que são de freguesias distintas, cujas sedes distam cerca de 10 Kms, uma da outra … 5.º Por outra banda, os arguidos são de gerações diferentes, sendo certo que nasceram com cerca de dezasseis de diferença – o que desde logo impede qualquer espécie de juízo de afinidade etária potenciada pela contiguidade geográfica.

    4. Quanto à militância política idêntica, deve dizer-se que ela ocorre no seio de um dos maiores partidos nacionais (o mais votado, que não o “vencedor” das últimas legislativas) o que torna de algum modo irrelevante tal circunstância … 7.º E o tratamento familiar por tu, também não suportará, só por si, a magnitude da ilação tirada.

    5. De resto, examinada a integralidade das escutas de que o recorrente foi alvo, constatar-se-á que as conversas tidas com o coarguido são só as relacionadas com esta questão e bastante curtas.

    6. O que deixa transparecer que o relacionamento entre ambos, não se alcandorava à dimensão constante do facto cujo julgamento se reponta de erróneo.

    7. No que tange aos factos 41 e 6 dos não provados, deve, antes, de mais, referir que o seu tratamento conjunto resulta da circunstância de ambos versarem sobre o mesmo pedaço da realidade, motivando respostas simétricas.

    8. Na verdade, esta factualidade atine ao valor dos objetos que foram entregues com a viatura, no interior desta.

    9. Ora, desde logo, não se vislumbra onde se baseou o tribunal para concluir pelos avantajados montantes descritos no ponto 41.

    10. Por outro lado, tal assunção fáctica colide, fragorosamente, com o depoimento da testemunha H... , prestado na audiência de discussão e julgamento, em 05 de Novembro de 2015 (gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, sob o ficheiro 20151105114507_2565300_2870728), com início às 11h 45 m e 08s e fim às 12h 41 m e 24 s.

    11. Designadamente do trecho constante do minuto 26` 51s ao minuto 34`08s.

    12. De facto, aí se afirma que os valores enumerados no facto 41 se apresentam empolados.

    13. Com efeito, pela sua vestuta idade das peças em questão e pela inexistência, no país inteiro, de viaturas onde pudessem ser aplicadas, o valor delas era nulo.

    14. Sendo provável que a sua conservação redundasse prejudicial, dado que para serem destruídas implicariam custos.

    15. Ou seja, a consideração do aludido depoimento levará a que a factualidade em causa no facto 41, mereça resposta de não provada e, consequentemente, que a resposta ao facto 6 dos não provados seja diferente: isto é, que tal facto seja tido como demonstrado.

    16. No que respeita ao facto 41 este é verdadeiramente o nó górdio do presente processo.

    17. Na verdade, aqui se afirma que os arguidos (e, evidentemente, também o recorrente) sabiam que, em 20/12/2013, não era reconhecido qualquer direito ao arguido B... sobre o veículo X [...], nem às peças de substituição que foram colocadas no interior deste.

    18. Ora, dos autos ressumarão elementos que põem em causa a presente resposta.

    19. Com efeito do depoimento da testemunha C... resulta evidente que o coarguido B... havia adquirido uma viatura aos SM .... (e por três mil euros) em 2002.

    20. Também ressuma, apoditicamente, que tal viatura nunca lhe foi entregue.

    21. E, identicamente, emerge que em 2013 foi entregue outra viatura ao coarguido do recorrente, havendo a consciência que tal ato serviu para saldar “dívida” anterior – cf. depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento, em 05. De Novembro de 2015 (gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, sob o ficheiro 20151105110847_2565300_2870728), com início às 11 h 08 m e 47s e fim às 11h 36 m 37s, designadamente do minuto 07`15 s ao minuto 07`28s.

    22. Tal circunstancialismo é amplamente corroborado pela testemunha Eng. H... (depoimento gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, sob o ficheiro 20151105114507_2565300_2870728), com início às 11 h 45 m e fim às 12h 41 m e 24 s, designadamente do minuto 05`07`ao minuto 06`27s).

    23. Que resulta confirmado na sessão de 05 de Novembro de 2015 da audiência de discussão e julgamento (gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, sob o ficheiro 20151105114507_2565300_2870728), com início às 11 h 45 m e 08 s e fim às 12 h 41 m e 24 s, designadamente do minuto 09`26 s ao minuto 10`05s.

    24. Esta testemunha narra, ainda, que a viatura não entregue foi vendida, de novo, pelos SM .... – cf. depoimento, designadamente do minuto 14`04s ao minuto 16`47s.

    25. Assim emerge um entendimento que foi perfeitamente entendido e aceite pela depoente C... – cf. minuto 09`28s ao minuto 09`38s do depoimento prestado no dia 5 de Novembro de 2015 (gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, sob o ficheiro 20151105110847_2565300_2870728), com início às 11 h 08 m e 47 s e fim às 11 h 36 m e 37 s e corroborado e aceite pela Testemunha H... (minuto 17`21 s ao minuto 18`46 s do depoimento prestado na sessão de 05 de Novembro de 2015 da audiência de discussão e julgamento (gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, sob o ficheiro 20151105114507_2565300_2870728).

    26. De resto, à testemunha C... tal espécie de atuação não causou qualquer espécie de perplexidade, dado que o destino das viaturas dadas para abate não era univocamente a venda, dado que havia alguma discricionariedade da administração que poderia dar-lhes outros destinos, não estranhando, pois, que uma viatura servisse como uma espécie de datio pro solvendo de uma responsabilidade dos Serviços – cf. depoimento do minuto 14`55s ao minuto 15`18s.

    27. Por outro lado, a testemunha, não obstante a sua longa experiência profissional ligada à empresa municipal em questão também referiu não ser do seu conhecimento alguma vez ter ocorrido uma situação de aplicação estrita do caderno de encargos de um concurso, gerando o irremediável prejuízo do vencedor do mesmo – cf. minuto 18`19s ao minuto 18`53s do já identificado depoimento.

    28. Talvez por isso, os pagamentos feitos fora das condições fechadas documentadas nesses sobreditos cadernos de encargos não eram rigorosamente controlados, aceitando-se pagamentos efetuados após os prazos neles estipulados – cf. declarações prestadas do minuto 19`12s ao minuto 20`27s do supra identificado depoimento.

    29. E, perante a não oposição a essa ideia que havia diversas vezes verbalizado é evidente que pensava que tal entendimento era partilhado, designadamente pela administração, pelo que conclui inexistir qualquer ilegalidade no procedimento – cf. do minuto 22`16 s ao minuto 23`14 s do depoimento prestado pela testemunha.

    30. Ora, como evidente se torna, a assunção factual que se contesta emerge, inevitavelmente, contra estes dois depoimentos analisados – prestados por quem foi chefe de divisão dos serviços Administrativos da entidade em causa e Técnico superior dessa mesma entidade.

    31. Na verdade, ao contrário do que no facto controvertido se afirma, nos Serviços existia a convicção que o Arq. B... tinha sido prejudicado pelas...

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