Acórdão nº 170/14.0TBCDR.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução18 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

S (…), Lda, apresentou-se a Processo Especial de Revitalização.

No seguimento do processo foi aprovado um plano de recuperação .

O Sr. administrador judicial provisório apresentou tal plano para homologação.

O plano foi homologado por decisão judicial.

  1. Inconformado recorreu o credor N (…).

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Contra alegou a requerente pugnando pela manutenção do decidido.

  2. Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª - Obrigatoriedade de notificação do recorrente/credor da aprovação do plano de recuperação sob pena de nulidade processual e/ou violação grosseira e não negligenciável das regras procedimentais.

    1. - Ilegalidade do plano de recuperação quando prevê a celebração de novo contrato de leasing a ser cumprido nos termos nele constantes.

  3. Factos provados com interesse para a decisão (em conformidade com o decidido no STJ): 1. S (…), Lda, instaurou o presente processo especial para a sua revitalização em 15.07.2014.

  4. Em 21.07.2014 foi publicado no Portal Citius o Despacho de nomeação do Senhor Dr. (…) como Administrador Judicial Provisório.

  5. Em 18.03.2015, na sequência da notificação do própria devedora datada de 25.02.2015 para reclamar créditos, (…), S.A. reclamou os seus créditos no montante total de € 28.682,21 (Vinte e oito mil, seiscentos e oitenta e dois euros e vinte e um cêntimos), relativos a uma livrança caução que foi subscrita e avalizada, para garantia de um financiamento concedido pelo Reclamante à requerente , sob forma de Contrato de Locação Financeira mobiliária n.º 2030541, concedido em 04.03.2008.

  6. Em 30.03.2015, foi publicada no Portal Citius a Lista Provisória de Créditos a que alude o n.º 2 do art. 17.º-D do CIRE.

  7. Na referida Lista Provisória de Créditos, o crédito reclamado pelo (…), S.A. veio a ser reconhecido nos montantes em que foi reclamado e reconhecida a sua natureza como crédito comum.

  8. O prazo negocial de dois meses para conclusão das negociações encetadas – iniciado findo o prazo para impugnações - veio a ser objeto de prorrogação pelo período de um mês.

  9. Durante o período negocial foi pela Devedora enviada ao (…) S.A. uma proposta de Plano de Recuperação, tendo o Reclamante desde logo manifestado a sua discordância com alguns pontos do Plano, aplicáveis aos credores bancários comuns e, sobretudo, aplicáveis aos contratos de leasing, atento o carácter manifestamente prejudicial do Plano no que à ora Reclamante concerne.

  10. Tal proposta de Plano de Recuperação foi objeto de votação pelos credores.

  11. Assim, em 13.07.2015, (…), S.A. remeteu ao Administrador Judicial Provisório o seu voto, tendo votado contra a aprovação do plano.

  12. Em 15.07.2015 foi o (…) notificado pelo Tribunal a ordenar que se notificasse o ilustre Administrador Judicial Provisório para vir aos autos informar o resultado das negociações encetadas.

  13. Deliberaram sobre o plano de recuperação proposto, credores que representavam 95,12% dos votos.

  14. A proposta do plano de recuperação recolheu o voto favorável de 8 credores representando 67,90% dos votos, sendo que mais de metade dos votos emitidos correspondem a créditos não subordinados.

  15. Em 22.07.2015 foi proferida sentença de homologação do plano apresentado e aprovado.

  16. Esta sentença foi notificada aos credores, incluindo o ora recorrente, em 22.07.2015.

  17. No plano admitiu-se como «capital reclamado» do Novo Banco, o montante de 25.575,66 euros.

  18. No plano de recuperação, para além do mais, plasma-se: «nos contratos de locação a propriedade do objeto é alheia ao locatário (S ....), sendo certo que havendo incumprimento, o locador tem pleno direito de recuperação do bem. Por outro lado, para a S ...., Lda continuar a usufruir dos bens locados, têm que obrigatoriamente ser liquidados os contratos, ainda que sejam alterados para prazos e condições distintos dos inicialmente celebrados» 17. E mais adiante consigna-se: «…termos de pagamento…Contratos de locação financeira.

    - Capital – sem período de carência; amortização do capital em dívida em 150 prestações mensais (a iniciar no mês seguinte à sentença homologatória do plano).

    - Juros – Capitalização dos juros vencidos até ao despacho de homologação do…plano..., bem como da totalidade das despesas e comissões vencidas em igual período.

    - Pagamento mensal de juros vincendos, calculados à taxa Euribor 3M adicionada de spread de 1%.» Fundamentação: Documentos juntos aos autos e posições expressas pelos diversos intervenientes, máxime pela recuperanda e pelo recorrente.

    Não se provou que o recorrente tenha declarado resolvido o contrato celebrado com a recuperanda.

    E mesmo que se admita que tal quid possa ser considerado controvertido e discutível, as, apelidadas, «dissertações» constantes no acórdão quanto a tal não prova, não são, como grosseira e desrespeitosamente adrede plasmam o recorrente e o advogado subscritor nas alegações recursivas para o STJ - conclusão 61, p.641 -, «absolutamente disparatadas».

    Na verdade… O insurgente alega que resolveu o contrato; mas não diz, nem prova, como, ie., por que meio ou modo: extrajudicialmente – artº 436º nº1 do CC – ou judicialmente.

    O Acordão da Relação do Porto junto aos autos, até porque consubstanciado em mera cópia não certificada, não faz, quanto à decisão e, máxime, aos seus fundamentos, caso julgado fora do processo – artº 619º nº1 do CPC.

    Assim, a simples referência nele constante quanto à resolução, não prova, neste nosso processo, esta.

    Destarte, e quando muito, o nele mencionado, é, probatoriamente, livremente apreciado.

    Ademais, versus o defendido pelo recorrente, tais referências não constituem confissão judicial da recuperanda quanto à verificação da resolução.

    Pois que não foi por ela feita diretamente em juízo, mas antes foi – terá sido - feita em documento particular, qual seja, o anterior PER, pelo que, a ter existido, assume o jaez de extrajudicial - artº 355º nº2 do CC.

    Finalmente, a confissão, mesmo que judicial, apenas valeria como tal no processo onde é feita – artº 355º nº3 do CC.

    Não tendo a cópia do citado aresto eficácia probatória plena e vinculada, tratando-se de, eventual, confissão extrajudicial feita em documento particular - anterior PER -, e não constando este documento nos presentes autos, sendo certo que, como é sabido, «quod non est in actis, non est in mundo», não poderia a resolução ser, muito menos inelutavelmente como parece ser posição do recorrente, dada como provada.

    A não ser que outros elementos probatórios, neste nosso processo, existissem, e que implicassem, só por si ou em concatenação com os parcos e insuficientes elementos nele constantes, tal prova e convencimento.

    E não existem.

    Antes os perscrutáveis apontam no sentido oposto.

    Efetivamente, dimana do presente PER, constante nos autos - cfr., vg., o teor dos pontos 15 e 16 supra referidos - que a devedora não tem o contrato em causa como resolvido, antes o assume, entre outros, como válido e eficaz, e pretendendo cumpri-lo, posto que com a reformulação proposta.

  19. Apreciando.

    6.1.

    Primeira questão.

    6.1.1.

    A ratio e teleologia do CIRE, na sua redação genética, qual seja a liquidação imediata do seu património do devedor com a satisfação dos direitos e interesses dos credores, na mais ampla perspetiva, deu lugar, com a alteração ao processo de insolvência, introduzida pela Lei n.º 16/2012, de 20/04, que aditou as normas reguladoras do PER, a que o fito primeiro e fulcral do processo de insolvência, passasse a ser a recuperação do devedor.

    Não obstante (ou talvez por isto), o objetivo do legislador do CIRE, na sua redação inicial, de desjudicializar o processo e perspetivar este, essencialmente, como um processo em que aos interessados é facultada a possibilidade de modelarem as suas pretensões – cfr. neste sentido Lebre de Freitas, Pressupostos Objetivos e Subjetivos da Insolvência in Novo Direito da Insolvência, Revista Themis, 2005, p.12 e sgs –, parece ter-se acentuado.

    Efetivamente, e como dimana dos seus preceitos atinentes – artº 17º A e segs -, todo o processo do PER, ainda que com intervenção, ativa e atual, do Sr. administrador judicial provisório e uma fiscalização mais a posteriori e essencialmente atinente a aspetos processuais formais, do Juiz, assume-se e consubstancia-se, na sua vertente material ou substancial, como uma negociação entre devedor e credores.

    Assim sendo, é evidente que os princípios do dispositivo, da autorresponsabilidade e da preclusão assumem uma importância acrescida.

    Tudo com o propósito de conceder celeridade ao processo.

    Na verdade: « O PER é dominado pela autonomia dos credores e da devedora, pela desjudicialização e, sobretudo, pela celeridade.» «…o plano de recuperação da devedora requerente deve ser apresentado no prazo das negociações previsto no art. 17.º-F, n.º 1, do ClRE, que é um...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT