Acórdão nº 474/14.2TJCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | V |
Data da Resolução | 18 de Outubro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – Relatório ([1]) E (…), com os sinais dos autos, intentou ([2]) ação declarativa comum (para despejo) contra M (…), também com os sinais dos autos, pedindo: a) Se declare que o valor da renda devido a partir de 01/02/2014, respeitante ao mês seguinte, é de € 400,78; b) Se declare justificada a recusa do A. em receber o valor de € 139,26 oferecido pela R. para pagamento da renda de março de 2014; c) Se declare nulo, por insuficiente, o depósito efetuado pela R. em 05 de fevereiro e, consequentemente, nulos também todos os depósitos que a R. venha a efetuar que não sejam no valor da renda devida; d) Se declare o incumprimento contratual por parte da R. e, consequentemente, resolvido o contrato de arrendamento vigente entre A. e R., ordenando-se o despejo; e) Se condene a R. a entregar o locado livre de pessoas e bens; f) Se condene a R. a pagar as rendas vencidas e vincendas na pendência da ação até entrega efetiva do locado; g) Se condene a R. a pagar a quantia de € 315,56, a título de rendas retroativas devidas desde fevereiro de 2013; h) Se condene a R. a pagar juros de mora à taxa legal sobre todas as rendas em dívida desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
Para tanto, alegou: - ser senhorio, sendo a R. arrendatária, com referência a relação locatícia de imóvel para habitação, cujo contrato de arrendamento remonta a 1971, tendo em novembro de 2012 desencadeado o processo de atualização da renda, nos moldes legais, pelo que, com base no RABC (rendimento anual bruto corrigido) do ano de 2012, foi fixado o valor de renda por um ano – com início em fevereiro de 2013 e fim em janeiro de 2014 –, que ascendia a € 139,26; - assim, em dezembro de 2013, cabia à R. – como fez em 2012 – comprovar o seu RABC e, não o conseguindo por impossibilidade legal, mostrar ter efetuado pedido respetivo junto do serviço de finanças competente, o que não fez; - por isso, deixando o valor da renda de ter em conta, a partir de então, o RABC anterior, passou a ascender, uma vez fixado em função do valor do locado, a € 400,78, devido a partir de fevereiro de 2014, como o A. comunicou à R.; - pretendendo esta pagar valor inferior de renda, o A. não o aceitou, nem aceita qualquer depósito nesses termos, pois que nulo por insuficiente, donde que estejam em dívida os montantes peticionados; - o não pagamento da renda vencida em 01/02/2014 confere ao A. o direito à resolução do contrato, com as legais consequências.
Contestou a R., pugnando pela improcedência da ação, e deduziu reconvenção, pedindo a condenação do A./Reconvindo no pagamento de € 5.000,00, a título de danos não patrimoniais.
O A. exerceu o contraditório, mantendo o vertido na petição inicial e concluindo pela improcedência da reconvenção, bem como pela condenação da R./Reconvinte, como litigante de má-fé, em multa e indemnização em montante não inferior a € 2.000,00.
Realizada audiência prévia, rejeitado o pedido reconvencional, saneado o processo e fixados o objeto do litígio e os temas da prova, procedeu-se depois à realização da audiência final.
Por sentença proferida em 11/11/2015 foi a ação julgada procedente, por provada, com a consequente condenação da R. no peticionado.
Inconformada, vem a R. interpor recurso, apresentando alegação, culminada com as seguintes Conclusões ([3]) «(…) O A./Apelado contra-alegou, pugnando pela total improcedência do recurso.
Este foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime e efeito fixados.
Colhidos os vistos, e nada obstando ao conhecimento da matéria recursória, cumpre apreciar e decidir.
*** II – Âmbito do Recurso Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso, não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito recursório, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil atualmente em vigor e aqui aplicável (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 ([4]) –, o thema decidendum, incidindo sobre a decisão da matéria de direito ([5]), consiste em saber ([6]): 1. - Se é lícito o pretendido aumento de valor da renda; 2. - Se há fundamento para a resolução do contrato por incumprimento do locatário; 3. - Se ocorre abuso do direito.
*** III – Fundamentação A) Matéria de facto É o seguinte o quadro fáctico provado pela 1.ª instância: «1- O Autor é proprietário da Fracção H correspondente ao 1º andar esquerdo, do nº 25, na Rua (....), de tipologia T4, com um logradouro exterior, sito na freguesia de (....), concelho e comarca de Coimbra, inscrito na matriz urbana respectiva sob o art. 8438 e descrito na CRP de Coimbra sob o nº 2172 (1º da p.i.).
2- Por contrato de arrendamento outorgado em 1971 pelo marido da Ré como arrendatário, foi-lhe dada de arrendamento a fracção identificada em 1) (2º da p.i.).
3- Na sequência do divórcio da Ré e do seu marido, o direito ao arrendamento foi transmitido à R, que assim, ocupa a referida fracção desde 1971. (2º da p.i.).
4- Na sequência da aquisição da propriedade da referida fracção em Agosto de 2011, o A. por carta datada do dia 16-08-2011, comunicou à R. a sua qualidade de proprietário e senhorio e a sua morada como local para pagamento das rendas (3º da p.i.).
5- A R. passou a pagar a renda ao A. na morada deste, tendo a primeira renda, recebida no dia 1 de Setembro de 2011, sido no valor de € 62,39 (4º da p.i.).
6- Em início de 2012, a renda foi actualizada, de acordo com o coeficiente legal aplicável à data, para o valor de € 65,00 (5º da p.i.).
7- Por carta registada com aviso de recepção, datada de 12 de Novembro 2012, o A., na qualidade de proprietário do imóvel referido em 1), veio nos termos do NRAU com as alterações introduzidas pela Lei n.º 31/2012, comunicar à R a transição do contrato de arrendamento para este novo regime e actualização da respectiva renda (7º da p.i.).
8- O A. escreveu, na referida carta: “Em conformidade, o novo valor da renda será de € 1.000,00/mês e o contrato de arrendamento destinado a habitação com prazo certo com a duração de 5 anos, sendo o valor do locado de 72.140,00 € nos termos do CIMI conforme cópia de caderneta predial urbana anexa” (7º da p.i.).
9- Em resposta, por carta registada com aviso de recepção datada de 6 de Dezembro de 2012, a R. “…vem nos termos do disposto art. 36º do NRAU dizer: (…) c) “não obstante propõe o montante de 145 € como actualização de renda, atento o seu rendimento anual bruto corrigido, do qual fará prova nos termos do art. 32º da referida Lei 31/12 de 14 de Agosto. (…) Junta: (…) comprovativo de que requereu junto do serviço de finanças competente o RABC do seu agregado familiar art. 32º da L 31/2012 de 14/08.
” (8º da p.i.).
10- Atenta a invocação pela R. do Rendimento Anual Bruto Corrigido (RABC) ser inferior a cinco Rendimentos Mínimos Nacionais Anuais (RMNA), o A., em resposta, por carta registada com aviso de recepção datada de 7 de Janeiro 2013, comunicou que (…) “aguardo a informação documental de tal rendimento, que caso se venha a verificar servirá para o apuramento do valor da renda nova.
Caso tal rendimento não se venha a confirmar (entre outras consequências legais) será devido o valor de 400,78€/mensal nos termos da m/carta datada de 13 de Dezembro passado.
Em qualquer das circunstâncias, o valor actualizado de renda, será sempre devido a partir do dia 1 de Fevereiro de 2013, inclusivé.
” (9º da p.i.).
11- Por carta registada com aviso de recepção, datada de 9 de Agosto de 2013, a R enviou ao A. documento comprovativo – Certidão do seu RABC, com base no seu rendimento no ano de 2012 (10º da p.i.).
12- Em resposta, por carta registada com aviso de recepção, datada de 26 de Agosto de 2013, o A comunicou à R o valor da renda nova: € 139,26 (11º da p.i.).
13- O A. enviou à R., que a recebeu, carta registada com aviso de recepção datada de 9 de Janeiro de 2014, em que comunicou à R o valor da renda devido a partir de mês seguinte, isto é, a partir de Fevereiro de 2014, nos seguintes termos: “(…) partir do próximo dia 1 de Fevereiro de 2014 a renda mensal devida será de 1/15 do valor patrimonial do imóvel, ou seja de 400,78€.
A este valor de renda mensal acrescem as rendas já vencidas (retroactivas) e a recuperar até Junho de 2014, sendo então, de Fevereiro de 2014 a Maio de 2014 devida mensalmente a renda no valor total de 470,41€ (=400,78€+69,63€), em Junho de 2014 no valor de total de 437,82€ (=400,78€+37,04€) e a partir de Julho no valor de 400,78€.
” Cfr. Doc. 12. (17º da p.i.).
14- Em resposta, a R. remeteu ao A. carta datada de 14 de Janeiro 2014, a enviar declaração da Autoridade Tributária do dia 13 de Janeiro da qual se extrai que “não é possível a emissão do referido documento, pelo facto da liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), relativo ao ano civil anterior à presente solicitação, não ter sido efetuada por ainda não ter decorrido o prazo legalmente previsto no artigo 77.º do CIRS para a referida liquidação”. (18º da p.i.).
15- O A respondeu à R. em 20 de Janeiro de 2014, por nova carta, considerando extemporânea a junção do referido documento e reiterando o teor da carta datada de 9 de Janeiro (19º da p.i.).
16- A R. enviou ao A., que a recebeu, carta datada de 27 de Janeiro, em que refere, além do mais que “(…) Para não...
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