Acórdão nº 36/13.1PFVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução20 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO Nos autos de instrução nº 36/13.1PFVIS que correm termos no Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Viseu – Instância Central – Secção de Instrução Criminal – J1 foi proferido despacho de não pronúncia do arguido A...., no termo de instrução requerida pela assistente Sociedade Portuguesa de Autores, CRL [doravante, SPA], visando a pronúncia do arguido pela prática de um crime de usurpação, p. e p. pelo art. 195º do C. do Direito de Autor e dos Direitos Conexos [doravante, CDADC], face ao despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público.

* Inconformada com a decisão, recorreu a assistente SPA, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: a) Nos presentes autos, entendeu a Meritíssima Juiz "a quo" não pronunciar o A... pelo crime de usurpação; b) Já que entendeu a Meritíssima Juiz "a quo" não ser necessário o arguido ter autorização dos autores, ou de quem os represente, para proceder à emissão de obras radiodifundidas no seu estabelecimento comercial; c) A recorrente entende que a decisão merece reparo e deverá ser alterada por outra que pronuncie o arguido pela prática de um crime de usurpação; d) Porquanto, no dia 19 de Junho de 2013, pelas 09h40, estavam a ser difundidas, no estabelecimento comercial " K... ", obras musicais e literário-musicais protegidas pelo direito de autor.

  1. Para efeito da difusão das obras, o arguido tinha no seu estabelecimento, um aparelho de rádio, ligado a oito colunas, de som através das quais o som era propagado.

  2. O arguido não tinha qualquer autorização dos autores, ou da entidade que os representa, a ora Recorrente, para difundir obras intelectuais protegidas para os clientes que estavam no estabelecimento; g) A comunicação da obra em local público é uma utilização diferente da radiodifusão, que implica a obtenção de uma autorização diferente daquela que o autor, ou o seu representante, haviam concedido para efeitos de radiodifusão. Assim, a autorização concedida à entidade de radiodifusão não se estende ao explorador de um estabelecimento comercial, e, por consequência, este não se pode servir da autorização que havia sido concedida àquela; h) Sempre que uma obra radiodifundida seja utilizada em local público, num estabelecimento comercial, como no caso dos autos, será sempre necessária autorização dos autores, certo sendo que a sua falta configura a prática de um crime de usurpação previsto e punido nos termos do artigo 195º do CDADC; i) Termos em que a decisão recorrida deverá ser alterada por outra que condene o arguido pela prática de um crime de usurpação; j) A decisão recorrida sustenta uma interpretação diferente da Lei, que resulta de uma interpretação incorrecta do conceito de comunicação de obra ao público. que tem origem no direito da União Europeia, em particular na Directiva 2001/29/CE; l) A generalidade das legislações internas dos países pertencentes à União Europeia, as quais de baseiam na Convenção de Berna, e, mais recentemente, se sustentam nas Directivas aprovadas e já transpostas para os diversos ordenamentos jurídicos internos, tal como acontece com o ordenamento jurídico português, consagra, de forma muito clara e evidente, o direito dos autores receberem a remuneração que lhes é devida pela comunicação de obras em local público; m) A orientação doutrinária sustentada na decisão de que se recorre coloca em causa o princípio da aplicação harmonizada e coerente do direito de autor na União Europeia.

Termos em que, e nos mais de direito, se requer a V. Exas., Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação de Coimbra, colham a argumentação expendida, revogando a decisão instrutória recorrida, substituindo-a por outra que pronuncie o arguido A... pela prática do crime de usurpação, p, e p, pelos artigos 195º e 197º do CDADC.

Assim fazendo V. Exas. a tão costumada JUSTIÇA! * Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1 – Não se verificam in casu condições para revogação da decisão de não pronúncia do arguido.

2 – A instalação das colunas ligadas ao rádio nada acrescentava ou alterava à emissão.

3 – O STJ uniformizou e fixou jurisprudência, no Acórdão nº 15/2013, de 13/11, publicado no D.R. de 16 de dezembro, considera que a distribuição do som feita por colunas distribuídas por vários pontos do estabelecimento comercial, que ampliam o som, não sendo estas parte integrante do televisor ou radiofonia, não extravasa a mera receção, que é livre, não configurando assim uma nova transmissão do programa.

Assim, mantendo-se a douta decisão que não pronunciou o arguido, farão, Vossas Excelências, como sempre, e mais uma vez, JUSTIÇA.

* Respondeu também ao recurso o arguido, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1. O despacho de não pronúncia proferido não merece qualquer reparo.

  1. O Arguido não praticou o crime de usurpação, porquanto os factos concretos não consubstanciam o crime referido.

  2. Na análise da efetivação dos pressupostos do tipo de ilícito em causa deverá ter-se em consideração o conceito do "público" a quem a obra é comunicada, para efeitos do art. 3.º, n.º 1 da Diretiva 2001/29/CE, que visa um número indeterminado de destinatários potenciais e implica, além disso, um número de pessoas bastante importante.

  3. Tal não sucede numa frutaria de bairro, em que a clientela é sempre a mesma e não se pode afirmar que seja um número de pessoas bastante importante.

  4. Por outro lado, uma frutaria é um estabelecimento comercial, mas sem qualquer semelhança com um bar, cafés, restaurantes, em que o público-alvo seja cativado pela emissão transmissão de obras radiodifundidas e onde as pessoas se desloquem para ouvir música.

  5. Acresce o facto de a transmissão não visar no caso concreto qualquer lucro nem se repercutir nas vendas de uma frutaria.

  6. Pois o espaço em causa nos autos não é um espaço de permanência, convívio mas sim de estrita passagem para compra de bens essenciais, pelo que a audição de música é completamente indiferente para essa clientela.

  7. Assim, e atendendo a estes dois conceitos: fim lucrativo e o que se entende por "público", não consubstanciam os factos crime de usurpação, socorrendo-nos para tanto do Acórdão do TJUE de 14 de Julho de 2015.

    Nestes termos, e nos melhores de Direito, não deverão V.as Ex.ªs Digníssimos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Coimbra dar provimento ao recurso apresentado pela Assistente, mantendo a decisão instrutória recorrida.

    Só assim se realizando a devida e costumada Justiça.

    * Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C....

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