Acórdão nº 835/13.4GCLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução20 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, Secção Criminal *** No processo supra identificado, após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que condenou: - A...

pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, nº 1, al. b) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão efectiva.

B...

pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à razão diária de € 7 (sete euros), o que perfaz a quantia de € 490 (quatrocentos e noventa euros); C...

pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº 1 do Código Penal, na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à razão diária de € 6 (seis euros), o que perfaz a quantia de € 300 (trezentos euros); Absolveu as arguidas B...

e C...

da prática de um crime de injúria, previsto e punido pelo artigo 181º do Código Penal, de que se encontravam acusadas; Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido nos autos pela demandante E... e, em consequência, condenar a demandada/arguida B...

a pagar a quantia de € 750 (setecentos e cinquenta euros), e a demandada/arguida C...

a pagar a quantia de € 250 (duzentos e cinquenta euros), a de indemnização por danos não patrimoniais, à demandante, absolvendo do demais peticionado; Julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido nos autos pela demandante E... e, em consequência, condenar o demandado/arguido A...

a pagar a quantia de € 3000 (três mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, à demandante, absolvendo do demais peticionado; Julgou totalmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE, e condenando os demandados civis/arguidos B... , C...

e A...

a pagar a quantia de € 112,07 (cento e doze euros e sete cêntimos), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento; Desta sentença interpôs recurso o arguido, A...

.

São do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso, interposto pelo arguido: (a) O Ministério Público acusou A... , imputando-lhe a prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º , nº 1º b) do Código Penal.

(b) O Relatório Social realizado por ordem do Tribunal é insuficiente e não permite conhecer as vivências, quer do Arguido A... , quer da Ofendida E... .

(c) O Tribunal a quo nunca ouviu o arguido, sobre os factos ocorridos, e nesse propósito não podia e nem devia, salvo o devido respeito por melhor opinião contrária, condenar o arguido numa pena de prisão efectiva, mediante um juízo de prognose desfavorável baseado, apenas e só, nas declarações da assistente E... , de sua mãe e irmão, no relatório social do arguido e no passado penal deste.

(d) O Tribunal a quo deu início à audiência sem ter tomado as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do Arguido, uma vez que a realização da audiência contende com o exercício pleno do direito de defesa do Arguido e o princípio da procura da verdade material que se impõe ao julgador, pelo que, tendo-se realizado a audiência de julgamento do Arguido - do qual saiu condenado - na sua ausência, apesar de não estar notificado da data da audiência, sendo obrigatória a sua presença, é nula a audiência de julgamento efectuada na ausência do Arguido sem que o Tribunal tenha tomado todas as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência, o que se invoca, com as legais consequências - cfr. artigo 122º, nºs 1 e 2, CPP.

(e) Efectuado o julgamento, o Tribunal a quo condenou o Arguido A... , como autor material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, nº 1º b) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão efectiva.

(f) Impugna-se a decisão do Tribunal a quo na medida em que o Arguido entende que houve insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição entre os factos provados e não provados e erro na apreciação da prova produzida (artigo 410, nº2, al.s a), b) e c), CPP) - da prova produzida não resulta a existência de uma relação de namoro, uma relação amorosa pois, para poder concluir-se pela existência de uma relação de namoro, é necessário que a eventual relação de índole amorosa seja estável e constitua o desenvolvimento de um projecto comum de vida do casal, exigindo-se uma relação próxima do ambiente familiar com sentimentos de afectividade, convivência, confiança, conhecimento mútuos, actos de intimidade, partilha da vida em comum e cooperação mútua.

(g) O Arguido entende ter havido uma incorrecta formação de um juízo pois a conclusão vai muito além das premissas e a matéria de facto provada é insuficiente para uma correcta formulação da solução de direito.

(n) Não existindo qualquer relação estável que constitua o desenvolvimento de um projecto comum de vida do casal, não existindo uma relação próxima do ambiente familiar com sentimentos de afectividade, convivência, confiança, conhecimento mútuos, actos de intimidade, partilha da vida em comum e cooperação mútua, não se encontram preenchidos todos os elementos do tipo legal de crime de violência doméstica.

(h) Inexistindo aquele elemento do tipo, forçoso é concluir que o arguido não praticou o crime por que veio acusado e pelo qual foi condenado.

(i) O Tribunal a quo dá como provado o facto 11 (Em data não concretamente apurada, compreendida no ano de 2008, em casa do primo do arguido, o arguido desferiu à ofendida várias chapadas e puxou-lhe os cabelos, ficando a mesma a sangrar do nariz) e por outro dá como não provado que os factos tenham ocorrido em casa do primo do arguido, existindo a afirmação e a negação de um mesmo facto, da mesma coisa, ao mesmo tempo.

(j) A análise do depoimento da Ofendida E... , que se encontram gravadas no sistema Habilus Media Studio, na audiência de julgamento de 18 Março de 2015, aos 00m33s e ss, quando questionada pela MM2 Juiz sobre a relação com o arguido A... , que respondeu "Era meu namorado", não permitem concluir pela existência de uma relação próxima do ambiente familiar com sentimentos de afectividade, convivência, confiança, conhecimento mútuos, actos de intimidade, partilha da vida em comum e cooperação mútua.

(l) Do depoimento das Testemunha F..., que se encontram gravadas no sistema Habilus Media Studio, na audiência de julgamento de 18 de Março de 2015, aos 04m31s e ss, e G... , que se encontram gravadas no sistema Habilus Media Studio, na audiência de julgamento de 18 de Março de 2015, aos 17m00s e ss, não se pode concluir pela existência de uma relação próxima do ambiente familiar, entre Arguido e Ofendida, com sentimentos de afectividade, convivência, confiança, conhecimento mútuos, actos de intimidade, partilha da vida em comum e cooperação mútua.

(m) A análise da prova produzida em julgamento e a sua conjugação com os demais elementos probatórios existentes não permitem considerar como provada a existência de uma relação estável que constitua o desenvolvimento de um projecto comum de vida do casal, de uma relação próxima do ambiente familiar com sentimentos de afectividade, convivência, confiança, conhecimento mútuos, actos de intimidade, partilha da vida em comum e cooperação mútua, devendo proceder-se, nos termos dos artigos 412º , ns 3 e 4 e 430, CPP, à sua renovação.

(n) 0 crime de violência doméstica pressupõe a existência de um agente que se encontra numa determinada relação para com o sujeito passivo daqueles comportamentos e sujeito passivo só pode ser a pessoa que se encontra, para com o agente, numa relação de proximidade, nomeadamente, na situação de cônjuge ou ex-cônjuge ou relação análoga, mas não tendo sido produzida prova que suporte a existência de uma relação estável que constitua o desenvolvimento de um projecto comum de vida do casal, de uma relação próxima do ambiente familiar com sentimentos de afectividade, convivência, confiança, conhecimento mútuos, actos de intimidade, partilha da vida em comum e cooperação mútua, não se encontram preenchidos todos os elementos do tipo legal de crime de violência doméstica.

(o) Não se encontrando preenchido aquele elemento do tipo, forçoso é concluir que o arguido não praticou o crime por que veio acusado e pelo qual foi condenado.

Sem prescindir, (p) No que concerne à medida da pena, os fundamentos aduzidos na Sentença a quo para a opção pela aplicação da pena de prisão, afastando a aplicação de pena não detentiva, não são concretizados, quando se impõem ao Tribunal a quo especiais cuidados de fundamentação, não bastando dizer que "já não é possível suspender a pena de prisão no presente caso, pois a ameaça da prisão nas anteriores condenações sofridas pelo arguido não foram suficientes para que não praticasse os factos deste processo, continuando o arguido a agredir física e psicologicamente quem lhe é mais próximo, e a quem deve respeito, permite concluir que não interiorizou a gravidade do seu comportamento", por ser necessário formular um juízo de prognose que contraria aquele que justificou a aplicação da pena de prisão.

(q) A ausência de tal fundamentação implica a nulidade da sentença, porquanto a mesma deixa de se pronunciar sobre questões que devia apreciar (cfr. artigo 379º, nº 1, al. a), CPP).

(r) A Sentença proferida pelo Tribunal a quo viola o disposto nos artigos 50º, 70º 71º e 152º, nº 1, al. b), todos do Código Penal e os artigos 32º e 205º, Constituição da República Portuguesa.

Termos em que, com os fundamentos supra expostos, deve ser revogada a douta sentença a quo, substituindo-se a mesma por outra que determine a absolvição do arguido A... pela prática, em autoria material, do crime por que veio acusado e foi condenado, pp artigo 1522, n2 1, al. b), do código penal e...

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