Acórdão nº 53/13.1GESRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | ORLANDO GON |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.
Relatório Pela Comarca de Castelo Branco – Instância Central de Castelo Branco, Secção Criminal – J2, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Colectivo, o arguido A...
, casado, reformado, filho de (...) e de (...) , nascido a 01/06/1948, na freguesia de (...) , concelho da Sertã, residente em (...) , Cernache do Bonjardim, imputando-se-lhe a prática, em autoria material e em concurso efectivo, de: - um crime de coacção sexual, p. e p. pelo artigo 163º, n.º 1, do Código Penal, e de - um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1, do Código Penal, na pessoa da ofendida C... , e de - três crimes de abuso sexual de crianças, ps. e ps. pelos artigos 171º, n.º 1, e 171º, n.º 3, alíneas a) e b), por referência ao disposto no artigo 170º, todos do Código Penal, na pessoa de B... .
A ofendida C... , por si e na qualidade de representante legal da sua filha B... , deduziu pedido de indemnização civil de fls. 259 a 261, requerendo a condenação do arguido A... no pagamento da quantia de € 7.700,00.
Realizada a audiência de julgamento - no decurso da qual foi comunicada ao arguido uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação e uma alteração da qualificação jurídica, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 358º, n.º 1 e 3, do C.P.P. -, o Tribunal Colectivo, por acórdão proferido a 4 de Maio de 2015, decidiu: Julgar parcialmente improcedente a acusação deduzida pelo Ministério Público e, em consequência: - absolver o arguido A... da prática do crime de coacção sexual, p. e p. pelo artigo 163º, n.º 1, do Código Penal, do crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171º, n.º 3, alínea a), por referência ao disposto no artigo 170º, ambos do Código Penal, e do crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171º, n.º 3, alínea b), do Código Penal, que lhe foram imputados; - condenar o arguido A... pela prática, como autor material e em concurso efectivo, de um crime de coacção, p. e p. pelo artigo 154º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa; de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa; e de um crime abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão; - proceder ao cúmulo jurídico das três penas aplicadas nestes autos ao arguido e, em consequência, condenar o arguido A... na pena única de 170 (cento e setenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz o montante de € 850,00 (oitocentos e cinquenta euros), e de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão; e - suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido pelo período de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses, com sujeição a regime de prova, de acordo com o plano que vier a ser elaborado pelos serviços de reinserção social.
Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado pelas demandantes e, em consequência: - condenar o demandado A... a pagar à demandante B... a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros) e a pagar à demandante C... a quantia de € 1.000,00 (mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais e absolver o mesmo do pagamento da restante quantia peticionada.
Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o Ministério Público, apresentando as seguintes conclusões retiradas da motivação: 1.ª Nos presentes autos o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido A... imputando-lhe a prática, como autor material e em concurso efectivo, de um crime de coacção sexual, p. e p. pelo artigo 163°, n.º 1, do Código Penal, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143°, n.º 1, do Código Penal, e de três crimes de abuso sexual de crianças, p. e p. pelos artigos 171°, n.º 1, e 171°, n.º 3, alíneas a) e b), por referência ao disposto no artigo 170°, todos do Código Penal.
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Submetido a julgamento decidiu o Tribunal a quo: - Julgar parcialmente improcedente a acusação deduzida pelo Ministério Público e, em consequência, absolver o arguido A... da prática do crime de coacção sexual, p. e p. pelo artigo 163°, n.º 1, do Código Penal, do crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171°, n.º 3, alínea a), por referência ao disposto no artigo 170°, ambos do Código Penal, e do crime de abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171°, n.º 3, alínea b), do Código Penal, que lhe foram imputados.
- Julgar parcialmente procedente a acusação deduzida pelo Ministério Público e, em consequência, condenar o arguido A... pela prática, como autor material e em concurso efectivo, de um crime de coacção, p. e p. pelo artigo 154°, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143°, n.º 1, do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, e de um crime abuso sexual de crianças, p. e p. pelo artigo 171°, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão.
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É exclusivamente quanto à absolvição do arguido da prática dos crimes de coacção sexual p. e p. pelo artigo 163°, n.º 1, do Código Penal e de abuso sexual de crianças p. e p. pelo artigo 171°, n.º 3, alínea b), do Código Penal, que lhe foram imputados que se insurge o Ministério Público.
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Na fundamentação de facto do douto acórdão recorrido, e com relevo para o que agora se impugna, foi dada como provada a seguinte matéria de facto: 1. A ofendida B... nasceu no dia 2 de Setembro de 2002 e é filha de C... e de D... .
2. No dia 3 de Julho de 2013, cerca das 21h00, a ofendida C... dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado K... , situado em (...) , Cernache do Bonjardim, acompanhada dos seus filhos B... e E... , com o intuito de aí confraternizar e tomar um café com o seu namorado F..., tendo permanecido nesse local até cerca das 23h30 do mesmo dia.
3. Depois de sair do mencionado estabelecimento comercial, a ofendida C... , acompanhada dos seus dois filhos, dirigiu-se a pé para a sua residência, situada na (...) , em (...) , Cernache do Bonjardim.
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A dada altura do percurso, a ofendida e os seus filhos cruzaram-se, por várias vezes, com o arguido, que circulava na via pública, fazendo-se transportar num velocípede.
5. Já próximo da residência da ofendida, o arguido imobilizou o velocípede e dirigiu-se apeado para junto da ofendida C... e dos seus filhos.
6. De súbito, o arguido abordou a ofendida C... , agarrou-a pelas costas, prendeu-lhe ambos os braços junto do tronco, impedindo-a assim de se mover.
7. Após, o arguido tentou beijá-la à força, enquanto a ofendida C... tentava libertar-se do arguido.
8. O arguido acabou por conseguir beijar a ofendida C... na face, após o que lhe mordeu a orelha direita, enquanto oscilava as ancas para trás e para a frente, encontrando-se já de frente para a ofendida.
9. Na tentativa de ajudar a sua mãe a libertar-se do arguido, a ofendida B... aproximou-se da mãe e do arguido, conseguindo que este largasse a sua mãe, afastando-se dela, após o que a mesma caiu no chão.
10. De seguida, o arguido aproximou-se da ofendida B... , então com 10 anos de idade, agarrou-a e colocou a mão direita entre as pernas da mesma, apalpando-a, por cima da roupa que trazia vestida, no seu órgão genital.
11. Acto contínuo, o arguido imobilizou a ofendida B... e beijou-a na face direita, ao mesmo tempo em que movimentava as ancas para trás e para a frente, tocando no corpo da ofendida.
12. Quando a mãe da ofendida B... se aproximou do arguido, o mesmo pegou no seu velocípede e abandonou o local.
13. No dia 15 de Julho de 2013, cerca das 22h00, na esplanada do mesmo estabelecimento comercial, iniciou-se uma discussão entre o arguido e a testemunha F... , namorado da ofendida C... .
14. No intuito de evitar maior confusão, a ofendida C... levantou-se e colocou-se entre os dois, tendo o arguido desferido um murro na zona do peito da ofendida C... , pontapés nas pernas e arranhões no pescoço da mesma.
15. Em consequência dos factos praticados pelo arguido, a ofendida C... sofreu hematomas e dores.
16. No dia 20 de Agosto de 2013, cerca das 22h30, no interior do café denominado K... , quando a ofendida B... se encontrava sentada num sofá a ver televisão, o arguido, que se encontrava sentado numa cadeira, começou a fazer gestos com a língua e, dirigindo-se à ofendida B... , proferiu a seguinte expressão: “ó pequenina, eu quero-te foder” 17. De imediato, a ofendida B... saiu do interior do estabelecimento comercial, tendo corrido em direcção à sua mãe, que se encontrava na esplanada do mesmo, relatando-lhe o sucedido.
18. Ao agir da forma descrita, o arguido pretendeu dar um beijo à ofendida C... , bem sabendo que actuava contra a vontade desta, recorrendo ao uso da força física para a impedir de resistir.
19. O arguido actuou com o propósito de satisfazer os seus impulsos libidinosos, bem como de provocar a excitação sexual da ofendida B... , apesar de saber que esta era menor de 14 anos e que a sua actuação era idónea para produzir dano no desenvolvimento psicológico da mesma.
20. O arguido actuou ainda com o propósito concretizado de molestar a integridade física da ofendida C... , bem sabendo que lhe provocava dores e lesões no corpo.
21. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que a ofendida B... tinha apenas 10 anos de idade e que lhe estava vedada a prática de actos sexuais com a mesma.
22. O arguido sabia que as suas condutas são censuráveis, proibidas e criminalmente punidas.
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E, de relevante para o que ora se impugna, deu como não provado que: “O arguido actuou com o propósito de manter conversação de cariz sexual com a ofendida B...
.” 6.ª Porém, analisando os factos dados como provados no acórdão...
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