Acórdão nº 141/13.4TATBU.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução27 de Janeiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: * I- Relatório No âmbito do processo comum singular n.º141/13.4TATBU do então Tribunal Judicial de Tábua, findo o inquérito o Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos A... Lda., sociedade comercial por quotas, pessoa colectiva n.º (...) , com sede social em (...) , Tábua e B... , solteiro, empresário, filho de (...) e de (...) , nascido em 21.10.19878, natural de Carregal do Sal e com última residência conhecida em Rua (...) , Oliveira do Hospital, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, p. e p. pelo art. 107.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (de ora em diante RGIT) na forma continuada.

Realizado o julgamento, por sentença proferida pelo Tribunal a quo foi o arguido B.... condenado pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 4,00 (quatro euros), para um total de € 280,00 (duzentos e oitenta euros)e foi declarado extinto o procedimento criminal instaurado contra a sociedade A.... , Lda., em consequência da respectiva declaração de insolvência.

* Inconformado em parte com tal sentença, o MP dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: “A.O Código Penal consagra no artigo 11.° a responsabilidade das pessoas coletivas, sendo que o artigo 7.° do R.G.I.T. também consagra a responsabilização destes entes; e que o artigo 127.°, n.º 1 do Código Penal consagra como causa de extinta da pessoa singular a morte; Ao apelar à similitude de situações (aplicando a mesma linha de pensamento e raciocínio) não poderemos olvidar que a extinção da pessoa coletiva (o “sistema organizativo” de que fala o Tribunal a quo) - uma criação instrumental do mundo normativo - não determina automaticamente a extinção da sua responsabilidade criminal; B. No caso das sociedades comerciais, o substrato patrimonial e pessoal das mesmas desaparece com o termo da sua personalidade jurídica que ocorrerá apenas aquando do registo do encerramento da liquidação, conforme consta do artigo 160.°, n.º 2 do Código das Sociedades Comerciais; C. Pelo que a responsabilidade criminal das sociedades comerciais não se extingue com a declaração de insolvência, não obstante a existência de uma eventual impossibilidade factual de agir sobre a entidade criminalmente responsabilizada na execução da pena que lhe foi aplicada; e antes ainda da mesma se encontrar liquidada; D. Na verdade, não se pode considerar que a sociedade arguida se encontra juridicamente extinta e muito menos que a mesma já não é criminalmente responsável; E. Pelo que o Tribunal a quo ao considerar extinta a responsabilidade da sociedade violou os artigos 141.°, n.º 1, alínea e), 146.°, n.º 2 e 160.°, n.º 2, do C.S.C., artigos 11.°, 127.°, n.º 2 e 128.° do Código Penal e artigos 7.° e 105.° e 107.° do R.G.I.T.. e artigo 475.° do Código de Processo Penal; F. Neste sentido, e considerando os factos dados como provados pelo Tribunal a quo, ter-se-ia de considerar que a conduta da sociedade arguida, é suscetível de ser apreciada criminalmente e, por isso, de ser julgada e apreciada em sede de julgamento; G. Não obstante o Tribunal a quo ter efetuado julgamento e ter fixado matéria de facto provada e não provada quanto a ambos os arguidos, a verdade é que não se pronunciou sobre a matéria de facto dada como provada, subsumindo-a criminalmente e fundamentadamente quanto à sociedade arguida, e fixando, consequentemente, pena e medida da pena; H. Contudo, sempre se dirá que os autos se encontram munidos de todos os elementos necessários para o Tribunal poder apreciar a responsabilidade criminal da sociedade arguida, condenando-a e fixando pena e medida da pena, desde logo considerando-se os seguintes elementos: certidão comercial, informação quanto aos pagamentos efetuados, certidão do processo de insolvência, as declarações remetidas, bem como toda a prova testemunhal, sendo ainda de considerar os pontos da matéria de facto dada como provada; I. Sendo que ao não o ter feito, verifica-se uma contradição entre a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento e a matéria de facto dada como provada e não provada: consubstanciando tal, um erro de julgamento que se traduz numa contradição entre a prova produzida em julgamento e os factos considerados provados e não provados, logo, um erro notório na apreciação dessa prova; J. Nestes termos teremos sempre que concluir que a Sentença violou, também, o disposto no artigo 127.° do C.P.P. e nos artigos 7.° e 107.°, n.ºs. 1 e 2 e 105.° n.ºs. 1, 4, 5 e 7 todos do R.G.I.T..

Nestes termos e nos demais de Direito deve a Sentença em crise ser revogada, na parte em que determina a extinção da responsabilidade criminal da sociedade arguida “ A.... Lda.”, e, consequentemente, substituída por outra que aprecie a responsabilidade da sociedade comercial arguida, procedendo-se a julgamento - caso se revele para tanto necessário, com a fixação da matéria de facto que considere provada e não provada referentes a esta arguida, e julgando de facto e de direito a causa -, com a determinação da sua condenação e consequentemente da pena e da medida da pena (ou absolvição), julgando o recurso ora interposto procedente e alterando a Decisão proferida pelo Tribunal a quo, com as demais e ulteriores consequências legais.” * Não houve resposta.

* O recurso foi admitido por despacho constante de fls. 447.

* Nesta Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer pronunciando-se pelo provimento do recurso, por entender que “ … a personalidade jurídica das sociedades comerciais não se extingue com a declaração e insolvência, com base em disposições legais do Código das Sociedades Comerciais (v.g. o art.° 146°, n.º 2). Assim sendo, até poderemos considerar que afastado fica o paralelismo que se pretenda fazer com o disposto no art.° 127°, n.° 1 do C. P., na medida em que a personalidade jurídica da pessoa colectiva permanece para além da declaração de insolvência até ao encerramento da sua liquidação.

Neste momento sim, também por lei especial expressa é declarada a extinção da pessoa colectiva (art.° 160°, n.º 2 do Cód. Soc. Com.) e só a partir deste momento se poderá considerar a extinção da responsabilidade penal.” * Cumprido o disposto no art. 417º, n.º2 do CPP e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência pelo que cumpre conhecer.

* II- Fundamentação 1. É o seguinte o teor da sentença na parte que interessa ao objecto do recurso (transcrição): «3.4.1. Questão Prévia – Extinção da Responsabilidade Criminal de A.... , Lda.

A.

A sociedade arguida nos presentes autos percorreu um processo de declaração de insolvência, ingressando em fase de liquidação do respectivo activo (cfr. Factos Provados 22.)).

Existindo declaração de situação de insolvência, a que acresce o respectivo ingresso em processo de liquidação, entendemos que o tribunal se confronta com um problema de subsistência da responsabilidade criminal – uma vez que se verifica o desaparecimento do centro de imputação da responsabilidade penal – num circunstancialismos em que subsiste a sua aptidão para ser sujeito de relações jurídicas, conferida pelo estatuto da personalidade e quando apenas à extinção desta última se associa, a extinção da responsabilidade por crime (cfr. art. 127.º/1, primeira parte, do CP...

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