Acórdão nº 1903/15.3T8PBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Janeiro de 2016
Magistrado Responsável | VASQUES OS |
Data da Resolução | 27 de Janeiro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO Por decisão delegada de 31 de Dezembro de 2013 do Presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, o arguido A... , com os demais sinais nos autos, foi condenado, pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelos arts. 27º, nºs 1 e 2, a), 138º, 143º e 145º, b), todos do C. da Estrada, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de sessenta dias, suspensa na respectiva execução pelo período de trezentos e sessenta e cinco dias, condicionada à frequência, durante o período de suspensão, de uma acção de formação no módulo velocidade.
Inconformado com o decidido, o arguido interpôs recurso de impugnação judicial o qual, por sentença de 29 de Setembro de 2015, depositada no dia imediato, foi julgado improcedente, com a consequente confirmação da decisão administrativa nos precisos termos em que foi proferida.
* De novo inconformado com a decisão, recorre o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1.ª A sentença de fls., debalde douta, deve ser revogada.
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Com efeito, subsiste nos autos um vício que inquina todo o processado, i.e. a falsa e deficiente fundamentação da decisão administrativa recorrida.
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Vício gerador da Inconstitucionalidades desta e da nulidade processual, que deve determinar a absolvição do Recorrente, com todas as legais consequências.
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O Tribunal "a quo" deu como provado que – cfr. ponto IV: 1. No dia 04.06.2013, pelas 09h46m, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros, com a matrícula LL... , na AE1, sentido Norte/Sul, ao km 144,400, Covinhas, Pombal, à velocidade de 168 km/h registada, correspondente à velocidade relevante de 159 km/h, sendo a velocidade máxima permitida no local de 120 km/hora.
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A velocidade foi verificada através Radar MULTANOVA MUVR-6FD, nº 2627, aprovado pela ANSR desp. 15919/11, de 12.08.2011, e pelo IPQ, através do despacho de aprovação nº 111.20.06.343, de 18Jun07, verificado em 17.05.2012, rolo nº 347/21, operador de radar nº 2653.
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O arguido ao actuar da forma descrita revelou desatenção e irreflectida inobservância das normas de direito rodoviário, actuando com manifesta falta de cuidado e prudência que o trânsito de veículos aconselha e no momento se lhe impunham, agindo de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta é proibida e sancionada pela lei contra-ordenacional.
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O arguido efectuou o pagamento voluntário da coima, através de depósito.
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O arguido tem averbado no seu registe individual de condutor a prática de uma contra-ordenação, auto nº 967358582, por factos de 30.05.2012, por condução com excesso de velocidade.
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A verdade é que não estamos perante um segmento de factualidade pura, não tendo sido concretizada a adjectivação "prova" ou forma de obtenção dessa.
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De acordo com a decisão administrativa recorrida, não concretiza Decisão, como legalizou a recolha da prova e provou os factos e, muito menos especifica qual a falta de cuidado e prudência.
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Como é sabido, a decisão administrativa proferida no quadro de um procedimento contra-ordenacional deve ser devidamente fundamentada, mediante a enunciação concreta, ainda que sucinta, de factos susceptíveis de integrar os normativos (alegadamente) violados.
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Fundamentar implica, por isso, alegar razões de facto e fundamentos de direito.
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Dizer que tem averbado em 2012 no seu cadastro uma contra-ordenação idêntica sem a especificar é o mesmo que nada dizer.
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Tudo conforme o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 58.º do Decreto-Lei n.º 433/83, de 27.10.
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Ora, ao invocar-se que a prova e os factos de forma generalizada e sem a prova devida, salvo o devido respeito, faz-se uso de um ou diversos "conceitos indeterminados" e descontextualizados.
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Com efeito, são conceitos que necessitam de ser adequadamente preenchidos com factos, que como se constata não ocorreram.
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Donde, a decisão administrativa recorrida padece de um vício de fundamentação, gerador de nulidade, face ao conteúdo das disposições conjugadas dos artigos 41.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27.10, e 379.º, n.º 1, al. a) do CPP.
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Nulidade que persiste, que inquina todo o processado, e que por isso se invoca.
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E da qual o Tribunal "a quo" deveria ter conhecido, daí extraindo todas as ilações e consequências.
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O que não fez, ao invés procurou enquadrar as omissões e Nulidades com uma nova prova generalizada e sem conteúdo de que o Arguido tem averbado no seu cadastro infracção idêntica, isto sem a concretizar.
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E a verdade é que não se compreende o entendimento professado pelo Tribunal recorrido.
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Com efeito, é sabido que as entidades autuantes têm o – mau … – hábito de transporem para os autos de notícia o texto integral dos tipos de ilícito.
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Deixando pouca margem para factos concretos.
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O que é tanto mais significativo quando o tipo legal de contra-ordenação não assenta numa actuação objectiva e directamente apreensível, mas em conceitos indeterminados.
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Como é o caso.
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Assim, dizer-se "condução com manifesta falta de cuidado e negligência" é, reitera-se, o mesmo que nada dizer.
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Donde, o auto de fls. e a decisão administrativa que se lhe seguiu não assenta em factos.
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Pelo que a decisão é nula, por vício de fundamentação, o que uma vez mais se invoca. Termos em que deve dar-se provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, tudo com as legais consequências e em conformidade com as conclusões.
DO DIREITO O processo de contra-ordenação no seu início é meramente administrativo e que sé se torna judicial se o Arguido pretender impugnar a decisão proferida na fase administrativa.
Na fase administrativa do processo, nem o auto de notícia, nem a posterior notificação para apresentação da defesa, no domínio da fase administrativa do processo de contra-ordenação equivalem à acusação em processo crime.
É a apresentação pelo M.P. ao juiz dos autos provenientes da autoridade administrativa que equivale à acusação. É este o momento em que a autoridade judiciária adquire a notícia do crime.
Ora, tendo o recorrente impugnado a Decisão e esta sido apresentado a juízo, perdeu estao cariz meramente administrativo, passando a ser este judicial.
Refere o Tribunal Recorrido que a aplicação das normas de direito penal a este tipo de processo só faz sentido nos casos omissos e ainda, que a notificação que a Recorrente recebeu da ANSR, apenas tem que obedecer aos requisitos do disposto no Art.170.º nº 1 do C. Estrada.
A decisão administrativa é nula por falta de especificação do facto imputado, ao não concretizar os factos em concreto em que assenta a condenação.
A decisão administrativa é ainda nula por falta de motivação, posto não indicar concretamente as provas obtidas, nem fazer tão pouco o exame crítico das provas que serviram para fundamentar a convicção do decisor (arts. 58.º- 1, al. b), 374.º- 2, 379.º, citados).
O reconhecimento da nulidade implicará a devolução do caso à autoridade administrativa para que repare o vício; não se sanando o mesmo com a emergência da decisão judicial.
A falta de documentação dos actos da audiência, supostamente autorizada pela lei (art. 66.º, DL 433/82), assim como a proibição de recurso na matéria de facto (art. 75.º), afrontam os princípios constitucionais do processo equitativo e do direito de defesa do arguido (arts. 20.º- 4, 32.º- 10, Const.), padecendo aquelas normas de inconstitucionalidade material.
A decisão judicial sofre de contradição insanável da fundamentação, como se diz na alegação, quanto às questões relacionadas com os meios como foi obtida a prova e outros, como a apresentação ou o facultar a prova ao Arguido – que não ocorreu – que violam a Constituição por não terem ocorrido, o que além de serem insuficientes para a decisão a matéria apurada, convolam na Nulidade toda a prova obtida, nomeadamente quando os técnicos que são aqueles que validam a prova carreada para o Tribunal, são os próprios militares e estes, contradizem o que o próprio Auto refere no que se traduz no máximo erro admissível.
Termos em que e, com o sempre Douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado Provimento ao recurso e, consequentemente seja revogada a decisão recorrida, determinando-se a final o Arquivamento dos Autos por falta de prova em concreto.
Só assim se fará a costumada e esperada JUSTIÇA! * Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público, alegando que o recorrente, apesar de considerar que o auto de notícia está mal feito, não identifica o defeito, nem o que deveria ter para perceber que apenas circulava, naquele lugar e àquela hora, com excesso de velocidade, sendo estes factos indicados e referidos os meios como foram obtidos, tratando-se, portanto, de uma situação em que a discordância é meramente artificial, e concluiu pela confirmação da sentença recorrida.
* Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, afirmando o acerto da decisão recorrida quanto às nulidades invocadas, a inexistência do vício da contradição insanável da fundamentação e a...
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