Acórdão nº 750/15.7T9LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Março de 2016
Magistrado Responsável | ISABEL VALONGO |
Data da Resolução | 02 de Março de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. Por decisão de 2-10-2013da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária foi a arguida A... , portador do BI n.º (...) e do título de condução n.º (...) , residente na Rua (...) Lisboa, condenada pela prática de uma contraordenação p. e p. prevista no art.ºs27º, n.º 1 , n.º 2 , alínea a) , 3º e 146º , do Código da Estrada, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 120 dias.
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Inconformada, a arguido impugnou judicialmente a decisão, concluindo nos termos constantes de fls. 20 a 24, pugnando, então, pela declaração de nulidade da decisão administrativa por falta de fundamentação por não identificar devidamente qual a infracção praticada pela arguida que deu origem à reincidência, e por considerar relevante para esse efeito uma sanção acessória suspensa na sua execução ( extinta),e pugna ainda pela aplicação da atenuação especial da sanção acessória.
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Recebido o recurso, que correu termos sob o n.º 750/15.7T9LRA pela Comarca de Leiria – Inst. Local – Secção Criminal – J2, perante o assentimento manifestado pela arguida e Ministério Público no sentido de o mesmo ser conhecido mediante despacho, em 12-06-2015 foi proferida a decisão de fls. 45 a 53, a qual julgou totalmente improcedente o recurso, mantendo a decisão administrativa.
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Uma vez mais inconformada recorreu a arguida, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: I - A decisão administrativa proferida pela ANSR é nula.
II- Ao não considerar nula a decisão administrativa proferida pela ANSR, o Tribunal “a quo” violou o disposto no art° 58°, n° 1, al. a), do RGCO e, ainda, o disposto no art° 379°, n° 1, al. a) do CPP, aplicável subsidiariamente ao direito contra-ordenacional, dada a inexistência de norma especial, quer no RGCO, quer no Código da Estrada.
III- A decisão administrativa enferma do vício de “falta de fundamentação” ou, pelo menos, de “fundamentação insuficiente”, por não identificar devidamente qual foi a infracção anteriormente praticada pela arguida, que deu origem à alegada reincidência, o que a toma nula e de nenhum efeito.
IV- Não basta a indicação do n° do auto de contra-ordenação anterior, sendo necessário que a decisão administrativa condenatória identifique essa infracção anterior, quais os factos em que a mesma se traduziu, qual a data da ocorrência e se a mesma transitou, ou não, em julgado, e em que data, fundamentando-se, então, a decisão de considerar a arguida reincidente e de elevar para o dobro a sanção acessória aplicada.
V- O Tribunal “a quo” não aplicou bem o direito, ao considerar relevante, para efeitos de reincidência, uma sanção acessória suspensa na sua execução, depois de decorrido o período de suspensão sem que tenha havido lugar à sua revogação, o que equivale a uma sanção extinta.
O Tribunal “a quo” violou, assim, o disposto no art° 75°, n° 4, do CP, aplicável subsidiariamente ao processo contra-ordenacional.
VI- O vício da decisão administrativa constitui, também, um dos fundamentos do presente recurso.
VII- Constituem, ainda, fundamentos do recurso, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e o erro notório na apreciação da prova(art° 410°, n° 2, al. a) e c) do CPP).
VIII- Deve, assim, a sentença recorrida ser alterada, nos termos supra expostos, ou, em alternativa, ser a mesma anulada e remetida ao Tribunal recorrido, com todas as legais consequências (art° 75°, n° 2, al. a) e b) do RGCO).
Concedendo-se provimento ao presente recurso, far-se-á a habitual JUSTIÇA.
Pede Deferimento.
Fazendo-se assim a habitual e necessária Justiça.” 5. Por despacho exarado a 7-09-2015 foi o recurso admitido, fixado o respetivo regime de subida e efeito.
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O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo: “(…) I- Da Nulidade da Decisão da Autoridade Administrativa A recorrente vem alegar que a decisão da ANSR é nula, sendo que, em nosso entender, não concretizou devidamente os factos pelos quais entende que tal decisão padece de tal vício.
O artigo 58° do RGCO esclarece quais os requisitos a que deve obedecer a decisão condenatória da autoridade administrativa.
Ora, da leitura de tal decisão (fls.9 a 10), resulta claramente que a mesma preenche os requisitos plasmados em tal artigo.
Assim, a decisão da autoridade administrativa fundou-se, entre outros, no auto de notícia elaborado, o qual, desde logo, contém a factualidade suficiente que permite a imputação da contra-ordenação em causa.
Acresce que, na decisão da autoridade administrativa é feita alusão à factualidade referente ao tipo subjectivo do ilícito, constando de tal decisão que a arguida actuou a título de negligência, por ter revelado “desatenção e irreflectida inobservância das normas de direito rodoviário”.
Mais decorre do teor da decisão administrativa, que a recorrente agiu deliberada, livre e conscientemente e que sabia que estava a praticar um ilícito contra-ordenacional.
Por outro lado, cumpre frisar que não se mostra estabelecido na norma do artigo 58° do RGCO, bem como em qualquer outra norma quais as consequências da inobservância dos requisitos previstos em tal artigo.
Neste caso, não tem aqui aplicação o disposto no artigo 379° do Código de Processo Penal, contrariamente ao alegado, uma vez que se o arguido interpuser recurso da decisão condenatória, esta converter-se-á em acusação, nos termos do artigo 62°, n° 1 (neste sentido acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 17.3.1999, Rec.°, n° 11/99, www.trc.pt,in " Contra-Ordenações, Anotações ao Regime Geral, Sérgio Passos, Editora Almedina, Junho 2004, página 385.
E no mesmo sentido " Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, anotado, 7a edição, António Beça Pereira, Editora Almedina, Julho 207,página 116").
Também não se deve recorrer ao disposto no artigo 283°, n° 3 do Código de Processo Penal, visto que se não for interposto recurso da decisão condenatória, esta não chega a assumir a natureza de acusação.
Acresce que, o artigo 118°, n° 1 do Código de Processo Penal estabelece o princípio que só são nulidades as que estejam expressamente previstas, pelo que a inobservância dos requisitos do artigo 58° do RGCO conduzirá a uma mera irregularidade, nos termos do artigo 123° do Código de Processo Penal (neste sentido Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, anotado, 7a edição, António Beca Pereira, Editora Almedina, Julho 207,página 116).
Em suma, concluímos que não se verifica qualquer nulidade da decisão da autoridade administrativa, por omissão de factos.
II- Da falta de fundamentação da decisão administrativa Nesta matéria, alega a recorrente que a decisão administrativa enferma do vício de " falta de fundamentação", por não identificar devidamente qual a infracção praticada pela arguida, que deu origem à alegada reincidência, uma vez que não basta a mera indicação do número do auto de contra-ordenação anterior.
Ora, do teor da decisão administrativa decorre que a arguida foi considerada como reincidente (em virtude de ter praticado uma infracção grave nos últimos cincos anos que procederam a tomada de decisão) e é feita uma menção ao auto respectivo (cfr. fls. 9, parte final) e, sem necessidade de mais delongas, entendemos que tal é suficiente para justificar a punição da recorrente como reincidente, tanto mais que o dever de fundamentação da decisão administrativa obedece a regras de celeridade e simplicidade que assumem uma dimensão muito menor daquela que é exigida numa sentença judicial.
III- Da violação do artigo 75°, n° 4 do Código Penal Conforme alega a recorrente, o tribunal a quo não aplicou bem o direito, ao considerar relevante para efeitos...
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