Acórdão nº 684/14.2T8CBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução16 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: O Banco A..., S.A. instaurou contra F..., Lda. e J... execução para pagamento de quantia certa sob a forma de processo ordinária, dando à execução uma letra de câmbio sacada pela sociedade executada e aceite pelo executado. Mais invocou que a letra foi sacada no âmbito das relações comerciais entre executados e que, depois de sacada, foi descontada pelo executado.

    Citado, veio o executado deduzir os presentes embargos, nos quais invocou a prescrição do título executivo, impondo-se portanto ao banco exequente que invocasse a relação material subjacente. Tendo alegado a este propósito tão-somente que a letra foi sacada no âmbito das relações comerciais mantidas pelos executados entre si, é tal alegação manifestamente insuficiente para que a letra de câmbio prescrita possa valer como título executivo.

    Mais invocou a prescrição dos juros, tendo ainda impugnado a taxa utilizada para o respectivo cálculo, assim como a quantia ali incluída a título de imposto de selo.

    Contestou o banco exequente, defendendo que a relação subjacente se encontra com suficiência explicitada no requerimento executivo, no qual foi alegada a existência de transacção comercial entre os executados, justificativa da emissão do título e a subsequente operação de desconto, pelo que a letra exequenda constitui título executivo plenamente válido.

    Sustentou ainda a correcção do cálculo dos juros e validade da taxa aplicada, defendendo que a cobrança do imposto de selo corresponde a um imperativo legal.

    Convidado o embargado a fazer prova da convenção de juros, veio o mesmo reconhecer não ter forma de o fazer, para além do que consta do sistema informático do banco.

    Anunciando que os autos continham os elementos necessários à prolação de decisão conscienciosa de mérito, proferiu a Mm.ª juíza “a quo” douto saneador sentença, por cujos termos foram os embargos julgados parcialmente procedentes, tendo sido declarada a prescrição dos juros anteriores a 28.12.2010, com a consequente redução da quantia exequenda, determinando-se o prosseguimento da execução pelo montante inscrito no título acrescido dos juros vencidos a partir de 29/12/2010 contados à taxa de 4%, ao invés da taxa utilizada pelo exequente, em virtude do que o pedido executivo sofreu nova redução, e montante devido a título de imposto de selo.

    Inconformado com a decisão apelou o embargante e, tendo desenvolvido em sede das doutas alegações apresentadas as razões da sua discordância com o decidido, condensou-as a final nas seguintes necessárias conclusões: ...

    Com os aludidos fundamentos requer a final a revogação da decisão proferida e sua substituição por outra que, na procedência do recurso, declare extinta a execução quanto ao recorrente.

    Contra alegou o Banco exequente/embargado, defendendo a manutenção do julgado.

    Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, as questões submetidas à apreciação deste Tribunal são: i. determinar se a sentença apelada padece dos vícios da falta de fundamentação e ambiguidade, que são causa de nulidade; ii.

    decidir se a letra junta aos autos reúne os requisitos necessários para que possa ser considerada título executivo contra o embargante atento o disposto no art.º 703.º, n.º 1, al. c) do CPC.

    i. da nulidade da sentença (por ambiguidade e falta de fundamentação) Considerando a sua precedência lógica, impõe-se que se inicie o conhecimento das questões elencadas pela invocação da nulidade da decisão apelada.

    O recorrente imputa à decisão recorrida o vício extremo da nulidade, por violação do disposto nas als. b) e c) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC.

    Analisemos, pois, cada uma das invocadas nulidades de “per se”.

    No entender do apelante, a sentença apelada “evidencia uma completa omissão de motivação da decisão sobre a matéria de facto”, assim incorrendo no vício da nulidade por falta de fundamentação.

    Epigrafado de “Dever de fundamentar a decisão”, o art.º 154.º do CPC impõe o juiz que fundamente as decisões proferidas sobre qualquer dúvida suscitada no processo ou qualquer pedido controvertido (vide n.º 1). Em consonância com tal dever de fundamentação, as sentenças são nulas quando não especifiquem os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (vide al. b) do art.º 615.º do mesmo diploma legal).

    O dever de fundamentação das decisões corresponde a uma exigência constitucional (cf. art.º 205.º, n.º 1 da CRP) e, sendo um instrumento legitimador da própria decisão -quanto mais persuasivo for o seu discurso, mais facilmente será convencido o seu destinatário e acatado o seu conteúdo-, constitui ainda garantia da efectividade do direito ao recurso. Todavia, conforme sem dissêndio vem sendo entendido -entendimento que mantém plena actualidade face à redacção da al. b) do art.º 615.º agora em vigor, uma vez que reproduziu, sem alterações, a solução normativa antes contida na al. b) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC- só a absoluta, que não a deficiente ou pouco persuasiva fundamentação, recai na previsão legal.

    Assim, para que se verifique o vício da falta de fundamentação, exige a lei que tenham sido de todo omitidas as razões (de facto e/ou de direito) que conduziram à prolação daquela concreta decisão (v., por todos, aresto do STJ de 15/12/2011, processo n.º 2/09.9 TTLMG.P1S1 e desta mesma Relação de 17/4/2012, processo n.º 1483/09.9 TBTMR, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).

    Do que vem de se expor resulta claro que a sentença proferida[1] não padece do imputado vício, uma vez que a Mm.ª juíza, independentemente do acerto da decisão, que para aqui não releva, enumerou e descreveu com clareza os factos considerados relevantes que julgou provados, tendo ainda explicitado, com indicação das normas jurídicas pertinentes, as razões de direito pelas quais considerou que a oposição deduzida pelo recorrente não merecia um juízo de procedência.

    Cumpre ainda precisar que eventual insuficiência da matéria de facto ou deficiência na motivação da decisão a este propósito proferida não têm a virtualidade de afectar o valor formal da sentença, cuja nulidade é determinada pelos vícios taxativamente elencados nas diversas alíneas do n.º 1 do dispositivo legal a que nos...

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