Acórdão nº 136/12.5TASEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Fevereiro de 2016
Magistrado Responsável | IN |
Data da Resolução | 03 de Fevereiro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Processo comum com intervenção do tribunal colectivoda Comarca da GUARDA - Instância Central – Secção Cível e Criminal – Juiz 1.
***Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório
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Recurso do acórdão: No processo supra identificado foi pronunciado o arguido A...
, solteiro, natural de (...) , onde nasceu a 7 de Julho de 1968, filho de (...) e de (...) , residente na (...) Seia, pelos factos descritos no despacho de pronúncia constante de fls. 788 a 793 pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, nos 1, al. a), e 2, e de um crime de violação, p. e p. pelo art.164.º, n.º 1, ambos do Código Penal.
*O tribunal colectivo deliberou: I.
Absolver o arguido do imputado crime de violação.
II.
Condenar o arguido, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, nos 1, alínea a), e 2, do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão.
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Condenar o arguido a pagar a B... a quantia de € 3 000,00 (três mil euros), nos termos do disposto nos artigos 21.º, n.º 2, da Lei nº 112/2009, de 16 de Setembro, e 82.º-A do Código de Processo Penal.
*Inconformado com o acórdão proferido recorreu o arguido, formulando as seguintes conclusões: «1.ª - A 9 de Outubro de 2013 foi proferido pelo Colectivo do 2.° Juízo do Tribunal Judicial de Seia o acórdão de fls. 1564 a 1574 destes autos, no qual se condenou o arguido pela prática de um crime de violência domestica, p. e p. pelo art. 152.°, n.ºs 1, al. a) e 2 do Código Penal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão efetiva.
- Questão prévia com influência para o presente recurso: 2.ª - Por requerimento de 22.07.2015 o arguido veio aos presentes autos arguir a nulidade insanável e de conhecimento oficioso prevista na al. c) do artigo 119.º, do C.P.P., na medida esteve ausente durante a audiência de julgamento e não se encontrava representado por advogado mandatado, nem por defensor.
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- Para o efeito alegou que a assinatura constante na procuração junta aos autos pela Il. Advogada que o representou na audiência de julgamento foi falsificada, e requereu que se ordenasse a realização de um exame pericial à assinatura aposta naquela procuração forense, e bem assim a suspensão destes autos até à decisão a proferir sob a invocada nulidade, após a realização do requerido exame pericial.
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- As presentes alegações de recurso são apresentadas sem que o arguido tenha conhecimento da resposta do Meritíssimo Juiz do Tribunal de 1.ª Instância ao referido requerimento e à invocada nulidade.
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– Assim, é sem rescindir da arguição daquela nulidade que se apresentam as presentes alegações de recurso.
Da nulidade insanável contemplada na al. c) do art. 119.° do C.P.P., pela realização da audiência de julgamento sem a presença do arguido: 6.ª - O arguido, devidamente notificado para a 1.ª e 2.ª datas da audiência de julgamento, faltou - sem que haja justificado a falta - tendo-se iniciado ambas as audiências sem a sua presença e produzido a respetiva prova (cfr. atas de fls. 1524/1527 e 1540/1545).
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- Ninguém pode ser julgado na ausência sem que seja cumprido o formalismo em que tal é permitido (artigos 332.º, n.º 1 e 333.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.P.).
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- Esse formalismo implicava que o Coletivo se pronunciasse: (i) sobre a não imprescindibilidade da presença do arguido desde o início da audiência para a descoberta da verdade material; (ii) sobre a prescindibilidade da sua presença no julgamento; (iii) sobre a realização das medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência.
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- No entanto, a audiência de julgamento decorreu sem que o Tribunal Coletivo se tenha pronunciado sobre nenhuma destas questões, ocorrendo, por isso, a nulidade insanável contemplada na al. c) do artigo 119.º, do C.P.P., que aqui expressamente se invoca.
- Do não adiamento da audiência devido à falta de comparência da ofendida: 10.ª - A ofendida, na qualidade de testemunha arrolada pelo Ministério Público, devidamente notificado para a 1.ª e 2.ª datas de julgamento, faltou - sem que haja justificado a falta - tendo decorrido ambas as audiências sem a sua presença (cfr. atas de fls. 1524/1527 e 1540/1545).
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- A ofendida era a única testemunha presencial dos factos imputados ao arguido e, por isso, não obstante ter prestado declarações para memória futura na fase de inquérito, o seu depoimento presencial, nos termos do n.º 8 do artigo 271.º, do C.P.P., era essencial à boa decisão da causa e à descoberta da verdade material.
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- Como a audiência não tinha sofrido ainda qualquer adiamento para efeitos do artigo 331.º, n.º 1 do C.P.P., o Tribunal a quo deveria ter-se pronunciado sobre se a presença da testemunha (ofendida) era indispensável ou não à boa decisão da causa e, nesse contexto, deveria ter adiado (se a considerasse, como se impunha, indispensável à boa decisão da causa) o julgamento.
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- Acontece que não foi prestado depoimento pela ofendida, não foi justificada qualquer impossibilidade de ser obtido esse depoimento, nem o tribunal se pronunciou sobre se a presença dessa testemunha era indispensável à boa decisão da causa.
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- Para mais, contêm os autos - como certamente o Coletivo não ignorará, mas que incompreensivelmente resulta haver ignorado ou desvalorizado elementos que permitem, de modo sério, questionar a credibilidade das declarações prestadas pela arguida.
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- Impondo-se, por isso, de forma reforçada, que o Tribunal considerasse a presença da ofendida na audiência de julgamento indispensável à boa decisão da causa.
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- Assim, considerando o disposto no artigo 340.º, n.º 1 do C.P.P., não tendo o Tribunal a quo adiado o julgamento, em clara violação daquela norma, cometeu a nulidade a que alude o art. o 120.º, n.º 2 al. d) do C.P.P. por omissão de diligência essencial à descoberta da verdade, a qual aqui expressamente se invoca.
- Exceção de caso julgado por violação do princípio ne bis in idem: 17.ª - O arguido foi condenado no Processo Comum Colectivo n.º 43/06.0GASEI, do 2.° Juízo do Tribunal Judicial de Seia, por acórdão proferido em 7 de Maio de 2008, transitado em julgado em 11 de Junho de 2010, pela prática de um crime de maus tratos, a que atualmente corresponde o crime de violência doméstica, na pessoa da ora ofendida B... , na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por 18 meses, com sujeição a regime de prova, que cumpriu. (cfr. ponto n.º 46 dos factos provados e certidão de fls. 181 e ss dos autos).
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- O acórdão proferido no processo n.º 43/06.0GASEI incidiu sobre factos ocorridos, pelo menos, até ao ano de 2007.
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- Comparando ambas as decisões, torna-se claro que certos factos dados como provados no acórdão ora recorrido se incluem no âmbito espácio-temporal da condenação anterior.
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- Assim, no que respeita à primeira parte do facto provado n.º 3 "Durante todo o tempo de vivência em comum do casal, o arguido sujeitou a ofendida, sua companheira, a humilhações e agressões (…)" - o arguido nunca poderia ser condenado neste processo por factos praticados durante todo o tempo de vivência em comum do casal, abarcando assim um "pedaço de vida" do arguido já objeto de decisão equiparada.
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- O ponto n.º 16 dos factos provados do acórdão recorrido, que se refere a uma agressão com uma pá de brinquedo, diz respeito a factos que já haviam sido julgados no processo n.º 43/06.0GASEI e que constam especificamente nos n.º 11 e 12 da matéria de facto não provada desse acórdão.
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- Resulta claro do acórdão recorrido que o Tribunal a quo não logrou situar temporalmente este facto, reportando-se apenas ao facto de ter ocorrido em ocasião anterior aos demais factos.
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- Nas declarações para memória futura prestadas pela ofendida, esta também referiu que este episódio ocorreu há muito tempo atrás, quando os dois filhos mais velhos eram pequenos (cfr. pág. 17 e 71 da transcrição das declarações da ofendida a fls. 383 e ss. dos autos).
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- Por sua vez, o ponto n.º 29 dos factos provados refere-se ao controlo exercido desde sempre pelo arguido em relação à ofendida e ao facto de sempre a ter impedido de trabalhar e de auferir os seus próprios rendimentos.
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- O ponto n.º 30 dos factos provados diz que o arguido sempre adquiriu os alimentos necessários à subsistência da ofendida e dos filhos e que só traz para casa o que lhe aprouver e quando lhe apetece.
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- O ponto n.º 31 dos factos provados refere que o arguido nunca permitiu que a ofendida tomasse qualquer método contraceptivo, contra a vontade desta.
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- O Tribunal a quo não deu como provado um único facto concreto, ocorrido em data posterior ao "período de história de vida" do arguido e da ofendida que já foi julgado no processo n.° 43/ 06.0GASEI, que justifique que o arguido volte a ser submetido a julgamento pela suposta prática de tais factos.
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- Ora, com o trânsito em julgado do acórdão proferido no processo anterior, transitou em julgado o "pedaço de vida" do arguido que, formando uma unidade de sentido, se submeteu à apreciação daquele Tribunal.
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- Deste modo, no que respeita aos pontos de facto n.ºs 3, 1.ª parte, 16, 29, 30 e 31, o arguido foi julgado duas vezes pela prática dos mesmos factos, em violação do princípio ne bis in idem previsto no n.º 5 do art. 29.° da Constituição da República Portuguesa, devendo, por isso, ser declarada a exceção de caso julgado e, em consequência, ser revogado o acórdão recorrido.
- Das imputações genéricas e violação das garantias de defesa do arguido: 30.ª - Num tipo de crime tão amplo como a violência doméstica, a precisa indicação e concretização dos factos necessários à integração no tipo deve ser um elemento essencial do julgamento. Porém, 31.ª - Os pontos n.ºs 3 (1.ª parte) e 4 dos factos provados são puras imputações genéricas, sem qualquer concretização factual.
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- Os pontos n.ºs 5, 6, 7, 17, 18 e 19 dos factos provados são imputações genéricas, indefinidas e imprecisas, que impossibilitam um adequado contraditório do arguido. Não se precisam as datas e os...
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