Acórdão nº 9/14.7GCTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelOLGA MAUR
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 4ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra: RELATÓRIO 1.

O arguido A... foi condenado na pena de 10 meses de prisão pela prática de um crime de detenção de arma proibida, do art. 86º, nº 1, al. c), da Lei nº5/2006, de 23/2, e foi absolvido dos crimes de violação agravada, na forma consumada, e de coacção sexual, na forma tentada.

  1. O Ministério Público recorreu, concluindo: «1. O Ministério Público conforma-se com a factualidade dada como provada e não provada, pelo que restringe o seu recurso à matéria de direito; 2. O Ministério Público conforma-se com a decisão recorrida quanto à absolvição do arguido pela prática do crime de violação da menor B... ; 3. Mas o Ministério Público entende que os factos dados como provados, relativamente à, então menor, D... consubstanciam o crime de coacção sexual de que o arguido vinha acusado e não o crime de assédio sexual que o tribunal a quo entendeu estar preenchido - pelo que houve violação do disposto no artigo 163º nº 1 do Código Penal; 4. Com efeito, o artigo 163º, nº 1 do Código Penal não exige que a ameaça seja típica, nem que a sua gravidade seja aferida pela sua subsunção a alguma das circunstâncias agravantes previstas no artigo 155º, nº 1 do Código Penal; 5. Ao invés, exige que a gravidade da ameaça seja aferida em face de todas as circunstâncias concretas, em termos objectivos, mas numa perspectiva de adequação da mesma à contracção da liberdade da vítima; 6. Considerando o grau de propagação e difusão dos conteúdos disponibilizados na internet, mormente os de cariz sexual, a ameaça de divulgação de imagens de intimidade corporal e/ou sexual da D... tinha o grau de gravidade e intensidade para ser adequada, apta e eficaz a manipular a liberdade sexual da mesma, subsumindo-se, por isso, à previsão legal do artigo 163º, nº 1 do Código Penal; 7. Atendendo que a pena abstracta aplicável ao crime de coacção sexual, na forma tentada, se situa entre 1 mês e 5 anos e 4 meses de prisão, entende o Ministério Público que a pena concreta a aplicar se deverá situar próxima de 1 ano e 6 meses de prisão; 8. Sendo a pena abstracta, prevista para o crime de detenção de arma proibida, a de prisão de 1 a 5 anos ou multa até 600 dias e tendo o tribunal a quo considerado, e bem, que a pena pecuniária era de excluir, não havendo nenhuma circunstância que permitisse a atenuação especial da pena, jamais poderia aplicar ao arguido, como fez, a pena de 10 meses de prisão - pelo que houve violação do disposto no artigo 71º nº 1 do Código Penal; 9. Tal como se admitiu no acórdão recorrido, a "pena concreta a fixar deve ter na moldura abstracta importante gradação relativamente ao limite mínimo"; 10. Pelo que pugna o Ministério Público, mormente em face das exigências de prevenção especial, pela condenação do arguido, relativamente ao crime de detenção de arma proibida, em pena próxima dos 2 anos e 6 meses de prisão; 11. E, em cúmulo jurídico, em pena unitária próxima dos 3 anos de prisão; 12. A qual não deve ser substituída, dado o arguido ter cometido o mesmo tipo de crime no decurso da suspensão da execução da pena de prisão anteriormente aplicada».

  2. O recurso foi admitido.

    O arguido respondeu.

    Alegou que as mensagens enviadas a D... ocorreram entre finais de Abril de 2014 e 18-5-2014. Para além disso dado que ele e D... nunca estiveram juntos, nunca falaram e não se conheciam não é possível defender que as referidas mensagens a pudessem coagir a aceitar ou praticar actos sexuais relevantes. Diz também que em tais circunstâncias a destinatária poderia ser uma mulher adulta, assim como o remetente poderia ser uma mulher ou alguém incapaz de prática sexual credível.

    Defende, ainda, o arguido que no circunstancialismo concreto o envio das mensagens nem sequer integra a figura da tentativa: o envio de mensagens para quem não se conhece e nunca se viu assume a natureza de actos inidóneos.

    Mas a entender-se, como o acórdão recorrido entendeu, que se trata de actos de execução, então só pode tratar-se de actos de execução do crime de assédio sexual, do art. 163º, nº 1, do Código Penal nunca configurando, porém, a situação de ameaça grave, que se reclama.

    Relativamente ao pedido de agravação da pena pelo crime de detenção de arma proibida, diz o arguido que o circunstancialismo da detenção retiram o carácter impressivo ao crime, facto que foi considerado na pena aplicada.

    A Exmª P.G.A. emitiu parecer no sentido do provimento do recurso, já que a ameaça foi grave, porque o arguido tentou coagir D... através da chantagem que exerceu sobre ela. Quanto à pena aplicada ao crime de detenção de arma proibida, considerando que o tribunal recorrido afastou a aplicação da pena de multa e que a pena de prisão aplicável se situa entre 1 ano e 5 anos não podia ser-lhe aplicada uma pena de 10 meses de prisão.

    Foi cumprido o disposto no nº 2 do art. 417º do C.P.P..

  3. Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.

    Realizada a conferência cumpre decidir.

    * FACTOS PROVADOS 5.

    No acórdão recorrido foram dados como provados os seguintes factos: «1.A menor B... nasceu a 08/01/1999 e residia, em finais de 2013/inícios de 2014, com os seus pais e uma irmã, em Viseu, no (...) , tendo por ocasião do Natal de 2013 mudado para a localidade de (...) , Tondela, onde ainda hoje residem.

  4. Em data e forma não concretamente apurada, mas ocorrida em inícios de Novembro de 2013, o arguido conseguiu obter o número de telemóvel da menor B... .

  5. Em data não concretamente apurada, mas ainda em inícios de Novembro de 2013, o arguido, através do seu telemóvel com o nº (...) , começou a trocar mensagens SMS com a menor B... , acabando ambos por falar ao telemóvel, dizendo-lhe que queria encontrar-se com ela e conhecê-la pessoalmente, no que ela anuiu.

  6. Assim, em dia não concretamente apurado, mas situado em início de Dezembro de 2013, a menor, via SMS, combinou com o arguido encontrarem-se os dois num café próximo da Central de Camionagem de Viseu, o que veio a acontecer, ali tendo estado a falar durante algum tempo.

  7. Posteriormente, o arguido e a menor B... continuaram a trocar mensagens SMS para o telemóvel, combinando novos encontros e encontrando-se ainda outras vezes, chegando o arguido a dar à menor a quantia de 40€ em notas do BCE e um telemóvel Samsung Galaxy S4, de cor preta.

  8. Assim, no dia 6 de Janeiro de 2014, o arguido e a menor B... combinaram encontrar-se no Parque de Estacionamento do Supermercado “Pingo Doce” em Tondela, o que aconteceu pelas 16h40m.

  9. Contudo, neste dia, quando a ofendida B... entrava no veículo do arguido, foi surpreendida pelo seu pai C..., que estava próximo e a impediu de entrar, chamando-a, pondo-se o arguido de imediato em fuga.

  10. De modo não concretamente apurado, o arguido obteve o número de telemóvel de D... , passando pelo menos a partir de 22 de Abril de 2014, a enviar várias mensagens SMS, para o telemóvel daquela com o número, tentando convencê-la a encontrar-se consigo.

  11. Como esta D... não aceitasse encontrar-se com ele no dia 18 de Maio de 2014 o arguido enviou, a partir do seu telemóvel com o nº (...) , para a mesma as seguintes mensagens SMS, respondendo-lhe ela através do seu nº (...) com as mensagens SMS assinaladas com “X”: 10. mensagens recebidas nome numero Data – 18-5-2014 não tem (...) - Não queres falar tudo bem a escolha é tua só te digo vais arrepender te muito vou enviar mais umas poucas se não responderes já – 9h24 XMas o que queres tu? – 9h26 - Chegar a um acordo pacífico e parar com tudo isto para não te magoares – 9h28 X Que acordo? – 9h29 - Passamos apenas dez minutos os dois e entrego te tudo e acabao os problemas todos de vez – 9H31 X Mas eu não tenho tempo – 9h32 - E então quando tens tempo – 9h34 - Continuas a tentar enganar me e eu não gosto disso vamos resolver isso duma vez nunca mais volto a incomodar te entrego te tudo hoje – 9h57 - Então como ficamos – 10h06 - Então respondes ou não nãoposso estar toda a vida à espera – 10h12 - Está me a parecer k vou ter de ir para vila maior da parte da tarde – 10h25 - Queres responder ou não??? – 10h27 - Foda se vou meter uma foto na net agora mesmo – 10h32 - Não espero nem mais um minuto vou começar a fazer merda prepara te – 10h53 - Anda lá fala comigo tenho uma proposta a fazer te pensei melhor – 10h57 X O que? – 11h03 - Tenho uma proposta para te fazer – 11h05 X O que? – 11h06 - Passamos dez minutos os dois eu quemo tudo e ainda te dou cem euros diz se queres – 11h09 - Então aceitas ou não ou tens algo a pedir mais diz como queres – 11h14 X Tenho medo – 11h22 - Então não me queres dizer como queres resolver isto – 11h23 - Medo do que diz – 11h23 X N sei. Apenas quero que apagues tudo e não me intimides mais – 11h24 - Eu sei e apago mas podíamos passar um pouco eu dou te o k quiseres – 11h26 X Então apaga tudo se faz favor – 11h26 - Sim apago mas prometes k passamos um bocado os dois e ainda te dou o guito – 11h34 - E então k me dizes pede o k queres k eu começo a apagar tudo – 11h36 - Então vamos ou não por um fim a isto de vez – 11h43 - Foda se não me parece k queiras resolver isto a bem – 11h50 X Tive que fazer umas cenas – 11h58 - E então queres os cem euros ou queres mais diz – 12h09 X N sei, tenho que pensar – 12h10 X Já apagaste as fotos? – 12h11 X Todas – 12h11 - Entã pensa podíamos ser bons amigos e nunca mais havia xatices mas dou te mais se quiseres diz só quanto queres – 12h13 X Já as apagaste todas – 12h14 - Apaguei os vinte discos so tenho o original por apagar – 12h17 X Então apaga esse também se faz favor – 12h17 - Faz me uma promessa de estar comigo hoje e eu apago tudo e ainda te dou o k quiseres – 12h20 X Desculpa mas hj n vai dar – 12h21 - Então diz quando vai dar k eu não faço mais nada para te prejudicar – 12h23 - Quem sabe se fores simpática comigo passamos só um bocado a conversar e nada mais e ficamos bons amigos – 12h30 X N me prejudiques mais e apaga tudo – 12h49 - Todas as pessoas a quem envie pedi para as apagaren disse k foi um engano...

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