Acórdão nº 535/14.8TBACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelFREITAS NETO
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: A... intentou no J3 da Secção Cível da Instância Central de Leiria da Comarca de Leiria uma acção com processo comum contra B... , alegando, em síntese: Autor e Ré estabeleceram uma relação amorosa em Julho de 2007 num altura em que esta iniciava o restauro de um imóvel degradado, denominado P (...) , sito em (...) , Alcobaça, que previamente adquirira com o objectivo de aí instalar um turismo rural; nessa circunstância, o A., então director técnico de duas empresas de construção civil, acordou com a Ré uma parceria na exploração da referida actividade, a formalizar posteriormente com a constituição de uma sociedade com participações iguais, de tal modo que a Ré contribuiria com o imóvel, cabendo ao Autor suportar as obras e os materiais a aplicar na respectiva beneficiação; sucede que, entre 2007 e 2010, no âmbito da falada “parceira” custeou o A. exclusivamente um conjunto de intervenções no imóvel cujo valor ascendeu a € 15.992,35 mais IVA, despendendo ainda as quantias de € 826,00 e 14.664,00 com a instalação de um termoacumulador e de uma piscina; e que a partir de 2008 também passou a dividir com a Ré as tarefas de hospedagem dos turistas, estimando em 3.600 as horas que trabalhou no empreendimento ao longo dos meses de Julho a Setembro dos anos subsequentes, até Setembro de 2012, ano em que a Ré o expulsou do imóvel; também depositou ou transferiu para uma conta bancária da Ré, entre Janeiro de 2008 e Janeiro de 2012, quantias várias que totalizam € 26.009,00; com a ruptura que provocou da relação com o A. veio a Ré a retirar exclusivo proveito das quantias, obras e tempo de trabalho do A., com o que injustificadamente se locupletou, na exacta medida do correlativo empobrecimento daquele.

Remata pedindo a condenação da Ré: a) A reembolsá-lo das despesas com materiais e equipamentos no total de € 15.

992,35; b) A pagar-lhe o custo com a aquisição do termoacumulador no valor de € 826,00: c) A pagar-lhe a despesa com a aquisição da piscina no montante de € 14.

664,00: d) A pagar-lhe as horas de trabalho no serviço de alojamento e cozinha, recepção aos hóspedes nas épocas sazonais, somando € 24.

107,14; e) A reembolsá-lo das quantias depositadas na conta titulada pela Ré na importância de € 26.

009,00; f) A pagar-lhe juros de mora à taxa legal sobre estas quantias desde a citação.

Contestou a Ré, impugnando a matéria da acção, não reconhecendo a realização das obras identificadas pelo A., os pagamentos da piscina e do termoacumulador, a prestação das horas de trabalho referidas, e negando que as quantias depositadas tivessem sido por si utilizadas.

Terminou com a improcedência da acção e a condenação do A. como litigante de má fé em multa e indemnização de € 4.000,00.

Replicou o A., concluindo como na petição e rebatendo os fundamentos invocados para a sua condenação como litigante de má fé.

A final foi a acção julgada parcialmente procedente em função do que se condenou a Ré B... a pagar ao Autor A... a quantia de € 25.490,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo pagamento, do mais peticionado sendo aquela absolvida.

Irresignado, desta decisão recorreu a Ré, recurso admitido como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito suspensivo.

Corridos os vistos, cumpre decidir.

A apelação.

São as seguintes as questões que vêm suscitadas na alegação recursiva: A nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos de factos e de direito e condenação em objecto diverso do pedido; A alteração da decisão sobre a matéria de facto; A inverificação dos pressupostos do enriquecimento sem causa.

Não houve contra-alegação.

Cumpre decidir.

Sobre os vícios da sentença.

Defende a recorrente B... que houve condenação em objecto diverso do pedido porquanto foi condenada com base numa “causa de pedir não alegada”, causa de pedir que segundo ela seria a “extinção de uma relação amorosa e consequente falta de verificação da suposta futura sociedade”.

Mas sem razão.

Como é bom de ver, a recorrente reconduz o vício que assaca à decisão recorrida à não coincidência de causas de pedir. Não a uma suposta incoerência ou não identificação entre o dispositivo da condenação e a pretensão formulada na acção pelo apelado.

Em todo o caso, não só a causa de pedir da acção não se traduz na factualidade que identifica, como tão pouco a sentença se serviu de uma causa de pedir diferente da que fundou a acção (num e noutro caso, o que vem invocado é sempre o enriquecimento sem causa como fonte de obrigações).

Não ocorre, pois, a falada condenação em objecto diverso do pedido, ou seja a nulidade prevista na alínea e) do art.º 615 do CPC.

Também alude a apelante a uma contradição entre os fundamentos de facto e a fundamentação de direito.

Ora a causa de nulidade da sentença é apenas a contradição entre os fundamentos de direito e a decisão – cfr. a alínea c) do nº 1 do art.º 615 do CPC.

Todavia, a apelante também não precisa concretamente em que consistiria tal contradição.

Antes parece querer pôr em crise o enquadramento dos factos não provados à luz das regras do ónus da prova.

Efectivamente, o que a apelante afirma é que o Autor não logrou alegar e provar a finalidade das importâncias por si depositadas na conta da mesma, o que equivaleria à ausência da prova da causa justificativa do enriquecimento.

Mas aqui trata-se apenas de matéria atinente ao mérito da decisão, à sua fundamentação de direito.

Daí que também não se verifique a nulidade da alínea c) do nº 1 do art.º 615 do CPC.

Improcede, destarte, a questão da nulidade da sentença.

A alteração da decisão sobre a matéria de facto.

De seguida ataca a apelante a decisão de facto considerando incorrectamente julgados os seguintes pontos: Da matéria provada: 6 – No âmbito do referido relacionamento amoroso entre Autor e Ré foi acordado entre ambos que o Autor passaria a dar colaboração à Ré na actividade económica por si desenvolvida, com a promessa da Ré formalizar mais tarde em “sociedade”, na qual ambos seriam sócios em partes iguais.

19 – No dia 25/10/2007 o Autor transferiu para a conta da Ré nº (...) da Caixa (...) a quantia de € 22.500,00, proveniente da venda de uma garagem que pertencia ao Autor, sendo que parte desta quantia se destinou ao pagamento da referida piscina.

29 – Foram ainda depositados pelo Autor na conta da Ré nº (...) 0 da Caixa (...) as seguintes quantias: i. Em 29 de Julho de 2008 a quantia de € 3.000,00 em numerário proveniente de pagamentos que foram efectuados pela firma do Autor; ii. Em 12 de Fevereiro de 2009 a quantia de € 2.000,00, em numerário, proveniente mais uma vez de valores pagos por uma das firmas de que o Autor era sócio.

Da matéria não provada; T) Que a piscina foi totalmente paga pela Ré; X) Que o Autor gastou em proveito próprio todas as quantias transferidas ou depositadas nas contas da Ré melhor descritas nos factos provados.

Pugna a apelante pela resposta de Não provado no que concerne ao...

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