Acórdão nº 61/12.0GBMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução04 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do PCC n.º 61/12.0GBMGR da Comarca de Leiria, Leiria – Inst. Central – Secção Criminal – J3, mediante acusação pública, foi o arguido A...

, melhor identificado nos autos, submetido a julgamento, sendo-lhe, então, imputada a prática, em coautoria, na forma consumada e em concurso real, de (i) um crime de furto qualificado, p. e p. pelo artigo 203.º, n.º 1 e 204º, n.º 1, alíneas b) e f) e n.º 2, alínea a) do C. Penal; (ii) um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do C. Penal; e (iii) um crime de dano p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1, do C. Penal.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento, no decurso da qual foi produzida e comunicada a alteração não substancial dos factos, por acórdão de 03.06.2015, deliberou o Coletivo [transcrição parcial do dispositivo]: Nos termos expostos, Acordam os Juízes que constituem este Tribunal Coletivo em: i) Julgar a acusação – com a alteração não substancial dos factos verificada no decurso da audiência – procedente e provada e, consequentemente, condenam o arguido A... pela prática, em coautoria material, na forma consumada e em concurso real de: a) um crime de furto qualificado, p. e p. nos artºs 203º nº 1, 204º nº 1 als. b) e f) e nº 2 al. a), e 202º al. b), todos do Cod. Penal, na pena de dois anos e seis meses de prisão; b) um crime de roubo, p. e p. no artº 210º nº 1 do Cod. Penal, na pena de três anos de prisão; c) um crime de dano, p. e p. no art.º 212º nº 1 do Cod. Penal, na pena de seis meses de prisão.

    1. Operando o respetivo cúmulo jurídico, condenam o arguido na PENA ÚNICA de quatro anos e seis meses de prisão efetiva.

    2. Mais condenam o arguido em 5 Ucs de taxa de justiça, consequentemente, nas custas.

    3. Determinam que o arguido continue a aguardar o trânsito em julgado do presente acórdão sujeito às obrigações decorrentes do TIR, que, nesta fase, se consideram adequadas e suficientes, tanto mais que o arguido se encontra preso em cumprimento de pena à ordem de outros autos.

    4. Nos termos do disposto no art.º 109º nº 1 do Cod. Penal, declaram-se perdidos a favor do estado os seguintes objetos apreendidos nos autos; o x-ato, o gorro de cor preta e os dois tubos em ferro; e, após trânsito, ordenam a sua destruição, lavrando-se o competente auto.

    5. Nos termos do disposto no art.º 186º do Cod. Proc. Penal, determinam o levantamento da apreensão incidente sobre o veículo de matrícula (...) SP e respetivo documento único automóvel, junto a fls. 90 e, após trânsito, ordenam a restituição ao seu legal proprietário, ou a quem validamente comprove representá-lo.

    (…) ii) Julgam o pedido de reembolso deduzido pelo Centro Hospitalar de Leiria, E.P.E., totalmente procedente e provado e, consequentemente, condenam o demandado A... a pagar àquele a quantia de € 1.827,14, acrescida de juros de mora, contados à taxa anula de 4%, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento, a título de reembolso das despesas médicas, medicamentosas e hospitalares suportadas com o ofendido C... em consequência da conduta daquele.

    Custas da instância cível a cargo do demandado.

    (…)» 3. Inconformado com o assim decidido recorreu o arguido, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1. O presente recurso visa seja apreciado por Vv. Exas. a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a insuficiência da matéria de facto para a decisão, a violação do princípio in dubio pro reo, e a determinação da medida da pena.

  2. O recorrente impugna a matéria de facto considerada provada pelo acórdão recorrido nos pontos a.1) a a.19).

  3. No que se refere a esta matéria de facto, o Tribunal a quo fundamentou a sua convicção essencialmente nos depoimentos das testemunhas de acusação inquiridas em audiência, concatenados com elementos documentais juntos aos autos.

  4. Por seu turno o arguido prestou declarações negando terminantemente a prática de todos os factos.

  5. quanto aos factos ocorridos no dia 17 de abril de 2012, elencados no Acórdão de a.4) a a.19), entende a Defesa que foram incorretamente julgados como provados, porquanto, 6. a testemunha B... apenas viu indivíduos de cara tapada, não consegui identificar ninguém dentro do carro que passou, logo, nunca conseguiu identificar os seus agressores.

  6. a testemunha C... declarou que reconheceu o arguido apenas como uma das pessoas que viu em momento anterior dentro do Armazém, nunca o tendo sequer chegado a ver entrar para a carrinha que depois perseguiram, colocando assim em crise o Teor do auto de fls. 99-100 na parte que respeita a “agressões”.

  7. a testemunha viu o arguido no armazém mas nem sequer confirma que a carrinha que depois perseguiram seria a mesma que estava perto do armazém.

  8. A testemunha inclusive aponta a possibilidade de se encontrarem mais pessoas no local além das duas que viu junto do armazém e que nunca chegou a ver o arguido ao pé da carrinha.

  9. De facto, a testemunha não sabe se o arguido ia dentro da carrinha e nunca chegou a perceber quem foram os seus agressores.

  10. Donde se retira que, ao invés do que conclui a decisão ora impugnada, nenhuma das testemunhas identificou ou reconheceu o arguido como um dos autores das agressões no pinhal junto à BA nº 5, nem essa conclusão sequer se alcança mediante qualquer concatenação com algum dos restantes meios de prova, por insanável contradição entre as explicações dadas pela testemunha em sede de Audiência de julgamento (só reconheceu o arguido de o ter visto apenas no armazém) e o teor do auto de reconhecimento (quando refere “agressões”).

  11. Pois que, inclusive, o x-ato apreendido nenhum vestígio tinha, e o gorro apreendido nem sequer poderia ter sido utilizado para tapar a cara, pois não tem nenhuma abertura para os olhos. Além do que, ambos os objetos são iguais a tantos outros do mesmo género, e nenhuma correspondência se alcança com os objetos descritos nesses factos.

  12. Com efeito, tais apreensões e depoimentos não demonstram os factos ocorridos no dia 17 de Abril de 2012, indicados no acórdão de a.4) a a.19), pelo que esta matéria de facto foi incorretamente julgada, como provada, porquanto nunca foi feita prova cabal e suficiente dessa factualidade, devendo, pelo contrário, passar a integrar o elenco dos factos não provados.

  13. Quanto aos factos ocorridos no dia 14 de maio de 2012, elencados no Acórdão de a.1) a a.3), entende igualmente a Defesa que foram incorretamente julgados como provados, já que, 15. Dos depoimentos das testemunhas D... , E... , F... e G... , apenas se conclui que nada sabem sobre a identidade dos autores dos furtos, e que quem se preparava para retirar o gasóleo não conseguiu transportar nenhum recipiente para longe do exterior das instalações da L....

  14. O arguido, logo na abertura da primeira sessão da Audiência de Julgamento, prestou declarações explicando que os contentores que lhe foram apreendidos se destinavam a melhor proteger o combustível dos carros e camionetes dele e do seu irmão que ficavam estacionados à porta de casa, 17. logo, subsistem dúvidas sérias e inultrapassáveis que os bidões apreendidos ao arguido pudessem corresponder ao produto desse crime.

  15. Com efeito, tais apreensões e depoimentos não demonstraram os factos ocorridos no dia 14 de maio de 2012, elencados no Acórdão de a.1) a a.3), pelo que esta matéria de facto foi incorretamente julgada como provada, porquanto não foi feita prova cabal e suficiente dessa factualidade, devendo, pelo contrário, passar a integrar o elenco dos factos não provados.

  16. No essencial, entende a defesa, com o devido respeito por opinião diversa, que não foi produzida prova suficientemente consistente e credível capaz de conduzir a um grau de certeza compaginável com as exigências do nosso ordenamento jurídico-penal e assim não ultrapassando a barreira imposta pelo princípio in dubio pro reo.

  17. A fundamentação fáctica do douto acórdão – única que permite reconduzir a motivação do julgador a critérios objetivos e suscetíveis de controlo pelas instâncias superiores – assenta exclusivamente na errada interpretação do depoimento das testemunhas e errada concatenação com os demais elementos documentados nos autos.

  18. De facto, a análise cuidada, ponderada e atenta de toda a prova produzida não pode deixar de, pelo menos, causar no espírito do julgador a séria dúvida sobre a autoria daqueles factos e, logo, sobre a culpabilidade do arguido. In dubio pro reo.

  19. No caso em apreço, não se trata de existirem versões díspares ou contraditórias sobre os factos relevantes mas, antes, da prova produzida resulta um inevitável estado de dúvida, não ficando minimamente demostrado, na douta decisão, como pode o julgador ultrapassar essa dúvida (aliás, não o pode ter sido), sendo flagrante que o Tribunal a quo, na dúvida, optou por decidir contra o arguido, violando pois o princípio in dubio pro reo.

  20. Em nosso modesto entender, salvo o devido respeito, não assiste razão ao Digníssimo Coletivo de Juízes, pois, limitou-se a valorar a prova segundo a sua livre convicção e a aplicar o direito correspondente.

  21. Ora, salvo o devido respeito pelo Tribunal, que é elevado, mas o art.º 374.º n.º 2 do CPP, quando interpretado e aplicado, como o foi no caso sub iudice, em termos de possibilitar que a fundamentação do acórdão dispense o enunciado das provas e o exame crítico das mesmas, que permitisse apreender o processo mental seguido no acórdão final, é materialmente inconstitucional, por violação dos art.ºs 32º nº 1 e 205º da Constituição da República Portuguesa.

  22. Amplamente demonstrado o erro e injustiça da condenação do arguido, deverão Vv. Exas. modificar a douta decisão recorrida, absolvendo-o dos crimes de que vem acusado e do respetivo pedido cível.

  23. Desta forma, a decisão do Tribunal a quo, respaldada na livre apreciação da prova prevista no art.º 127.º do CPP, ultrapassou os limites constitucionalmente impostos principalmente pelos art.ºs 18.º n.º 2, 32º...

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