Acórdão nº 330/13.1TBSCD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução10 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

J (…) e B (…) intentaram contra P (…) e M (…), ação declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediram: Sejam os réus condenados: - A procederem à reconstrução do muro de pedra na propriedade dos autores, de acordo com o contrato verbal de empreitada celebrado, bem como a removerem todos os escombros (pedra e terra) que se encontram na base do muro ruído; - A procederem à reparação do barracão de J (...) ; - Entregarem-lhes, a título de danos morais, a quantia de € 2.000,00, acrescido de juros vincendos até efetivo e integral pagamento.

Para tanto invocaram em súmula: Acordaram com o réu marido que este procederia à construção de um muro de pedra (granito), junteado a cimento, com 17 m de altura e 15 m de comprimento, pelo valor de € 15.600,00, acrescido de IVA, o que aquele aceitou, tendo construído o dito muro.

A construção do muro ocorreu em alturas de clima adverso e chuvoso, o que levou a que a terra que foi preenchendo o vazio existente entre a parede e a barreira de pedra não pudesse ser compactada, sendo que a parte final muro, no cume, teve de ser construída em blocos de cimento, em cima de uma cinta de betão, cinta e muro estes que foram construídos em cima da terra que se encontrava a preencher o espaço entre a barreira e o muro de pedra.

A obra foi dada como concluída em 20/01/2012 tendo ruido em inícios de maio do mesmo ano.

Sofreram com tais factos desgaste emocional, com medo, desgosto e angustia.

Contestaram os réus.

Disseram que na execução do dito muro foram observadas as legis artis e que o autor marido agiu sempre como dono da obra, fiscalizando, dando orientações e definindo os tempos de pagamento.

O réu alertou, por diversas vezes, o autor para a colocação de pontos de drenagem na parte superior do muro para escoamento das águas pluviais provindas da sua casa tendo este relegado para final da obra a possibilidade de decidir mandar fazer ou não essa obra, tendo, a final, declinado tal conselho.

A queda em causa poderá ter-se devido à anormal precipitação que ocorreu nos meses de Janeiro a Maio de 2012, aliado ao facto do autor não ter anuído desviar as águas no cimo do muro assim evitando que as mesmas se infiltrassem de modo a fragilizar a estrutura edificada.

Pedem: Que a ação seja julgada improcedente e em consequência sejam absolvidos de todos os pedidos contra si deduzidos.

Foi proferido despacho que julgou os autores parte ilegítima no que concerne ao pedido de condenação dos réus na reparação do barracão de (…) e, em consequência, foram os réus absolvidos, nesta parte, da instância.

  1. Prosseguiu a ação os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual se decidiu: «Pelo exposto, o Tribunal julga parcialmente procedente, por provada, a presente acção e em consequência decide: a) Condenar os réus a proceder à reconstrução do muro de pedra na propriedade dos autores, construindo-o em pedra de granito, junteado a cimento, com 17 m de altura e 15 m de comprimento; b) Condenar os réus a remover todos os escombros (pedra e terra) que se encontram na base do muro ruído; c) Condenar os réus a entregar aos autores, a título de danos morais, a quantia de € 750,00, acrescido de juros de mora desde a presente data e até integral pagamento, absolvendo-os do remanescente peticionado.» 3.

    Inconformados recorreram os réus.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Contra alegaram os autores, pugnando pela manutenção da decisão, aduzindo os seguintes argumentos finais: (…) 4.

    Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª – Nulidade da sentença.

    1. – Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    2. – Improcedência da ação.

  2. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    Os réus imputam à sentença várias nulidades, expressando ela «enfermar …na sua fundamentação de causas de nulidade, por violação do disposto no artigo 1221º do CC e bem assim por configurar ambiguidade que torna a decisão ininteligível, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 615º do NCPC e d) do mesmo preceito legal, e por ter ido além da prova produzida, violando a alínea e), prova essa que para tal fim haverá que ser reapreciada…» 5.1.1.

    Estatui, no que para o caso interessa, o artº 615º do CPC: 1 - É nula a sentença quando: c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) – O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.

    Da oposição dos fundamentos com a decisão.

    A oposição dos fundamentos com a decisão reconduz-se a um vicio lógico no raciocínio do julgador, em que as premissas de facto e de direito apontam num sentido e a decisão segue caminho oposto, ou, pelo menos, direção diferente.

    Distinguindo-se das situações em que tal disparidade advém de mero erro material, pois, neste caso, a oposição não é substancial mas apenas aparente, dando apenas direito à retificação, enquanto que no caso invocado e que ora nos ocupa a invocada contradição, a existir, é autentica e real - pois que o juiz escreveu o que queria escrever -, a qual, verificando-se, acarreta um vício de conteúdo da sentença que implica a sua nulidade – cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 1981, 5º, 141, Castro Mendes, Direito Processual Civil, ed. AAFDL, 1978, 3º, 302 e Abílio Neto, Breves Notas ao CPC, 2005, 195.

    Já a parte final deste segmento normativo emergiu da reforma de 2013.

    Tal como relativamente sucede com a nulidade da al. b), por falta de fundamentação, entendemos que os vícios da ambiguidade ou obscuridade que tornem a decisão ininteligível se prende com a garantia do direito ao recurso e tem a ver com a legitimação, independência e imparcialidade da decisão judicial.

    Na verdade porque a decisão não é, nem pode ser, um ato arbitrário, mas a concretização da vontade abstrata da lei ao caso particular submetido à apreciação jurisdicional, as partes, maxime a vencida, necessitam de saber as razões das decisões que recaíram sobre as suas pretensões, designadamente para aquilatarem da viabilidade da sua impugnação.

    Mas se assim é, dos textos legais e dos ensinamentos doutrinais se retira que apenas a total e absoluta falta de fundamentação pode acarretar a nulidade.

    Na verdade a lei não comina com tão severo efeito uma motivação escassa, ou, mesmo deficiente. E onde a lei não distingue não cumpre ao intérprete distinguir.

    Nem tal exigência seria de fazer considerando a «ratio» ou finalidade do dever de fundamentação supra aludidos.

    O que a lei pretende é evitar é a existência de uma decisão arbitrária e insindicável.

    Tal só acontece com a total falta de fundamentação, ou, no caso que nos interessa, a ambiguidade ou obscuridade assumirem tal magnitude que não permitam descortinar os fundamentos decisórios.

    Assim sendo, a grande maioria da nossa jurisprudência tem-se pronunciado no sentido de que só a carência absoluta de fundamentação e não já uma motivação escassa, deficiente, medíocre, incompleta ou errada, acarreta o vício da nulidade da decisão – cfr. Entre outros, Ac. do STA de 18.11.93, BMJ, 431º, 531 e Acs. do STJ de 26.04.95, CJ(stj), 2º, 57, de 17.04.2004 e de 16.12.2004, dgsi.pt.

    Da omissão ou excesso de pronúncia.

    Este segmento normativo ínsito na al. d) do artº 615º do CPC conexiona-se com o estatuído nos arts. 154º e 608º do mesmo diploma, ou seja, com o dever do juiz administrar a justiça proferindo despachos ou sentenças sobre as matérias pendentes – artº 152º - e com a necessidade de o juiz dever conhecer das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica e de resolver todas as questões – e só estas questões, que não outras, salvo se de conhecimento oficioso - que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras –artº608º.

    Há decisão “ultra petitum” sempre que o julgador não confina o julgamento da questão controvertida ao pedido formulado pelo autor ou ao pedido reconvencional deduzido pelo réu e conhece, fora dos casos em que tal lhe é permitido “ex officio”, questão não submetida à sua apreciação.

    Para que não se verifique tal vício terá de existir uma correspondência entre a pronúncia e a pretensão, isto é, a sentença não pode decidir para além do que está ínsito no pedido, nos termos formulados pelo demandante. Este princípio é válido quer para o conhecimento excessivo em termos quantitativos, quer por condenação em diverso objeto - excesso qualitativo – cfr. Ac. do STJ de 28.09.2006, dgsi.pt, p.06A2464. Por outro lado e como é consabido e constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, não se devem confundir «questões» a decidir, com considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pelas partes.

    A estes não tem o tribunal que dar resposta especificada ou individualizada, mas apenas às pretensões formuladas e aos elementos inerentes ao pedido e à causa de pedir –cfr. Rodrigues Bastos, in Notas ao CPC, 2005, p.228; Antunes Varela in RLJ, 122º,112 e, entre outros, Acs. do STJ de 24.02.99, BMJ, 484º,371 e de 19.02.04, dgsi.pt.

    Da condenação em quantidade superior ou em objeto diverso.

    Este segmento está em relação direta com o preceituado no artº 609º nº1.

    Condenando em quantidade superior ou em objeto diverso o juiz excede o limite imposto por lei ao seu poder de condenar e infringe o princípio do dispositivo que assegura à parte a faculdade de circunscrever o thema decidendum.

    5.1.2.

    No caso vertente.

    O objeto da ação, tal como delineado pelas partes é a responsabilização, ou não, dos réus, pela reconstrução do muro e indemnização aos autores por danos não patrimoniais.

    A julgadora...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT