Acórdão nº 1/14.1GBMDA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução18 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Viseu – Moimenta da Beira – Instância Local – Secção de Competência Genérica – J1, o assistente P... , acompanhado pelo Ministério Público, requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal singular, dos arguidos A...

e B...

, ambos com os demais sinais nos autos, imputando a prática, a cada um e em autoria material, de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181º, nº 1 do C. Penal.

O assistente deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, com vista à sua condenação solidária no pagamento da quantia de € 2.000, por danos não patrimoniais sofridos.

Por sentença de 15 de Julho de 2015, foram os arguidos absolvidos da prática do crime a cada um imputado e do pedido de indemnização civil deduzido.

* Inconformado com a decisão, recorreu o assistente, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1º A prova produzida aponta em sentido que condena os arguidos pela prática do crime de injúrias, motivo por que se pode dizer que existe erro de julgamento.

  1. O douto Tribunal deu como não provado que os arguidos não injuriaram o assistente.

  2. Face aos documentos dos autos e face à prova produzida na audiência de julgamento, o tribunal considerou não credível a prova testemunhal.

  3. Era imperioso que o douto tribunal tivesse formado um todo coerente e bem fundado, quer do ponto de vista lógico, quer das regras da vida e da experiencia decisão diferente da que tomou, absolveu os arguidos.

  4. Com efeito os argumentos do douto tribunal assentam na falta da credibilidade das testemunhas arroladas pela acusação, mas fica-se só por aí, não concretiza nem fundamenta convenientemente tal raciocínio.

  5. Todas as testemunhas quer as de acusação quer as de defesa concordam nas más relações entre os arguidos e o assistente, ora seguindo um raciocínio lógico e coerente, além das regras da vida e experiencia comum, não se afigura o porquê do douto Tribunal ter tanta dificuldade em aceitar a realidade dos factos, insistindo na falta de credibilidade das testemunhas da acusação.

  6. Assim, os juízos sobre os documentos e os depoimentos das testemunhas, revelam-se sem fundamento lógico e coerente, além de que afrontam as regras da vida e da experiência comum, incorrendo nos vícios referidos no artº 410º, nº 2, alíneas a), b) e c) do Código de Processo Penal.

  7. Pelo exposto, ao abrigo do que se dispõe, designadamente, no art. 412º, nº 3 do Código de Processo Penal, o douto Tribunal julgou incorrectamente a matéria de facto ao considerar não provados os factos elencados nas alíneas B) a, b, c, d, e, f, g, h, i, j, k, da douta sentença.

  8. Salvo o devido respeito, a apreciação da prova, ainda que livre, não pode ser uma actividade puramente subjectiva, antes deve ser juridicamente fundamentada, devendo concretizar-se "numa valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permitirá ao julgador objectivar a apreciação dos factos, requisito necessário para uma efectiva motivação da decisão." (Ac. Trib. Constitucional de 98/03/15, DR II de 98/09/23). 10º Estes factos deverão ser considerados provados com base precisamente nas concretas provas que se deixaram especificadas, as quais impõem uma decisão diversa da proferida, no sentido precisamente da condenação dos arguidos.

    11º Caso assim não se entenda o que não se espera, atento ao teor dos documentos e das versões das testemunhas da acusação, deverá então, salvo sempre melhor opinião, ser determinada a renovação e reapreciação das provas em apreço ou as demais que vierem a ser reputadas como necessárias.

    Nestes Termos, e com o suprimento de Vossas Excelências deve o presente recurso, ser julgado procedente e a sentença recorrida ser revogada e substituída por decisão que condene os arguidos, com as legais consequências.

    Caso assim se não entenda, ser determinado a renovação das provas em apreço ou as demais que vierem a ser reputadas como necessárias.

    Assim, por tudo o alegado e pelo mais que Vossas Excelências não deixarão de suprir, deve dar-se provimento ao presente recurso, decidindo conforme se conclui e é de inteira JUSTIÇA.

    * Respondeu ao recurso o arguido, alegando que não impugnou a matéria de facto nos termos do art. 412º, nº 3 do C. Processo Penal e que a sentença recorrida não enferma de qualquer dos vícios da decisão previstos no art. 410º, nº 2 do mesmo código pelo que, sendo imodificável a decisão de facto, deve o recurso improceder, com a confirmação da sentença recorrida.

    * Respondeu também ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1.º – O assistente considera que toda a matéria de facto dada como não provada não foi correctamente julgada.

    2.º – Da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, não resultou provada a mencionada matéria de facto, sendo que o Tribunal a quo apreciou correctamente a prova produzida em audiência.

    3.º – A prova testemunhal deve ser valorada de acordo com o princípio da livre apreciação da prova previsto no artigo 127.º do Código de Processo Penal, o que in casu aconteceu.

  9. – O Tribunal expôs na sua fundamentação o processo racional e lógico que percorreu para dar como não provados os factos aqui em apreço e na sua apreciação crítica da prova produzida em audiência de discussão e julgamento o Tribunal explica, de forma clara e compreensível para os destinatários da sentença, as razões que levaram o Tribunal a dar mais relevo a certos depoimentos.

    Nestes termos e nos demais de direito, que V. Exa. dignarão suprir, negando provimento ao recurso e mantendo, na íntegra, a douta sentença recorrida, farão como sempre, a costumada JUSTIÇA.

    * Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pronunciando-se no sentido de não ter o recorrente impugnado devidamente a decisão sobre a matéria de facto e estar a sentença devidamente fundamentada, e concluiu pela improcedência do recurso.

    * Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

    * Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

    * * II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.

    Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A nulidade da sentença; - A existência de vícios da decisão; - A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto e consequente condenação dos arguidos.

    * Para a resolução destas questões importa ter presente o que de relevante consta da sentença recorrida. Assim:

    1. Nela foram considerados provados os seguintes factos: “ (…).

      1. Arguidos são casados vivem numa residencial que os mesmos exploram, sendo que o supermercado que o assistente à data explorava se situava no piso inferior ao da dita residencial.

      2. Os arguidos não têm antecedentes criminais.

      (…)”.

    2. Nela foram considerados não provados os seguintes factos: “ (…).

      1. Os arguidos nunca aceitaram a compra por parte do assistente do supermercado que se situava no edifício onde funciona a residencial; b) Fruto disso, os arguidos encontravam sempre maneira de dificultar exploração do supermercado pelo assistente, discutindo com clientes, impedindo descargas mercadorias directamente para o espaço comercial, sendo assistente muitas vezes obrigado a chamar a GNR para conseguir efectuar as descargas.

      2. No dia 7 Agosto 2013, Arguido A... , encontrando-se nas escadas de acesso à sua residência, vendo o assistente a dirigir-se para o espaço comercial que este ainda detinha na Rua (...) , Vila Penedono, freguesia e sede concelho, proferiu seguintes expressões: “És um ladrão, vieste fugido (...) , tu és um cão e se não tiras os carrinhos compra corredor, mato-te, é por causa pessoas como país está falência, tu e o presidente são mesma laia, uns gatunos”.

      3. Não satisfeito com os insultos proferidos, arguido pegou numa grade cerveja com as garrafas vazias e com ela tentou agredir assistente.

      4. Entretanto, chegou ao local Arguida, B... proferiu as seguintes expressões para o assistente: “És um filho da puta” e outras palavras em francês que o assistente desconhece o significado mas pelo tom seriam ofensivos à sua honra, além dos insultos, arguida empurrou os carrinhos de compras que se encontravam no corredor exterior do supermercado para a via pública.

      5. Perante tal o assistente telefonou para a GNR de Penedono.

      6. Por estes motivos, o assistente considera-se não só profundamente ofendido na sua honra, dignidade e consideração, com também constrangido pelo receio de novas injúrias.

      7. Os arguidos agiram de forma livre, deliberada, consciente e intencional, no propósito de injuriar o assistente, e causar-lhe dano e constrangimento, sabendo que a respectiva conduta era proibida e punida por lei, e ainda assim não se coibiram de a levar adiante.

      8. As expressões proferidas pelos arguidos e constantes de c) e e) lesaram profundamente a dignidade do lesado e a sua determinação pessoal.

      9. As referidas expressões tiveram divulgação alargada em Penedono.

      10. O lesado passou a temer que mais episódios destes se repetissem.

      (…)”.

      E dela consta a seguinte motivação de facto: “ (…). Para alicerçar a sua convicção, o Tribunal atribuiu relevância ao conjunto da prova produzida, criticamente analisada e concatenada entre si. Assim, formou a sua convicção com base na apreciação crítica das declarações prestadas pelos Arguidos A... e B..., bem como no depoimento do assistente e das seguintes testemunhas: - F... , amigo do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT