Acórdão nº 836/14.5T8ACB-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução17 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Comarca de Leiria - Alcobaça – Instância Central – 2.ª Secção de Comércio – J1 I. Relatório Por sentença proferida nos autos principais foi declarada a insolvência de L... e fixado em 30 dias o prazo para a reclamação de créditos.

O Sr. AI fez juntar aos autos a lista de credores reconhecidos, a qual não foi objecto de qualquer impugnação.

Foi de seguida proferida sentença na qual, partindo o Mm.º juiz da constatação de que se encontra apreendido nos autos o direito à meação do insolvente nos bens comuns do casal e não qualquer bem ou quota-parte desses bens, com apoio nos acórdãos da Relação de Lisboa de 13/2/2014 e de Coimbra de 24/9/2013, concluiu que os créditos reclamados pelas credoras C... e M..., reconhecidos pelo Sr. AI como garantidos por hipotecas incidentes sobre os imóveis que constituem o património comum do dissolvido casal formado pelo insolvente e seu ex-cônjuge, se encontravam afinal desprovidos de qualquer garantia, vindo em consequência a reconhecê-los como créditos comuns. E porque todos os créditos reconhecidos participavam desta mesma natureza, determinou que seriam pagos em igualdade pelo produto do bem apreendido, procedendo-se a rateio, se necessário.

Inconformada, apelou a credora reclamante C... e, tendo desenvolvido nas alegações as razões da sua discordância com o decidido, formulou a final as seguintes conclusões: “1.ª- A credora ora apelante reclamou oportunamente os seus créditos, sendo parte dos créditos garantidos por hipotecas registadas sobre dois bens imóveis.

  1. - A Lista de Créditos Reconhecidos (artigo 129.º do CIRE), reconheceu que parte dos seus créditos reclamados é garantida por hipotecas constituídas sobre os bens imóveis dados em garantia.

  2. - No registo predial da insolvência sobre os bens imóveis vendidos não consta a menção ao direito à meação, mas apenas e somente que “Incide sobre a meação”.

  3. - A Lista de Créditos não foi impugnada por qualquer dos intervenientes processuais e na mesma não foi cometido qualquer outro lapso manifesto na quantificação de valores ou relacionamento com as respectivas garantias reais, pelo que o Juiz do Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 130º, nº 3 e 140º, nº 2 do CIRE.

  4. - Foi errada a subsunção do direito aos factos, na correcção de um erro inexistente e no consequente juízo de ilegalidade que recaiu sobre a aplicação dos artigos 130º, nº 3º, e 140º do CIRE, e 686º, 690º, 696º do Código Civil.

  5. - O Tribunal recorrido foi mal ao fazer depender as qualificações dos créditos da errada menção à apreensão de meações e não dos efectivos produtos das vendas de bens imóveis concretamente realizadas em momento anterior ao proferimento dessa decisão.

  6. - Através da junção sucessiva das três escrituras de compra e venda dos três concretos bens imóveis que foram vendidos, livres de qualquer ónus e/ou encargo, bem como toda a demais documentação de suporte às vendas constante do apenso de Liquidação, intervieram nos actos formais de venda todos aqueles legalmente habilitados para as realizar, nos termos do disposto no artigo 1682º-A e 1730º do Código Civil e artigo 81º, nº 1, do CIRE, com a manifesta concordância de mais de 95% dos direitos de voto, o que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 640º, nº 1, alínea b) do CPC.

  7. - Dando-se provimento à presente apelação, a douta sentença proferida deverá ser revogada, com fundamento em erro de julgamento de direito e de facto, e substituída por outra onde se efectue uma correcta graduação de créditos, através da homologação da Lista de Créditos Reconhecidos, devendo ser especial para os créditos garantidos pelos produtos das três vendas concretamente realizadas, sem prejuízo da precipuidade das custas”.

A credora M... veio posteriormente aderir ao recurso interposto, invocando o disposto no art.º 634.º, n.º 2, al. a) do CPC, requerendo a final que a sentença recorrida seja substituída por outra que “reconheça as hipotecas tituladas pela M... e C..., bem como sejam os seus créditos graduados como garantidos”.

Questão prévia: Da adesão pela M...

Nos termos do art.º 634.º do CPC, o recurso interposto por uma das partes aproveita aos seus compartes no caso de litisconsórcio necessário (vide n.º 1). Fora do caso de litisconsórcio necessário, o recurso interposto aproveita ainda aos outros “se estes, na parte em que o interesse seja comum, derem a sua adesão ao recorrente”.

Pela adesão o aderente, que não recorreu, beneficia do recurso interposto por uma comparte “na parte em que o interesse seja comum”.

O recurso adesivo pressupõe portanto um interesse comum. Não se trata de uma total comunhão de interesses, como ocorre nas situações de litisconsórcio necessário, mas apesar da autonomia da situação de cada um dos compartes nos casos de litisconsórcio voluntário ou coligação, identifica-se um interesse que é, ainda que parcialmente, comum. “Em tais circunstâncias, os compartes podem aderir à iniciativa daquele ou daqueles que interpuserem recurso, a fim de extraírem proveito do que vier a ser decretado”[1].

Por outro lado, porque do que aqui se trata é de estender os efeitos do recurso oportunamente interposto, e não permitir à parte que viu precludido o direito de recorrer, designadamente pelo decurso do prazo, que venha, por esta via, introduzir em juízo um recurso autónomo, é de todo inadmissível que o aderente proceda à ampliação do objecto do recurso, já fixado pelas alegações do recorrente.

Tendo presentes tais considerandos, e sem nos determos na questão de saber se aos credores no âmbito de um processo de insolvência é de reconhecer a qualidade de compartes, a verdade é que os interesses da recorrente C... e da aderente M..., não só não são comuns, como são até conflituantes[2]. Com efeito, a reconhecer os créditos da recorrente como garantidos, eles serão satisfeitos com preferência sobre os demais, nos quais se inclui o crédito desta última, qualificado e graduado como comum.

Por outro lado, a mera procedência do recurso da C... em nada aproveita à aderente M..., que, reconhecendo isso mesmo, se viu na contingência de alargar o objecto do recurso, pedindo a este Tribunal que atribuísse ao seu crédito a natureza de garantido pela hipoteca que incide sobre um dos imóveis que constitui o património comum do casal antes formado pelo insolvente e pela sua ex-mulher, e como tal o reconhecesse e graduasse para ser pago pelo produto da venda respectiva. O que, todavia, teria que ter feito em recurso autónomo e não fez em tempo.

Atento o exposto, e por não se verificarem os requisitos legais, declara-se que o presente recurso não aproveita à aderente M...

Custas do incidente a cargo da aderente.

* Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, a única questão submetida à apreciação deste Tribunal consiste em determinar se parte dos créditos reconhecidos à recorrente C... devem ser tidos como garantidos por hipoteca, devendo consequentemente ser satisfeitos pelo produto dos bens imóveis sobre os quais incidia e com a preferência que resulta de tal garantia.

II Fundamentação De facto: Sendo embora a sentença completamente omissa quanto à indicação dos factos em que assenta, resultam demonstrados pelos elementos juntos a este apenso os seguintes: 1. L... foi declarado insolvente por sentença proferida nos autos principais pelas 15:00 horas do dia 4/12/2014, transitada em julgado em 5/1/2015, tendo sido subsequentemente deliberada a liquidação do activo.

  1. O insolvente foi casado com A..., tendo o casamento sido dissolvido por decisão do Sr. Conservador do Registo Civil do Cadaval transitada em julgado em 24/10/2010.

  2. Do auto de apreensão/arrolamento constam identificados os seguintes bens: i. Verba n.º 1: meação da fracção autónoma designada pela letra A do prédio urbano composto pelo rés-do-chão D destinada a comércio, com a área bruta privativa de 31 m2, situada na Rua ...; ii. Verba n.º 2: meação da fracção autónoma designada pela letra A do prédio urbano composto de rés-do-chão, destinada a comércio, com a área bruta de 23 m2, situada na Rua ...; iii. Verba n.º 3: meação do prédio urbano composto de rés-do-chão, 1.º andar e logradouro, destinada a habitação, com a área bruta privativa de 201,76 m2, situada na Urbanização do ...

  3. Foram reconhecidos pelo Sr. AI os seguintes créditos: a) Reclamados pela M... no montante global de €95.428,41, encontrando-se o crédito no valor de €58.807,09, acrescido de juros remuneratórios à taxa de 5,366% no valor de €310,50, e juros moratórios à taxa de 9,336% que, computados à data da declaração da insolvência, ascendiam a €6.663,48, garantido por hipoteca incidente sobre o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT