Acórdão nº 294/14.4TBGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Maio de 2016
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 17 de Maio de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 20.3.2014, MM (…) e mulher MF (…) intentaram a presente acção declarativa comum contra R (…), Lda. (1ª Ré) e Sociedade de Construções (…), Lda. (2ª Ré), deduzindo os seguintes pedidos: a) que seja determinado o suprimento da declaração negocial das Rés, enquanto promitentes vendedoras, e, em execução específica do contrato-promessa de compra e venda junto com o n.º 9 [documento de fls. 40], conjugado com a declaração negocial do documento junto com o n.º 13, e transferida para os AA. o direito de propriedade sobre o imóvel urbano correspondente ao lote n.º 15, identificado na petição inicial (p. i.).
b) que seja determinado o cancelamento de quaisquer inscrições que incidam sobre a respectiva descrição a favor de outrem, nomeadamente da 2ª Ré.
c) subsidiariamente, e a improceder tal suprimento e execução específica por culpa de quaisquer das Rés, que seja declarado resolvido, por incumprimento das Rés, o contrato, e em consequência, condenada a 2ª Ré a indemnizar os AA. do valor actual do imóvel que lhe foi prometido vender, no montante de € 115 000. d) a não procederem tais pedidos, e subsidiariamente, ser a 2ª Ré condenada a indemnizar os AA. no montante de € 12 475,94, correspondente à devolução em dobro das quantias que entregou à 1ª Ré a título de sinal e princípio de pagamento, cuja responsabilidade foi expressamente assumida pela 2ª Ré no documento junto com o n.º 9.
e) também em sede subsidiária, e improcedendo os pedidos anteriores, serem as Rés condenadas, em regime de solidariedade, a indemnizar os AA. no montante de € 108 762,03 a título de enriquecimento sem causa.
Alegaram, em síntese: o A. celebrou com a 1ª Ré um contrato-promessa de compra e venda relativo ao lote de terreno identificado na p. i., tendo os AA. pago o montante de € 4 987,98 a título de sinal e princípio de pagamento, devendo o contrato definitivo ser outorgado no prazo de 120 dias, a contar de 15.3.1986, tendo ficado consignado a possibilidade de execução específica; após a celebração do contrato, o A. passou a deslocar-se ao terreno, efectuando a sua limpeza, manutenção, colocando divisórias e procedendo às medições e cálculos necessários para a construção de uma moradia, dado que lhe tinha sido dito pela legal representante da promitente vendedora que poderia tomar posse imediata do imóvel; não obstante as interpelações efectuadas, a 1ª Ré nunca procedeu à marcação da escritura pública, sendo que mantêm o interesse na realização do negócio; a 2ª Ré comprou o imóvel do qual fazia parte o lote de terreno prometido vender aos AA., tendo feito um novo projecto de loteamento sobreposto àquele que já existia; no entanto, a 2ª Ré tinha conhecimento da existência de contratos-promessa de compra e venda, sabia que haviam sido pagas quantias a título de sinal e assumiu as obrigações que a 1ª Ré havia contraído perante terceiros, nomeadamente os AA., derivadas da celebração dos contratos-promessa; apesar disso, a 2ª Ré não cumpriu as suas obrigações em relação aos AA..
Citadas as Rés, apenas a 2ª Ré contestou, invocando, por excepção, a prescrição, em face da data prevista no contrato-promessa para a celebração da escritura pública e da data em que ocorreu a citação nos presentes autos, e ser parte ilegítima, na medida em que uma acção em que seja invocado o incumprimento do contrato-promessa e pedida a execução específica do mesmo, ou a devolução das quantias entregues, deve ser apenas proposta contra os promitentes outorgantes; por impugnação, alegou, nomeadamente, o desconhecimento dos factos alegados que não são pessoais, nem factos de que deva conhecer, e, ainda, que o terreno em causa se encontra devidamente registado na Conservatória do Registo Predial da (...) a seu favor, em virtude de o ter adquirido aos seus proprietários, e que nunca foi transferida a posse do mesmo para os AA., até porque a 1ª Ré nunca foi a proprietária e legítima possuidora do terreno. Concluiu pela improcedência da acção. Em audiência prévia, os AA. pediram e viram indeferida a ampliação do pedido (com dedução de articulado superveniente) e responderam às excepções deduzidas pela 2ª Ré.
Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a dita excepção de ilegitimidade e relegou para final o conhecimento da excepção de prescrição; delimitou-se o objecto do litígio.
Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal, por sentença de 12.10.2015, julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, declarou resolvido, por incumprimento das Rés, o contrato-promessa referido em 7. dos factos provados e condenou a 2ª Ré a pagar aos AA. a quantia de € 47 506,02, absolvendo as Rés do demais pedido.
Inconformada, a 2ª Ré apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - Da impugnação da matéria de facto dada como provada e como não provada pela sentença, e a aceitar-se a tese da recorrente, resultará que se deve considerar como não provados os factos apreendidos em 17, 18, 21, 22 e 23 dos Factos Provados, e como provado o facto apreendido em 4 dos Factos Não Provados.
2ª - O(s) direito(s) do(s) autores resultante(s) do contrato-promessa prescreveu(ram) em 15.7.2006, tanto mais quanto é certo que os mesmos autores apenas interpelaram a recorrente através de notificação judicial avulsa de 19.8.2013 - o que suficiente seria para soçobrarem as pretensões dos autores.
3ª - O reconhecimento a que alude o art.º 325º, do Código Civil (CC), para ter os efeitos pretendidos pela sentença, deveria ter sido feito directa e explicitamente aos autores, situação que não ocorreu.
4ª - É que para que reconhecimento houvesse, interruptivo do prazo de prescrição, face ao contrato-promessa outorgado em 15.3.1986, deveria o mesmo ter sido realizado directamente perante os promitentes compradores (autores), o que não aconteceu.
5ª - O Assento do STJ de 19.11.1987 (Diário da República, 1ª série, de 12.01.1988), que se crê aqui aplicável, veio determinar que «na vigência do DL 289/73, de 06.6, é válido o contrato-promessa de compra e venda de terreno compreendido em loteamento sem alvará, a menos que, no momento da celebração desse contrato haja impossibilidade de obtenção do alvará, por haver lei, regulamento ou acto administrativo impeditivo da sua emissão».
6ª - À data de celebração do contrato-promessa em causa, existiam e vigoravam normas jurídicas que impediam a emissão do alvará relativo ao loteamento em apreço.
7ª - Por isso que importa concluir que, de acordo com a legislação em vigor e jurisprudência uniformizada, o contrato-promessa com base no qual os autores erigem as suas pretensões no âmbito do presente processo é nulo.
8ª - Aliás, a mesma conclusão impõe o disposto no art.º 280º do Cód. Civil nos termos do qual «é nulo o negócio jurídico cujo objecto seja (…) legalmente impossível», como é o caso da promessa de venda de terrenos para construção, compreendidos em loteamentos, antes de obtidas as necessárias licenças.
9ª - Anulado o negócio, devem as partes ser restituídas à situação anterior a ele, restituindo uma à outra as...
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