Acórdão nº 402/12.0TAPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Dezembro de 2016
Magistrado Responsável | MARIA JOS |
Data da Resolução | 07 de Dezembro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo comum singular n.º 402/12.0TAPBL da Comarca de Leiria, Leiria – Inst. Local – Secção Criminal –J1, foi o arguido A...
, melhor identificado nos autos, pronunciado pela prática de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d) do Código Penal.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, por sentença de 09.02.2015, depositada na mesma data, o tribunal decidiu: «Pelo exposto, nos termos das disposições legais supra referidas, julgo totalmente provada e procedente a pronúncia e, consequentemente, condeno o arguido A... pela prática, em autoria material na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.º, n.º 1, alínea d) do Código Penal, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à razão diária de 5,00 € (cinco euros), o que perfaz o montante global de 900,00 € (novecentos euros).
(…)» 3. Inconformado com o assim decidido recorreu o arguido, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1.
O Sr. Juiz não deveria ter dado como provado os factos provados na sentença 1 a 36, por não se ter feito prova da mesma em audiência e julgamento.
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Com base nas declarações da assistente e arguido, obtém-se uma versão, de que a sua conduta nunca foi dolosa, que a assistente manteve inscrição fiscal durante dez anos e omitiu rendimentos, não fazendo declarações.
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Além de que o Tribunal ultrapassou os limites na livre apreciação da prova testemunhal e documental, nos termos do art. 128º, 129º e 355º do CPP, devendo ter dado como provado o inexistir de intenção dolosa do arguido em falsificar.
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Os restantes documentos não foram confirmados na audiência, não tendo qualquer valor probatório, nos termos do n.º 1 do art. 355º do CPP.
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Em nome do princípio in dubio pro reo o arguido deveria ter sido absolvido por falta de prova, nos termos do art. 32º nº 2 da CRP, 14º, n.º 2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art.º 6.º, n.º 2 da Convenção Europeia para proteção dos Direitos e Liberdades Fundamentais e art.º 11.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
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Além de que o Tribunal ultrapassou os limites da livre apreciação da prova testemunhal e documental, nos termos do art.º 128º, 129.º e 355º do CPP.
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O tribunal violou os artigos 3º e 32º, n.º 2 da CRP, n.º 1 do art.º 355º do CPP, art. 128.º, nº 1 do CPP, art.º 129º, nº 1 e n.º 2 do CPP, n.º 2 do art.º 374.º do CPP, art.º 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, art.º 6º, n.º 2 da Convenção Europeia para a proteção dos Direitos e Liberdades Fundamentais e art.º 14º, n.º 2 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.
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Deveria o Tribunal, como único silogismo e corolário lógico objetivo acordado em absolver o arguido, face à falta de prova e presunção da sua inocência.
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Deveria o Tribunal aplicar ao arguido uma pena diferente, nomeadamente, mais reduzida, atento o inexistir de precedentes, quanto ao mesmo.
Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada, absolvendo-se o arguido.
Assim se fará a devida Justiça! 4. Em simultâneo com a interposição do recurso da sentença requereu o arguido ao tribunal «a transcrição de toda a audiência e julgamento».
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Requerimento, esse, indeferido por despacho judicial de 19.03.2015.
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Uma vez mais inconformado, recorreu o arguido, concluindo: III.1- Do requerimento do arguido de transcrição de gravação de prova e recusa do Juiz: 2. Foi requerido pelo arguido transcrição escrita da audiência e julgamento, que o Meritíssimo Juiz indeferiu, indevidamente.
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Deveria o Meritíssimo juiz ter aceite conforme Assento/acórdão do Supremo Tribunal com o n.º 2/2003, de 16-01-2003 – “Sempre que o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, em conformidade com o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal, a transcrição ali referida incumbe ao tribunal” – D.R. I-A, n.º 25, de 30-01-2003.
III.2 - Da inconstitucionalidade e violação da legalidade do despacho do Meritíssimo Juiz: 3. O despacho viola claramente regras constitucionais, 12º, 13º, 16º, 17º, 18º, 20º, 21º, 25º, 26º, 27º, 29º, 30º, 32º, 51º, 52º, da CRP.
III.3 - Das disposições legais violadas: 4. Foram violados os artigos 609.º, 615.º do CPC; artigos 116.º, nº 1 e 117-B, n.º 1 e 2 do CRP, 2078º do C.C., art. 30º, nº 3 do CPC, 12º, 13º, 16º, 17º, 18º, 20º, 21º, 25º, 26º, 27º, 29º, 30º, 32º, 51º, 52º, da CRP.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente nos termos legais.
Assim se fará a devida justiça! 7. Em 08.04.2013, invocando uma nulidade insanável do requerimento para abertura de instrução, veio o arguido requerer «a inadmissibilidade legal da instrução e sua consequente extinção, anulando-se todo o processado a posteriori, por ser uma nulidade insanável.
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Sobre o assim requerido incidiu o despacho judicial de 22.05.2015, que procedeu ao indeferimento da arguida nulidade.
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Recorreu, então, o arguido, formulando as seguintes conclusões: IV.2 - Da recusa na apreciação da nulidade do requerimento de abertura de instrução: 1. Veio o arguido alegar nulidades no requerimento de abertura da instrução, o requerimento de abertura de instrução não contém a identificação do arguido, o assistente limita-se a imputar os factos ao arguido, não sendo percetível no requerimento de abertura de instrução a identificação do arguido, e se pode reportar a alguns deles ou a todos.
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Ora de acordo com o artigo 311º, n.º 3 a) do CPP, a acusação considera-se manifestamente infundada e, como tal, deverá ser rejeitada, quando não contenha a identificação do arguido, o que era o caso e deveria ter sido indeferida.
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Assim, o requerimento de abertura de instrução, valendo como acusação, por ter sido requerido pelo assistente e não tendo a identificação do arguido é inexequível.
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Pode ler-se no acórdão do Tribunal da relação de Évora de 27 de janeiro de 2011, em CJ, www.coletaneajurisprudencia.com, que o requerimento de abertura de instrução deve ter estrutura de uma acusação, devendo ser dirigido contra uma identificada pessoa ou entidade, e conter os elementos objetivos e subjetivos face aos quais se possa concluir que o arguido cometeu um ilícito penal, sob pena de rejeição por inadmissibilidade legal, de harmonia com o disposto no art. 287º, n.º 3 do CPP.
IV.3 - Da inconstitucionalidade e violação do despacho do Meritíssimo Juiz 5. O despacho viola claramente regras constitucionais, 12º, 13º, 16º, 17º, 18º, 20º, 21º, 25º, 26º, 27º, 29º, 30º, 32º, 51º, 52º, da CRP.
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4 - Das disposições legais violadas: 6. Foram violados os artigos 609º, 615º do CPC; artigos 116º, nº 1 e 117-B, nº 1 e 2 do CRP, 2078º do C.C., art. 30º, nº 3 do CPC, 12º, 13º, 16º, 17º, 18º, 20º, 21º, 25º, 26º, 27º, 29º, 30º, 32º, 51º, 52º, da CRP, e, artigos 8º, 311º, nº 3 a) do CPP, 302º, nº 1, 292º, 299º, do CPP.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente nos termos legais.
Assim se fará a devida justiça! 10. Por despacho exarado em 13.04.2015 foram os recursos interpostos da sentença e do despacho de 19.03.2015, admitidos.
Também, em 18.06.2015, veio a ser admitido o recurso interposto do despacho de 22.05.2015.
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Ao recurso interposto da sentença respondeu o Ministério Público, concluindo: Neste termos, deverá ser mantida a douta sentença recorrida, devendo ser julgado improcedente o recurso ora interposto pelo recorrente, tendo o Tribunal a quo apreciado corretamente a prova produzida em audiência de discussão e julgamento e subsumido a mesma ao direito aplicável, bem como a medida da pena se mostra adequada e proporcional ao caso, assim se fazendo a tão costumada Justiça! 12.
Reagiu, igualmente, o Ministério Público ao recurso interposto do despacho de 19.03.2015, defendendo a manutenção da decisão recorrida.
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Por fim, respondeu o Ministério Público ao recurso interposto do despacho de 22.05.2015, pronunciando-se pela respetiva improcedência por não ocorrer qualquer nulidade, designadamente a invocada pelo recorrente.
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Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido dos recursos não merecerem provimento.
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Cumprido o disposto no artigo 417.º, nº 2 do CPP nenhum dos sujeitos processuais interessados reagiu.
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Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, pois, decidir.
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Fundamentação 1. Delimitação do objeto dos recursos Delimitando as conclusões o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento das questões de natureza oficiosa, cumpre decidir: (i) Recurso do despacho de 22.05.2015: Se ocorre a nulidade do requerimento de abertura da instrução.
(ii) Recurso do despacho de 19.03.2015: Se deveria o tribunal a quo ter determinado a transcrição da prova produzida em sede de audiência de julgamento.
(iii) Recurso da sentença: Se, - Incorreu o tribunal em erro de julgamento; - Foi valorado depoimento indireto; - Ocorreu violação do artigo 355º, nº 1 do CPP; - Foi preterido o princípio in dúbio pro reo; - A pena deveria ter sido diferente.
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As decisões recorridas Ficou a constar das decisões em crise: A.
Sentença [transcrição parcial]: A – FACTOS PROVADOS Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos: 1. A assistente D... é natural da Ilha da Madeira, mais concretamente de (...) .
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No início do ano de 2003, a assistente decidiu refugiar-se no continente em virtude de ser vítima de violência doméstica por parte do então marido, o que foi causa de perturbações emocionais propícias ao desenvolvimento de um quadro psiquiátrico com intensidade grave, que exigiu acompanhamento médico psiquiátrico e tratamento através de medicamentos antidepressivos, que lhe determinou incapacidade para o trabalho.
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Desesperada, a assistente a partir de um anúncio publicado, numa revista contacta o arguido e este ajuda-a a vir para o continente, para com ele passar a residir.
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De início a relação da assistente com o arguido...
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