Acórdão nº 41/11.2PEFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução07 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo comum singular 41/11.2PEFIG da Comarca de Coimbra, Instância Local da Figueira da Foz, Secção Criminal, J1, após realização da audiência de julgamento, em 20 de Outubro de 2015 foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: Por todo o exposto, decido julgar a acusação parcialmente procedente, por provada, e consequentemente:

  1. Absolver o arguido A...

    da prática do crime de detenção de munição proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º n.º1 d) da Lei n.º 5/2006, de 23.02, de que vinha acusado; b) Condenar o arguido B...

    pela prática de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo artigo 86.º n.º1 d) da Lei n.º 5/2006, de 23.02, numa pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros); c) Condenar o arguido C... pela prática de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo artigo 86.º n.º 1 d) da Lei n.º 5/2006, de 23.02, numa pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros).

  2. Condenar os arguidos B... e C... no pagamento das custas do processo, cuja taxa de justiça se fixa em 2 UC (cfr. artigos 513.º e 514.º do Código de Processo Penal e 8 n.º 5.º do Regulamento das Custas Processuais) Declaro perdidas a favor do Estado:

  3. As armas e munições descritas nos pontos 1, 2, 4 e 5 do elenco de factos provados; b) O produto estupefaciente apreendido a fls. 5, que, oportunamente, deve ser destruído.

    Inconformado com a decisão, dela recorreu o Ministério Público no segmento relativo ao arguido C...

    , extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões: Concluindo, dir-se-á, pois, que: 1 º - A factualidade dada como provada não poderá, levar à condenação do arguido por um crime de detenção ilegal de arma, mas sim dois crimes de detenção ilegal de arma.

    1. - O arguido C... já tinha tido contacto com as autoridades policiais que recolheram as armas ilegais que este tinha na sua posse num primeiro momento e ainda assim, volvidos vários meses, voltou a adquirir armas ilegais (munições), o que segundo as regras da experiência comum revela uma renovação a sua resolução criminosa.

    2. - A Mm.ª Juiz "a quo", violou na sentença recorrida, por erro de interpretação do preceituado no art.º 86.º n.º 1 al. d) da Lei n.º 5/2006 de 23/02, e art.º 30.º n.º 1 do Código Penal ao não considerar a existência de dois crimes e ao condenar apenas por um crime em face da factualidade dada como provada.

    3. - Uma das modalidades da prática do crime de tráfico de armas, p. e p. no art.º 87.º n.º 1 da lei n.º 5/2006 de 23/02 é a cedência a qualquer título, com intenção de transmitir a sua detenção, posse ou propriedade das armas previstas no art.º 86.º da Lei n.º 5/2006 de 23/02.

    4. - Das declarações de C... , A... e D... , retira-se que a munição referida no ponto 5 da matéria de facto dada como provada, foi oferecida por C... a D... , como se retira dos excertos das declarações acima referidas, situação aliás espelhada na motivação da matéria de facto da sentença.

    5. - A Mm.ª Juiz "a quo", violou na sentença recorrida, por erro de interpretação do preceituado no art.º 86.º n.º 1 al. d) e 87.º n.º 1 da Lei n.º 5/2006 de 23/02 ao não considerar a existência desse crime de tráfico de armas por parte de C... e do crime de detenção ilegal de arma praticado por D... .

    6. - Impõe-se dar cumprimento ao art.º 358.º n.º 1 e 3 do Código de Processo Penal, na medida em que o tribunal deve alterar a qualificação jurídica dos factos que constavam da acusação.

    7. - Para que o tribunal tenha em conta uma alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação, basta-lhe comunicar essa alteração ao arguido e conceder-lhe, se ele requerer, prazo para a preparação da defesa. Assim, não há qualquer limitação ou obstáculo a que o tribunal se pronuncie sobre a nova qualificação jurídica dos factos que não seja o cumprimento do mero dever de comunicação.

    8. - Mais se impõe dar cumprimento ao art.º 359.º n.º 2 e 3 do Código de Processo Penal, quanto à alteração substancial de factos, referente aos factos do tráfico de armas, e detenção ilegal de arma por D... .

    9. - Sendo que in casu, não foram cumpridas essas comunicações, violando dessa forma por omissão os art.º 358.º n.º 1 e 3 e 359.º n.º 2 e 3 do CPP.

      11 º - Assim, ao não cumprir a essas comunicações, deixou o tribunal de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, uma vez que para as apreciar, bastava o tribunal ter comunicado a nova qualificação jurídica e a alteração substancial dos factos.

    10. - Esta omissão de cumprimento de comunicação previsto no art.º 358.º e 359.º do CPP tem, a consequência no âmbito da sentença, desta comportar nulidades de omissão de pronúncia, do art.º 379.º, n.º 1, al. c) do CPP, na medida em que os factos merecem uma qualificação jurídica diversa da que constava na acusação (nesse sentido veja-se o Ac. da Relação do Porto de 6-05-2009, Rec. Penal n.º 42/06.2GBMDLP l - 4.ª Secção, disponível em www.trp.pt) e na medida em que se apurou de uma alteração substancial dos factos autonomizável em relação ao objecto do processo.

    11. - Omissão essa que deve ser sanada no tribunal de 1.ª instância, na medida em que essa questão foi levantada ainda nessa instância, em sede de alegações ( vide Paulo Pinto de Albuquerque, em comentário aos art.º 358.º e 424.º do CPP, pág. 886 e 887, parágrafo 6 e pág. 1164, parágrafo 5 e 6, do Comentário do Código de Processo Penal, Coimbra Ed.3, 2007.).

    12. - Em face do exposto deve ser revogada a sentença recorrida, e determinar-se que, no tribunal "a quo" seja cumprido o disposto no art.º 358.º, n.º 1 e 3 do CPP, relativamente à alteração da qualificação jurídica dos factos praticados pelo arguido, no que se refere aos dois crimes de detenção ilegal de arma, e seja dado cumprimento ao art.º 359.º n.º 2 e 3 do Código de Processo Penal, quanto à alteração substancial de factos, referente aos factos do tráfico de armas por C... , e detenção ilegal de arma por D... e dada a palavra ao Ministério Público para ponderar da utilização da faculdade do art. 16.º n.º 3 do Código de Processo Penal, após a obtenção ou não da concordância do arguido para o julgamento pelos novos factos.

      Porém, V.as Ex.ªs, Senhores Juízes Desembargadores, decidirão, como sempre, fazendo Justiça.

      O recurso foi objecto de despacho de admissão.

      Notificado, o arguido respondeu ao recurso, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

      Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer acompanhando o recurso no que respeita à questão da qualificação jurídica, entendendo que previamente deve ser cumprido o disposto no artigo 424º, nº 3 do Código de Processo Penal e que deve ser instaurado processo autónomo quanto aos novos factos apurados em audiência.

      Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, o arguido respondeu continuando a pugnar pela manutenção da decisão recorrida.

      Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.

      *** II. Fundamentos da Decisão Recorrida Constam da sentença recorrida os seguintes fundamentos de facto: Da discussão da causa e com interesse para a decisão, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 06.10.2011, o arguido B... tinha na sua posse, guardados no interior da residência sita na Rua (...) , Figueira da Foz:

  4. Um punhal (imitação) com bainha em metal, de cor dourada, com o comprimento total de 17 cm. (sendo 11 cm. de lâmina de aço, com corte de ponta afiada e 6 cm. de punho); b) Uma faca de abertura automática, com cabo em plástico de cor preta e lâmina em metal, com mola para exercer pressão que liberta a lâmina e fecho de segurança, com o comprimento total de 18 cm. (sendo 7,5 cm. de lâmina e 11.5 cm. de cabo).

    1. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar descritas no ponto 1, o arguido C... tinha na sua posse: a) Uma faca de abertura automática, com cabo em liga metálica com fecho de segurança e botão para exercer pressão e libertar a lâmina, com o comprimento total de 21 cm. (sendo 9,5 cm. de lâmina e 11,5 de cabo); b) Uma navalha tipo borboleta, com cabo de cor preta e lâmina em metal, com o comprimento total de 22 cm. (sendo 10 cm. de lâmina e 12 cm. de cabo) 3. Naquele mesmo dia foram ainda encontradas e apreendidas no interior da residência uma barra e várias línguas de cannabis resina, em produto vegetal prensado, do qual 26,035 gramas (de peso líquido) tinham um grau de pureza de 6,8 % e 44,395 gr (de peso líquido) um grau de pureza de 6,7%, equivalendo tal quantidade ao suficiente para 94 doses.

    2. No dia 23.04.2012, pelas 07h05, o arguido o arguido C... tinha na sua posse, guardada no interior da residência referida no ponto 1, uma munição com bala...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT