Acórdão nº 427/13.8TBPMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A...

, intentou a presente acção declarativa com forma de processo comum contra B... e mulher C... , já todos identificados nos autos, formulando os seguintes pedidos:

  1. Declarar-se a nulidade do contrato de mútuo por vício de forma; b) Condenar-se os réus a restituírem a quantia de 50.000,00 €, acrescida dos respectivos juros ou frutos civis vencidos à taxa de 4% ao ano, no montante de 20.493,15 € e dos vincendos a partir de 01.04.2013, à mesma taxa até efectivo pagamento.

    Para tanto, alega que em 10 de Setembro de 2002, o réu pediu emprestado a “D.... , L.da”, a quantia de 50.000,00 €, para custear as despesas com as obras de ampliação e remodelação da casa para residência da sua família, para o que foi emitido, à ordem do réu marido o cheque do Finibanco n.º 1.. , no valor de 50.000,00 €, que o réu recebeu e depositou na sua conta, no dia 13 de Setembro de 2002.

    O réu obrigou-se a restituir tal quantia até ao dia 31 de Dezembro de 2002, bem como a pagar juros à taxa de 10%, ao ano, o que não fez.

    Em 30 de Dezembro de 2003 “ D... , L.da”, cedeu à autora, o referido crédito.

    Como o referido mútuo não foi celebrado por escritura pública, é o mesmo nulo, devendo, por isso, ser restituída a quantia mutuada, acrescida de juros, enquanto frutos civis, que a autora limita à taxa de 4%, ao ano.

    Mais alega a autora que os réus são casados no regime da comunhão geral de bens, o que já se verificava em 10 de Setembro de 2002 e o cheque acima referido foi depositado em conta comum de ambos os réus e a quantia nele referida, foi utilizada nas obras de ampliação e remodelação da casa de morada da sua família, que é pertença de ambos os réus, do que deriva, igualmente, a responsabilidade da ré, pelo pagamento da quantia mutuada, que, para além do mais, autorizou e consentiu o referido empréstimo.

    Contestando, no que ao presente recurso interessa, alegou a ré a sua ilegitimidade, com o fundamento em nunca ter solicitado nem à ora autora, nem à referida primitiva credora, qualquer empréstimo, nem nunca ter tido intervenção em qualquer conversa quanto ao alegado empréstimo, nem lhe foi entregue qualquer quantia, nem autorizou tal empréstimo, nem dele beneficiou fosse de que modo fosse, bem como referiu que a alegada quantia não foi utilizada em qualquer obra de ampliação e remodelação da casa de morada de família, que pertencia a ambos os réus; em função do que pugna pela sua absolvição da instância.

    Respondendo, a autora, reitera, quanto a tal, o que já havia alegado na petição inicial, pugnando, em consequência pela condenação da ré, nos termos peticionados.

    Teve lugar audiência prévia, no decurso da qual foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a excepção de ilegitimidade da ré, por se tratar do mérito da causa e se fixou o objecto do litígio e se enunciaram os temas de prova.

    Realizou-se a audiência de julgamento com observância do legal formalismo, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 157 a 169, na qual se seleccionou a matéria de facto dada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final se decidiu o seguinte: “Nos termos e fundamentos expostos, 1.

    Julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, 2.

    Condeno o 1.º Réu B... a entregar à Autora A... a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, contados desde a citação até integral pagamento.

    1. Absolvo o 1.º Réu B... da restante quantia pedida.

    2. Absolvo a 2.ª Ré C... de todo o pedido formulado pela Autora.

    3. As custas são a cargo da Autora e do 1.º Réu, na proporção do decaimento.“.

      Inconformada com a mesma, interpôs recurso a autora A... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 211), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1 - O que nestes autos releva é saber se a quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros) que o credor primitivo emprestou ao 1.º Réu integrou o património comum de ambos os RR.

      e se, tal quantia, reverteu em proveito comum de ambos.

      2 - E aqui seguimos de perto os ensinamentos do Prof. Pereira Coelho, no sentido de que o proveito comum não se afere pelo resultado mas antes pela aplicação da quantia que originou a dívida, ou seja, o que releva é a finalidade que o devedor tinha em vista quando contraiu tal dívida, devendo tal finalidade beneficiar o casal.

      3 - Ao depositar a quantia de 50.000,00 € (cinquenta mil euros) na conta comum do casal para cuja movimentação a 2.ª Ré havia dado o prévio consentimento, tal quantia integrou-se de imediato no património comum do casal, enriquecendo-o nessa medida, pouco importando já para a questão em apreço, quais os pagamentos ou investimentos efectuados a partir daquela conta e quem a movimentou, se o 1.º ou a 2.ª R.

      4 - O proveito comum do casal a que alude o art. 1691.º, n.º 1, al. c) do C. Civil, afere-se pelo fim objectivamente visado pelo agente, ou seja, pela aplicação da dívida no interesse de ambos os cônjuges ou da sociedade familiar em geral, visto aos olhos de uma pessoa média e, portanto, à luz das regras da experiência e das probabilidades normais.

      (vide Ac. do Tribunal da Relação de Gumarães, Processo n.º 181/07-1, de 22/02/2007, in www.dgsi.pt) 5 - O simples depósito de 50.000,00 € (cinquenta mil euros) proveniente do empréstimo contraído por um dos cônjuges na conta titulada por ambos os cônjuges é um facto constitutivo do proveito comum do casal e da comunicabilidade da dívida proveniente do empréstimo. Caberia ao outro cônjuge provar o contrário.

      6 - Nas palavras de Pires de Lima e Antunes Varela, na anotação ao artigo 342.º do Código Civil, in Código Civil Anotado, pág. 306, aquele que invoca determinado direito tem de provar os factos que normalmente o integram; a parte contrária terá de provar, por seu turno, os factos anormais que excluem ou impedem a eficácia dos elementos constitutivos.

      (…) Nos casos de dúvida sobre se determinado elemento é facto constitutivo ou se é a sua falta que representa um facto impeditivo, o n.º 3 do artigo 342.º dá um critério supletivo, optando pela primeira solução.

      7 - Os factos das alíneas a), b), c) e d) constantes da matéria não provada foram, no nosso entender, incorrectamente julgados e valorados não se atendendo nem valorando os depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas pela Autora.

      8 - Sobre aqueles factos apenas foram inquiridas as testemunhas: - G...

      - H...

      - E...

      9 - Da prova produzida em julgamento quer a testemunha G... , que presenciou o momento em que o credor primitivo entregou ao 1.º R. o cheque da quantia de €50.000,00 (cinquenta mil euros) e assistiu à conversa havida entre ambos, quer a testemunha H... quer ainda a testemunha E... que melhor que ninguém pode relatar os factos tal como aconteceram pois foi ele quem emprestou a referida quantia ao 1.º Réu, resulta que, a quantia foi pedida pelo 1.º Réu para custear as obras de ampliação e remodelação da casa de família e foi utilizada nessas obras de melhoramento.

      10 – No seu depoimento G... que presenciou o 1.º Réu a pedir o empréstimo dizendo que era para reparar a casa.

      11 - No seu depoimento H... referiu que ao fornecer a pedra para obras na vivenda do Réu, há uns 10/12 anos atrás, lhe foi referido pelo cunhado do Réu ( J... ) que quem tinha financiado as obras tinha sido um canadiano mas que não soube logo quem era, só mais tarde veio a saber que era o senhor E... mais referindo que tal conversa ocorreu no tempo das obras e confirmou também ao Tribunal que era nessa casa que os Réus viviam.

      12 – E... referiu de forma isenta as circunstâncias em que o empréstimo foi pedido, para que finalidade e esclareceu ainda que a 2.ª Ré dele teve conhecimento. Esclareceu também que, por seu naturalizado canadiano é por isso conhecido como “o canadiano”. Mais referiu ter feito o cheque no nome da empresa “ D... ” e que tal valor se destinava a colmatar os trabalhos na vivenda onde o 1.º Réu vive com esposa, 2.ª Ré. Foi o 1.º Réu que lhe disse que tal valor era para utilizar na casa de família.

      13 – A testemunha E... referiu ainda que, o valor das obras foi superior a 100.000,00 € esclarecendo que os acabamentos eram muito bons e que foram feitas com requinte. Mais disse que, foi acrescentado escritório, foi arranjada toda a casa, a casa era de rés-do-chão e passou a ter um 1.º andar, foram feitos uns anexos sendo uma casa bastante grande e com luxo.

      14 – A testemunha I... questionado acerca do valor estimado das obras referiu que não fazia ideia mas que era uma casa grande, valores como cento e muitos mil euros, duzentos mil, eram números grandes.

      15 - Não poderia o douto Tribunal a quo concluir que, uma vez que os Réus recorreram ao crédito bancário para fazerem obras não se vê a necessidade de recorrerem a mútuo junto de particulares.

      16 - Do que acima ficou dito conclui-se que, todas as testemunhas arroladas pela Autora foram capazes de concretizar que o empréstimo foi pedido pelo 1.º R. para a realização de obras na casa de família dos Réus e que a 2.ª Ré teve conhecimento desse mesmo empréstimo e do fim a que se destinava.

      17 - Pelo que, os factos descritos nas...

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