Acórdão nº 388/17.4JACBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução10 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I - RLATÓRIO No processo supra identificado, investiga-se a prática de crime de explosão, p. e p. pelo art. 272.º, n.º 1, al. b) e um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art. 203.º, n.º 1, e 204.°, n.º 1, al. e) e n.º 2, al. a), todos do Código Penal.

O Ex.mo Procurador Adjunto, pela promoção de fls. 91 daqueles autos e 44 deste recurso em separado, por se entender que as diligências são indispensáveis para a descoberta da verdade e para identificar a identidade dos agentes dos ilícitos em causa, sendo a prova, de outra forma, impossível, ou muito difícil de obter, requereu junto do Juízo de Instrução Criminal de Leiria, nos termos do disposto nos art. 187.º, n.º 1 al a) e 189.°, n.º 2, do Código de Processo Penal, que fosse determinado o levantamento do sigilo das comunicações, autorizando as operadoras de telecomunicações móveis “MEO”, "VODAFONE" e "NOS" a remeterem, em formato digital, a seguinte informação: 1) Identificação de todas as chamadas efectuadas e recebidas (tráfego das células apresentadas, bem como o tráfego respeitante às frequências e bandas com a mesma localização e o mesmo azimute), conforme consta de fls. 40 a 41v., que permitam identificar os aparelhos/cartões que estiveram registados nas antenas/células, tendo em conta as variáveis abaixo identificadas, na data e hora abaixo mencionados:

  1. Na agência da A... do Banco B... , sita na esquina da Av. (...) coma (...) , Leiria, dia 08/08/2017, entre as 05h15 e as 06h15.

    MEO CI CELULAS_NOME CGI 1273 --------------------LEIRIA1 1 -------------------------------------------------------268-06-8310-1273 7896 --------------- LEIRIA1 DCS 1 ---------------------------------------------------268-06-8310-7896 33704 ------------- LEIRIA1 FDD 1----------------------------------------------------268-06-8310-33704 48704 -----------------EIRIA1- FDDH 1 ---------------------------------------------- 268-06-8310-48704 416543 ---------------LEIRIA 1 LC 1------------------------------------------------------268-06-0-416543 7244 ------------- LEIRIA HEROIS ANGOLA M 1 ----------------------------------268-06-8310-7244 VODAFONE CELL_IDENTIFIER SITE_NAME CGI 3JF2114C------------------------LEIRIA MARINGA------------------------------------268-01-43-21146 3JFF2114F----------------------LEIRIA MARINGA------------------------------------268-01-43-21149 3JF2387C-----------------------LEIRIA MARINGA-------------------------------------268-01-43-23876 4LR003227C-------------------LEIRIA MARINGA-------------------------------------268-01-00327-03 4LR003227C------------------LEIRIA MARINGA--------------------------------------268-01-00327-06 CD0798C----------------------LEIRIA MARINGA----------------------------------------268-01-43-7983 3JF2112A---------------------LEIRIA BAIXA--------------------------------------------268-01-43-21124 3JF2112D---------------------LEIRIA BAIXA--------------------------------------------268-01-43-21127 3JF2688A---------------------LEIRIA BAIXA--------------------------------------------268-01-43-26884 4LR00324A------------------LEIRIA BAIXA--------------------------------------------268-01-00325-01 4LR00325D-----------------LEIRIA BAIXA---------------------------------------------268-01-00325-04 CD0963A-------------------LEIRIA BAIXA-----------------------------------------------268-01-43-9631 NOS CODE-SRATION NAME_SITE CGI AZIMUTE 243S5_2-----------------------------------LEIRIA_2----------------268-03-6300-24352---------------130*b) No local onde foram abandonadas peças metálicas pertencentes a uma ATM, na Travessa (...) em Leiria, numa zona de pinhal, em frente à habitação n.º 4, dia 08/08/2017, entre as 05h00 e as 06h45.

    MEOCI CELULAS_NOME CGI 7538 --------------------BOAVISTA 2----------------------------------------------------268-06-8310-7538 35873---------------- BOAVISTAFDD2-----------------------------------------------268-06-8310-35873 54450 ------------- BOAVISTA FDDH2-----------------------------------------------268-06-8310-33704 VODAFONE CELL_IDENTIFIER SITE_NAME CGI 3JF2972C------------------------BOAVISTA LEIRIA-----------------------------------268-01-43-21146 3JF6044C------------------------BOAVISTA LEIRIA-----------------------------------268-01-43-60446 3JF6044F------------------------BOAVISTA LEIRIA-----------------------------------268-01-43-60449 4LR05836C---------------------BOAVISTA LEIRIA------------------------------------268-01-05836-03 CD3464C------------------------BOAVISTA LEIRIA-----------------------------------268-01-43-34643 NOS CODE-SRATION NAME_SITE CGI AZIMUTE 167C92_2-------------------BOAVISTA_EN1_UMTS-----------268-03-30050-16792--------------130 167N4_2-------------------BOAVISTA_EN1----------------------268-03-30050-16792--------------130*O senhor juiz de instrução criminal, pelo despacho de fls. 94 a 98, fls. 45 a 49 destes autos, indeferiu ao requerido levantamento do sigilo das comunicações.

    Despacho recorrido: «Promoveu o Ministério Público, em 30/1 0/20 17, a fls. 91 (por remissão para informação policial) que se obtenha junto de operadoras de telecomunicações, a identificação de todas as chamadas efectuadas e recebidas (tráfego das células apresentadas, bem como o tráfego respeitante às frequências e bandas com a mesma localização e o mesmo azimute), que permitam identificar os aparelhos/cartões que estiveram registados em antenas/células que a informação policial detalha.

    Como resulta inequívoco do n.º 2 do artigo 189.° do C. P. Penal, a obtenção de dados de tráfego e de localização como aqueles que o Ministério Público pretende só pode ocorrer em relação às pessoas referidas no n.º 4 do artigo 187.° do mesmo diploma legal. O mesmo decorre do disposto nos artigos 4°, n.º 1 e 9.°, n.os 1 e 3, ambos da Lei n.º 32/2008, de 17/07, aplicável ao solicitado pelo Ministério Público. No caso concreto, pretende-se lograr a identificação de suspeitos da prática de crimes de explosão e de furto qualificado, sendo evidente que a diligência pedida visa precisamente chegar à identificação de suspeitos e não, como exige a lei, incidir sobre dados de tráfego e localização relativos a suspeito ou suspeitos concretos. Dito de outro modo, o que é pretendido é que se aceda a dados de tráfego e de localização de um conjunto indeterminado de pessoas que efectuaram comunicações accionando células de antenas de telecomunicações, na esperança de, entre todas, descortinar quem possa ter praticado os crimes investigados. Ou seja, pretende-se obter dados de tráfego e de localização, desejavelmente de suspeitos, mas, seguramente, de muitos "não suspeitos".

    Parece evidente que a salvaguarda do sigilo das telecomunicações, plasmada nos apertados limites em que se admite a obtenção de dados de tráfego e de localização, nos termos das normas legais citadas, não consente tal identificação de suspeitos com recurso a "varrimento" de dados de número indeterminado de pessoas, a grande maioria (na melhor das hipóteses) ou todas (na pior) absolutamente alheias aos factos investigados.

    Neste sentido, vejam-se os seguintes arestos (todos disponíveis na internet em www.dusi.pt): 1. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 23/09/2010 (Processo n. o 20/10.7GCLLE-A.El, Relator Juiz Desembargador Edgar Valente): «(…) De acordo com o disposto no art. 189.º n.° 2 do CPP, a obtenção e junção aos autos de dados sobre a localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações só podem ser ordenadas ou autorizadas, em qualquer fase do processo, por despacho do juiz, quanto a crimes previstos no n° 1 do artigo 187.º e em relação às pessoas referidas no n.° 4 do mesmo artigo. (. . .) Nas situações em que se pretende a obtenção de dados sobre a localização celular ou de registos da realização de conversações ou comunicações relativos a uma determinada área geográfica e a determinado intervalo temporal, não é possível relacionar tais dados/registos com qualquer "suspeito" (existe apenas a possibilidade de poderem vir a dizer respeito a suspeitos, possibilidade que pode nem sequer se concretizar, vindo a ser abrangida apenas uma miríade de cidadãos anónimos que não praticaram qualquer crime). (. . .) A pretensão referida (. . .) vai necessariamente abranger um leque muito alargado de cidadãos que não possuem o estatuto jurídico-processual de "suspeito" e, como tal, é ilegal (. . .]».

    1. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 18/1 0/20 11 (Processo n. o 19/11.6GCEVR-A.El, Relator Juiz Desembargador Fernando Ribeiro Cardoso): « (…) No caso apreciando, não há suspeitos nem arguidos e pretendia-se com a promoção desatendida obter informações que abarcam um universo ilimitado, incaracterístico e indiferenciado de destinatários para partir daí em busca de um suspeito. (…) A exigência de individualização do suspeito enquanto interveniente processual, designadamente para efeitos do n.° 4 do artigo 187. ° do CPP, não se...

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