Acórdão nº 3906/16.1T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução16 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. AA (…) e mulher AM (…)instauraram, na Comarca de Viseu, a presente acção comum contra Banco B (…) , S. A., pedindo, a título principal, a condenação do banco Réu a pagar-lhes o capital de € 50 000 acrescido de juros vencidos no montante de € 7 000 e dos juros vincendos desde a citação até integral pagamento, e ainda € 3 000 a título de compensação por danos não patrimoniais, ou, no tocante àquele primeiro pedido, a declaração de nulidade de qualquer eventual contrato de adesão subjacente à aplicação dos € 50 000 (que os AA. entregaram ao banco Réu) em obrigações subordinadas SLN 2006, condenando-se o banco Réu na restituição de tal montante, acrescido de juros vencidos e vincendos.

Alegaram, em síntese, terem investido € 50 000 em obrigações SLN 2006, o que fizeram na qualidade de clientes do banco Réu, e por a sua gerente lhes ter garantido tratar-se de uma aplicação em tudo similar a um depósito a prazo, com capital garantido e juros disponíveis de 6 em 6 meses; nunca lhes foram fornecidas quaisquer outras informações ou explicações sobre o investimento em causa, pelo que desconheciam estarem a subscrever produtos de risco; a conduta do banco Réu colocou-os num estado de permanente preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saber quando iam reaver o seu dinheiro.

A Ré contestou, defendendo-se, por excepção, invocando a ineptidão da petição inicial, a incompetência territorial do tribunal e a prescrição por decurso do prazo de dois anos desde a conclusão da operação em discussão (a ter existido qualquer deficiência de informação por parte dos seus funcionários foi uma negligência ou culpa leve), e, por impugnação, considerando que o produto financeiro em causa era um produto seguro à data da sua subscrição, pelo que o incumprimento resultou de circunstâncias imprevisíveis e anormais, relacionadas com a própria nacionalização do banco, e bem assim que os AA. foram exaustivamente esclarecidos sobre as condições do produto financeiro em questão, e a sua subscrição não foi sujeita a qualquer contrato de adesão. Concluiu pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.

Os AA. responderam à matéria de excepção concluindo pela sua improcedência.

Na audiência prévia foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes as excepções de incompetência em razão do território e de ineptidão da petição inicial, relegou para final a apreciação da prescrição, firmou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, por sentença de 18.4.2017, julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou o banco Réu no pagamento aos AA. da quantia de € 57 000 (cinquenta e sete mil euros), acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde o dia 25.7.2016 (data da citação) até integral pagamento, à taxa de 4 % ao ano, bem como da quantia de € 2 500 (dois mil e quinhentos euros) a título de indemnização de danos não patrimoniais.

Inconformada, a Ré apelou formulando as seguintes conclusões: (…) Os AA. responderam concluindo pela improcedência do recurso.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir: a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova); b) decisão de mérito, cuja modificação depende, sobretudo, da eventual alteração daquela decisão.

* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: 1 - Os autores eram clientes do B (…), S. A. (actualmente B (…) S. A.) na sua agência de X (...) , com a conta à ordem n.º 00 (...) , onde movimentavam parte dos dinheiros, realizavam pagamentos e efectuavam poupanças, depositando os autores confiança nos funcionários e gerente do Réu.

2 - Em Abril/2006, uma funcionária do Réu da agência de X (...) propôs aos autores uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, e com capital garantido pelo B (...) , e com rentabilidade assegurada.

3 - A dita funcionária do Réu sabia que os autores não possuíam qualificação, ou formação técnica que lhes permitisse, à data, conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente, e ainda que os autores tinham um perfil conservador quanto ao investimento do seu dinheiro que, até então, sempre aplicaram em depósitos a prazo.

4 - Na sequência da proposta supra mencionada, e após subscrição da “comunicação de cliente” pela autora cuja cópia consta de fls. 73, € 50 000 dos autores foram colocados em obrigações SLN 2006, sem que os autores soubessem em concreto o que era, desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa.

5 - O que motivou a autorização, por parte dos autores, foi o facto de lhes ter sido dito pela funcionária que o capital era garantido pelo banco Réu, com juros semestrais, e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendessem, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias.

6 - Os autores actuaram convictos de que estavam a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características e garantia de um depósito a prazo, no convencimento de que o Réu lhes restituiria o capital e juros quando lhos solicitasse, nunca tendo pretendido comprar obrigações SLN 2006, produto de risco em que o capital não era garantido pelo B (...) .

7 - Os autores nunca tiveram a intenção de investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu.

8 - Daí a convicção plena com que os autores ficaram da segurança da aplicação em causa, cujos juros foram sendo semestralmente pagos, o que transmitiu segurança aos autores.

9 - Em Novembro/2015, o banco Réu deixou de pagar os juros respectivos.

10 - O banco Réu atribui a responsabilidade pelo pagamento à SLN, entidade que os autores nem sabiam existir, pensando que se tratava de uma mera denominação da conta a prazo que o Réu utilizava.

11 - Os autores desconheciam que tinham adquirido uma aplicação com características diferentes de um depósito a prazo.

12 - Os autores não foram informados pelo gerente ou funcionários do Réu nem sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006, nem sobre o que eram tais obrigações.

13 - Nunca qualquer contrato foi lido aos autores, nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores, não lhes tendo sido entregue qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações SLN.

14 - O prazo de maturidade das obrigações SLN 2006 subscritas pelos autores ocorreu em Maio/2016.

15 - Na data de vencimento contratada, o Réu não lhes restituiu o montante que os autores lhe confiaram, sendo que na agência de X (...) lhes diziam que era melhor esperar até à maturidade das obrigações.

16 - O Réu também não tem cumprido o pagamento dos juros acordados, uma vez que contrataram uma taxa de 4,5 % ao ano ilíquida, e foram pagos juros na ordem de 1 % desde Maio de 2009 e até à maturidade.

[1] 17 - O Réu foi apresentado pelos seus funcionários como garante da aplicação financeira em causa.

18 - As orientações e comunicações internas existentes no B (...) , e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões (que, por sua vez, as transmitiam aos clientes), consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade, e em assegurar que o banco garantia o capital investido.

19 - O Réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos.

20 - Os autores ficaram impedidos de usar o dinheiro que investiram nas obrigações SLN 2006 como bem entendessem.

[2] 22 - A actuação do Réu tem colocado os autores num permanente estado de stress, preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saber quando iam reaver o seu dinheiro, o que lhes tem provocado ansiedade, tristeza.

23 - O negócio mencionado em 4. constituiu um acto em que o Réu intermediou a aquisição do produto financeiro em causa, cumprindo ordens dadas pelos seus clientes (os autores) no sentido da subscrição de Obrigações SLN 2006.

24 - Os autores recebiam extractos mensais periódicos, onde apareciam discriminadas as suas aplicações financeiras.

25 - As obrigações SLN 2006 foram emitidas pela “SLN, SGPS, S. A.”, sociedade titular de 100 % do capital social do banco Réu, até Novembro/2008, altura em que foi nacionalizada.

26 - As obrigações SLN 2006 consistiam em valores mobiliários emitidos em representação da dívida da sociedade emitente.

27 - Até ao ano de 2015, os funcionários do Réu asseguravam ao autor o reembolso do valor reclamado.

2. E deu como não provados os factos dos art.ºs: a) - 41º e 42º (estes dois últimos apenas no segmento não transposto para a petição inicial) da petição inicial; b) - 20º a 23º, 25º, 26º, 33º, 34º, 37º a 47º e 50º a 72º da contestação; c) - 95º a 98º, 139º e 145º do articulado de resposta às excepções.

3. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

a) A Ré/recorrente insurge-se contra a decisão sobre a matéria de facto, invocando a prova pessoal e documental produzida nos autos e em audiência de julgamento - olvidando porventura algumas das exigências do art.º 640º do Código de Processo Civil/CPC[3]… -, pugnando para que se dê como não provada toda a matéria indicada em II. 1.

2.

a 13.

, 16.

a 19.

e 22.

, supra.

Independentemente dos eventuais “desvios” a exigências claramente previstas no citado normativo da Lei Processual Civil [nomeadamente, quanto à concretização exigida na alínea c) do n.º 1 do art.º 640º - veja-se, inclusive, que a própria recorrente afirma que «não pode deixar de discordar, de uma forma...

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