Acórdão nº 1189/16.2T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO H (…), casado, agricultor, contribuinte nº (...), residente na (...) instaurou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra J (…), casado, bancário reformado, contribuinte nº (...) , residente em (...) e mulher M (…) casada, professora, contribuinte nº (...) , residente em (...) , pedindo que na procedência da acção sejam os Réus condenados no pagamento ao Autor da quantia de €89.927,00 (oitenta e nove mil e novecentos e vinte sete euros) acrescido de juros legais desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Em fundamento da sua pretensão alega concretas condições na sequência das quais se conheciam - por via da actividade de bancário, o Réu marido e cliente da instituição na qual prestava serviços aquele, no caso do Autor - sendo que em condicionalismo temporal que caracteriza os RR solicitaram-lhe um empréstimo de importância que especifica, a que se seguiram vários outros empréstimos, escalonados temporalmente e em montantes distintos, em valor ou montante total que quantifica.

Sucede que os RR foram pagando o montante de juros acordado, até data que precisa, momento a partir do qual nada mais pagaram, elencando os montantes pagos a tal título, ademais de dizer que nenhuma parte do capital mutuado foi pago.

* Citados regular e pessoalmente contestaram os Réus a fls 33 e segs.

Nesta peça processual começam por contrariar a afirmação do Autor relativamente à localidade na qual o Réu marido exercia a sua actividade, tal como dizem que se conheciam há muitos anos, em condições ou circunstâncias que nada têm a ver com a actividade bancária, tal como negam terem pedido o(s) empréstimo(s) ao Autor, antes foi este quem se ofereceu para tal, sabedor que os RR estavam a pensar reconstruir a casa da família.

Em seguida descrevem com pormenor as entregas de dinheiros, taxas de juro, pagamentos efectuados, etc, num total que quantificam, sendo que as taxas de juro foram impostas pelo Autor.

Após aludem às condições acordadas entre as partes para a restituição do capital mutuado, sendo que seguidamente se centram na abordagem jurídica da questão, no caso da nulidade do contrato por falta de forma.

Por isso que finalizam pedindo a procedência da excepção de nulidade do contrato por falta de forma e bem assim a improcedência da acção.

* O Autor respondeu única e exclusivamente em sede jurídica, no que tange à invocada nulidade do contrato por falta de forma e bem assim alegando ou invocando em seu benefício o instituto do abuso de direito, reiterando o pedido inicial.

* Em tempo oportuno foi designada e teve lugar a efectivação de audiência prévia, com elaboração de despacho saneador, com apreciação da bondade dos pressupostos processuais, foi fixado o objecto do litígio e temas de prova e seriados os meios de prova, incluindo a marcação de dia para julgamento.

* A audiência de julgamento foi realizada com respeito pelas regras processuais, numa única sessão, sem que no seu decurso se tenham suscitados quaisquer questões.

Veio, na sequência, a ser proferida sentença, na qual após identificação em “Relatório”, das partes e do litígio, se alinharam os “factos provados” e os “não provados”, mais se apresentando a correspondente “Motivação”, após o que se considerou, em suma, que os RR. não podem invocar a nulidade por falta de forma dos contratos de mútuo, porque tal corresponderia a agirem com “abuso de direito”, na modalidade do “venire contra factum proprium”, isto face ao apurado pagamento pelos mesmos, ao longo dos anos, dos juros convencionados, por força do que o R. marido teria criado “a confiança de que iria cumprir o acordado”, termos em que se concluiu pelo seguinte concreto “dispositivo”: «Termos em que, por todo o exposto julgo a acção procedente, por provados os factos que a fundamentam e consequentemente decido condenar os RR J (…) e mulher M (…) a restituirem ao Autor H (…) a quantia de €89.782,79 (oitenta e nove mil, setecentos e ointenta e dois euros, setenta e nove cêntimos) acrescida de juros de mora calculados à taxa legal supletiva desde a data da citação para os termos da presente acção até integral e efectivo pagamento.

* Custas pelos Réus- artº 527º nºs 1 e 2 do CPC * Notifique e Registe e notifique.

» * Inconformados com essa sentença, apresentaram os RR. recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) * Não foram apresentadas quaisquer contra-alegações.

* Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos Recorrentes nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte: - desacerto da decisão de direito que perfilhou o entendimento de que os RR. não podiam invocar a nulidade por falta de forma dos contratos de mútuo, porque tal corresponderia a agirem com “abuso de direito”, na modalidade do “venire contra factum proprium”? * 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Vejamos o elenco factual que foi considerado/fixado como “provado” pelo tribunal a quo, sendo certo que no recurso não se questiona a decisão neste particular: «Com interesse e relevo para uma boa decisão da causa, emergindo da sua discussão, por ordem lógico-cronológica, estão provados os seguintes factos: 1 O Autor emprestou aos Réus diversas importâncias em dinheiro, numa quantia total de €89.782,79 (oitenta e nove mil, setecentos e oitenta e dois euros, setenta e nove cêntimos), em condições definidas infra, nenhum deles titulado por escritura pública ou por documento particular autenticado, sem beneficiar de qualquer garantia por parte dos devedores/Réus, quantia que estes e até à data ainda não lhe restituíram.

2 Para além de terem pago a totalidade dos juros acordados até 31 de Dezembro de 2007, em montante não apurado em concreto, os RR efectuaram ainda os seguintes pagamentos a título de juros: - em 20/03/2008 - €1.200,00 (mil e duzentos euros); - em 30/10/2008 - €2.793,27 (dois mil setecentos e noventa e três euros e vinte sete cêntimos) e €1.995,19 (mil novecentos e noventa e cinco euros e dezanove cêntimos); - em 20/05/2009 - €1.200,00 (mil e duzentos euros) - em 20/09/2009 – 2.793,27 (dois mil setecentos e noventa e três euros e vinte sete cêntimos); - em 15/05/2010 – €1.200,00 (mil e duzentos euros); - em 15/06/2010 - €1.200,00 (mil e duzentos euros); - em 15/10/2010 - €1.496,50 (mil quatrocentos e noventa e seis euros e cinquenta cêntimos) e €2.096,50 (dois mil e noventa e seis euros e cinquenta cêntimos); - em 04/04/2011 - €897,40 (oitocentos e noventa e sete euros e quarenta cêntimos); - em 12/07/2011 - €897,84 (oitocentos e noventa e sete euros e oitenta e quatro cêntimos); - em 26/09/2011 - €598,55 (quinhentos e noventa e oito euros e cinquenta e cinco cêntimos); - em 26/10/2011 - €2094,95 (dois mil e noventa e quatro euros e noventa e cinco cêntimos), num total de €16.371,34.

3 No ano de 1996 o Réu J (…) trabalhava na instituição de crédito Caixa Geral de Depósitos em localidade ou agência não apurada em concreto.

4 Em condições não apuradas em concreto, em 16 de Agosto de 1996, o Autor emprestou aos RR o montante de 6.000.000$00 (seis milhões de escudos) na moeda com curso legal à data, equivalente hoje a €29.927,00 (vinte nove mil e novecentos e vinte sete euros) à taxa de juro de 10% ao ano.

5 Em 20 de Abril de 2001 os Réus viram ser-lhes concedido, pelo Autor, um novo empréstimo, este no montante de 5.000.000$00 escudos (cinco milhões de escudos), ou seja, €24.939,94 (vinte quatro mil, novecentos e trinta e nove euros, noventa e quatro cêntimos), à taxa de juro de 8%.

6 Ainda nesse ano de 2001, mas em 19 de Junho, o Autor emprestou aos Réus a quantia de 7.000.000$00 escudos (sete milhões de escudos), ou seja, €34.915,85 (trinta e quatro mil, novecentos e quinze...

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