Acórdão nº 5525/16.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | V |
Data da Resolução | 06 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório Intentando ação de investigação de paternidade, contra A (…), com os sinais dos autos, o Exm.º Magistrado do M.º P.º, reportando-se ao menor M (…), também com os sinais dos autos, pediu o reconhecimento da paternidade do R. relativamente a tal menor, procedendo-se ao respetivo averbamento no seu assento de nascimento, bem como da avoenga paterna, alegando, para tanto, em síntese, que: - o menor nasceu em 09/08/2000 e foi perfilhado por J (…) sendo, porém, que, por sentença de 17/07/2014, foi declarado que este não era o seu pai; - em inícios de dezembro de 1999, a mãe do menor e o R. mantiveram entre si relações sexuais de cópula completa, em consequência das quais aquela engravidou, dando à luz o menor, no termo do período normal de gestação.
O R., citado, negou ter mantido relações sexuais com a mãe do menor ou ser pai deste, sendo que nunca a própria mãe do menor, a qual declarou ter mantido relações sexuais com vários homens, lhe imputou a paternidade do filho, assim concluindo pela improcedência da ação.
Dispensada a audiência prévia, saneado o processo, delineados objeto do litígio e temas de prova, determinada a realização de prova pericial para averiguação da paternidade do menor – não realizada por não comparência do R. no IMNL –, procedeu-se à produção de prova em audiência final.
Após o que foi proferida sentença, pela qual, conhecendo de facto e de direito, foi a ação julgada procedente, assim se declarando “o R. A (…) pai do menor M (…) para todos os efeitos legais” e ordenando-se o cumprimento, após trânsito em julgado, do “disposto no artigo 78º do C. de registo civil, a fim de se proceder ao correspondente averbamento da paternidade ora declarada, bem como da respectiva avoenga paterna, no assento de nascimento do menor”.
Inconformado, recorre o R., apresentando alegação, culminada com as seguintes Conclusões ([1]): (…) O M.º P.º apresentou contra-alegação recursória, concluindo pela improcedência do recurso e confirmação do decidido.
O recurso foi admitido, como de apelação, com efeito suspensivo da decisão e subida imediata e nos próprios autos, tendo sido ordenada a remessa do processo a este Tribunal ad quem, onde foi mantido tal regime recursivo.
Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.
II – Âmbito do Recurso Sendo o objeto dos recursos delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo delimitado em sede de articulados – como é consabido, são as conclusões da parte recorrente que (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso, nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor e aqui aplicável (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, está em causa na presente apelação saber ([2]):
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Se houve irregularidade no procedimento adotado nos autos para realização da prova pericial, afetando, de forma relevante, o direito de defesa do R.; b) Se deve proceder a impugnação da decisão da matéria de facto; c) Se, em matéria de direito, ocorreu erro de julgamento, seja quanto ao ónus da prova (e inversão do mesmo) seja quanto ao desfecho do litígio.
III – Fundamentação
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Da irregularidade no procedimento para obtenção da prova pericial Pretende o Recorrente, desde logo, ter ocorrido irregularidade no procedimento adotado nos autos para realização da prova pericial, afetando, de forma relevante, o seu direito de defesa, o que impediria a extração das conclusões firmadas na sentença e que conduziram ao juízo de procedência da ação, mormente a inversão do ónus da prova.
Vejamos, então.
Dispõe o art.º 417.º do NCPCiv. (com a epígrafe “Dever de cooperação para a descoberta da verdade”), na parte aqui relevante: “1 - Todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspeções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os atos que forem determinados.
2 - Aqueles que recusem a colaboração devida são condenados em multa, sem prejuízo dos meios coercitivos que forem possíveis; se o recusante for parte, o tribunal aprecia livremente o valor da recusa para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova decorrente do preceituado no n.º 2 do artigo 344.º do Código Civil.
3 - A recusa é, porém, legítima se a obediência importar:
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Violação da integridade física ou moral das pessoas; b) Intromissão na vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações; c) Violação do sigilo profissional ou de funcionários públicos, ou do segredo de Estado, sem prejuízo do disposto no n.º 4.” (itálico aditado).
E estabelece o n.º 2 do art.º 344.º do CCiv. que há “inversão do ónus da prova, quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, sem prejuízo das sanções que a lei de processo mande especialmente aplicar à desobediência ou às falsas declarações” (itálico aditado).
Ora, resulta do processado dos autos, quanto à considerada recusa do R./Recorrente a submeter-se ao exame/prova pericial no INML, que:
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Foi proferido despacho de expressa admissão dessa prova (fls. 49), do qual não foi interposto recurso (cfr. art.ºs 644.º, n.º 2, al.ª d), e 638.º, n.º 1, ambos do NCPCiv.); b) Tal despacho de admissão de prova foi objeto de notificação ao R. (fls. 54); c) O qual veio mostrar discordar da determinada realização do exame, por desnecessário, e afirmar que “não aceita” fazê-lo, o que traduz recusa perentória a submeter-se ao mesmo, sem nada requerer (fls. 56 a 58); d) Perante o que foi ordenada a notificação ao R. para comparência no INML, na data designada, “com a advertência do disposto na segunda parte do n.º 2 do artigo 417.º do C.P.C.” (fls. 62); e) Tendo-se procedido à notificação deste despacho ao Mandatário do R. (fls. 63) e ao próprio R., com explicitação da respetiva cominação (de multa, livre apreciação probatória do valor da recusa, sem prejuízo da inversão do ónus da prova, nos termos do n.º 2 do art.º 344.º do CCiv.
) – cfr. fls. 64 ([3]); f) Foi junta informação do INML, comunicando que o R. não compareceu ao exame, que, por isso, não foi realizado (fls. 73), tendo os autos prosseguido os seus normais trâmites...
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