Acórdão nº 2/18.0YRCBR de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal veio, nos termos do disposto no artigo 16.º, n.º 1, da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, na redação da Lei n.º 35/2015, de 4 de maio, requerer a execução do Mandado de Detenção Europeu (MDE), emitido pela Autoridade Judiciária Espanhola, relativo a A...

, de nacionalidade portuguesa, nascido a 23 de janeiro de 1967, na (...) , em Lisboa, filho de (...) e de (...) , titular do cartão de cidadão n.º (...) , detido desde as 12h30m do dia 04.01.2018 à ordem dos presentes autos, [situação em que, desde então, se encontra] com os seguintes fundamentos: (i) Pela Autoridade Judiciária Espanhola competente (Magistrado na Secção Quarta da Audiência Provincial de Madrid), no âmbito do processo n.º (...)/1991 desta Audiência Provincial de Madrid, foi em 02.11.2017 emitido um Mandado de Detenção Europeu (MDE), e inserida no Sistema de Informação Schengen (SIS) a indicação, nos termos do disposto no artigo 95.º da Convenção do Acordo Schengen de 14.06.1985, da necessidade de detenção e entrega às Autoridades Espanholas do cidadão português acima referido – inserção com a identificação Schengen (...), datada de 14.12.2017; (ii) Mandado e inserção emitidos pela circunstância de o requerido A... ter sido condenado, por sentença ( (...)/1991) transitada em julgado, proferida em 16.10.1991, pela referida Audiência Provincial de Madrid, Secção 4, na pena de 26 (vinte e seis) anos, 8 (oito) meses e 1 (um) dia de prisão, destinando-se a detenção do requerido à sua entrega às Autoridades Espanholas para cumprimento da dita pena; (iii) Condenação fundada na autoria de um crime de roubo com homicídio voluntário, p. e p. pelos artigos 109.º do Código Penal Espanhol e 240.º da LECR – artigos 500.º e 501.º do Código Penal Espanhol de 1973, consubstanciado nos factos descritos no Ponto 44 do formulário A da inserção Schengen; (iv) Quer a inserção no sistema SIS, da indicação de existência de um Mandado de Detenção Europeu e da necessidade de procurar e deter o requerido, quer a sua detenção foram legais; (v) Os factos que justificam o MDE e a inserção SIS, independentemente dos seus elementos constitutivos ou da sua aplicação, constituem a infração prevista e punível em Portugal pelos artigos 131º e 132º, n.ºs 1 e 2, alínea h) do Código Penal (homicídio qualificado), correspondendo ao mesmo a pena de 12 a 25 anos de prisão; (vi) Não se verifica nenhuma das situações que permitem a recusa do mandado de detenção europeu – artigos 11.º e 12.º da Lei n.º 65/03, de 23.08; (vii) As Autoridades Espanholas comprometeram-se a apresentar o original do MDE respeitante ao requerido, em boa e devida forma, no prazo legal; (vii) O requerido foi detido no âmbito dos presentes autos, no dia 04.01.2018, pelas 12 h 30 m, na Zona Industrial da Tocha, em Cantanhede, comarca de Coimbra.

Concluiu, requerendo a audição do detido [artigo 18.º da Lei n.º 65/03], com a validação e manutenção da detenção, e subsequente entrega às Autoridades Judiciárias Espanholas.

  1. O requerido A... foi, na condição de detido, apresentado neste tribunal para interrogatório, no decurso do qual – que decorreu com a assistência da Exma. Defensora nomeada - declarou não consentir na sua entrega às Autoridades Espanholas, pretendendo cumprir a pena em Portugal, opondo-se, assim, à execução do presente MDE, e não renunciar ao princípio da especialidade, requerendo prazo para apresentar a sua defesa (oposição), o que lhe foi concedido.

  2. Findo o interrogatório foi determinado que o requerido permanecesse na situação de detido, aguardando nessa condição o desenvolvimento da instrução do mandado de detenção europeu.

  3. Na mesma ocasião solicitou-se ao processo, que surge a fundamentar a emissão do MDE, determinados elementos, quais sejam certidão, com nota de trânsito, da sentença condenatória, informação sobre uma eventual declaração (no âmbito daquele) de contumácia ou equivalente e, bem assim, os relativos ao cumprimento da pena.

  4. Foram, entretanto, remetidos aos autos o mandado de detenção europeu, contendo os requisitos indicados no formulário anexo A que se reporta o artigo 3.º da Lei n.º 65/2003 e a certidão e sentença conforme disposto no artigo 4.º da Decisão-Quadro 2008/909/JAI do Conselho, de 27 de novembro.

  5. Na oposição o requerido, invocando: ter sido detido passado cerca de vinte e dois anos desde que na sequência da concessão de uma saída precária não regressou ao estabelecimento prisional, onde esteve preso à ordem do processo em que sofreu a condenação e que fundamenta o presente MDE aproximadamente cinco anos; residir com a irmã num apartamento em Coimbra; ter contacto diário com a filha, de 17 anos de idade, e a frequentar o 12 º ano, a quem acompanha nos estudos, e residir no prédio em que a mesma habita com a mãe, sua ex-companheira, convivendo os três de forma harmoniosa; sempre ter trabalhado na construção civil, como pedreiro, pintor, carpinteiro, em jardinagem, fazendo os descontos para a Segurança Social, encontrando-se até ao dia da sua detenção a trabalhar, desde Março de 2017, na Câmara Municipal de Coimbra, mediante contrato de emprego de inserção, requereu a este tribunal, com fundamento na alínea g) do artigo 12.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, a recusa de execução do MDE, comprometendo-se o Estado Português a executar a pena de prisão em que foi condenado, de acordo com a lei portuguesa.

  6. Notificado da oposição, o Exmo. Magistrado do Ministério Público respondeu nos seguintes termos: (i) O requerido, invocando para tanto o artigo 12.º, n.º 1, alínea g) do Regime Jurídico do Mandado de Detenção Europeu, requereu o cumprimento do remanescente da pena em Portugal, circunstância que, em função do seu percurso desde a condenação, salientando a sua atual situação, a vivência em Coimbra junto de familiares, facilitaria a sua reinserção; (ii) Dado o enorme lapso de tempo decorrido desde os factos e a interrupção da execução da pena, ocorrida em 01.09.1995, importa esclarecer, junto da Estado de emissão, se houve qualquer declaração de contumácia ou ato equivalente; (iii) Com efeito, embora o prazo de prescrição da pena, em Espanha, seja de 30 anos (artigo 133.º, n.º 1 do C. Penal Espanhol), em Portugal é de 20 anos, interrompido apenas, ou suspenso, no que ao caso releva, pela declaração de contumácia, nos termos dos artigos 122º, nº 1, alínea a), 126.º, nº 1, alínea b) e 125.º, n.º 1, alínea b) do C. Penal; (iv) Tendo em conta o disposto no n.º 3 do citado artigo 12.º, a causa de recusa invocada não poderá ser atendida se a pena não poder ser executada, nem sequer reconhecida, em Portugal, conforme decorre do artigo 17.º, n.º 1, alínea e) da Lei n.º 158/2015, de 17.09; (v) A prescrição da pena à luz da lei portuguesa, a verificar-se, não constituindo, embora, causa de recusa facultativa, poderá levar a um equacionar da situação em termos de proporcionalidade e adequação no que respeita ao cumprimento da pena, atento o direito a um processo equitativo, estipulado pelo artigo 6º da Convenção Europeia Para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais que deve abranger também o cumprimento de pena num prazo e em condições razoáveis, sendo incontornável ter decorrido um lapso de tempo manifestamente excessivo, tendo em vista a recaptura do condenado, desde a data do seu não regresso ao estabelecimento prisional onde iniciara o cumprimento da pena de prisão imposta e a emissão em 23 de Março...

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