Acórdão nº 156/14.5TTMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução03 de Novembro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 156/14.5TTMAI.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 407) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, jogador profissional de futebol, residente na Maia, veio intentar a presente acção declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato de trabalho (desportivo) contra C…, S.A.D., com sede em …, pedindo a condenação desta a pagar-lhe 2.085,00€ referentes à retribuição mensal ilíquida vencida a 8 de Junho de 2013 e não paga, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, e 2.500,00€ a título de danos patrimoniais[1], também acrescida de juros de mora.

Alegou em síntese que celebrou com a Ré contrato de trabalho desportivo para profissionais de futebol, por duas épocas, com início a 1.7.2011 e termo a 30.6.2013, as quais cumpriu, sendo porém que a Ré não pagou a retribuição peticionada, o que causou danos morais ao A.

A Ré, pugnando pela improcedência da acção, contestou, por impugnação e excepcionando dilatoriamente a violação da cláusula compromissória atributiva de competência exclusiva a uma comissão arbitral, e excepcionando peremptoriamente o pagamento, e invocando litigância de má-fé, peticionando indemnização não inferior a 2.500,00€.

O A. respondeu, e para o que aqui interessa, à excepção de incompetência, sustentando que o recurso à Comissão Arbitral Paritária apenas foi estabelecido para enquanto durasse o contrato, e não para após a sua cessação por caducidade, caso em que o litígio passava a estar submetido à jurisdição dos tribunais judiciais, concretamente, do Tribunal do Trabalho da Maia.

Foi então proferida a seguinte decisão: “Da competência absoluta Veio o réu C…, SAD, arguir a incompetência absoluta deste tribunal por preterição de tribunal arbitral, alegando que no contrato de trabalho celebrado entre si e o autor foi convencionado submeter os litígios decorrentes do mesmo à Comissão Arbitral Paritária prevista na cláusula 54.ª do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol (publicada no Boletim do Trabalho e do Emprego, 1.ª série, n.º 33, 08/09/1999, págs. 2778 e ss.).

Respondeu o autor, alegando que tal cláusula apenas seria válida durante a vigência do contrato, tendo sido nessa perspetiva que acordou em celebrar o contrato de trabalho e sendo essa a interpretação que um declaratário normal retira da cláusula do contrato de trabalho celebrado.

Cumpre decidir, sendo este o momento adequado para tal – art.º 98.º do Código de Processo Civil.

As partes estão de acordo em terem celebrado o contrato junto a fls. 8v. e ss., denominado “contrato de trabalho desportivo”, que dispõe na sua cláusula 18.ª o seguinte: “para dirimir conflitos entre si emergentes, as partes acordam em submeter a respetiva resolução à Comissão Arbitral Paritária constituída nos termos do disposto no artigo 55.º do C.C.T. referido na cláusula anterior”.

As cláusulas 54.ª e 55.ª do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e o Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol dispõem o seguinte: “Artigo 54.º Conflitos entre as partes Em caso de conflito decorrente do contrato de trabalho desportivo, será o mesmo submetido à apreciação da Comissão Arbitral Paritária constituída nos termos previstos no artigo seguinte, a qual decidirá, segundo o direito aplicável e o presente CCT e de acordo com o regulamento previsto no anexo II, que faz parte integrante deste CCT, não havendo lugar a recurso judicial das suas decisões.” “Artigo 55.º Comissão Arbitral Paritária Durante a vigência deste CCT é constituída uma Comissão Arbitral, que será composta por seis membros, sendo três nomeados pela LPFP, três pelo SJPF, cujo funcionamento está previsto no anexo II do presente CCT, tendo fundamentalmente as seguintes atribuições: a) Dirimir os litígios de natureza laboral existentes entre os jogadores de futebol e os clubes ou sociedades desportivas; b) Interpretar a aplicação das cláusulas do presente CCT; c) Vigiar o cumprimento do regulamentado; d) Estudar a evolução das relações entre as partes contratantes; e) Outras atividades tendentes à maior eficácia prática deste CCT.” Nenhuma das partes põe em causa a celebração do contrato e a cláusula que prevê o recurso à Comissão Arbitral Paritária, baseando-se a discordância do autor na interpretação que faz de tal cláusula como sendo apenas destinada a vigorar durante a execução do contrato de trabalho e não após a sua cessação, momento em que poderão as partes livremente recorrer aos tribunais.

Ora, salvo sempre o devido respeito por tal posição defendida pelo autor, entendo que da cláusula contratual e das cláusulas da CCT acima transcritas não pode ser essa a interpretação correta.

No que toca à cláusula do contrato, nada permite que se retire da mesma a conclusão de que se destinava apenas a vigorar durante a execução do contrato. Por um lado, não há qualquer menção literal expressa a essa situação – apenas se referem “conflitos entre si emergentes”, não sendo estabelecido qualquer limite temporal. Por outro lado, a interpretação da cláusula tem de ser feita em conjugação com o resto do contrato e tratando-se de um contrato de trabalho, logicamente a previsão de recurso à Comissão Arbitral tem de abranger qualquer conflito emergente de tal contrato, independentemente de estar o mesmo ainda em execução ou não. É sabido e notório que a esmagadora maioria dos conflitos emergentes de contratos de trabalho surgem num momento em que o contrato já não vigora, prendam-se eles com a cessação propriamente dita (despedimento promovido pelo empregador ou resolução por justa causa invocada pelo trabalhador) ou com créditos decorrentes da execução do contrato mas não pagos após a sua cessação. Além disso, remetendo a cláusula para a CCT, a análise desta também aponta claramente para que o recurso à Comissão Arbitral seja obrigatório quer o contrato ainda dure, quer já tenha cessado, desde que o conflito se baseie na relação de trabalho desportivo – na supra transcrita cláusula 54.ª apenas se refere “conflito decorrente do contrato de trabalho desportivo” e na cláusula 55.ª apenas se fala em “dirimir os litígios de natureza laboral existentes entre os jogadores de futebol e os clubes ou sociedades desportivas”. Ora, não há qualquer dúvida quanto a estarmos perante um litígio de natureza laboral entre o autor e o réu, pelo que cabe integralmente na esfera de competência da Comissão Arbitral Paritária. Na jurisprudência pode ver-se o acórdão da Relação de Lisboa de 01/06/2011 (disponível em www.dgsi.pt, com o n.º de processo: 261/10.7TTFUN.L1-4), que decidiu neste mesmo sentido num caso em que o contrato também...

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