Acórdão nº 434/12.8PASJM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelELSA PAIX
Data da Resolução08 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 434/12.8PASJM.P1 3º Juízo do Tribunal Judicial de São João da Madeira Acordam, em Conferência, as Juízas desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório No 3º Juízo do Tribunal Judicial de São João da Madeira, no processo comum singular nº 434/12.8PASJM, foi submetido a julgamento o arguido B…, tendo sido proferida decisão com o seguinte dispositivo: Em conformidade com todo o exposto, julgo a acusação procedente, por provada e, em consequência, condeno o arguido a) B…, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86º, nº 1, al. d) da Lei 5/2006, de 23.02, na versão actualizada pela Lei nº 12/2011, de 27.04, em conjugação com os artº 3º, nº 2, al.s e), h) e i do mesmo diploma legal, na pena de 260 (duzentos e sessenta) dias de multa à taxa diária de 7,50 (sete euros e cinquenta) o que perfaz o montante global de €1950,00 (mil novecentos e cinquenta euros) b) vai ainda o arguido condenado nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2( duas) unidades de conta.

*Atendendo a que existem sérios riscos dos objectos examinados nos autos poderem vir a ser utilizada na prática de ilícitos, nos termos do artº 109º, nº 1, do Código Penal, declaro-os perdidos a favor do Estado.

*Notifique e deposite.

Após trânsito, remeta boletins ao registo criminal.

***Inconformado com a decisão condenatória o arguido veio interpor recurso, terminando a motivação com as seguintes conclusões (transcrição): - houve incorrecta interpretação do art. 311º CPP no sentido que a nulidade invocada deveria ter sido apreciada antes do envio da acusação para julgamento, consubstanciando numa irregularidade e tendo como consequência a invalidade de todos os actos posteriores – art. 123º CPP - existe uma nulidade na busca efectuada ao veículo, com a consequência de invalidar todos os actos posteriores – artigos 120º, n.º 3, al. c); 122º e 125º - todos dos CPP Infere-se a nulidade tanto pelas declarações do recorrente e ainda das testemunhas arroladas por ele – C… “vieram cinco, seis agentes” – “ordenaram para sair…, e não deram qualquer explicação” … “não deram qualquer justificação para a busca” (03.53) - D… “mandaram sair do carro… não sei porque nos revistaram” (02.45) E ainda pelo depoimento do arguido “nunca usei… e eu em 50 anos nunca ninguém me chateou” (09.00) - em face da prova produzida em audiência de julgamento deveria ter siso dado como provados os seguintes factos: a) que os objectos encontrados no veiculo do recorrente não lhe pertenciam -b) esses objectos foram lá colocados por uma amigo do recorrente; c) já que o recorrente tem por hábito emprestar o veículo ao seu amigo quando ele vem a Portugal, acontecendo o mesmo ao recorrente quando se desloca ao país onde se encontra o seu amigo d) o recorrente desconhecia a existência dos objectos Tais factos baseiam-se nas seguintes transcrições da prova produzida em audiência de julgamentos: pelas declarações do arguido “assumi a responsabilidade… não quis que as pessoas que estavam comigo tivessem problemas”; “não sabia dos objectos”; “tenho um amigo em França .. e eu quando estou em França, ele empresta-me o carro dele… e ele quando cá está, eu empresto-lhe o meu carro” (03.50) Pelos depoimentos das testemunhas arroladas pelo recorrente (e mesmo quando interpeladas de forma quase intimidatória na instância da Sr.ª Juíza, em comparação para uma instância “suave com os senhores agentes policiais): - testemunha C… – “já em outras situações , possível de conflito… a postura do Sr. B… foi sempre justa/recta” (10.33) “eu próprio já conduzi o carro… sei quem é … de vista … de nome não sei “ (14.00) – “já o vi a conduzir o carro” (14.18) “ ele tinha cá estado” (15.00) – “já o vi conduzir 2/3 vezes “ (14.35) - testemunha D… – “não viu nada debaixo do banco” (05.15) “o Sr. B… não é uma pessoa para andar com este tipo de objectos” (07.30) - testemunha E… “o Sr. B… assumiu porque o carro é dele… empresta o carro.. já vi…” (04.00) Assim, os factos dados como provados nos números 3, 5 e 6 deveriam ter sido dados como não provados TERMOS EM QUE SE REQUER COM O SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVEM JULGAR PROCEDENTE A NULIDADE INVOCADA E CASO ASSIM NÃO ENTENDAM A IRREGULARIDADE E CASO ASSIM NÃO ENTENDAM DEVERÁ SER O RECORRENTE ABSOLVIDO DO CRIME QUE FOI CONDENADO O QUE PARECE SER DE INTEIRA JUSTIÇA***O recurso foi admitido.

***Em resposta ao recurso do arguido, o Ministério Público na 1ª instância pugnou que o mesmo seja julgado totalmente improcedente, mantendo-se, na íntegra, a sentença recorrida.

***Nesta Relação, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto aderindo à essência da resposta apresentada pelo Ministério Público em 1ª instância e, pugnando igualmente pela manifesta falta de razão, quer quanto à invocada nulidade, quer quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

***Cumpriu-se o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta.

***Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência.

***II – FUNDAMENTAÇÃO Passemos agora ao conhecimento das questões alegadas no recurso interposto da decisão final proferida pelo tribunal singular.

Para tanto, vejamos, antes de mais, o conteúdo da decisão recorrida- fundamentação de facto e de direito (transcrição): II - FUNDAMENTAÇÃO A) FACTOS PROVADOS 1-No dia 19 de Julho de 2012, cerca das 23h00, na Rua …, na cidade de São João da Madeira, área desta comarca, o arguido transportava na viatura com a matrícula ..-..-TS, que conduzia, os seguintes objectos: - Um aerossol com gás pimenta a 11% de concentração, apresentado sob a forma de botija portátil de cor preta, construída em alumínio, com um suporte de fixação e difusor em plástico, de cor preta, que continha 50 mililitros de gás comprimido, cujo princípio activo é um produto designado por “OC” (Oleoresin Capsicum), com 11% de concentração.

2-O produto “OC” é um spray de pimenta, também conhecido como OC spray (Oleoresin Capsicum), o gás OC e spray de capsicum é um agente lacrimogéneo que consiste num composto químico que irrita os olhos para causar lágrimas, dor e até mesmo cegueira temporária.

- Um boxer/soqueira, construído integralmente em metal (latão), o qual se destina a ser empunhado, introduzindo nos dedos de uma das mãos, sendo a sua função a de ampliar o efeito resultante de uma agressão.

- Um bastão extensível, com 20 cm de comprimento, constituído por um tubo rígido em metal cromado, com punho em borracha de cor preta, duas molas helicoidais flexíveis, também em metal cromado, que se distendem telescopicamente ficando com 51,5 cm de comprimento máximo, ponta da mola mais fina, uma pequena massa rígida em metal amarelo.

3-O arguido não justificou porque trazia consigo, na altura, o aerossol, a soqueira e o bastão extensível, que são objectos susceptíveis de serem utilizados como instrumentos de agressão.

4-Para além disso, o arguido não tinha qualquer autorização para se fazer acompanhar desses objectos.

5-O arguido agiu livre, deliberada e com a perfeita consciência de que detinha os citados objectos, de que os mesmos apresentavam as características acima indicadas, de que não tinha qualquer justificação para ter os mesmos na sua posse, que não fosse poder usá-los como instrumentos de agressão e/ou defesa.

6-Tinha, ainda, conhecimento de que a sua conduta era proibida, todavia não se absteve de ter esses objectos em seu poder e nessas condições.

Mais se provou que o arguido: 1-Tem duas empresas, concretamente, um bar e um restaurante.

2-Aufere o salário de 500,00 euros numa empresa, tendo três funcionários em cada empresa e refere que estão a dar prejuízo.

3- Vive em casa própria que se encontra a pagar ao banco através de uma prestação mensal de 750,00 euros.

4- A sua companheira, aufere um salário de 800/900 euros.

5-Tem dois filhos maiores, a cargo, de 24 e 19 anos de idade, que frequentam a Universidade pública, no Porto.

6- Conduz um veículo de marca Mercedes da empresa.

7-O arguido não tem antecedentes criminais.

Da contestação: 1-Nesse dia os senhores agente policiais dirigiram-se ao veículo em causa que se encontrava estacionado e parado na Rua …, nesta cidade e comarca onde o indivíduo se encontra acompanhado por mais de três indivíduos B) MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA Não se provaram, no decurso da audiência de julgamento, quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.

  1. MOTIVAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS A convicção do tribunal, alicerçou na apreciação critica do conjunto da prova produzida, conjugada com as regras de experiência comum O arguido negou que os objectos apreendidos, naquelas circunstâncias de tempo e lugar lhe pertenciam e disse que nem sequer sabia que os mesmos se encontravam no seu veículo.

Atenta a forma e o conteúdo das suas declarações não convenceu minimamente, desde logo na justificação que apresentou para a sua permanência dentro do seu veículo naquele local com três indivíduos, todos residentes fora da comarca.

Disse que por, após jantar em São João da Madeira e iniciar a condução constatar que se encontrava alcoolizado, ficando a aguardar, por tempo indefinido que o efeito etílico passasse.

Declarou que, na altura, só assumiu a propriedade dos objectos perante as autoridades, para que os acompanhantes não fossem responsabilizados, mas que pertenciam a um amigo, que se encontra emigrado em França e a quem 15 dias antes tinha emprestado o veículo e que se esqueceu dos mesmos no seu interior.

Ora, disse que quando viu tais objectos, lembrou-se logo que teria sido o amigo que estava em França e que ficou espantado, De acordo com as regras de experiência comum não fazia qualquer sentido que o dito amigo que necessitou do veículo por não ter trazido carro de França fizesse transportar tais objectos pelos vários países fronteiriços e que tendo a preocupação de os trazer para Portugal onde não era permitido a sua...

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